Mitos gregos - Perseu e Medusa
Mais uma história mitológica de um rei a
desejar um filho, herdeiro do seu trono. A primeira que lemos foi a de Egeu, rei de Atenas, que acabou por ter o
filho Teseu, da sua
sobrinha Etra, tudo
comandado pelo destino, tendo Teseu
cometido,
entre outras façanhas, a proeza de matar o Minotauro num labirinto de paredes de bronze, na ilha de Creta, onde governava o rei Minos, cuja mulher, Pasifae, tivera esse monstro, devido a uma
história pecaminosa, por vingança de Poseidon contra Minos, que não lhe sacrificara o touro que
aquele lhe enviara, para confirmar que ele era o verdadeiro sucessor do seu suposto
pai Astérion, no trono
de Creta, sendo ele,
na realidade, filho de Júpiter e de Europa, juntamente com mais dois irmãos
gémeos.
O
nascimento de Perseu
Desta vez foi em Argos que a história se iniciou, contada por Ramón Ronda e impressa na U E - a estranha história de Perseu e Medusa.
O rei de Argos chamava-se Acrísio, e era
casado com Eurídice, filha do
rei Lacedémon e de Esparta, (origem, respectivamente, dos
topónimos Lacedemónia e Esparta). Tinha uma filha apenas – Dánae – mas precisava de um herdeiro para lhe
suceder no trono, receoso de que seu irmão Preto, rei de Tirinto, que
odiava, lho arrebatasse. Consultado o oráculo, este predisse que um neto seu, filho da sua filha de catorze anos,
Dánae, seria causa
da sua morte. Assustado, fez construir uma câmara subterrânea onde mandou um
criado encerrar a sua filha, que ele fez acompanhar, contudo, como pai condoído,
pela criada Aspásia. O
sofrimento da pobre Dánae, foi,
naturalmente, enorme, longe de todos e de tudo, e sobretudo do ar exterior e da
luz solar. Além do tear com que se entretinham, a criada Berenice levava-lhes o alimento diário e
falava-lhes do tempo e do mundo natural, proibida de lhes contar das pessoas e
coisas do palácio, sob pena de morte. Mas Zeus apareceu a Dánae sob a forma de uma chuva dourada, e
fez-lhe um filho a quem ela chamou Perseu.
Infância
e juventude de Perseu
Sabendo do nascimento da criança, Acrísio castigou a criada Berenice, mandando
amputar-lhe as mãos e cortar-lhe a língua. Dirigiu-se à tal câmara subterrânea,
disposto a matar filha e neto mas não teve coragem e no dia seguinte, depois de
os levar ao palácio, onde dormiram nessa noite, acompanhou-os ao mar Egeu,
explicou à filha o motivo dos seus actos – o oráculo tenebroso sobre a sua
própria morte, causada por um seu neto - mandou uns soldados enfiarem os dois
numa espécie de arca, e entregou-os às ondas e ao seu destino. E Zeus,
condoído, conduziu a barca a uma enseada, onde um pescador os encontrou e
salvou, levando-os para a sua humilde casa, e tratando deles.
Quando Danae despertou da sua profunda fraqueza, o homem, que
disse chamar-se Dictis, deu-lhe de
comer e explicou-lhe que estavam na ilha
Serifo. Foi ali que Perseu foi criado,
julgando Dictis seu pai –
que, de resto, o educou bem, nas coisas práticas da vida e nos sentimentos
respeitáveis, tendo-se Danae ocupado da
formação escolar do filho.
Um dia, Dictis confessou a Danae que era irmão do rei da ilha – Polidectis – e aquela estranhou a sua pobreza,
tendo Dictis silenciado
as suas razões. Entretanto, esse rei Polidectis encontrou Dánae na praia, com o filho Perseu, apaixonou-se por ela e quis levá-la
para o seu palácio, o que ela, naturalmente, recusou, dizendo já ser casada.
Estranhou a insistência, feita de insolência, e foi então que Dictis lhe contou ser irmão daquele, que,
naquela ilha, era um déspota. que reduzira os ilhéus a seus escravos servis.
*
Entretanto,
Perseu foi crescendo, robusto e são, ele
próprio tornando-se pescador e o sustentáculo da família, enquanto Polidectis continuava insistindo nas propostas à
bela Dánae, o que
levou Perseu, um dia, já
rapagão, a apresentar-se no palácio para exigir ao rei um ponto final nas propostas
ofensivas à sua mãe. A conversa provocatória do rei, descambou num desafio: ele
deixaria de provocar a mãe, desde que Perseu lhe trouxesse, dentro de um mês, a cabeça de Medusa, uma das três irmãs Górgonas, monstros com víboras na cabeça no lugar
dos cabelos e cujo olhar petrificava quem as fixasse. Perseu, irreflectidamente, aceitou o desafio,
exigindo, em troca, que Polidectes
cumprisse
a promessa de deixar a mãe em paz e, além disso, de abandonar o trono da ilha.
