terça-feira, 16 de junho de 2020

«Folhetim da capital»



“pelo nosso “Júlio Dantas” /ou qualquer coisa entre tantas /duma antipatia igual”. Aceitemos pois, já que é pecha antiga o nosso gosto pelos policiais e as deduções à Almada Negreiros, com a virulência ou a ironia da prática antiga. Veremos como conclui o folhetim Centeno/ Costa/Banco, que Helena Ramos reproduz, com a verve de sempre, fruto de preocupação e indignação de sempre…


Centeno, Costa e o Banco de Portugal/premium
Vamos viver uma crise sem precedentes. Por cá não temos dinheiro para um plano de recuperação. Soma-se o inédito processo de saída do ministro das Finanças que quer ser governador do Banco de Portugal
HELENA RAMOS        OBSERVADOR, 15 jun 2020
A entrevista que Mário Centeno deu à RTP dissipou todas as dúvidas: o ex-ministro das Finanças quer ser governador do Banco de Portugal e já falou sobre o tema com o primeiro-ministro. O que fará António Costa se a esmagadora maioria dos partidos com representação parlamentar se opuserem à sua nomeação é a grande incógnita. Mas tudo o que se passou nos últimos dias já é motivo para nos preocuparmos. Parece até que já nos habituámos a que um grupo possa pôr e dispor do país, sem qualquer respeito pelas regras ou instituições. Já nem reparamos que nos dizem uma coisa um dia e fazem outra, passados poucos dias. Temos novos donos disto tudo, sem que isso pareça causar grande preocupação. A partir desta segunda-feira, 15 de Junho, João Leão será o novo ministro das Finanças e Mário Centeno deixa de ser ministro mas, reparem, mantém-se como presidente do Eurogrupo até dia 13 de Julho, quando o mandato acaba. Entretanto, Centeno vai regressar ao seu lugar de origem, o Banco de Portugal, onde irá exercer o seu mandato de presidente do Eurogrupo durante mais um mês.
Temos então que o ministro deixa de ser ministro sem esperar o fim do seu mandato no Eurogrupo e vai liderar os ministros das Finanças do euro nas instalações do banco central. Qual é o problema, dirão? Nenhum, a não ser que a independências das instituições também se avalia pelos detalhes. Porque não há um espaço no Ministério das Finanças para Centeno levar o seu mandato europeu até ao fim? A razão oficial para a saída de Mário Centeno é o calendário das candidaturas à presidência do Eurogrupo. O actual presidente do Eurogrupo teria de lançar as candidaturas a novo mandato até dia 11 de Junho e, considerou-se, seria estanho fazer isso e ao mesmo tempo não ser candidato. Mas, claro, que só se resolveu meio problema: o Eurogrupo agora tem um presidente que não é ministro das Finanças e passa a ser gerido a partir do Banco de Portugal.
Mas este é apenas o mais recente episódio dos sucessivos casos que têm envolvido Mário Centeno.
Ficará também para a história o inédito processo da sua demissão. O primeiro-ministro anuncia a sua saída, com um grande elogio, tendo ao seu lado esquerdo o sucessor. Horas depois, já quase noite, o ainda ministro das Finanças Mário Centeno faz a conferência de imprensa de apresentação do orçamento suplementar, que elaborou, mas não vai defender, e pede ao seu sucessor que fale sobre as questões orçamentais. Nunca tal coisa se tinha visto. Mas qual é o problema? Nenhum. Primeiro-ministro e Presidente da República não vêem qualquer problema.
O Presidente da República e o primeiro-ministro também não identificam nenhum problema em dizerem ao país há menos de um mês que Mário Centeno fica no Governo, para depois nos dizerem que afinal não fica – entre 13 de Maio e 10 de Junho foram 28 dias dos 1664 dias que Centeno contou que foi ministro das Finanças. A realidade é de facto dinâmica. Finalmente há o desejo de Mário Centeno de ser governador do Banco de Portugal. Um caso que promete também novos episódios.
Neste momento temos o Parlamento a fazer uma espécie de “Lei contra Centeno no Banco de Portugal”, com o PS a prometer que vai arrastar o processo para que o diploma não seja aprovado antes da decisão de nomeação do novo governador. Um exemplo lamentável, ver uns partidos a fazerem uma lei “ad hominem” e o PS a boicotá-la. O interesse público pouco interessa.
