terça-feira, 16 de junho de 2020

Como uma bênção



A eleição de Mário Centeno para governador do tal Banco. Porque somos conformados com a nossa mediocridade, segundo JMTmas nunca com a nossa mediania, segundo nós– até nos convém o proteccionismo que esse cargo de Mário Centeno nos vai trazer a todos, e sobretudo ao nosso PM, para dar solidez ao governo e reforçar assim também a nossa, e podermos continuar a usufruir do apoio para essa nossa inconformidade com a tal mediania que a Covid-19 veio acentuar. Por isso a chefia de Mário Centeno do Banco de Portugal será um bónus para a nossa “mão estendida” da designação de JMT.
I - OPINIÃO
Portugal, país conformado com a sua mediocridade
Infelizmente, é assim que estamos e que vamos estar – um país com cada vez menos portugueses livres e com cada vez mais portugueses de mão estendida, aguardando de forma obediente as migalhas que caem da mesa dos orçamentos de Estado aprovados por Bruxelas. Triste destino. Triste país.
JOÃO MIGUEL TAVARES
PÚBLICO, 11 de Junho de 2020
Portugal tem falta de muita coisa, mas a maior delas é a ambição. Somos um país conformado com a sua pobreza relativa, com a sua falta de meios, com a sua posição na cauda da Europa, com a sua mediocridade. Isso parte-me o coração. Mesmo para aqueles que acham – como eu acho – que a experiência da “geringonça” foi um sucesso político, o que é que ela realmente ofereceu ao país? O primeiro superavit da história da nossa democracia, sustentado numa engenhosa filigrana financeira montada pela equipa de Mário Centeno, que combinou cativações, pequenos crescimentos económicos, diminuição do desemprego à base de baixos salários e um equilíbrio altamente habilidoso entre devolução de rendimentos e impostos indirectos.
Nada disto é fruto de uma visão política para o país, ou de uma qualquer estratégia de desenvolvimento a médio prazo. É um estranho minimalismo na acção política baseado no maximalismo do Estado. Em vez de se retirar o elefante da sala, treina-se o elefante para se mexer o menos possível, a ver se não parte a louça, como em 2011. José Sócrates tinha a visão errada para o país – mas tinha uma visão. Pedro Passos Coelho tinha a visão certa para o país – mesmo que muitos não concordassem com ela. António Costa não tem visão alguma – ou, para sermos justos, tem uma visão baseada na mera gestão do presente, por não acreditar em grandes estratégias reformistas mas apenas em mudanças incrementais, que possam aos poucos melhorar o país, garantindo a perpetuação do Partido Socialista no poder.
Infelizmente, se tal estratégia já era curta para um segundo mandato pós-reversões, não se percebe bem como é que ela possa ser aplicada num contexto pós-covid. O monumental buraco provocado pela pandemia vai exigir ideias, riscos, ambição, investimento e mão firme para impedir a vampirização dos fundos europeus – tudo aquilo que o Governo de António Costa nunca quis ou nunca soube fazer.
Tenho um amigo de esquerda que me enviou, destroçado, a resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020, com a provação do PEES (Programa de Estabilização Económica e Social). O que mais o chocou foram as medidas destinadas à Educação: um volumoso pacote de 400 milhões de euros para “adquirir computadores, conectividade e licenças de software para as escolas públicas”, “desenvolver um programa de capacitação digital dos docentes” e “incrementar a desmaterialização de manuais escolares e a produção de novos recursos digitais”. Em resumo: o deslumbre tecnológico próprio dos parolos, que acham que o computador é a varinha mágica que transforma analfabetos em doutorados. Quanto a formas alternativas de compensar as centenas de milhares de crianças mais desfavorecidas que perderam quase metade do ano, oferecendo-lhes aulas de recuperação e professores dedicados, o número de medidas do PEES é zero – nada de nada. É tão mais fácil abrir concursos públicos milionários para despejar Magalhães por cima do problema…
Há quem pense que a esquerda é a área ideológica que melhor combate a desigualdade. Há muito que isso deixou de ser verdade. Hoje, a esquerda é a área ideológica que melhor subsidia a desigualdade, o que não é, de todo, a mesma coisa. Infelizmente, é assim que estamos e que vamos estar – um país com cada vez menos portugueses livres e com cada vez mais portugueses de mão estendida, aguardando de forma obediente as migalhas que caem da mesa dos orçamentos de Estado aprovados por Bruxelas. Triste destino. Triste país.
