Duas figuras que passaram, no jogo
político que deu que falar, um seguindo a sua vida lá fora, sob os auspícios da
sua fada madrinha, outro que, para além de escrever livros que também li com
gosto, continua por cá falando ou escrevendo sobre gentes. O colunista do
Observador, João Marques de Almeida , escreve com acrimónia sobre Miguel de Sousa Tavares, que denegriu
a imagem de Durão
Barroso, que ele estima. Muitos comentadores atacaram um ou
outro, com algum conhecimento e por vezes violência. Por mim, o que me fez
apreciar a leitura, foi a revisão de momentos que fizeram a nossa história e tivemos
com isso ocasião de a reviver.
Miguel Sousa Tavares: ignorância e mentiras /premium
Quem é MST para decidir quem possui os dotes
necessários para o sucesso político? Estavam sempre todos, cidadãos
portugueses, militantes do PSD e líderes europeus, enganados? Só MST é que está
certo?
OBSERVADOR, 23
jun 2020
Miguel Sousa Tavares (MST) escreveu um artigo de ódio pessoal contra Durão
Barroso na última edição do Expresso. A
carreira política de Durão Barroso foi longa, seguramente com decisões
polémicas, e qualquer pessoa tem o direito de o criticar e de discordar de
muitas das suas posições. O que é inaceitável é atacá-lo com base em
mentiras, sem a preocupação de estudar devidamente o que aconteceu e ignorando
os factos. Pior do que tudo, para atacar Durão Barroso MST pôs em causa
conquistas da diplomacia portuguesa, transformando-as em “derrotas” que só
existem numa cabeça cega pela inveja pessoal. MST tem de resto o hábito de
fazer afirmações categóricas que são falsas ou erradas. Mas quando se escreve
em público não se pode escapar ao escrutínio.
Antes de entrar na substância do artigo, quero que
fique registado que trabalhei com Durão Barroso em Bruxelas durante
quase sete anos, e ficámos com uma relação de amizade e estima. Se é
verdade que gosto de defender os meus amigos de acusações injustas, também
acompanhei por razões profissionais algumas das questões levantadas por MST e
acho que devo recordar os factos e a verdade, tão mal tratados por MST no seu
artigo no Expresso.
Comecemos com a crítica
de MST aos Acordos de Bicesse e ao processo de paz em Angola. Os Acordos de Bicesse foram uma vitória da diplomacia
portuguesa e resultaram ainda nas primeiras eleições democráticas em Angola,
reconhecidas como tal pelos observadores internacionais e pela ONU. Durão Barroso fez aquilo
que um mediador deve fazer. Conseguiu, ao contrário de outros, sentar o MPLA e a Unita à mesma mesa, ajudando as
partes da guerra civil angolana a assinar um tratado de paz. Para o fazer, o
seu interlocutor inicial teria que ser naturalmente o governo de Angola,
reconhecido diplomaticamente por todos os países do mundo, incluindo os nossos
parceiros europeus.
O líder da Unita
não aceitou a derrota eleitoral e a guerra civil voltou a Angola. Mas é preciso
muita má vontade para culpar Durão Barroso por isso. Aliás, MST deve ser a única
pessoa que o faz. O que MST nunca faz é propor
uma alternativa aos Acordos de Bicesse. Deveria Portugal nada fazer pela paz e aceitar a guerra civil? Ou
deveria Portugal permitir que outro país europeu liderasse a mediação entre as
partes em conflito? Ou deveria o Estado português apoiar a Unita contra o
governo legal de Angola?
Convém ainda salientar que as negociações para os
Acordos de Bicesse, ao aprofundarem as relações bilaterais com Angola,
contribuíram para o início de reuniões multilaterais entre Portugal e os cinco
países africanos de língua portuguesa – o processo 5+1 – os quais até então se
tinham recusado a realizar reuniões conjuntas com Portugal. Podemos mesmo
argumentar que o processo 5+1, iniciado por Durão Barroso, foi o embrião do que
mais tarde seria a CPLP.