Imagine-se agora que Mário Centeno consegue o que tanto ambiciona e é o novo governador do Banco de Portugal. Pelo caminho percorrido, Centeno entrará na Rua do Comércio em Lisboa fragilizado. E o Banco de Portugal, depois de ter sido violentamente atacado nos últimos cinco anos, boa parte das vezes pela voz de Centeno, viverá mais uns anos de fragilização.
Mário Centeno, como quem o apoia, não vê nenhum problema, nesta sua passagem directa da Praça do Comércio para a Rua do Comércio. Dois dos exemplos que dão é o de José da Silva Lopes e Miguel Beleza. Esquecem-se que Silva Lopes, governador entre 1975 e 1980, assumiu essas funções num período muito especial da nossa história, quando tentávamos afirmar a democracia. E que Miguel Beleza assume o cargo de governador entre 1992 e 1994, meses depois de ter sido ministro das Finanças – deixou o cargo em Outubro de 1991 quando acabou a primeira legislatura completa de Cavaco Silva. Ou seja, não foi uma passagem directa, entre uma função e outra até houve eleições.
Além disso, os tempos eram outros, menos exigentes em matéria de incompatibilidades e o banco central não era independente – era o Governo que mandava nele. Por outro lado, o banco central está hoje envolvido numa série de dossiers bancários, sobre os quais Mário Centeno se tem pronunciado de forma que pode fragilizar a posição do supervisor nos tribunais. Basta que os advogados dos visados queiram que Mário Centeno, com o chapéu de governador do Banco de Portugal, explique porque considera que no caso BES se esteve perante “a mais desastrosa resolução bancária da história”.
Há ainda todo um conjunto de decisões tomadas pelo ministro das Finanças que podem acabar na mesa do governador. E Centeno governador irá contra Centeno ministro? Depois há ainda as nomeações que Centeno fez, nomeadamente para a Comissão de Auditoria: devem ser da confiança do Governo mas passarão a ser da confiança do governador.
Para além de todos estes aspectos, que Centeno considera pouco importantes se considerarmos que disse na RTP que a independência não é uma abstracção, há o próprio peso da instituição. O Banco de Portugal precisa de um governador que deixe de estar sob ataque permanente do Parlamento e do Governo, como aconteceu até agora com os governos de António Costa e especialmente pela voz de Mário Centeno. Não temos assim tantas instituições fortes que nos possamos dar ao luxo de delapidar. Mário Centeno poderia ter o peso político para recuperar esse poder do Banco de Portugal, mas no caminho para lá chegar pode perder o estatuto que ganhou. Claro que o pode recuperar, depois, já no cargo. Mas como diz Ana Sá Lopes, Mário pode estar a desfazer o mito Centeno. Vamos viver uma crise sem precedentes e temos o ministro das Finanças mais popular da histórica recente portuguesa a querer ser governador do Banco de Portugal, em vez de se atirar para vencer o desafio de gerir o Tesouro nestes tempos tão difíceis. Não é fácil ser ministro das Finanças num país muito pendurado no Estado, mas é inédito na nossa história ver um ministro sair porque quer outro cargo.
A última palavra sobre a sucessão de Carlos Costa no Banco de Portugal será de António Costa. Nenhum primeiro-ministro pode gostar de perder o seu ministro das Finanças numa crise económica, muito menos um ministro que transmitia confiança, factor tão importante para recuperar desta crise. Costa também não pode ter gostado. Centeno diz que já falou com o primeiro-ministro sobre a ida para o Banco de Portugal, mas António Costa pode acabar por considerar que não tem condições políticas para o nomear. Na altura em que Pedro Passos Coelho decidiu manter Carlos Costa no Banco de Portugal, o então líder da oposição António Costa considerou que devia ter sido ouvido e não foi. Se a maioria dos partidos disser a António Costa que não, que não considera Centeno uma boa solução, o que fará o primeiro-ministro?
COMENTÁRIOS
Joaquim Moreira: Esta boa análise de Helena Matos sugere-me várias conclusões. Desde logo, a de que estamos perante dois excelentes políticos, que são também dois excelentes aldrabões. Para que fique claro, devo dizer que detesto estes políticos excelentes, prefiro políticos coerentes, ainda que politicamente menos competentes. Por uma simples razão: estes, ao contrário daqueles, estão preocupados com os interesses da nação. E daí, uma outra conclusão: quer num caso quer noutro, usam a política de uma forma indevida. Ou seja, só estão na política para subir na vida. E para não ser maçador, o último parágrafo é muito esclarecedor. Esta gente faz tudo o que for preciso para se manter no poder, até que esteja garantido o que a seguir querem fazer. Mas também não posso deixar de dizer, tudo isto é possível, porque há muita gente, no mínimo sofrível! No fundo, trata-se de gente que apoia os políticos que mentem mais, até porque, ao dizerem que, “os políticos são todos iguais”, estes só querem parecer que são melhores que os demais!