Jornalista
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COMENTÁRIOS
PdellaF INICIANTE: O seu artigo revela, antes de mais, ignorância sobre a situação existente nas escolas. Hoje depende-se muito de computadores e restante parafernália e uma escola não funciona sem eles. Não se trata de ter um computador por aluno ou de passar a dar aulas por meios electrónicos. O parque informático das escolas não é actualizado desde 2011 (!), na escola onde trabalho desde 2009. Conseguimos ter o equipamento funcional nos limites da obsolescência. Os docentes sempre se habituaram a ter de lidar com falta de equipamentos pedagógicos, como se o acesso à tecnologia educativa fosse um luxo. No tempo em que havia um projector por piso, nas escolas militares havia um por sala. O sistema prevê que o professor compre os seus equipamentos e as ligações à rede e financie o ensino dos filhos dos outros
Incomoda-me muito a desconsideração que exprime relativamente à resposta dada à situação de pandemia. A recente experiência foi uma imposição das circunstâncias. Quando o ME decidiu interromper as aulas, o que se ouvia na sala dos professores foi a preocupação dos docentes para com a aprendizagem dos alunos. Grande parte não sabia como fazer e nem estava equipada. Os docentes e organizações (de professores e editoras, sobretudo) em dias organizaram-se para fornecer formação (com ausência total do ME) e dezenas de milhares assistiram às sessões que surgiram graças a essas iniciativas particulares. Na "minha" escola arranjámos um computador novo e ligação para TODOS os alunos que não os tinham, deu-se formação. Tem-se trabalhado muito, para além do horário normal. Ainda faltam os exames. 11.06.2020
Joao Marco.907195 INICIANTE : O milagre económico português deixou os portugueses para trás. Fomos nós que tivemos de apertar o cinto para o conseguirmos, mas no fim, a riqueza não aumentou: fomos ultrapassados pelos países do alargamento em PIB per capita. As nossas cidades estão arranjadas, mas não são para nós, são para outros, aos de cá oferecem-se despejos, e reformas míseras. Acertámos as contas, mas não investimos na melhoria dos serviços públicos. Investiu-se em feiras de tecnologia, mas continuamos a perder os nossos mais brilhantes para outros países. E agora, quando a maré deu a volta, vamos aos palcos da Europa, mais uma vez de joelhos e com pouca vergonha, pedir “solidariedade” e aquilo a que nos achamos de direito, porque não tivemos culpa, porque somos pobres — em especial de espírito. 11.06.2020

II - OPINIÃO
Não há crime, disse ele
A nomeação de Mário Centeno para governador do Banco de Portugal é um espelho do nosso atraso institucional. Há crime? Não há. É politicamente criminoso? Sem dúvida que é.
JOÃO MIGUEL TAVARES
PÚBLICO, 16 de Junho de 2020
Para defender a ida de Mário Centeno para o Banco de Portugal, e para o proteger daquilo que diz ser uma lei ad hominem aprovada no Parlamento, António Costa perguntou ontem aos jornalistas: “Mário Centeno cometeu algum crime?” Vale a pena pararmos um bocadinho para reflectir sobre esta frase, porque não é todos os dias que alguém diz tanto com tão pouco. A pergunta tem apenas cinco palavras, mas ela é um resumo perfeito de cinco séculos de atraso português.
O maior dos défices deste país não é económico, nem financeiro, nem cultural, nem social – é institucional. As instituições portuguesas são más, estão politizadas, são subservientes e medrosas, estão intelectualmente depauperadas e a razão da sua falta de independência está à vista de todos – o poder político abocanha, sem qualquer espécie de pudor, tudo o que pode abocanhar. Abaixo de crime – é essa a triste consequência das palavras do primeiro-ministro – vale tudo, e assim sendo, aquilo a que se costuma chamar “conflito de interesses” não tem qualquer razão para existir. O conflito de interesses não é punido pelo Código Penal, logo, só mesmo um malévolo desejo de “perseguição” (António Costa repetiu várias vezes o verbo “perseguir”) pode justificar tanta crítica à súbita transformação de um ministro das Finanças em governador do Banco de Portugal.
