sexta-feira, 12 de junho de 2020

Já tive o livro



Cozinha Tradicional Portuguesade Maria de Lurdes Modesto, que emprestei e nunca mais vi, com muita pena minha. Era um livro de capa sugestiva, com o retrato de pratos e caçarolas num armário antigo, e, no seu interior, com imagens e receitas de cozinhados portugueses, simples e saborosos que muitas vezes lia, no gosto dessas imagens poderosas que faziam crescer a água na boca, e o prazer na alma.
É por isso que concordo plenamente com o texto de Miguel Esteves Cardoso de vibrante homenagem a uma MULHER que ele descreve com uma energia de grande admirador, conquanto, estranhamente, no nosso país de glutões, apenas tenha merecido um comentário – a evocar, todavia, uma outra figura de Panteão e não a da simpatia de MEC. E embora discorde da grosseria inaceitável da frase referente ao 10 de Junho e a tudo o que ela implica de irreverência e infantilidade para com um Camões intemporal – “Ao pé da data dela o 10 de Junho parece um barrigudo” – não posso deixar de concordar com a linda frase, que reponho, sobre Maria de Lurdes Modesto:
«Maria de Lourdes Modesto: deveria haver um panteão especial para estas pessoas que tudo dão e nada pedem
Mas como pessoa simples que sempre foi, ela não faz parte do escol que se pretende politicamente soberbo ou da elite, e JEC bem o faz sentir, desta vez com maturidade.
CRÓNICA
Maria de Lourdes
Maria de Lourdes Modesto: deveria haver um panteão especial para estas pessoas que tudo dão e nada pedem.
MIGUEL ESTEVES CARDOSO
PÚBLICO, 4 de Junho de 2020
No deve e haver da vida de cada um deveríamos (ou havíamos de) escrever de um lado os nomes das pessoas que mais contribuíram para a nossa felicidade, tal qual é, por muito pequena que possa ser, e, do outro, uma estimativa daquilo que nos custaram em tempo, carinho, nervos, desgostos, desilusões e – porque não? – dinheiro.
No topo da minha boa contabilidade estaria o nome de Maria de Lourdes Modesto. E nisto estou bem acompanhado, por milhões de portugueses, por centenas de milhões de boas refeições, gargalhadas, lições, ideias e horas de leitura divertida.
E o meu custo? Desgraçadamente zero. Só me custou uns poucos eurinhos. Deveria haver um panteão especial para estas pessoas que tudo dão e nada pedem. Não para dar o exemplo porque é impossível seguir-lhes os passos mas apenas para nos lembrarmos que são verdadeiramente excepcionais: já é uma sorte estarmos vivos enquanto elas também estão.
Conheça ou não conheça a obra maravilhosa da Maria de Lourdes, o melhor sítio por onde começar é a excelente biografia que Mauro Gonçalves escreveu para o Observador para celebrar o nonagésimo aniversário dela no dia 1 de Junho. Meu Deus, até a fazer anos se sente a grácil inteligência dela a funcionar. Ao pé da data dela o 10 de Junho parece um barrigudo.
Esperemos que a Imprensa Nacional leve pouco tempo a publicar as Obras Completas de Maria de Lourdes Modesto que tanta falta fazem nas estantes do futuro e do presente. E do passado: o grande Leite de Vasconcelos teria aprovado a urgência e elegância desta edição.

COMENTÁRIO
Armando Heleno EXPERIENTE: Pelo meu lado, proporia o Prof José Hermano Saraiva, por tudo o que nos mostrou do nosso país e ainda por ter sido - malgré salaire- o "descodificador" dos Lusíadas completos, que saíram no Expresso. Apesar da sua popularidade, dentro de pouquíssimos anos, estará já esquecida - com a miserável e ingrata ajuda de políticos e nem só - esta enormíssima figura e tudo o que fez vir ao de cima sobre a nossa terra. Vi poucos da sua categoria e postura. Para terminar, também ele recorreu um dia ao sábio José Leite de Vasconcelos.


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