sexta-feira, 19 de março de 2021

Pelo contrário


Há aspectos, nas opiniões de André Ventura, que parecem certeiros e ditados por quem se esforça por sair da apatia em que nos quedamos, em relação ao encaixe das medidas que vão saindo, com que o Governo vai bolando as suas resoluções, na crise. É o caso – leio no Observador – da questão que aquele pôs “no debate parlamentar bimestral com o chefe do Governo”:

"No início do seu mandato disse que a idade da reforma não é para descer. Todos soubemos como a idade da reforma aumentou esta semana. Num país que dá borlas fiscais à EDP, esbanja dinheiro no Novo Banco que nunca mais acaba, que paga subvenções vitalícias a presos, sente-se bem com o facto de serem os pensionistas a pagar a factura da crise?", perguntou o deputado único da extrema-direita parlamentar.”

Não me parece que a pergunta seja despicienda, e pelo contrário, denota uma sã questionação sobre questões vitais para a sobrevivência da nação portuguesa.

Mas, segundo a crónica de JMT, e os seus comentadores, assim vamos reagindo, entre farsas e comédias, distraindo-nos com as opiniões deste e daquele, a maioria entretida na gozação, como neste caso, sobre um André Ventura que, jovem e corajoso, não se deixa cair na apatia que vai corroendo a sociedade portuguesa. E isso parece bem positivo.

OPINIÃO   A diabolização pavloviana do Chega é uma burrice

É bom ter consciência de que há um tom recorrente de humilhação que apenas faz sorrir os convertidos e entrincheirar os ofendidos. É um tom que acaba por dar trunfos ao Chega, ao ser depois amplificado até ao zénite da estupidez nas redes sociais.

JOÃO MIGUEL TAVARES           PÚBLICO, 18 de Março de 2021, 0:01

Tenho esta tese: André Ventura e os militantes do Chega dizem suficientes barbaridades para não ser necessário inventar barbaridades que eles não dizem. É fundamental que a comunicação social e os comentadores não se transformem em cãezinhos de Pavlov, que começam a salivar de indignação assim que Ventura toca à campainha, ainda antes de ele abrir a porta. Não digo isto para proteger o Chega – pelo contrário. Digo isto para impedir radicalizações desnecessárias e para não continuarmos a alimentar a fogueira da perpétua vitimização, onde o Chega vai buscar o seu combustível.

Nuno Graciano foi apresentado como candidato do Chega à Câmara de Lisboa. É uma novidade importante, porque é a primeira vez que o partido apresenta a eleições um candidato diferente, e, portanto, será uma boa forma de avaliar se o Chega consegue ter vida para além do seu líder. A conferência de imprensa de Graciano foi normalíssima e surpreendentemente articulada. Só que parece ser sempre irresistível a tentação de sublinhar o quão horrível a galáxia Chega é, independentemente dos seus protagonistas. Filipe Santos Costa, na TVI24, recuperou a ideia de Lisboa-capital-do-Minho-a-Timor só porque a apresentação foi junto ao Padrão dos Descobrimentos, e declarou que, depois de Nuno Graciano e de Maria Vieira, só faltava o Chega ir buscar os palhaços Croquete e Batatinha.

Note-se que aprecio bastante – e até pratico – o humor no comentário político, mas é bom ter consciência de que há um tom recorrente de humilhação que apenas faz sorrir os convertidos e entrincheirar os ofendidos. É um tom que acaba por dar trunfos ao Chega, ao ser depois amplificado até ao zénite da estupidez nas redes sociais. Um dos momentos mais conseguidos da conferência de imprensa foi quando Nuno Graciano lamentou o hashtag “Graciano bom é Graciano morto”, inventado mal se soube que ele seria candidato do Chega a Lisboa, e o impacto que a sua decisão já estava a ter na sua família e nos seus quatro filhos. Não custa acreditar que tenha razão: ele foi transformado em saco de pancada antes de ter pronunciado uma única palavra.

