quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

Os discursos sibilinos de um homem sábio


Com bastos exemplos da sua teoria a respeito dos liliputianos que nunca tinham visto um homem tão grande, como Gulliver, para eles, gigante, que as aventuras seguintes relativizam, no paralelo com outras figuras de muito maior tamanho. Realmente, os Americanos parecem-nos enormes, desde os tempos dos primeiros filmes, em que eles apareciam como figuras de lenda, altos e belos e corajosos, além de que pioneiros, salvo algumas excepções, nas conquistas do espaço. Poderosos, sim, na aparência, que, também por ambição, vão colaborando nas lutas pelo mundo, quando estas assumem caminhos de uma orientação política desumana - apesar do ponto de partida de aparente bondade para com os humildes, como se viu pelas Ásias, e continua. Os Americanos aí estão em tentativas de auxílio, como no Afeganistão, que acabou em desaire, ou nesses seres fundamentalistas em cujo desaparecimento intervieram. Ouço dizer que são incultos, julgo que isso não será tão verdadeiro para quem tanto faz pelo conhecimento dos mundos da curiosidade humana. E o mundo espera desses Americanos o auxílio constante – interrompido aquando da presença grosseira mas realista de Trump - mas em que Biden uma vez mais participa na questão da Ucrânia. Tio Sam é muito mais justo, quanto a mim, como tributo da personalidade americana, que vejo, nos Estados Unidos, um espaço que, apesar de tudo, acolhe tanta gente e onde, aparentemente, se é mais livre – e talvez cumpridor.

FREEDOM - 5

 HENRIQUE SALLES DA FONSECA

A BEM DA NAÇÃO 11.01.23

À volta de Gulliver, todos são liliputs e se alguns se julgam grandes, não passam de pigmeus. E quando algum pequenote se porta mal, é mandado para um canto, virado para a parede e com orelhas de burro. Sem desprimor para esse simpático animal que tão útil foi para a Sagrada Família.

* * *

Os EUA são um buraco negro que tudo absorve à sua volta ou é um benigno Tio Sam rodeado de sobrinhos e afilhados?

Humanamente, é um chamariz mirífico  que atrai multidões desgraçadas pelo subdesenvolvimento intelectual de tiranos, tiranetes, caciques e caudilhos nepóticos. E a pergunta é: os EUA são poderosos porque são grandes ou porque são democráticos? Creio que a resposta é porque são democráticos e têm a sorte de serem grandes. Mas, para além do sentido democrático do regime pluripartidário e do plebiscito periódico e universal da opinião dos cidadãos, há o sentido cultural que dá à maioria dos políticos americanos o conceito de serviço ao bem comum, o Sentido de Estado enquanto nos liliputs rareia a democracia e sobra o Sentido de Propriedade por parte do «Dono do País».

Nesta viagem, lembrei-me de Friedrich List que dizia que a liberdade comercial internacional só é globalmente útil quando os países envolvidos se encontram sensivelmente no mesmo grau de desenvolvimento; caso contrário, os mais desenvolvidos arrasam os menos desenvolvidos. Vidé, o caso da NAFTA a beneficiar os EUA e o Cabadá em desfavor do México. Mas será mesmo por isto que o México não passa duma relativa cepa torta ou é a tal questão cultural do Sentido de Estado dos dirigentes?

Baixando agora ao nível liliputiano, constato as diferenças abissais entre opções tão opostas como a da hostilidade cubana para com os EUA e a atitude cooperante das Bahamas com o macro vizinho. E os resultados são tão diferentes que me limito a dizer que os cubanos cantam para espantarem os males que os afligem enquanto nas Bahamas a abundância é evidente e o povo é sereno.

Boa solução, a das Bahamas, que tem um Rei lá longe e que não se imiscui na vida do país e um Tio (Sam) que lhe dá navios para registo em bandeira de conveniência. E a economia suporta perfeitamente uma moeda tão forte como o US$ ou a matriarcal £. E assim foi que me lembrei de quem certa vez disse que Trás-os-Montes se esvaziaram porque não aguentaram uma moeda tão forte como foi o Escudo nos seus inícios. Não creio! Trás-os-Montes esvaziaram-se quando os transmontanos se fartaram do ostracismo e optaram pela aventura de melhores paragens.  E viva a «Porca de Murça» que vale hoje bem mais do que  Maurício de Nassau.

