terça-feira, 30 de setembro de 2025

Os entreténs


Lá por fora. Os nossos são de consumo interno, sem relevo, pois. A não ser televisivamente, até que nos aprazem também, na inércia dos noventa, com o vento a levar a vida, aliterativamente falando… ou sussurrando...

Trump "fez a sua magia" e convenceu Bibi. Mas a paz ainda está longe de estar garantida

Em dia "histórico", Presidente norte-americano conseguiu convencer líder israelita a pedir desculpa ao Qatar e a aceitar um acordo para Gaza. Hamas pode recusar; e os parceiros de Netanyahu também.

CÁTIA BRUNO: Texto

OBSERVADOR,  30 set. 2025, 01:032

Índice

O acordo Biden 2.0 que tem dois pormenores espinhosos

A “exasperação” com Netanyahu que levou Trump a dar um murro na mesa

Os entraves: a resistência do Hamas e parceiros de coligação israelitas

 

“Um lindo dia, talvez até um dos maiores dias de sempre da civilização.” Foi assim que o Presidente norte-americano classificou o anúncio feito, esta segunda-feira, na Casa Branca, de uma proposta de plano para acabar com o conflito em Gaza, que contou com a anuência de Benjamin Netanyahu. Donald Trump falou num “dia histórico para a paz” e Bibi acabou por selar o anúncio, dizendo “apoio o seu plano para pôr fim à guerra em Gaza, que cumpre os nossos objectivos de guerra”.

É um avanço grande, já que é a primeira vez que o primeiro-ministro israelita afirma tão declaradamente em público que quer pôr um ponto final no conflito perante uma proposta que implica algumas cedências da parte de Israel. O que, à primeira vista, se traduz numa grande vitória para Trump.

Benjamin Netanyahu e Donald Trump na conferência de imprensa de segunda-feira Getty Images

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Mas ainda falta a luz verde do Hamas — e é possível que ainda haja tortuosas negociações, com o grupo terrorista a resistir à desmilitarização e o líder israelita a querer evitar um compromisso maior de reconhecimento de um futuro Estado da Palestina, a fim de não alienar ainda mais os seus parceiros de coligação no Governo. Por isso, impõe-se a questão: irá este dia ficar de facto para a História? Ou ainda é cedo para dizer que Trump conseguiu o que parecia impossível?

O acordo Biden 2.0 que tem dois pormenores espinhosos

Em linhas gerais, o acordo de 20 pontos apresentado esta segunda-feira inclui uma série de propostas como o fim imediato das operações militares por parte de Israel, combinadas com a libertação dos reféns em 72 horas. Prevê entrada de ajuda humanitária na Faixa de Gaza, a desmilitarização do Hamas (e possível amnistia dos seus membros), permanência dos palestinianos no enclave e o estabelecimento uma gestão de transição gerida por tecnocratas palestinianos, presidida pelo próprio Donald Trump e co-liderada por figuras internacionais como o antigo primeiro-ministro britânico Tony Blair, levantando a possibilidade de a Autoridade Palestiniana vir a ocupar esse lugar no futuro.

Na prática, a proposta não é radicalmente diferente de outras que já foram discutidas no passado, como notou o jornalista da Economist Anshel Pfeffer: “Deve ser dito que o acordo é essencialmente o mesmo apresentado por [Joe] Biden em 31 de maio do ano passado”, escreveu no X o também biógrafo de Netanyahu. “Tantas vidas poderiam ter sido poupadas se Biden tivesse pressionado Netanyahu à altura como Trump fez agora.”

A obrigatoriedade de desmilitarização do Hamas e a possibilidade de a Autoridade Palestiniana vir a assumir o poder em Gaza — com o reconhecimento de um Estado da Palestina no futuro — são os pontos da proposta que enfrentarão mais resistência.

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Há de facto vários pontos de contacto em ambas as propostas. Embora o plano de Biden previsse um cessar-fogo temporário como primeira fase do acordo, também previa a libertação de reféns israelitas de um lado (embora de forma faseada) e de prisioneiros palestinianos do outro, a entrada de ajuda humanitária e o regresso e permanência de palestinianos no território. Mas também há algumas nuances: o plano de Biden não tinha mais detalhes sobre o que constituía “um grande plano de reconstrução” com apoio internacional.

Era uma definição de futuro vaga. Desta vez, há alguns detalhes extra, como a criação de um órgão internacional para supervisionar o enclave. Os outros novos pormenores são precisamente os que representam o principal entrave à concretização deste plano de paz. Por um lado, a obrigatoriedade de desmilitarização do Hamas, que consta no texto; por outro, a possibilidade de a Autoridade Palestiniana vir a assumir o poder em Gaza, como abordou Trump, e o reconhecimento de um Estado da Palestina no futuro.

A desmilitarização do Hamas é um dos pontos do acordo que pode levantar mais resistência por parte do grupo Getty Images

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Ambas estão intrinsecamente ligadas, do ponto de vista do Hamas. Pouco depois da conferência de imprensa, um dos líderes do grupo terrorista deu uma entrevista à Al Jazeera onde não fechou a porta a um acordo, mas sublinhou que o plano atual é “uma tentativa de suprimir o impulso e a vaga de reconhecimento de um Estado palestiniano” — indiciando que essa pode ser uma das condições do Hamas para aceitar a proposta. Outro representante do grupo fez declarações à BBC que apontam no mesmo sentido, dizendo que a desmilitarização é “uma linha vermelha”, que só pode ser discutida se houver garantias de que venha a ser “estabelecido um Estado palestiniano independente com as fronteiras de 1967”.