Passemos agora a Timor
Leste. MST culpa Durão Barroso por ter aceite a ocupação de Timor Leste pela
Indonésia. Isto é absolutamente delirante. Nada poderia ser mais falso e
os timorenses bem o sabem. Aliás, nas suas memórias, o antigo MNE indonésio, Ali Alatas, reconhece que Durão Barroso
foi um dos seus principais adversários. Quando Durão Barroso se tornou MNE, em 1992, além de
Portugal, a Irlanda era o único país da União Europeia que apoiava a
independência de Timor. A partir daí, Portugal fez um esforço diplomático para
criar as condições para os parceiros europeus apoiarem os direitos humanos a
depois a independência de Timor Leste.
Foi com Durão Barroso que se realizaram as primeiras
rondas de negociações entre os MNEs de Portugal e da Indonésia, e com o
patrocínio do então secretário-geral da ONU, Boutros Boutros-Ghali. Pela primeira vez a Indonésia reconhecia que Timor Leste não era
apenas um problema interno. No plano europeu, Portugal passou a fazer sempre
declarações em defesa dos direitos humanos em Timor Leste nas reuniões
ministeriais entre a UE e a ASEAN, contra a vontade dos grandes países
europeus, sobretudo da Alemanha e do Reino Unido.
Mais: foi por iniciativa de Durão Barroso que Portugal
propôs o Prémio Nobel para uma personalidade de Timor Leste, o que veio a
acontecer em 1996 (quando Ramos Horta e Ximenes Belo ganharam o prémio Nobel da
Paz) dando uma enorme visibilidade à questão de Timor. A carta com a proposta foi
assinada por Durão Barroso. A verdade é indiscutível: em 1995, quando Durão
Barroso saiu do MNE, o processo de Timor Leste estava muito mais avançado do
que em 1985, quando o PSD chegou ao governo. Como reconhecimento do seu
papel no processo de Timor Leste, Durão Barroso, na altura líder do PSD na
oposição, foi convidado para as cerimónias da independência do novo país. Os
timorenses não esquecem o que Durão Barroso fez para os ajudar.
Chegamos por fim à Cimeira
das Lajes. MST garante que não havia armas de destruição maciça no Iraque. A
Agência de Energia Atómica, a França e a Rússia na altura não diziam isso.
Defendiam que as inspeções seriam a melhor maneira para impedir o Iraque de
continuar a desenvolver armas de destruição maciça. Toda a gente sabia que o
Iraque tinha armas químicas e que as tinha usado contra a sua população. MST
gosta de viajar. Proponho que vá ao Curdistão e que tenha uma conversa sobre
armas de destruição maciça com a população curda.
A Cimeira das Lajes também deve ser entendida no contexto da divisão
entre países europeus que se opunham e apoiavam os Estados Unidos. Ao
contrário do que afirma MST, a maioria dos países europeus estava ao lado
dos Estados Unidos. Com a excepção da Alemanha, da Bélgica, da França, e
do Luxemburgo, todos os outros países da União Europeia, incluindo os novos
membros, que entrariam em 2004, estavam ao lado dos Estados Unidos. Por
exemplo, Vaclav Havel, na altura Presidente da República Checa, e que não
era seguramente um perigoso neoconservador, assinou a Carta dos Oito a apoiar
os Estados Unidos. Do mesmo modo, Clinton e os democratas apoiaram Bush. Havia na altura um consenso forte nos Estados Unidos sobre o Iraque.
A Cimeira
dos Açores foi uma decisão polémica, mas
corajosa, e é inteiramente legítimo discordar e criticá-la. Mas foi consistente com a
política externa atlanticista de Portugal desde o início da democracia. Além
disso, a maioria dos países europeus partilhava a posição de Portugal.
De resto, o Presidente francês, Chirac, e o Chanceler alemão, Schroeder, interpretaram a Cimeira
dos Açores à luz dos interesses nacionais de Portugal e mais tarde isso não os
impediu de apoiarem Durão Barroso para Presidente da Comissão Europeia.