A cabeça
de Medusa
Perseu estava
atrapalhado, sem saber bem que decisões tomar, sentindo que fora precipitado
num desafio que só a muita indignação contra quem lhe desfeiteava a mãe,
justificara. Mas Perseu, afinal, era
um herói, uma espécie
de semideus, por ser filho de Zeus,
embora
de uma mãe mortal, e valeram-lhe
os seus meio irmãos, Atena e Hermes, esses, sim, verdadeiros deuses, por terem, juntamente com o mesmo pai,
uma deusa como mãe, Zeus sendo um autêntico
campeão em prática de adultério, disperso por Terra e Céus. Assim, como deuses,
com as suas respectivas funções, Atena e Hermes orientaram Hermes, mandando-o, em primeiro lugar, visitar as Greias, na sua gruta, onde elas guardavam o caminho das Górgonas. Eram aquelas, umas divindades
ancestrais, anteriores aos próprios deuses do Olimpo, vivendo numa gruta onde só existia fealdade, como “país da noite”. Partilhavam entre elas um único olho e um dente, usados à
vez por uma delas, enquanto as outras duas dormiam. Perseu conseguiu arrebatar olho e dente à que estava de
guarda na altura, e isso foi motivo de grande zaragata entre as três, até que Perseu lhes apareceu, prometendo entregar-lhes
o olho e o dente desde que elas lhe indicassem o caminho das Górgonas, o que aconteceu, depois de uma luta
assanhada.
*
O passo seguinte foi a passagem de Perseu pela ilha das Ninfas, seres belos e alados, representantes
da juventude eterna, a quem Perseu contou os motivos da sua ida até elas, que
muito se impressionaram com a história de Danae, a mãe de Perseu, perseguida
por Polidectes. Como
talismã, deram-lhe o elmo de Hades,
que
o tornaria invisível, um saco de
pele curtida para colocar a cabeça de Medusa – que tinha o condão de petrificar quem quer que a
olhasse. Também Hermes, que ali
apareceu, lhe trouxe uma espécie de foice para cortar
a cabeça de Medusa,
aconselhando-o a nunca a olhar directamente nos olhos, mas apenas o seu reflexo
no escudo de bronze, onde o
olhar da Górgone perderia o
seu poder.
Equipado, pois, com as sandálias aladas, o elmo da invisibilidade, o saco e a foice, Perseu, embora admirado por merecer ajuda tão
valiosa, partiu, segundo orientação das Ninfas, para a mansão
das Górgones, uma ilhota perdida no meio do mar.
*
Era um sítio imundo e asqueroso, rodeado
de estátuas dos que foram petrificados ao tentarem enfrentar Medusa, ou dela fugir. Perseu, invisível sob o elmo, e calçado com as sandálias aladas, percorreu o espaço até junto de Medusa, a única Górgone mortal, a quem evitou olhar directamente, guiando-se
pelo seu reflexo no escudo de bronze, enquanto lhe cortava a cabeça com a
foice, cabeça que guardou, a seguir, no saco, fugindo a toda a velocidade,
antes que as duas outras Górgones,
-
essas imortais – Esteno e Euríale, aparecessem.
Entretanto, quando ia a levantar voo, viu
dois seres maravilhosos surgirem do pescoço decepado da Medusa que estava
grávida de Posídon –
o cavalo alado Pégaso, que se
ergueu nos ares em direcção ao Olimpo, e o gigante Crisaor. E Perseu assistiu, invisível sob o elmo, aos
gritos enfurecidos das duas Górgones imortais, Esteno
e Euríale.
As
Tribulações de Andrómeda
Novas aventuras mirabolantes esperavam Perseu, de regresso a casa, a voar por sobre a
África do Norte: A primeira
foi com o Titã Atlas, o tal que
segurava a abóbada celeste aos ombros, que lhe recusou ajuda e que Perseu, com o auxílio da cabeça de Medusa, que virou sobre ele, primeiro
petrificou e a seguir
transformou em frondosa cordilheira montanhosa, que vai da Tunísia a Marrocos.
Daí partiu para o Reino de Cefeu, na Etiópia, tendo avistado uma linda rapariga chorosa acorrentada
a um farilhão, ou seja, um pequeno ilhéu, perto da praia, e pela qual Perseu logo se apaixonou, à medida que ela, que
disse chamar-se Andrómeda, ia
contando a sua história – um castigo de Posídon, rei dos mares, por sua mãe, Cassiopeia, se ter gabado de ser mais bela que as ninfas do mar, Nereidas, filhas
daquele, coisa que Posídon não
desculpou. O triste pai de Andrómeda,
o
rei Cefeu, fora
consultar o oráculo na Líbia, o
qual lhe explicou que a ira de Posídon
só
se aplacaria com a oferta da Andrómeda,
acorrentada a um ilhéu, a um monstro marinho, e, apesar da recusa horrorizada dos
pais, o povo etíope forçou-os a ceder a filha, que ali estava acorrentada,
desde essa manhã, à espera do monstro horrendo. Daí a sua aflição.