Netanyahu, na conferência de imprensa, pareceu rejeitar liminarmente a ideia de a Autoridade Palestiniana vir a gerir o território — e, portanto, de vir a reconhecer um Estado da Palestina —, o que pode chocar com as palavras (vagas) do texto. “Não será uma surpresa para vocês que a larga maioria dos israelitas não tem qualquer fé que o leopardo da Autoridade Palestiniana venha a mudar as suas manchas”. Trump, contudo, não considerou isso um problema: “O primeiro-ministro Netanyahu foi muito claro sobre a sua oposição a um Estado palestiniano”, disse. “Compreendo e respeito a sua posição em muitas coisas, mas o que ele está a fazer hoje é tão bom para Israel.”

A “exasperação” com Netanyahu que levou Trump a dar um murro na mesa

Talvez Donald Trump acredite que pode vir a convencer Bibi a mudar de ideias no futuro da mesma maneira que o fez esta segunda-feira. O seu poder de persuasão sobre o líder israelita ficou patente num momento crucial: aquele em que o primeiro-ministro israelita telefonou ao primeiro-ministro do Qatar para pedir desculpas pelo ataque ao país no início de setembro.

“Israel não tem qualquer plano para voltar a violar a vossa soberania no futuro e fiz esse compromisso ao Presidente [Trump]”, acrescentou Netanyahu durante a chamada. Um flic flac claro, se tivermos em conta que, na véspera, em entrevista à Fox News, Bibi comparou o ataque ao Qatar (que tinha como alvos líderes do Hamas que vivem no país) à operação dos EUA no Paquistão que matou Bin Laden. “Um país que se respeite não dá abébias a terroristas”, disse.

Mas foi um passo que Trump forçou Netanyahu a tomar, por uma razão simples: na sequência do ataque, o Qatar retirou-se como negociador da questão israelo-palestiniana. Sem o emirado, que mantém grande influência sobre o Hamas e é também aliado dos Estados Unidos, era praticamente impossível que as negociações se mantivessem de pé.

Trump com o emir do Qatar, país mediador do conflito em Gaza e aliado dos EUA

Getty Images

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A pressão de Trump foi evidente até na linguagem corporal da conferência de imprensa, com o Presidente norte-americano a protagonizar um longo monólogo perante um Netanyahu sem expressão e em silêncio, ao contrário da sua postura habitual.

Mas como conseguiu Donald Trump dominar Netanyahu e obrigá-lo a aceitar um acordo não muito diferente daquele que Biden oferecera — e cujos novos detalhes podem ser ainda mais pesados, do ponto de vista do primeiro-ministro israelita? Várias fontes da Casa Branca foram dando sinais sobre isso ao longo do último mês:“toda a gente está exasperada com o Bibi”, lamentava uma fonte da administração ao site Axios, destacando como Steve Witkoff e Jared Kushner — que estiveram na sala durante a reunião desta segunda-feira na Casa Branca — estão “pela ponta dos cabelos com Israel”.

“Os árabes já concordaram a 100%. Agora estamos à espera que o Presidente faça a sua magia com Netanyahu.” Conselheiro de Donald Trump ao site Axios

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A gota de água parece ter sido precisamente o ataque ao Qatar, um conhecido aliado dos norte-americanos. Cada vez que estamos a fazer progressos, ele bombardeia alguém”, disse uma fonte da equipa de Segurança Nacional ao Politico. “É por isso que o Presidente e os seus conselheiros estão tão frustrados com Netanyahu.”

Perante essa exasperação, como se posicionaram os Estados Unidos para conseguir pressionar Benjamin Netanyahu? Ao que tudo indica, terá sido uma combinação de diplomacia com pulso firme. Primeiro, conseguindo alinhavar a proposta com vários países árabes e conseguindo que a apoiassem — o que ficou patente horas depois da conferência de imprensa, com uma declaração conjunta de respaldo à proposta. “Os árabes já concordaram a 100%. Agora estamos à espera que o Presidente faça a sua magia com Netanyahu”, comentava outro conselheiro do Presidente com o Axios.

Ninguém sabe ao certo o que disse Trump a Bibi dentro daquela sala. Mas, a fazer fé no mesmo conselheiro, a estratégia poderá ter sido dura: se Netanyahu não aceitasse, o Presidente norte-americano iria culpá-lo em público por não ter sido alcançado um acordo, o que seria um puxão de orelhas inédito dos Estados Unidos ao seu aliado.

Os entraves: a resistência do Hamas e parceiros de coligação israelitas

Significa isto que agora é apenas uma questão de tempo até os bombardeamentos pararem e os reféns serem libertados? Não exactamente.

Primeiro, é preciso que o Hamas aceite a proposta. A esperança de Washington é que a pressão dos países árabes possa ajudar a dobrar o grupo terrorista e convencê-lo, mesmo isso implicando aceitar uma paz que representa a sua auto-destruição, ao mesmo tempo que suaviza a resistência dos israelitas a uma transferência de poder futura para a Autoridade Palestiniana.

 Não vejo ainda um acordo. Vejo um grande acordo teórico, vejo uma simulação”, notou à Al Jazeera o ex-diplomata israelita Alon Pinkas. “Quero ser optimista, mas acho que isto é demasiado complicado, demasiado complexo, há demasiados temas alvo de disputa aqui.