Mais uma vez ao contrário do que MST diz, na altura Juncker não se candidatou a
Presidente da Comissão Europeia porque não tinha o apoio da maioria dos Estados
membros, e não por recusar o lugar, o qual ocupou depois de Durão Barroso. A
verdade é que Durão Barroso foi até hoje o único político a ser votado duas
vezes por maiorias no Parlamento Europeu para a Presidência da Comissão
Europeia. Algumas qualidades terá.
MST faz ainda mais
duas afirmações extraordinárias. Diz que Durão Barroso chegou “até onde os seus dotes
jamais fariam prever de o terem feito.” Quem é MST para decidir quem possui os
dotes necessários para o sucesso político? Durão Barroso foi eleito deputado
várias vezes, líder do PSD, ganhou eleições legislativas, foi eleito duas vezes
Presidente da Comissão Europeia. Como acha MST que isso aconteceu? Estavam
todos, cidadãos portugueses, militantes do PSD e líderes europeus, enganados?
Só MST é que está certo? Ou no fundo MST acha que os dotes adequados pertencem
apenas aqueles dos meios que frequenta ou que gozam das suas preferências
políticas?
Em segundo lugar, afirma que a
militância no MRPP, entre os 18 e os 20 anos, mostra um “defeito de carácter.”
Fico contente que MST com 20 anos já estivesse do lado da liberdade (só é pena
que alguém que era moderado na sua juventude se tenha tornado agora tão
radical.) Mas daí a confundir uma escolha ideológica, por mais que se discorde
dela, com falhas de carácter vai um passo que ninguém deve dar. Há políticos
com falhas de carácter em todas as famílias políticas, e há políticos com
carácter que fazem escolhas ideológicas das quais discordamos, mas não devemos
associar as duas. Por razões históricas, muitos políticos portugueses fizeram
escolhas ideológicas na sua juventude das quais se arrependeram. Na sua
geração, sobretudo em Lisboa, Durão Barroso fará mais parte da regra do que da
excepção. Aliás, recordo a MST que um dos seus heróis políticos, Mário Soares,
era militante do PCP bem depois dos seus 20 anos, e isso não o impediu de ter
lutado mais tarde pela liberdade em Portugal. Ou será que MST também atribui a
militância de Soares no PCP a uma falha de carácter?
MST sugere que a vida política de
Durão Barroso merece “uma biografia à maneira anglo-saxónica, sem
contemplações.” Deixo aqui uma sugestão a MST: poderia escrevê-la. Teria que
ler, que aprender e ficaria seguramente menos ignorante. Podia até mudar um
pouco a sua opinião sobre Durão Barroso. Nunca é tarde para aprender e mudar.
COMENTÁRIOS
Maria José Melo: MST, sempre arrogante e
grosseiro. Tem ódios de estimação. Falta-lhe a imparcialidade para poder ser
comentador seja do que for. Deveria
limitar-se a escrever romances. Escrever ele sabe. Ou não fora filho de Sofia.
Maria Narciso: Tal como o Senhor , Miguel
Sousa Tavares escreve os seus artigos de Opinião . Pode -se gostar ou não, é um
Direito que lhe assiste. E onde está a mentira no caso das Lages o próprio
Durão Barroso já admitiu que se fosse hoje , não o teria feito. E quando deixou o cargo de PM
para aceitar o convite para presidir á Comissão Europeia., colocando os seus
interessf…
josé maria: Durão Barroso abandonou o governo de Portugal para beneficiar de sucessivas
mordomias. Para mim, sempre foi um político muito menor.