Imediatamente, Perseu se dirigiu
ao palácio dos tristes pais, pedindo-lhes a permissão de lutar com o monstro
para libertar Andrómeda, o que
eles, evidentemente aceitaram, tendo Perseu
eliminado
as dúvidas de Cefeu sobre o seu
êxito, contando-lhe as aventuras anteriores, sob a protecção dos deuses Atena e Hermes, e dizendo-se escudado com vários instrumentos por
eles e outras divindades oferecidos. Tudo aconteceu segundo a sua promessa, Perseu matou o monstro, libertando Andrómeda, e levando-a para os felizes pais, a
mãe Cassiopeia muito
arrependida da sua vaidade, pois com os deuses temos que ser comedidos nas
nossas provocações.
*
Depois do reencontro comovente de Andrómeda com os pais - Cassiopeia, como já se disse, muito arrependida da
sua vaidade provocante - Perseu, que pediu a
mão de Andrómeda, conta a sua
história, a pedido do rei, dizendo-se filho de Dánae, que o ensinara nos seus estudos e brinquedos, e do
pescador Dictis, que o
ensinara no seu trabalho e nas coisas práticas da vida, segundo um prisma de
rectidão sempre. De facto, Perseu nada sabia
a respeito dos seus, a não ser aquilo que lhe fora transmitido, que eles,
afinal, tinham calado, já que sua mãe sabia que ele, Perseu, representava um perigo de morte para o
seu próprio pai, Acrísio, o avô de Perseu. Cefeu, todavia, entende que Perseu, com tantos poderes mágicos por oferenda de deuses, ou
outras entidades, e capaz de realizar feitos tão extraordinários como os que
referira, acha que a história estava mal contada e que ele devia ter uma origem
diferente da que contara. Aconselhou-o, pois, a pedir à sua mãe, Dánae, que desfizesse o mistério do seu
nascimento, até para poder justificar o casamento de sua filha Cassiopeia com ele, que pedira a sua mão, mas que
o seu estatuto de plebeu, embora com tão nobres sentimentos, contrariava.
Entretanto, fez-se um banquete para festejar a vida da filha e o herói que a
salvara, apontando, além disso para um casamento futuro entre os dois. Ora, um tio de Andrómeda, que também a amava, apareceu no banquete, com os
seus homens, disposto a lutar por ela. Mas Perseu interpôs-se, e com o auxílio da cabeça de Medusa, pedindo aos partidários de Cefeu que não olhassem para ela, assestou-a
sobre o tal tio e seus
homens, transformando-os em estátuas de pedra que logo foram dali levadas pelos
soldados do rei. E o banquete continuou, no meio da alegria geral. A um tal
herói, Cefeu não podia
recusar mais a mão de sua filha, e o casamento fez-se, partindo os noivos
seguidamente, para a ilha Serifo, para junto
de Danae e Dictis, transportados pelas sandálias aladas, juntamente
com os outros instrumentos divinos da salvação de Perseu.
Um pai
mortal e um pai imortal
Mas a casa de Dictis estava vazia e o seu barco lançado na
areia, e, preocupados, dirigiram-se para casa de um pescador amigo de longa
data, Anatólio, que lhes
explicou que o rei Polidectis não
respeitara a combinação de esperar um mês por Perseu, que lhe iria levar a cabeça de Medusa, e fora em busca de Danae, mas sabendo
das suas intenções, ela e Dictis tinham
fugido, estavam recolhidos no templo de Apolo, sendo tratados pelos pescadores, mas vigiados pelos
soldados de Polidectis. É claro
que, depois de deixar Andrómeda na casa de Anatólio, Perseu dirigiu-se ao palácio de Polidectis, que estava num banquete, sobre o qual e a outros
comensais foliões, assestou a cabeça de Medusa, petrificando-os. Salvou os soldados, que todos lhe obedeceram,
e voltando ao templo de Apolo, para
libertar os pais e onde, a seu pedido, a mãe Danae lhe contou da sua história, em que a criada Aspásia fora a sua informadora sobre a tal
presença de Zeus, em forma de chuva dourada, que lhe fizera o filho – Perseu. Seguir-se-á a apresentação de Dictis ao povo da ilha como seu rei e vão os
cinco viver para o palácio, onde reinara Polidectis.
O Destino
puxa os seus fios
Trata-se do capítulo final, com Perseu, (que, entretanto, entregara os
instrumentos de que precisara para obter a cabeça de Medusa, a Hermes e a Atena que lhe apareceram, quando ele se dispunha a ir
entregar-lhos), a desejar ir ver o seu avô Acrísio, a Argos, acompanhado
de sua mãe Dánae e de sua
mulher Andrómeda. Mas o avô
recusou-se a vê-los. Entretanto, Perseu foi
convidado a participar nuns jogos distantes, em Larissa, para onde partiu, deixando a mãe e a esposa à sua
espera, alojadas numa casa. Perseu ganhou
todos os jogos, e no lançamento do disco, uma tempestade fez o disco desviar-se,
indo espetar-se no pé de um velho, na bancada, o qual se provou ser o seu avô,
joguete do seu destino, ao qual ninguém foge. Após a morte do avô, Perseu não quis ser rei de Argos. Governará Micenas, por ele fundada, e sempre fiel à sua Andrómeda, de quem teve vários filhos.
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