Não só é difícil imaginar o Hamas a aceitar livrar-se do seu armamento e estruturas militares, como também não é claro como conseguirá Bibi convencer os partidos de extrema-direita que sustentam a sua coligação a aceitar esta proposta. O ministro da Segurança, Itamar Ben-Gvir, já tinha avisado no sábado: “Senhor primeiro-ministro, o senhor não tem mandato para acabar com a guerra sem uma derrota completa do Hamas”, escreveu no X. Já o ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, tem colocado como exigências para um acordo a manutenção de tropas israelitas no corredor de Filadélfia (na fronteira de Gaza com o Egito) e o completo afastamento do processo da Autoridade Palestiniana e do Qatar.

Ben-Gvir e Smotrich, os ministros radicais do Governo de Israel que podem rejeitar o acordo POOL/AFP via Getty Images

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Sobre este último país — e ilustrando o afastamento de Smotrich de Bibi —, o ministro reagiu ao telefonema de Netanyahu para Doha comparando-o ao Acordo de Munique, assinado por Neville Chamberlain e outros líderes europeus com a Alemanha Nazi em 1938. Dirigindo-se directamente ao seu primeiro-ministro, acusou: “O seu bajulador pedido de desculpas a um Estado que apoia e financia o terrorismo é uma desgraça.”

Isso não significa, contudo, que Ben-Gvir e Smotrich arrisquem deitar abaixo o Governo e perderem a capacidade de continuar a influenciar a liderança do país. E, mesmo que o venham a fazer, há sinais de que isso pode ser contornado, como explicou à BBC Jonathan Conricus, antigo porta-voz das IDF: o militar reconhece que o acordo é “difícil de vender internamente”, mas também que é possível “embrulhá-lo e oferecê-lo à opinião pública de Israel”.

Não por acaso, os principais líderes da oposição, Yair Lapid e Benny Gantz, aplaudiram o documento e desfizeram-se em elogios a Donald Trump. Lapid classificou a proposta como “a base certa para um acordo”, Gantz destacou que este “deve ser implementado”. No passado, ambos já se ofereceram para substituir os partidos de extrema-direita, caso Netanyahu precise de apoio político para aprovar um acordo que leve ao fim da guerra em Gaza.

No fundo, as incógnitas ainda são muitas. “Estamos numa espécie de limbo; meio que fora do inferno, mas ainda sem saber se vamos chegar ao paraíso”, resumiu à BBC Yehuda Cohen, pai do refém Nimrod Cohen, que ainda está em Gaza. Por agora, só há uma coisa clara: “Entre sorrisos e abraços, Trump forçou Netanyahu a aceitar este acordo”, diz o israelita, apontando o telefonema para o Qatar como exemplo máximo. “Trump está a forçar Netanyahu a aceitar este acordo enquanto o abraça.”

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COMENTÁRIOS;

Antonio Madureira: Biden 2.0?! Por amor de Deus! É um plano totalmente diferente que inclui passos detalhados para a reconstrução de Gaza e envolve muitos Estados Árabes. Sei que é muito difícil reconhecer que Trump possa fazer qualquer coisa certo mas os jornalistas terão de se habituar...

henrique pereira dos santos: Nem uma palavra sobre os reféns que o Hamas não quer libertar. Extraordinário.

Saliência


Vistosa, por vezes, na opção política, por amor à novidade ideológica do momento, que nos moderniza a nós.

A aliança entre a extrema-esquerda e o radicalismo islâmico

Para esses movimentos, Israel simboliza o triunfo de tudo o que sempre combateram: o capitalismo, a economia de mercado, a democracia liberal e os valores ocidentais.

JOÃO MARQUES DE ALMEIDA Colunista do Observador

OBSERVADOR, 29 SET. 2025, 00:2082

Há uns meses os serviços de segurança franceses escreveram um relatório para o Presidente Macron. O principal tema do relatório era a infiltração crescente nos últimos anos de grupos radicais islâmicos na sociedade e em instituições francesas. Muitas das actividades destes grupos são financiadas por países estrangeiros, como a ARGÉLIA, O IRÃO, O QATAR E A TURQUIA.

O relatório também mostrava que há uma aliança entre as extremas-esquerdas francesas e os grupos islâmicos radicais. Os serviços de informação olham para esta aliança como uma ameaça grande à segurança interna francesa. A aliança entre o partido de Melenchon (a França Insubmissa) e os movimentos islâmicos radicais, até em listas comuns para eleições locais, não é novidade para quem segue a política francesa.

Os serviços de informações alemão e britânico também produziram relatórios semelhantes. As alianças entre as extremas-esquerdas e os islâmicos radicais também existem na Alemanha e no Reino Unido. Em terras alemãs, é o De Linke que se alia aos islâmicos radicais, e no Reino Unido é o novo partido de Corbyn. Na Alemanha e no Reino Unido, a situação não é tão grave como em França. A razão não tem a ver com o número de imigrantes, já que é semelhante nos três países. Tem a ver com a dimensão política da extrema-esquerda: é muito maior em França do que na Alemanha e no Reino Unido.

Neste momento, Gaza transformou-se na maior causa do esquerdismo-islamismo. Os grandes aliados do Hamas são o Irão, o Qatar e as extremas esquerdas europeias. Não são os outros países árabes. Tirando o Qatar, nenhum outro estado árabe apoia o Hamas. Por que razão o governo do Egipto não abre a sua fronteira com a Faixa de Gaza, apesar da tragédia humanitária no território? Por uma razão muito simples: não quer elementos do Hamas no seu país.

