segunda-feira, 22 de março de 2021

Mitos gregos - Perseu e Medusa

 

Mitos gregos - Perseu e Medusa

Mais uma história mitológica de um rei a desejar um filho, herdeiro do seu trono. A primeira que lemos foi a de Egeu, rei de Atenas, que acabou por ter o filho Teseu, da sua sobrinha Etra, tudo comandado pelo destino, tendo Teseu cometido, entre outras façanhas, a proeza de matar o Minotauro num labirinto de paredes de bronze, na ilha de Creta, onde governava o rei Minos, cuja mulher, Pasifae, tivera esse monstro, devido a uma história pecaminosa, por vingança de Poseidon contra Minos, que não lhe sacrificara o touro que aquele lhe enviara, para confirmar que ele era o verdadeiro sucessor do seu suposto pai Astérion, no trono de Creta, sendo ele, na realidade, filho de Júpiter e de Europa, juntamente com mais dois irmãos gémeos.

O nascimento de Perseu

Desta vez foi em Argos que a história se iniciou, contada por Ramón Ronda e impressa na U E - a estranha história de Perseu e Medusa.

O rei de Argos chamava-se Acrísio, e era casado com Eurídice, filha do rei Lacedémon e de Esparta, (origem, respectivamente, dos topónimos Lacedemónia e Esparta). Tinha uma filha apenas – Dánae – mas precisava de um herdeiro para lhe suceder no trono, receoso de que seu irmão Preto, rei de Tirinto, que odiava, lho arrebatasse. Consultado o oráculo, este predisse que um neto seu, filho da sua filha de catorze anos, Dánae, seria causa da sua morte. Assustado, fez construir uma câmara subterrânea onde mandou um criado encerrar a sua filha, que ele fez acompanhar, contudo, como pai condoído, pela criada Aspásia. O sofrimento da pobre Dánae, foi, naturalmente, enorme, longe de todos e de tudo, e sobretudo do ar exterior e da luz solar. Além do tear com que se entretinham, a criada Berenice levava-lhes o alimento diário e falava-lhes do tempo e do mundo natural, proibida de lhes contar das pessoas e coisas do palácio, sob pena de morte. Mas Zeus apareceu a Dánae sob a forma de uma chuva dourada, e fez-lhe um filho a quem ela chamou Perseu.

Infância e juventude de Perseu

Sabendo do nascimento da criança, Acrísio castigou a criada Berenice, mandando amputar-lhe as mãos e cortar-lhe a língua. Dirigiu-se à tal câmara subterrânea, disposto a matar filha e neto mas não teve coragem e no dia seguinte, depois de os levar ao palácio, onde dormiram nessa noite, acompanhou-os ao mar Egeu, explicou à filha o motivo dos seus actos – o oráculo tenebroso sobre a sua própria morte, causada por um seu neto - mandou uns soldados enfiarem os dois numa espécie de arca, e entregou-os às ondas e ao seu destino. E Zeus, condoído, conduziu a barca a uma enseada, onde um pescador os encontrou e salvou, levando-os para a sua humilde casa, e tratando deles.

Quando Danae despertou da sua profunda fraqueza, o homem, que disse chamar-se Dictis, deu-lhe de comer e explicou-lhe que estavam na ilha Serifo. Foi ali que Perseu foi criado, julgando Dictis seu pai – que, de resto, o educou bem, nas coisas práticas da vida e nos sentimentos respeitáveis, tendo-se Danae ocupado da formação escolar do filho.

Um dia, Dictis confessou a Danae que era irmão do rei da ilha – Polidectis – e aquela estranhou a sua pobreza, tendo Dictis silenciado as suas razões. Entretanto, esse rei Polidectis encontrou Dánae na praia, com o filho Perseu, apaixonou-se por ela e quis levá-la para o seu palácio, o que ela, naturalmente, recusou, dizendo já ser casada. Estranhou a insistência, feita de insolência, e foi então que Dictis lhe contou ser irmão daquele, que, naquela ilha, era um déspota. que reduzira os ilhéus a seus escravos servis.

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 Entretanto, Perseu foi crescendo, robusto e são, ele próprio tornando-se pescador e o sustentáculo da família, enquanto Polidectis continuava insistindo nas propostas à bela Dánae, o que levou Perseu, um dia, já rapagão, a apresentar-se no palácio para exigir ao rei um ponto final nas propostas ofensivas à sua mãe. A conversa provocatória do rei, descambou num desafio: ele deixaria de provocar a mãe, desde que Perseu lhe trouxesse, dentro de um mês, a cabeça de Medusa, uma das três irmãs Górgonas, monstros com víboras na cabeça no lugar dos cabelos e cujo olhar petrificava quem as fixasse. Perseu, irreflectidamente, aceitou o desafio, exigindo, em troca, que Polidectes cumprisse a promessa de deixar a mãe em paz e, além disso, de abandonar o trono da ilha.