FIM

Janeiro de 2023

Henrique Salles da Fonseca

Tags: viagens

 COMENTÁRIOS:

 Anónimo  12.01.2023  16:27: Vê-se mesmo que as perguntas que fazes, Henrique, é de quem vai descontraidamente a navegar em veraneio… Começo por dizer que ainda bem que os EUA são democráticos e são grandes, quer territorial, quer económica, quer política, quer militarmente. Mas tens o exemplo do seu vizinho do Norte que, embora também grande territorialmente e democrático, não é muito importante mundialmente, pese embora pertencer ao club do G7. Se olhares para a Europa e para a Ásia encontras dois países extensos, respetivamente, a Rússia e a China, que são importantes e a Democracia nunca constou nas suas Histórias, ou, se constou, foi por um período tão breve que é irrelevante no tempo histórico (Kerensky, em 1917). Na Europa ainda se encontram países que foram importantes, embora territorialmente fossem relativamente pequenos. É o caso da Grã-Bretanha, pois o que lhe faltava em território sobrava em armada naval e em Império, ou o caso da França em que as baionetas, os canhões e o génio militar compensavam a escassez relativa de território. E ambos eram democráticos concomitantemente com o nascimento dos EUA. É claro que estes dois países europeus saíram da 2ª guerra mundial sem o anterior estatuto de potência, embora só mais tarde se tenham apercebido disso. A Inglaterra saiu vitoriosa, mas falida, enquanto a França saiu livre, mas humilhada. Só em 1956, quando os EUA do presidente acabado de ser reeleito, Eisenhower, as mandou sair do Suez (aonde tinham ido fazer uma incursão, com Israel, sem autorização prévia daqueles e quando os tanques soviéticos entravam na Hungria) é que interiorizaram que não eram mais potências. Não cabe num simples comentário (nem eu tenho o conhecimento, nem a expertise) o aprofundamento das respostas às tuas questões, mas não quero deixar de avançar com dois ou três tópicos sobre a génese do processo de engrandecimento dos EUA. Primeiro, recordo o próprio processo de formação do território, quer por conquista, quer por compra. Depois, a Doutrina de Monroe, no final do primeiro quartil do século XIX – A América para os americanos -, avisando que as potências europeias se deveriam manter afastadas do hemisfério ocidental. Depois, e como corolário dessa Doutrina, temos Theodore Roosevelt, no princípio do século passado, a proclamar intervenções unilaterais dos EUA na América Latina (a chamada política do “big stick”). Podemos apontar muitas causas do engrandecimento progressivo dos EUA, e certamente haverá as mais díspares opiniões valorativas dessas causas. Mas há pelo menos algumas que julgo que não oferecem grande controvérsia: a sua Democracia, o espírito empreendedor americano, a descoberta de petróleo, o seu território ter sido poupado às duas guerras mundiais do século transato e à genialidade do Plano Marshall que ajudou a reedificar a Europa, bem como a relançar a indústria americana no fornecimento dos bens e serviços que o velho continente carecia. O insuspeito Henry Kissinger, na sua fundamental obra “Diplomacia”, faz no capítulo 2 uma resenha sobre a evolução do seu País e logo no começo refere que a América, sob a administração de Wilson (1913-21), desempenhou um papel preponderante nas questões mundiais, proclamando princípios que constituíam ideias revolucionárias para os diplomatas do velho continente, tais como: a paz dependia da difusão da democracia, os Estados deveriam ser julgados pelos mesmos critérios éticos do que os indivíduos e que o interesse nacional consistia em aderir a um sistema de direito universal. Continuação de bom cruzeiro. Forte abraço. Carlos Traguelho

 António  12.01.2023  18:04: Muito agradecido, Doutor Henrique Salles da Fonseca, pelo prazer que proporcionou aos seus leitores com o seu diário de viagens. Não resisto a comentar sobre a sua astuta observação que é o sentido cultural, o Sentido do Estado v. o Sentido de Propriedade que é o factor determinante no sucesso ou atraso de um povo. Entre os três países do NAFTA o México é o que mais carece desse Sentido, embora, a meu ver, constato com pesar, vejo uma sensível decadência deste Sentido nos EUA. É o prenúncio que os melhores dias se situam no passado, não no futuro.

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