É fundamental fazer uma distinção entre quem neste momento discorda da política do governo israelita em Gaza e os grupos de extrema-esquerda que sempre odiaram Israel, como Melenchon, Corbyn e, em Portugal, o Bloco de Esquerda e o PCP. Já eram favoráveis ao Hamas e anti-Israel muito antes dos ataques terroristas de 7 de Outubro de 2023. Para esses movimentos, Israel simboliza o triunfo de tudo o que sempre combateram: o capitalismo, a economia de mercado, a democracia liberal e os valores ocidentais. Entre o Hamas e as virtudes ocidentais, preferem o primeiro. Para as extremas esquerdas, o radicalismo islâmico é o grande aliado para as suas lutas revolucionárias na Europa.

De acordo com a sua tradição histórica, as extremas-esquerdas representam o pior das ideologias até hoje produzidas na Europa e, como sempre, aliam-se ao pior que existe: os Bolcheviques, o estalinismo, o maoismo, a Albânia, Cuba, o Chavismo e agora o radicalismo islâmico e o Hamas. Há uma linha condutora nas extremas esquerdas ao longo dos últimos cem anos: combater a cultura, as tradições e os valores ocidentais. Hoje, o grande aliado das extremas-esquerdas para combater os valores ocidentais é o radicalismo islâmico.

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COMENTÁRIOS (de 82)