Paulo Guerra: “A verdade é que Durão Barroso foi
até hoje o único político a ser votado duas vezes por maiorias no Parlamento
Europeu para a Presidência da Comissão Europeia.” E
o único presidente da CE, condenada pela Provedora Europeia. E o único
presidente da UE, a bem dizer, persona não grata em todas as instituições
europeias, onde perdeu todos os privilégios e terá que passar por todos os
controles de segurança. E o único
presidente da CE com uma queixa dos próprios funcionários da UE também por
falhas de conduta. E o único presidente da
CE que contratou o próprio filho como jurista para o Departamento de Supervisão
Prudencial do Banco de Portugal sem recurso a concurso, através de um
procedimento de "carácter excepcional" reservado a candidatos de
comprovada e reconhecida competência profissional. Quando o currículo do filho
só tinha dois estágios de Verão. E o único
presidente da CE enxovalhado por toda a imprensa europeia por causa das
informações privilegiadas por trás do salto para a Goldman Sachs, que esteve na
origem da crise do subprime e que ajudou a Grécia a esconder parte do seu
défice, antes de especular contra a dívida grega, conduzindo a zona euro a uma
crise sem precedente. Como aliás acontece
por norma a todos os tipos sem carácter que só conseguem ser bem avaliados
depois de abandonarem o forte. Como aliás
voltou a acontecer ainda há bem pouco tempo em Portugal com a Marilu. Que
depois de MF foi trabalhar para um cangalheiro financeiro já com os olhos nos
cadáveres financeiros que a Marilu deixou para trás como MF. Mas o Centeno
voltar ao BdP é que é um ai jesus.
Cruzeiro O Verdadeiro: Nunca fui um
fã do Miguel Sousa Tavares, mas ver a reacção de todos aqueles que o combatem
ideologicamente, é degradante e desesperado, o desconsolo dessa gente.
Não conheço nada de útil feito pelo autor
deste crónica, nem o seu nome me diz nada.
Anibal Augusto Milhais: Não me canso.
Actividade política: A sua actividade política teve início nos seus tempos
de estudante, antes da Revolução dos Cravos de 25 de abril de 1974. Foi um dos
líderes da FEM-L (Federação dos Estudantes Marxistas-Leninistas), do Movimento
Reorganizativo do Partido do Proletariado (MRPP), força política de inspiração
maoísta. Barroso foi expulso do MRPP depois de ter demonstrado uma série de
atitudes que atentavam contra os princípios pelos quais o partido se movia; por
exemplo a situação em que Durão Barroso surge na sede do PCTP/MRPP com uma
carrinha cheia de mobília da Faculdade de Direito de Lisboa, roubada na sequência dos
tumultos pós 25 de Abril. Nesse instante, Arnaldo Matos (líder do partido)
ordena a Durão Barroso que vá devolver o material roubado. Em 1980, Barroso
aderiu ao Partido Social Democrata, partido do centro-direita português, no
qual está filiado até hoje.
Fernandes J: Artigo muito
bem escrito, aliás como é apanágio do João Marques de Almeida..., que faz muito
bem em defender quem conhece bem e de quem é amigo e deixa claro no início do
texto, como pessoa de bem que é... que deriva estranha a do MST..., que falta
de senso crescente que me faz esquecer o seu passado, irreverente ,mas muito
mais interessante, está cada vez menos lúcido nos seus comentários...
Lucas Corso: Os que
criticam a suposta "fuga" de Durão Barroso e a sua falta de patriotismo
são, na sua larga maioria, os mesmos que andaram os dois anos anteriores a
insultá-lo e a gritar na rua, nas televisões e nos jornais "vai-te
embora!". Se o Durão Barroso fosse jogador de futebol haveria viúvas a
chorar pelo menino e galfarros a cutir bué o chavalo. Os heróis dos Portugueses
não são empresários, bombeiros, cientistas, voluntários humanitários,... só
jogadores de futebol.
Gil Carneiro de Almeida: Excelente e
muito esclarecedor artigo. Esse "génio" pouco esclarecido e tão cheio
de presunção, que cada vez mais perde clientela, é um comentarista muito
superficial e sem qualquer credibilidade. Não leio, ou escuto, o que quer que
seja que venha daquela mente tão "brilhante".
Ipsum Libertas: Comentadores
como MST, são tão responsáveis como os medíocres políticos que nos têm
governado, pelo estado a que o país chegou. Comportam-se como sabujos, tecem loas e tudo fazem para
branquear as medidas dos políticos da sua simpatia ou quiçá dos que melhor
beneficiam os seus próprios interesses. Se Barroso é um traste, MST não lhe
fica atrás. ………………………………
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