A cabeça de Medusa

Perseu estava atrapalhado, sem saber bem que decisões tomar, sentindo que fora precipitado num desafio que só a muita indignação contra quem lhe desfeiteava a mãe, justificara. Mas Perseu, afinal, era um herói, uma espécie de semideus, por ser filho de Zeus, embora de uma mãe mortal, e valeram-lhe os seus meio irmãos, Atena e Hermes, esses, sim, verdadeiros deuses, por terem, juntamente com o mesmo pai, uma deusa como mãe, Zeus sendo um autêntico campeão em prática de adultério, disperso por Terra e Céus. Assim, como deuses, com as suas respectivas funções, Atena e Hermes orientaram Hermes, mandando-o, em primeiro lugar, visitar as Greias, na sua gruta, onde elas guardavam o caminho das Górgonas. Eram aquelas, umas divindades ancestrais, anteriores aos próprios deuses do Olimpo, vivendo numa gruta onde só existia fealdade, como “país da noite”. Partilhavam entre elas um único olho e um dente, usados à vez por uma delas, enquanto as outras duas dormiam. Perseu conseguiu arrebatar olho e dente à que estava de guarda na altura, e isso foi motivo de grande zaragata entre as três, até que Perseu lhes apareceu, prometendo entregar-lhes o olho e o dente desde que elas lhe indicassem o caminho das Górgonas, o que aconteceu, depois de uma luta assanhada.

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O passo seguinte foi a passagem de Perseu pela ilha das Ninfas, seres belos e alados, representantes da juventude eterna, a quem Perseu contou os motivos da sua ida até elas, que muito se impressionaram com a história de Danae, a mãe de Perseu, perseguida por Polidectes. Como talismã, deram-lhe o elmo de Hades, que o tornaria invisível, um saco de pele curtida para colocar a cabeça de Medusa – que tinha o condão de petrificar quem quer que a olhasse. Também Hermes, que ali apareceu, lhe trouxe uma espécie de foice para cortar a cabeça de Medusa, aconselhando-o a nunca a olhar directamente nos olhos, mas apenas o seu reflexo no escudo de bronze, onde o olhar da Górgone perderia o seu poder.

Equipado, pois, com as sandálias aladas, o elmo da invisibilidade, o saco e a foice, Perseu, embora admirado por merecer ajuda tão valiosa, partiu, segundo orientação das Ninfas, para a mansão das Górgones, uma ilhota perdida no meio do mar.

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Era um sítio imundo e asqueroso, rodeado de estátuas dos que foram petrificados ao tentarem enfrentar Medusa, ou dela fugir. Perseu, invisível sob o elmo, e calçado com as sandálias aladas, percorreu o espaço até junto de Medusa, a única Górgone mortal, a quem evitou olhar directamente, guiando-se pelo seu reflexo no escudo de bronze, enquanto lhe cortava a cabeça com a foice, cabeça que guardou, a seguir, no saco, fugindo a toda a velocidade, antes que as duas outras Górgones, - essas imortais – Esteno e Euríale, aparecessem.

Entretanto, quando ia a levantar voo, viu dois seres maravilhosos surgirem do pescoço decepado da Medusa que estava grávida de Posídono cavalo alado Pégaso, que se ergueu nos ares em direcção ao Olimpo, e o gigante Crisaor. E Perseu assistiu, invisível sob o elmo, aos gritos enfurecidos das duas Górgones imortais, Esteno e Euríale.

As Tribulações de Andrómeda

Novas aventuras mirabolantes esperavam Perseu, de regresso a casa, a voar por sobre a África do Norte: A primeira foi com o Titã Atlas, o tal que segurava a abóbada celeste aos ombros, que lhe recusou ajuda e que Perseu, com o auxílio da cabeça de Medusa, que virou sobre ele, primeiro petrificou e a seguir transformou em frondosa cordilheira montanhosa, que vai da Tunísia a Marrocos.

Daí partiu para o Reino de Cefeu, na Etiópia, tendo avistado uma linda rapariga chorosa acorrentada a um farilhão, ou seja, um pequeno ilhéu, perto da praia, e pela qual Perseu logo se apaixonou, à medida que ela, que disse chamar-se Andrómeda, ia contando a sua história – um castigo de Posídon, rei dos mares, por sua mãe, Cassiopeia, se ter gabado de ser mais bela que as ninfas do mar, Nereidas, filhas daquele, coisa que Posídon não desculpou. O triste pai de Andrómeda, o rei Cefeu, fora consultar o oráculo na Líbia, o qual lhe explicou que a ira de Posídon só se aplacaria com a oferta da Andrómeda, acorrentada a um ilhéu, a um monstro marinho, e, apesar da recusa horrorizada dos pais, o povo etíope forçou-os a ceder a filha, que ali estava acorrentada, desde essa manhã, à espera do monstro horrendo. Daí a sua aflição. Imediatamente, Perseu se dirigiu ao palácio dos tristes pais, pedindo-lhes a permissão de lutar com o monstro para libertar Andrómeda, o que eles, evidentemente aceitaram, tendo Perseu eliminado as dúvidas de Cefeu sobre o seu êxito, contando-lhe as aventuras anteriores, sob a protecção dos deuses Atena e Hermes, e dizendo-se escudado com vários instrumentos por eles e outras divindades oferecidos. Tudo aconteceu segundo a sua promessa, Perseu matou o monstro, libertando Andrómeda, e levando-a para os felizes pais, a mãe Cassiopeia muito arrependida da sua vaidade, pois com os deuses temos que ser comedidos nas nossas provocações.