Uiros Ueramos: Em Portugal, França, Alemanha, Espanha, Itália ou Reino Unido, vemos partidos como o Bloco de Esquerda, o PCP, o Livre e o PAN sistematicamente com narrativas que não escondem a simpatia pelo Hamas. Não se trata apenas de crítica à política de Israel, trata-se de uma escolha deliberada de lado: entre o radicalismo islâmico e os valores ocidentais, escolhem o primeiro. A história não engana: ontem foi Estaline, Mao, Castro ou Chávez. Hoje é o Hamas. Sempre a mesma lógica, atacar o capitalismo, a economia de mercado, a democracia liberal, as tradições e valores do Ocidente. Gaza é apenas o palco mais recente de uma velha guerra ideológica. É notável a desfaçatez. Enquanto milhões morreram na Ucrânia e em conflitos africanos sem uma única manifestação da extrema-esquerda, para Gaza não faltam cartazes, gritos e até flotilhas “humanitárias” autênticos cruzeiros de luxo disfarçados de causa revolucionária, orçados em dezenas de milhares de euros por cabeça. E o mais grave: esta aliança não é mera retórica. Relatórios dos serviços de informações de França, Alemanha, Bélgica, Países Baixos, Itália, Suécia e Reino Unido confirmam a infiltração de grupos islâmicos radicais e a colaboração activa de forças de extrema-esquerda. Uma convergência perigosa que mina a segurança interna e cria uma frente ideológica contra as próprias sociedades democráticas que lhes dão palco para a extrema-esquerda europeia o que lhes interessa é a oportunidade de, mais uma vez, se colocar ao lado do pior que existe para atacar o Ocidente. O que ontem foi estalinismo, maoismo ou chavismo, hoje veste a túnica do islamismo radical. A linha de continuidade é clara: sempre contra as liberdades, sempre contra a democracia, sempre contra o Ocidente.                Ricardo Ribeiro: O problema não é só a extrema-esquerda, que em Portugal, por exemplo, é praticamente residual. A questão torna-se mais grave quando partidos ditos centristas, Ps e Psd, dão apoio e confirmam essa política criminosa anti-ocidental.Exemplos não faltam, refiro apenas 2: 1 - Geringonça do Ps com essa extrema para tomar conta do poder tendo como contrapartida e consequência a implementação dessas políticas. 2 - Governo do Psd e respetivo reconhecimento do pseudo estado da Palestina. Portanto quem tem visão contrária a essas políticas só tem uma solução (Cds não conta pois está aliado a um dos partidos referidos), é votar no que sobra com todos os seus defeitos, que os tem. Adivinhem qual é?...                    José Fernandes: Parece não ser só a extrema. Há ainda os jornaleiros que costumam esquecer os reféns israelitas e ... palestinianos.               Manuel Almeida Gonçalves: Uma boa, válida e bem exposta perspectiva.         Hugo Vieira > Ricardo Ribeiro: Só não concordo com uma coisa que escreveu e que acho importante. Extrema-esquerda em Portugal não é residual. PS tem dado demasiados sinais de ser extrema-esquerda. PSD é centro-esquerda. Este país está tão inclinado para a esquerda que nem nos apercebemos da dimensão do problema.                    Quase Famoso: Não se esqueçam, enquanto os muçulmanos forem a minoria, irão sempre gritar pelos direitos das minorias. Em todo o lado onde os muçulmanos são a maioria, o direito das minorias pura e simplesmente não existe.          José Mendes Gil: Artigo certeiro e transparente. A extrema esquerda tem ódio ao Ocidente, à liberdade e democracia e a Israel . Prefere os assassinos do Hamas. " Do rio até ao mar " representa aniquilar Israel . Esquecem um dos autores : A. Hitler e os campos de extermínio                    João Angolano: Curto e grosso só não concluiu um pouco mais sobre o caso Macron que sabendo do que se passa nada faz e até oferece ao Hamas uma bandeira…mas Macron é tão só mais um caso de um pervertido europeu que chega ao poder ….aliás como há aos pontapés e até nós cá em Portugal temos isso mas um pouco mais fofinho.                     Ana Torres: Aqui em Portugal não é diferente, existe uma clara aliança entre o PS, a extrema-esquerda e o radicalismo islâmico, assim como a maioria da CS e dos comentadores de serviço, Pizarro anda de braço dado com a comunidade islâmica do Bangladesh no Porto com a ganância de obter os seus votos, nas últimas eleições viram-se imagens na tv de Mariana Mortágua após votar ir cumprimentar e a dar uma entrevista aos líderes das comunidades islâmicas em Lisboa, assim como Rui Tavares é um firme defensor de uma sociedade multicultural, desde que os filhos possam estudar num colégio de elite e longe dessa realidade.           Jorge Espinha: A sua crónica devia ser diária . Obrigado!                 Rui Lima: Parabéns,  hoje é preciso muita coragem na Europa para falar verdade sobre Israel todos estão com o extremismo do Hamas (objectivamente) até o nosso governo que muitos dizem ser de direita . Um livro que vai sair fala dessa aliança da esquerda com o Islão o radical  "Os Cúmplices do Mal" que fala do “islamo-gauchisme “ O seu Omar Youssef Souleiman que fugiu da Síria e viveu Arábia Saudita o encontrou um ambiente em França não é diferente deste países de onde fugiu. Hoje quase toda a esquerda é totalitária foram para tribunal para impedir a publicação deste livro, faz lembrar o processo Kravchenko que tinha desertado escreveu um livro, J’ai choisi la liberté (“Escolhi a liberdade”), publicado em francês em 1947, no qual denuncia o regime de Stalin, também ele foi perseguido em França pelos comunistas .        Carlos Chaves: Isto a ser devidamente comprovado, era razão suficiente para ilegalizar estes partidos nas democracias ocidentais! Estão a pôr em causa a nossa segurança, o nosso bem-estar, os nossos valores, a nossa cultura, e as nossas tradições! Autênticos traidores, não têm lugar nas nossas sociedades! O PS e o PSD deviam levar uma coça valente nas eleições, não esqueçamos que apoiaram o reconhecimento de um “estado” terrorista!        António Lamas: É a aliança mais contra-natura do mundo de sempre. Como é possível juntar direitos das mulheres, defesa da homossexualidade, a imposição da ordem pelas armas, a falta de democracia com o radicalismo islâmico? A extrema-esquerda é mesmo estúpida                      Carlos Chaves > Ana Torres: E a cereja em cima do bolo, é o PSD ter reconhecido um “estado” terrorista! Ou seja, não são só os socialistas a fazerem má figura, a esses já estamos habituados que a façam!             graça Dias: Caro João Almeida, os meus Parabéns por este seu "grito de alerta" , e que muito gostaria que o 1°Ministro Luís Montenegro tenha oportunidade de ler e concluir como a sua ignorância o levou a CERTIFICAR a agenda política do Mr. Macron bem consciente dos SEUS PROBLEMAS internos. Recomendo o livro" CÚMPLICES DO MAL  do jornalista franco-sirio Omar Youssef Souleimane. Todos podemos compreender melhor no que se traduzem as manifestações "PALESTINA LIVRE" Cruzeiros " Flotilhas " ...PROPAGANDA DO ANTISSEMITISMO e o apelo a um novo HOLOCAUSTO.         Paulo Cardoso > José Roque: Teve a oportunidade de expandir a análise, com a justificação da sua válida opinião, mas optou por simplesmente classificar sem fundamentar. A análise está fundamentada. Por muito redutora e limitada que a possa considerar, é bem mais esclarecedora que o seu comentário.         Bailaruco Madeira: Bom artigo. A Extrema Esquerda, tal como os seus Aliados e Amigos Radicais Islâmicos, constituem dois CANCROS nas sociedades europeias, que têm que ser combatidos vigorosamente, sem tréguas.                  Maria Oliveira: João Marques de Almeida está absolutamente certo.           Nuno Abreu: Muito bom. Muito bom mesmo. Tudo clarinho como a água. Mortágua e Raimundo são farinha do mesmo saco. Querem acabar com a civilização Ocidental.          