Há apenas um detalhe mal resolvido. Se o conflito de interesses não existe, e se abaixo de crime vale tudo, então por que raio é que o Código de Conduta dos Membros do Conselho de Administração do Banco de Portugal dedica 15 pontos – quinze longos pontos – a prevenir um conflito inexistente? Ali está definido o seu significado, o que talvez aproveite a António Costa, e ali está explicada a necessidade de “evitar situações de que possam resultar conflitos de interesses ou que sejam susceptíveis de colocar em causa a imagem e reputação do Banco”.
Segundo o código de conduta, o impacto das decisões do Banco de Portugal “na evolução dos mercados e na estabilidade do sistema financeiro” exige aos membros do conselho – e, por extensão, ao governador – que estejam “sempre em posição de poderem actuar com plena independência, isenção e imparcialidade”. E, para isso – ponto 5.4 –, eles “devem considerar-se impedidos de participar na discussão e votação de deliberações que envolvam matérias nas quais possa estar em causa um conflito de interesses”.
Agora pensem comigo: entre as “milhões de decisões” que Mário Centeno garantiu ter tomado ao longo dos últimos cinco anos, quantas disseram respeito à banca? Resolução do Banif, dinheiro para o Novo Banco, capitalização da Caixa Geral de Depósitos, as relações com a Parvalorem, os 600 milhões que no ano passado foi preciso injectar no antigo BPN, já para não falar nas críticas directas e indirectas ao próprio Banco de Portugal. Mário Centeno pôs a sua assinatura, ou a sua boca, em cada uma daquelas decisões. Como é que vai ser quando ele for governador? Vai declarar-se impedido de debater e de votar as questões mais sensíveis do sistema financeiro português, sobre as quais andou a decidir desde 2015?
 “Qual foi o crime?”, perguntou António Costa. “Foi ter sido membro do Governo? Foi ter sido cinco anos ministro das Finanças?” A resposta é: sim, senhor primeiro-ministro, foi por ter sido tudo isso. A nomeação de Mário Centeno para governador do Banco de Portugal é um espelho do nosso atraso institucional. Há crime? Não há. É politicamente criminoso? Sem dúvida que é.
Jornalista
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COMENTÁRIOS
Nuno Silva EXPERIENTE: Não. Centeno não cometeu nenhum crime. Nem sequer por negligência, algo que não se podem gabar os anteriores governadores, porque ainda não se escreveu a história completa do cavaquismo banqueiro imobiliário. Centeno ainda é trabalhador do Banco de Portugal, onde trabalha há que anos!!! E sempre quis ser governador, e não é por acaso que há tanto vespeiro cavaquista a querer impedir que ele meta mão naqueles irresponsáveis banqueiros (incluindo o actual governador Carlos Costa, também conhecido como "O Ultimo Cavaquista" da era imobiliária do roubo de 40 biliões)...
cidadania 123 INICIANTE: Acima de tudo, como diz o povo, " isto cheira mal". Claramente a AR a querer decidir que Centeno não pode ser governador criando uma lei à medida, o que é inconstitucional e fora das suas competências. Mas também o PM a fazer-nos de parvos, ao querer cumprir o que combinou com o Centeno, marimbando-se para a importância de escolher alguém unanimemente aceite como competente e isento num cargo muito importante da sociedade portuguesa, pela sua duração, mas também pelo impacto na economia
Manuel Figueira INICIANTE: JMT: Venha outro Carlos Costa, já. Para dizer, poucos meses, antes de outro banco falir, que ele está robusto e que não há perigo ter lá as poupanças. JMT, o problema é que em Portugal, não se tolera o sucesso de ninguém, muito menos se a pessoa em causa for do lado contrário politicamente. O crime político do Centeno foi o de um superavit nas contas públicas, que retirou o argumento à Direita: a Esquerda é a cigarra, só gasta, enquanto a Direita, é a formiga, põe as contas em ordem. Sobre o ex-deputado de Passos Coelho, director de uma Faculdade pública, o ter contratado como catedrático, apesar das qualificações académicas mínimas: a licenciatura tirada numa universidade manhosa aos 37 anos, aqui não há crime político. (continua)
Carlos Costa MODERADOR: Tudo isto não é mais que uma grande dor de cotovelo.
João Cunha INICIANTE: Óbvio. Arranjem outra pessoa, por favor.

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