Isso não é razoável. O Chega é um partido do nosso sistema democrático. Existe uma imensa diferença entre discordar de forma veemente das suas ideias e demonizar qualquer pessoa que se atreva a orbitar na sua esfera. Essa diabolização pisa tanto as fronteiras da democracia como algumas declarações de André Ventura. Ventura é mau, logo, tudo o que ele diz é mau, logo, os que estão com ele são maus, logo, todos são horríveis por defeito, logo, se são carecas devem ser skinheads (levo essa particularmente a peito).

Pergunto: é esse o critério que usamos à esquerda? Ainda há poucos dias tivemos largas avenidas de Portugal decoradas com bandeiras do Partido Comunista, a um ponto tal que um turista distraído pensaria estar na URSS. Felizmente, sabemos que o PCP não é o PCUS estalinista, responsável pela morte de milhões de pessoas. Contudo, se usássemos a mesma lógica do odioso-por-afinidade que aplicamos ao Chega, não seria tudo aquilo absolutamente obsceno? Não deveria o PCP ficar marcado para sempre com o ferro do genocídio, e a sua foice e martelo merecer o mesmo tratamento da suástica?

Na medida do possível – e das regras da Constituição –, os extremos devem ser integrados no sistema democrático. Combater firmemente as suas más ideias vale bem a pena. Diabolizar todos aqueles que a elas aderem é um erro enorme, que se paga caro.         Jornalista

TÓPICOS  OPINIÃO  CHEGA  CÂMARA DE LISBOA  ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS  ANDRÉ VENTURA  PARTIDOS POLÍTICOS

COMENTÁRIOS:

João Santos.499137 INICIANTE: Na maioria das vezes estou em completo desacordo co JMT, mas este artigo espelha uma verdade difícil de contestar. O crescimento do Chega assenta em vários fatores, entre os quais a promoção e diabolização da imprensa sempre, nos últimos tempos ávida de sensacionalismo. Para se manter o Chega não precisa de muito, basta-lhe estar quieto e observar a restante paisagem político-partidária, que nunca foi tão fraquinha. Por cada diabolização é mais um potencial eleitor que aparece. Não chegando diabolizar o André Ventura, agora até os candidatos deste partido são diabolizados como se de leprosos se tratassem. Ontem houve eleições na Holanda e o número de partidos, no parlamento, já chega a 15. é a democracia a funcionar. Cá o ideal é só 5, tudo o resto é extremista. Só resta sorrir...          roberto.gomes.1034586  INICIANTE: 1. É claro como água que JMT não simpatiza com o Chega e André Ventura. Dizer o contrário é pura desonestidade. 2. O Chega, e acho que é isso que o autor tenta dizer neste artigo, só pode ser combatido no campo das ideias e da democracia. Com raiva e ódio, só o estamos a alimentar, pois não nos esqueçamos que a génese do partido assenta sobre esses mesmos valores.             Ahfan Neca EXPERIENTE: Pavloviana: Já estou a salivar. Sondagem saída ontem: Chega 10%, PS 37%, PSD 24%, BE 8%, PCP 5%, CDS 4%. Vai ser preciso todo um regimento de trauliteiros pavlovianos de esquerda a dizer barbaridades para atirar o Chega às malvas.          Alexandre Pinto-Fernandes EXPERIENTE: Clarinho como a água. JMT está carregado de razão. O Bloco faz as propostas mais indecentes como o roubou de patentes, o saque fiscal, a humilhação dos portugueses que têm uns trocos no bolso etc. e passa pelos pingos da chuva sem se molhar. O Chega pode ter mil e um defeitos mas as barbaridades que se escrevem nas redes sociais sobre ele são em tudo semelhantes àquelas que André Ventura vomita.           FMTC  INICIANTE: JMT, estou de acordo consigo, mas o Nuno Graciano diz que foi presidente de uma associação de estudantes quando na realidade não foi, tem de ser denunciado. jmtavares  EXPERIENTE: Com certeza. Parece que foi vice-presidente. O escrutínio é sempre fundamental, e haverá muito para escrutinar.          jorge morais  INICIANTE: Quero lembrar ao FTC que o Sócrates também dizia que era engenheiro e afinal não era.             Novo Humbo  EXPERIENTE: O Chega vai inchar e desinchar num ciclo tão rápido como rápida e eficaz é a nossa consciência colectiva relativamente ao que é inequivocamente mau e inaceitável. Dou 3 a 5 anos para o Sr. (a)Ventura ficar a falar sozinho com os 1500 luso-nazis que são o "core" da sua base de apoio. Não é por acaso que se olha para o mapa da Península Ibérica e, do que pareceria ser uma inevitabilidade geográfica - aquela jangadinha de pedra - este rectângulo a oeste insiste em negar. Construiu-se com muitos séculos de cimento e muito siso como argamassa. Lá terá que voltar aos programas desportivos, o hitlarilas, empurrado pelo dito colectivo bom-senso genético. Vão ver.        Nelson Sousa  EXPERIENTE: Vai inchar e desinchar mas não assim tão rápido. Depende muito do caminho político que Portugal seguir. A continuar assim, o inchaço vai ser prolongado. Não é que A. Ventura seja inteligente ou trabalhe muito. Basta que haja quem seja burro e faça o trabalho por ele. E isso é coisa que não falta. OldVic1  MODERADOR: … e essa burrice demonstra que entre o Chega e alguns dos que o combatem da pior forma possível a diferença que existe é de rótulo. Pedem-nos que os julguemos pelas intenções e não pelos resultados trágicos das suas ideologias: podemos ser ingénuos, mas nessa já não caímos. miguelc  EXPERIENTE: tem muita razão jmt, concordo com a necessidade de, democraticamente, não eliminar à partida. Continua com o paralelismo à esquerda, com que não concordo - os da esquerda não são potencialmente desumanizantes, o chega sim.            Novo Humbo  EXPERIENTE: "não são potencialmente desumanizantes"...!!?? Todo o vector filosófico e prática política da "esquerda" é o esmagamento do indivíduo em benefício tribal de um "colectivo" imaginário. Criar o "homem novo" - lembra-se? - sempre fez passar todo o tipo de atrocidades (…as de proporções bíblicas e as mais comezinhas...) como actos virtuosos. Não estranhe os paralelismos. Aqueles são umas bestas e os outros, também.            miguelc EXPERIENTE: o PC anda cá há décadas - o que fez/propôs que nos tornasse uma sociedade menos humana e inclusiva. A mesma pergunta acerca do BE. Algum destes tem alguma acção/proposta que nos torne uma sociedade menos saudável (opções económicas à parte)? É que o risco do Chega está nestas coisas. Eu acho que na realidade objectiva comparar uma coisa com a outra é demagogia, mesmo que na definição filosófica de ambas as partes sejam extremistas. OldVic1  MODERADOR: O PREC, o apoio incondicional a ditaduras do seu campo ideológico, a constante   proposta de medidas que atentam contra a liberdade individual, etc. E se entrarmos em linha de conta com os partidos fundadores do BE, todas essas coisas também lhe podem ser atribuídas.     Adolfo-Dias  EXPERIENTE: Bom artigo, JMT. Claro que já houve aqui quem dissesse que está a defender ou a branquear o Chega, mas isso é gente que não percebe (ou não quer perceber), e por isso distorce os escritos. bukowski  INICIANTE: Tu é que não percebes nada. Não sabes ler nas entrelinhas, otário. Isto é um apologismo do Chega, puro e duro. Mas claro que o JMT não vai dizer isso explicitamente.         Ahfan Neca  EXPERIENTE: Pelos vistos, temos dois tipos de trauliteiros contra o Chega. Os trauliteiros parvos que dizem barbaridades e os trauliteiros inteligentes como o JMT que deixam que seja o Chega a dizer as suas barbaridades. A minha questão perante tanta trauliteirice é a seguinte: é mesmo preciso haver um corpo de trauliteiros especializados em Chega? Quem lhes passou a carta de alforria? Não serão eles os maiores de todos os bárbaros?         Mario Coimbra:  INFLUENTE: Esta crónica é válida para o Chega como para qualquer partido com ideias mais extremistas. É na casa da democracia que temos que combater estas chagas e correr riscos ao combatê-las. Elas podem mesmo chegar ao arco da governação. E para quem não gosta, existem rennies e outros comprimidos. Custa muito mas é assim a democracia.

 

 

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