António Costa e Silva: Falta escrever sobre a cumplicidade e colaboração dos "moderados", da esquerda, do centro e da direita, na promoção da invasão da Europa pelo islão. Ser "moderado", hoje, é ser traidor; dos seus Avós, dos seus Pais e dos seus filhos. Ser verdadeiramente moderado, é promover a deportação dos invasores à força, hoje, para prevenir a inevitabilidade da violência amanhã.                    Ricardo Ribeiro > Hugo Vieira: Verdade! Estava-me a referir ao que este cronista considera extrema esquerda no seu artigo.           Jose Bastos: Escreva assim que continuo a ser seu leitor assíduo Total concordância.                     João Diogo: Excelente texto.            Fernando Soares Loja: Na mouche. E o que mais impressiona é que a esquerda até sacrifica as suas ideias e deixa cair ao chão as suas bandeiras, como a igualdade entre homens e mulheres e a protecção dos LGBTQ, para apoiar movimentos islâmicos que são, como sabemos, opressores das mulheres e inimigos dos LGBTQ. A incoerência da esquerda no seu melhor.                      Paulo Coelho: O problema é que não necessitam converter os convertidos. Traduzindo, quem lê esta crónica, já sabe isso. Mesmo que fosse apenas a nível do subconsciente. Como sempre, o que é necessário é o velho "follow the money".           Miguel Seabra: A aliança entre a esquerda e o radicalismo islâmico está bem presente nas UN. A propósito vamos ter esta semana uma conferência da UNesco, para “ definir a agenda cultural dos próximos anos”. Em Barcelona com o Pedro Sanches como mestre de cerimónias. A UNESCO não tem nenhuma credibilidade, tal como a as UN em geral. Há uns anos aprovaram uma resolução determinando que o Povo Judeu não tem qualquer ligaçâo histórica e cultural com a cidade de Jerusalém. Esta resolução foi aprovada com os votos favoráveis dos Países muçulmanos e seus aliados e com a covarde e vergonhosa abstenção das democracias ocidentais incluindo Portugal. Entre os raros votos contra, destacou-se a Itália, certamente receosa de alguma resolução a questionar se Roma é património cultural italiano….Para esta interessante reunião em Barcelona esperam-se boas novidades. Talvez a revelação de que Pedro Sanchez é descendente de Maomé….      graça Dias > Nuno Abreu: Deve-se acrescentar uma relevante parte do partido socialista, o Livre e até o PAN, aos quais acresce jornalistas e comentadeiros.                      vitor gonçalves > António Lamas: Posteriormente, depois de atingir o poder, eliminavam os islâmicos , como têm feito nas sociedades marxistas ao longo dos tempos. O contrário também é verdade; o Ayatola komeini foi apoiado inicialmente em 79 pelos comunistas e depois de atingir e consolidar o poder, fez uma purga e matou a totalidade das elites socialistas e comunistas. E tudo a mesma m@rda.                      António Alberto Barbosa Pinho: Absolutamente certo.                       graça Dias: HOJE em Portugal ( e em muitos outros países) a extrema esquerda ( PS, BE,PCP e Livre), e alguns dos grupos de comunicação são um "COMPLEXO INDUSTRIAL " da Propaganda: faz DOUTRINAÇÃO intensiva, pretende reescrever a História, impõe o PENSAMENTO ÚNICO , manipula a verdade, manipula políticos frágeis em carácter e pensamento, impõe alterações de programas de ENSINO, Organizações como a ONU as ONGs ( onde gentinha da extrema esquerda está luxuosamente instalada), fazem parte deste poderoso "COMPLEXO INDUSTRIAL ", que condiciona a liberdade e promove discursos de ódiooo.         Edite: "Complexo Industrial " visa alcançar um sistema de DITADURA TOTALITÁRIA.       Coxinho > Fernando Soares Loja: A "incoerência da esquerda" é coerente com uma outra realidade que está subjacente e bem camuflada por essa mesma esquerda: o propósito inconfessável de reduzir a população mundial desencadeando guerras e catástrofes "climáticas", provocando divisões no seio da sociedade com o pretexto falso do humanitarismo, conferindo privilégios e subsídios a minorias religiosas, estimulando a entrada massiva de muçulmanos no território nacional, sabendo de antemão que está a favorecer a destruição da coesão social... Ou seja: desde a experiência estalinista da URSS, a esquerda sempre usou a falsidade do humanitarismo para promover o caos de que precisa para sobreviver.         Maria Soares: Muito bem!                          graça Dias: Caríssimo João Almeida: Se me permite, recomendo livro "CÚMPLICES DO MAL " sobre as ligações entre o artigo La France Insoumise ( partido da extrema esquerda francesa do Jean Luc Mélenchon) e o ISLAMISMO. Livro do jornalista franco-sirio Omar Youssef Souleimane, em que o autor na contracapa escreve como " um grito de alarme que denúncia a aliança obscura da France Insoumise com o islamismo e o seu plano, para desestabilizar a democracia francesa. NOTA: O partido de Jean Luc Mélenchon inclusive recorreu a advogados para impedir o lançamento do (o autor do livro escreve em inúmeras manifestações de apoio à PALESTINA LIVRE, igualmente em associações palestinas marcadas com a presença de Islâmicos. Livro muito bem documentado com factos e testemunhas irrefutáveis). Podemos concluir no que se traduz as," Flotilhas, Palestina livre ", e que lastimavelmente o1º Ministro Luís Montenegro   Certificou !           José Piçarra: O fio condutor de todas as alianças, algumas antagónicas ou contraditórias, dos movimentos de extrema-esquerda é fazer acontecer a dita revolução, seja da maneira como for. Esse fim último justifica todo e qualquer meio. Não querem criar nada, só destruir.                   Carlos Chaves > Ana Torres: Caríssima Ana Torres, ou muito me engano, mas o preço eleitoral a pagar pela arrogância (para ser simpático), de Luís Montenegro e Paulo Rangel, vai ser elevado! Até este inaceitável episódio, relevei alguns erros grosseiros já cometidos por este governo, mas este não tem perdão, este governo não me representa, são autênticos traidores à Pátria!                        graça Dias > Ricardo Ribeiro: Só posso concordar com a evidência do que aqui escreve. Lamentavelmente o nosso 1º Ministro Luís Montenegro e a sua cultura básica e imaturidade política, deu um duro golpe na política externa de Portugal, mas também na confiança que milhares de alguns portugueses lhe deram.                         Joel Marques > Novo Assinante: Na Nigéria já mataram mais de duzentos mil cristãos, já queimaram cerca de dezoito mil templos. Onde está a indignação? Onde estão os protestos? Onde estão as bandeiras? Onde estão as capas de jornais? Onde está a esquerda humanista? Nada! Zero!! Porquê? Aniquilar tudo o que é judaico - cristão é para ser exterminado, aniquilado, varrido da face da terra. E os milhões de deslocados no Sudão? E em Moçambique? Coerência precisa-se! Isto de condenar apenas os judeus por lutarem pela sua sobrevivência, é odioso, é racismo. Mas claro, são os valores da esquerda. Mas pode ser que um dia estes valorosos extremistas islâmicos vos batam à porta. E é um caminho sem retorno! Aguentem-se.                    João Floriano > Ricardo Ribeiro: Mas mesmo residual mantém-se muito activa na CS. Veja-se o caso do Observador, o caso dos canais de televisão onde se contam pelos dedos de uma mão os comentadores a favor de Israel, enquanto que os do Hamas são «às paletes», lembrando o Nélio de Herman José.                 joao lemos: nem mais. pensar que assim não é, não sendo de esquerda radical, é tão só desempenhar o papel de "idiota úitl"                Carlos Carvalho: Infelizmente ainda temos alienados mentais que votam nesses grupelhos, sobretudo o bloco comunista. Muita culpa do “jornalismo” não do articulista.