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Depois do reencontro comovente de Andrómeda com os pais - Cassiopeia, como já se disse, muito arrependida da sua vaidade provocante - Perseu, que pediu a mão de Andrómeda, conta a sua história, a pedido do rei, dizendo-se filho de Dánae, que o ensinara nos seus estudos e brinquedos, e do pescador Dictis, que o ensinara no seu trabalho e nas coisas práticas da vida, segundo um prisma de rectidão sempre. De facto, Perseu nada sabia a respeito dos seus, a não ser aquilo que lhe fora transmitido, que eles, afinal, tinham calado, já que sua mãe sabia que ele, Perseu, representava um perigo de morte para o seu próprio pai, Acrísio, o avô de Perseu. Cefeu, todavia, entende que Perseu, com tantos poderes mágicos por oferenda de deuses, ou outras entidades, e capaz de realizar feitos tão extraordinários como os que referira, acha que a história estava mal contada e que ele devia ter uma origem diferente da que contara. Aconselhou-o, pois, a pedir à sua mãe, Dánae, que desfizesse o mistério do seu nascimento, até para poder justificar o casamento de sua filha Cassiopeia com ele, que pedira a sua mão, mas que o seu estatuto de plebeu, embora com tão nobres sentimentos, contrariava. Entretanto, fez-se um banquete para festejar a vida da filha e o herói que a salvara, apontando, além disso para um casamento futuro entre os dois. Ora, um tio de Andrómeda, que também a amava, apareceu no banquete, com os seus homens, disposto a lutar por ela. Mas Perseu interpôs-se, e com o auxílio da cabeça de Medusa, pedindo aos partidários de Cefeu que não olhassem para ela, assestou-a sobre o tal tio e seus homens, transformando-os em estátuas de pedra que logo foram dali levadas pelos soldados do rei. E o banquete continuou, no meio da alegria geral. A um tal herói, Cefeu não podia recusar mais a mão de sua filha, e o casamento fez-se, partindo os noivos seguidamente, para a ilha Serifo, para junto de Danae e Dictis, transportados pelas sandálias aladas, juntamente com os outros instrumentos divinos da salvação de Perseu.

Um pai mortal e um pai imortal

Mas a casa de Dictis estava vazia e o seu barco lançado na areia, e, preocupados, dirigiram-se para casa de um pescador amigo de longa data, Anatólio, que lhes explicou que o rei Polidectis não respeitara a combinação de esperar um mês por Perseu, que lhe iria levar a cabeça de Medusa, e fora em busca de Danae, mas sabendo das suas intenções, ela e Dictis tinham fugido, estavam recolhidos no templo de Apolo, sendo tratados pelos pescadores, mas vigiados pelos soldados de Polidectis. É claro que, depois de deixar Andrómeda na casa de Anatólio, Perseu dirigiu-se ao palácio de Polidectis, que estava num banquete, sobre o qual e a outros comensais foliões, assestou a cabeça de Medusa, petrificando-os. Salvou os soldados, que todos lhe obedeceram, e voltando ao templo de Apolo, para libertar os pais e onde, a seu pedido, a mãe Danae lhe contou da sua história, em que a criada Aspásia fora a sua informadora sobre a tal presença de Zeus, em forma de chuva dourada, que lhe fizera o filho – Perseu. Seguir-se-á a apresentação de Dictis ao povo da ilha como seu rei e vão os cinco viver para o palácio, onde reinara Polidectis.

O Destino puxa os seus fios

Trata-se do capítulo final, com Perseu, (que, entretanto, entregara os instrumentos de que precisara para obter a cabeça de Medusa, a Hermes e a Atena que lhe apareceram, quando ele se dispunha a ir entregar-lhos), a desejar ir ver o seu avô Acrísio, a Argos, acompanhado de sua mãe Dánae e de sua mulher Andrómeda. Mas o avô recusou-se a vê-los. Entretanto, Perseu foi convidado a participar nuns jogos distantes, em Larissa, para onde partiu, deixando a mãe e a esposa à sua espera, alojadas numa casa. Perseu ganhou todos os jogos, e no lançamento do disco, uma tempestade fez o disco desviar-se, indo espetar-se no pé de um velho, na bancada, o qual se provou ser o seu avô, joguete do seu destino, ao qual ninguém foge. Após a morte do avô, Perseu não quis ser rei de Argos. Governará Micenas, por ele fundada, e sempre fiel à sua Andrómeda, de quem teve vários filhos.

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