Joaquim Moreira >Joaquim Moreira: Helena Garrido, evidentemente!
J. Carneiro:  “Ficará também para a história o inédito processo da sua demissão” - até pode ser inédito mas que se trata de uma grande peça de teatro, lá isso trata. O Estado e as instituições da República estão reféns e a saque. Verdadeiramente isto é uma dança de cadeiras onde o que menos interessa é Portugal e os Portugueses.
Ping PongYang > J. Carneiro: É tudo muito mau, mas pelo menos temos a certeza que o PPCalaceiro não estará lá para estragar tudo com os seus desvios criminosos, mentiras e ignorância de alarve... Já é um grande alívio, não acha ?    Pedro SilveiraPing PongYang: Explique lá melhor os desvios criminosos, mentiras e ignorância de alarve (será Algarve..?) do PPC. E já agora, não se esqueça que o ainda Governador do BdP foi nomeado em 2010 pelo governo Sócrates     Ping PongYang: Agora, um pequeno apontamento: Até ao ano de 2014, havia um proeminente economista cá na nossa aldeia chamado Dr. Victor Bento, que tinha SEMPRE opiniões muito fortes sobre defices, dívidas, mantarrotas e TUDO. Entretanto, o Sr. Dr. Vitó "perdeu o pio" (e não foi o único)... Não se poderá aplicar o mesmo método aos outros TODOS?   Pedro Silveira > Ping PongYang: Caro Ping, está enganado, Vítor Bento ainda prestou declarações na semana passada. Água
O Pensador: Que esperanças que alguém faça qualquer tipo de oposição a Costa. Passámos a país de partido único. Adeus democracia pluralista.   Mario Areias: Cara Helena, não tenha ilusões, o Mário Centeno vai mesmo para o BP com a bênção do António Costa, do Presidente da República e Rui Rio. O PSD vai juntar-se à esquerda para o folclore do costume e no fim fica tudo como combinado entre eles.
Manuel Magalhães: Está bonito está, o “chefe” do governo não tem a mais mínima vergonha na cara, o ministro que sai, sai na pior altura e no período mais difícil para o Estado, situação essa que muito se lhe deve por não ter tomado as medidas necessárias, mais uma vergonha, quanto ao ministro que entra fez uma série de 5 orçamentos que sabia não poderem ser cumpridos, daí as cativações e ainda por cima em áreas altamente lesivas para a sociedade portuguesa, agora é nomeado para ministro pelo seu anterior chefe que o irá controlar a seu belo prazer e sempre que for preciso tirar a sujidade “debaixo do tapete” que o Centeno lá deixou, lá estará o governador do BP a puxar lhe as orelhas. Bonito, bonito...     josé maria: Centeno foi o melhor ministro das finanças de Portugal, mesmo merecendo algumas críticas pertinentes, no que respeita às cativações. Porque não haveria de poder ocupar o cargo de governador do BdP, tanto mais que, antes de ocupar o cargo de ministro das finanças, já era um alto quadro desse Banco? Costa tem toda a razão: só por mesquinhez, inveja ou despeito, alguém se pode insurgir contra a nomeação de Centeno para governador do BdP.
Joao Figueiredo > josé maria: dois artigos e o meu amigo faz copy paste do seu comentário ?
josé maria >  josé maria: assim mesmo é que é, quanto ao melhor ministro das finanças ... talvez o menos mau e mesmo assim tenho dúvidas    Pedro Silveira >josé maria: Caro JM, sempre o mesmo. Mas conhece todos os anteriores Ministros das Finanças para considerar este embuste o melhor? E acha que os contextos são os mesmos? E já agora, qualquer alto quadro do BdP poderá ser nomeado Governador, é assim? Maravilha. Em relação à nomeação, pelos vistos só o PS é que concorda; todos os outros partidos são, portanto, mesquinhos e invejosos. Tal como todos os portugueses que entendem que é uma promiscuidade. Abraço
Pedro Santos da Cunha: Nisto tudo há tramóia! E das Grandes! O que é que eles andam a esconder? Ou a favorecer alguém? Ou vários?     Xico Nhoca: Centeno estava a fazer muita sombra ao charlatão. Será que este pregou uma rasteira ao Mário Centeno que vai acabar por ficar sem cabra e sem soga?