segunda-feira, 29 de setembro de 2025

“Imagens que passais”

 

“Pela retina dos meus olhos” foi o que me lembrou mais este magnífico texto evocativo, de JAIME NOGUEIRA PINTO, que traduz vivências e prazeres a que, mais parcamente embora, também pudemos aceder se não sempre pela visualização dos filmes de que fala, na sua totalidade, pelo menos muito parcialmente, e sobretudo nos registos referenciais.

Uma bonita homenagem de JNP – mais um texto, a enriquecer o nosso património cultural e que desta vez nos faz reviver uma bonita figura que por nós passou e permanece fixada nos filmes que protagonizou – CLÁUDIA CARDINALE-

E, já agora, um soneto, no prolongamento do prazer pela beleza da palavra escrita, expressiva, neste caso do título do soneto de Camilo Pessanha, não de prazeres vividos, mas do sentimento trágico da vida sobre o irrefutável da morte e da vacuidade das aspirações humanas a um prolongamento dessas, mas necessariamente efémeras. Por isso, no final deste texto de JNP, reponho o soneto de CP, pelo prazer da sua leitura, não como corolário do texto de vivências na magia que é o sentido da vida que nos foi dada, plena de recordações de prazeres e de amores que os tempos trazem, uns mais gratos pelo dom da vida, outros mais dramáticos no sentimento trágico do seu efémero. Ambos os textos – o de JAIME NOGUEIRA PINTO e o de CAMILO PESSANHA merecedores da nossa gratidão – o primeiro pela evocação de algo que passou e que amámos, o segundo pela criatividade no sentimento, por derrotista que seja, ambos transparentes de realidades vivenciadas e que nos são oferecidas para nosso prazer de colhedores do espírito alheio. Daí a nossa gratidão constante, no bem-estar espiritual com que pensamentos alheios nos deleitam.

 

Claudia Cardinale (1938-2025)

O desaparecimento de Claudia Cardinale lembra-nos o muito que nos trouxe e ao cinema e damos graças pelo dom da vida e pelo que de bom e de belo constantemente se cruza connosco e nos toca neste mundo

JAIME NOGUEIRA PINTO Colunista do Observador

OBSERVADOR, 27 set. 2025, 00:1836

Quando comecei a ver cinema (a “ir ao cinema”, como se dizia), o cinema italiano era um grande cinema, para não dizer o grande cinema. A começar pelos realizadores, os Visconti, os Fellini, os Pasolini, os Antonioni, os Monicelli, os Risi, os Rossellini, os De Sica, criadores admiráveis em todos os géneros, da comédia mais divertida à tragédia mais shakespeariana.

Mas para nós, miúdos, muito mais do que os realizadores, que até à adolescência nos passavam relativamente despercebidos, impressionavam-nos os actores – um cómico admirável, como Antonio de Curtis, Totó, um actor genial para papéis mais sérios, como Marcelo Mastroianni, ou alguém preparado para todos os géneros, como Vittorio Gassman. E mais ainda que os actores, fascinavam-nos as actrizes.

Estávamos no Portugal dos anos 1960, a sair da Igreja pré-conciliar de Pio XII, e as nossas “referências artísticas” eram americanas (como a Marilyn Monroe, a Rita Hayworth ou a Ava Gardner, que víamos nos filmes e nas páginas do Século Ilustrado), francesas (como a Brigitte Bardot de Et Dieu créa la femme ou a Catherine Deneuve de Belle de Jour) e italianas (como a Silvana Mangano, a Sofia Loren, a Gina Lollobrigida, a Monica Vitti… e a Claudia Cardinale).

Claudia Cardinale era uma italiana nascida na Tunísia, então um domínio francês, onde, com 19 anos, ganhara um concurso de beleza. O primeiro prémio dava direito a uma semana em Veneza com acompanhante. Claudia levou a mãe e voltou para a Tunísia. Estávamos em 1957. Não passou um ano até que saísse da Tunísia para o grande écran, com I Soliti Ignoti, de Mario Monicelli.

Era o começo. Em 1960, estava em Rocco e i Suoi Fratelli, de Visconti, com Alain Delon, em 61 era La Ragazza con la Valigia no filme de Valerio Zurlini, e em 63 dava corpo à Ragazza di Bube, de Luigi Comencini. No mesmo ano, Visconti voltava a escolhê-la, desta vez para desempenhar o papel de Angelica em Il Gattopardo. Angelica era a bela filha do burguês Dom Calogero Sedara, parte do exercício de transição política e social que “o Leopardo”, o príncipe de Salina (Burt Lancaster), vai protagonizar para que a estrutura social não sofra muitos abalos com a passagem da monarquia tradicionalista dos Bourbon-Duas Sicílias para a monarquia liberal e revolucionária dos Saboia.