Ana Ferreira: Uma vez com o conhecimento, e reconhecimento, nacional e no estrangeiro, da excelência do desempenho de Centeno, para além de pouco patriótico, não é nada profissional que uma economista, por questões ideológicas, ponha o interesse do país em segundo lugar!
Pedro Silveira > Ana Ferreira: O interesse do país é que o Centeno não vá para Governador do BdP
S. Nunes: O PS continua a sua captura do Estado e instituições. Quem se mete com o PS leva! Rio, teve a ousadia e a incúria de contrapor e exprimir a sua opinião (e a de muitos outros certamente) e, como tal, foi grosseiramente distratado por palavras ocas. A entourage ri-se e abana a cabeça em sinal positivo de confirmação. A vida corre-lhes bem com o beneplácito de... de quem quiser fazer uma reflexão sobre o seu contributo para este staus quo podre. De vez em quando é preciso mudar as moscas... 
Sergio Coelho: Perfeito! E o povão anestesiado por futeboladas 24h em todas as tv em horário nobre (paga pelo Desgoverno) feliz da vidinha e cada vez mais na cauda da Europa e OCDE! Bem feito para os labregos que elegeram este malabarista e chefe do clube mais obscuro, mafioso e nepotista da Europa.
Carlos Chaves: Cara Helena, muito obrigado pelo seu artigo. Será que ainda vivemos em democracia? E qual é a posiҫão do maior partido da oposição sobre esta matéria? Quando dermos conta temos mais uma vez as instituiҫões do estado tomadas de assalto por esta esquerda desastrosa! Até lá vamos assobiando para o lado!
Domingas Coutinho: Isto é uma ditadura travestida do PS e com a bênção do Presidente. O povo aplaude.
Ursa Urso: A corte lisboeta...    bento guerra: Parece que estamos a assistir ao capricho de um malabarista que não foi aceite no estrangeiro, mas serviu o bando que manda neste rectângulo, cortando em despesa orçamentada e necessária. Tem a oposição dos outros partidos políticos, mas quem se mete com o PS, já sabe. República de bananas     Adelino Lopes: Na eventualidade de Centeno ser proposto para o BP, parece-me que o BCE tem ainda uma palavra a dizer. Se o BCE (Constâncio?) disser que sim o que se pode fazer? Compreender e aceitar a palhaçada da independência do BP.   NunoW Nunow: Centeno desconhecido, saiu pela porta das traseiras do Banco de Portugal, despeitado por ser preterido em concursos internos e agora vai entrar pela janela para Governador. Um Ronaldo que abandona a Equipe quando esta mais precisa dele não merece a promoção.
António Vieira: Tipo Churchill, mas ao contrário. Quando era realmente importante que colocasse as suas auto proclamadas qualidades ao serviço do pais, ele foge para ir para o conforto de quem nada tem que decidir e limitar-se a supervisionar o que ele próprio fez.     André Ondine: Será que isto não foi o que Centeno sempre quis? Regressar ao Banco de Portugal como Governador, já que, enquanto foi quadro do BdP, não o deixaram ser o que ele queria? E, agora, Centeno pode fazer a sua vingançazinha....afasta Carlos Costa (e humilha-o, prática que deve ter aprendido do Habilidoso, que é mestre na humilhação alheia) e regressa para mandar naqueles que o impediram de ser o que queria, nos seus tempos do BdP. Mas alguém devia avisar Centeno que o Habilidoso não é homem de grandes lealdades nem amizades. Se for preciso deixar cair Centeno, deixa. E com estrondo. E Centeno diz adeus ao BdP, ao Eurogrupo e ao Governo. E ainda acaba como o mau da fita da nova crise, tudo em nome da Glória suprema Do Habilidoso.    Vitor Batista > André Ondine: Habilidoso ou querido lider?....   Dário Moreno > André Ondine : E Centeno merece mais?  André Ondine > Vitor Batista: Querido Habilidoso, para alguns :)     André Ondine > Dário Moreno: Acho que não, de facto. Nem a sua vingança merece, mas parece ser uma obsessão de que não prescindirá....

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