São raros os grandes filmes de grandes livros, ou da adaptação de grandes livros, vá-se lá a saber porquêTalvez porque os livros falem outra linguagem, mais intimista, centrada na palavra e deixando a imaginação visual à solta, e o cinema encontre o seu encanto sobretudo na imagem, no movimento, na acção, num apelo mais directo aos sentidos. Por alguma razão nem as adaptações francesas de Le Rouge et le Noir ou de La Chartreuse de Parme, de Stendhal, resultaram em grandes filmes, nem os livros que serviram de guião aos geniais tratados do poder e da condição humana que são Os Padrinhos de Coppola eram obras-primas.

Il Gattopardo, de Lampedusa, é uma excepção. É um romance admirável que, pela mão de Visconti, inspira um filme admirável. Livro e filme são obras diferentes e assumem essa diferença. Visconti, ao sabor do seu tempo, da sua arte e da sua condição de aristocrata-comunista, faz uma leitura marxista do romance de Lampedusa, a narrativa nostálgica da viagem à Sicília do aristocrata Giuseppe Tomasi de Lampedusa à procura de um tempo perdido.

CLAUDIA CARDINALE veste bem a pele de Angelica, a filha de Dom Calogero (Paolo Stoppa), o burguês em ascensão social que, nas terras feudais dos Salina, ajuda a evitar a revolução que a sucessão dos “homens novos” aos aristocratas e o fim do Ancien Régime podia provocar. Visconti encerra o filme com Claudia Cardinale a rodopiar no salão dos Salina nos braços do patriarca, um Burt Lencaster que nos tínhamos habituado a ver nas fitas americanas como trapezista, pirata, cowboy  ou até índio (no Último Apache), mas que o realizador italiano se atreve a transformar no aristocrata nostalgicamente maquiavélico que muda o que for preciso (o acessório) para que o essencial (a propriedade dos meios de produção – segundo Visconti, conde de Lonate Pozzolo, com casa em Milão, cheia de criadagem e dois chefs de cozinha, segundo o amigo e rival Fellini) continue na mesma. E sim, o filme é diferente do livro também no essencial.

A versatilidade de Claudia Cardinale não será menor do que a do trapezista, pirata, cowboy, índio e príncipe, Burt Lancaster. Em 1968, em Hollywood, vai protagonizar entre vaqueiros, caminhos-de-ferro, maus muito maus (Henry Fonda) e um bom com cara de mau (Charles Bronson) Aconteceu no Oeste, um filme de Sergio Leone, que trabalhara com mestres como Vittorio de Sica e Luigi Comencini e se lançara nos chamados Western Spaghetti com fitas como Por um Punhado de Dólares e O Bom, o Mau e o Vilão.

Contrastando em quase tudo com a Angélica de O Leopardo, Claudia é, em Once Upon a Time in the West, Jill McBain, uma mulher de vida fácil (ou difícil) de Nova Orleães que vem para a terra onde se passa a acção porque casa com o homem que é assassinado, com a família, logo no princípio da história. E desce, linda e feliz, do comboio, para enfrentar o que der e vier.

Vi este Aconteceu no Oeste num dia que é sempre inesquecível: o dia seguinte ao do último exame da época; o dia ou a noite em que, pela primeira vez depois de um tempo de grande azáfama e sofrimento, em pleno Verão, estamos livres, soltos e podemos jantar bem e ir ao cinema.

Pude, por isso, apreciar mais ainda a beleza da Cardinale, ajudado pela música de Ennio Morricone e por aqueles desfechos típicos dos Westerns, com os maus a serem punidos e tudo a acabar bem.

E vi-a em muitas outras fitas – como Claudia, no 8 ½ de Fellini, como dona de uma casa de passe, no Fitzcarraldo de Werner Herzog, como chefe de quadrilha em Les Petroleuses, de Christian-Jacques (que juntava na mesma quadrilha Bardot e Cardinale, BB e CC). Vi-a sempre bela, como princesa Dala na Pantera Cor de Rosa sempre bem, ainda na tela ou já a sair de cena e a envelhecer.

Dizem que em 1967, na Basílica de S. Pedro (Paulo VI quisera receber um grupo de actrizes italianas), o Papa conversou alguns minutos a sós com ela e Claudia saiu a chorar. Especula-se que teriam falado do que lhe acontecera aos 17 anos: a violação, a hesitação em abortar e a decisão de ter o filho, o seu Patrick, que o futuro marido, Franco Cristaldi, iria perfilhar.

O desaparecimento de Claudia Cardinale lembra-nos o muito que nos trouxe e ao cinema, a sua forma única de passar pelo tempo. E lembra-nos também aquilo de que muitas vezes nos esquecemos: de dar graças pelo dom da vida e pelo que de bom e de belo constantemente se cruza connosco e nos toca neste mundo. Que descanse em paz.

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Transposto da INTERNET_

«O SONETO DE CAMILO PESSANHA»:

«Imagens que passais pela retina»

“Imagens que passais pela retina
Dos meus olhos, porque não vos fixais?
Que passais como a água cristalina
Por uma fonte para nunca mais!...
Ou para o lago escuro onde termina
Vosso curso, silente de juncais,
E o vago medo angustioso domina,
_ Porque ides sem mim, não me levais?
Sem vós o que são os meus olhos abertos?
_ O espelho inútil, meus olhos pagãos!
Aridez de sucessivos desertos...
Fica sequer, sombra das minhas mãos,
Flexão casual de meus dedos incertos,
_ Estranha sombra em movimentos vãos.”


CAMILO PESSANHA, in 'CLEPSIDRA'