Quem havia
de dizer que teste e testículo provêm da mesma fonte etimológica, como afirma o Dr. Salles, que logo me pôs a consultar o dicionário etimológico,
ficando-me pelos da Internet, de mais fácil transcrição. Nunca tinha pensado no
caso, e achei que o Dr. Salles estava a exceder-se nos campos semânticos, para
contar a sua graciosa história, com que pretende mostrar uma excelente
disposição, na véspera de uma operação que, para todos os efeitos, não deixa de
infundir receios, mas que será mais uma prova do avanço da medicina e da
cirurgia, pois vai correr como todos nós desejamos, para continuarmos a ler as
suas análises críticas e as suas histórias de vida bem- humoradas, a disfarçar,
por vezes, outros “états d’âme” mais agrestes. Mas sim, ela lá estava, a
etimologia, bem escarrapachada, a demonstrar o “testemunho” de virilidade assente
na palavra “testículo”, pois, pelo sim, pelo não, fui consultar a Internet, onde encontrei a explicação a confirmar o “sei que nada
sei” do meu complexo, e cujos dados porei no fim.
Mas do texto “O prego”
de Salles da Fonseca resultou
ainda o meu receio sobre hipotéticos idênticos escrúpulos que poderiam ter
assaltado o nosso PR sobre o
mesmo teste da Covid 19, com toda a visibilidade corporal de que ele é
habitualmente protagonista, caso o teste não se ficasse pela «cotonete até à base frontal da consciência», - como no caso de Salles da Fonseca, - o que não impediu, contudo, que lhe admirássemos
as partes do arcaboiço, a que, de resto, já estamos habituados, com os seus
mergulhos marítimos. Mas felizmente que não foi preciso o prego, nesse caso.
Quanto ao Dr. Salles, sem a
mesma projecção de visibilidade mediática, não haveria esse receio, ficaria
tudo inter pares, lá pelo gabinete sem prego… Bastaria a anedota, a sugerir.
HENRIQUE SALLES DA
FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 09.03.21
Foi
lá pela segunda metade do séc. XX que em Portugal se iniciou a inseminação
artificial das vacas leiteiras, época a partir da qual os Veterinários de
província tiveram que passar a visitar tudo quanto era estábulo leiteiro por
esse país além…
Remonta
a essas épocas primevas da dita técnica a história que se conta do Veterinário
que foi inseminar artificialmente as vacas de um casal já velhote de
agricultores minhotos. Chegado ao local, recebido pelo casal anfitrião, logo
foi conduzido ao estábulo. Eram duas as vacas a beneficiar. Poisada algures a
instrumentália apropriada ao acto, tomou o Veterinário a iniciativa de tirar a
camisa para poder usar as mãos e os braços depois de apropriadamente ensaboados
para melhor fluírem no interior das vacas sem o estorvo das mangas e sem bulir
com as partes a manipular.
E
o par de velhotes, nada percebendo do que se passaria de seguida e só
conhecendo o método reprodutivo que consta da Natureza, esperava que o
Veterinário se aprontasse para a função… Então, solícito, o agricultor logo foi
dizendo que, «para pendurar as calças, o Senhor Doutor tem ali aquele prego».
*
*
Foi
desta história que hoje me lembrei quando me dirigi a um famoso laboratório de
análises clínicas para fazer o «teste do Covid», exame prévio este que é
legalmente imprescindível para a intervenção cirúrgica a realizar dentro de
dois dias.
Ao
entrar no gabinete em que o «teste» se realizaria, fiz a parte de procurar o
cabide ou, no mínimo, o prego na parede. Vendo-me indeciso, uma das Técnicas
presentes perguntou-me o que eu procurava. Respondi-lhe que procurava o prego
para pendurar as calças.
- Pendurar as calças para
quê?
- Para não se amarrotarem
quando as tirar.
- Mas não precisa de tirar as
calças.
- Como assim? Não pretendem
fazer-me um «teste»?
- Sim, claro, mas não precisa
de tirar as calças.
- Então?
- Qual é a dúvida que o
Senhor Fonseca tem?
- A questão está em que
«teste» tem a ver com testículo e, para me fazerem essa observação, vou ter que
tirar as calças. Ou serão as Senhoras já tão experientes que vos basta um golpe de vista mesmo por cima
das calças?
A
gargalhada da Técnica da conversa foi mesmo hilariante, a outra que estava ao
lado esboçou um sorriso de quem não alcançou a etimologia e a terceira
manteve-se sisuda como se o seu mentor religioso, seguramente paulino, não lhe
permitisse humores carnais.
Posto
o que me enfiaram uma cotonete até à
base frontal da consciência e me mandaram em paz.
Ao sair, a hilária ainda me agradeceu
a aula de português e confirmou que naquele gabinete só se fazem exames e não
testes.
E
o prego não estava lá.
Lisboa, 9 de Março de 2021 Henrique Salles da Fonseca
Tags: humor
COMENTÁRIOS:
Anónimo 09.03.2021 Gostei da cotonete até a base frontal da consciência.
Ficou uma dúvida: como se pode fazer o teste, por exemplo ao PR ou ao PM dois
inconscientes? Anónimo 10.03.2021: Sr. Dr. Salles, não há dúvida que tem um refinado
sentido do humor, o que, aliás, transparece em quase todos os seus escritos. E
isso vale muito nesta altura em que os especialistas dizem que podemos precisar
de ajuda de psicólogos para não nos darmos em maluquinhos com o confinamento.
Eu acho isso um exagero, só explicável nestes tempos em que reclamos tudo e
mais alguma coisa, esquecendo aquela máxima de Kennedy: pergunta o que podes
fazer pelo teu país antes de saber o que ele pode fazer por ti. Foi mais ou
menos isto, não é? Olhe, ri-me bastante com o que contou e isso é, sem dúvida, uma boa ajuda para
a saúde mental dos seus leitores. Como deu a conhecer a razão por que foi fazer
o teste da Covid, faço os meus melhores votos pelo bom sucesso da cirurgia a
que vai ser submetido o seu órgão visual.
Anónimo 10.03.2021: Hilariante.
Boa sorte na intervenção cirúrgica a que se vai submeter. Sugestão - gostaria
ver o blog de hoje no SPG. António Fonseca Miguel
Magalhaes, 10.03.2021: Muito boa.
Henrique.
Henrique Salles da Fonseca 12.03.2021: Como diria
Karl Popper, «só nos resta ir para o Inferno» quando se lhe apresentava uma
situação aparentemente irresolúvel. Mas eu tenho duas certezas:
1.
A de que NADA sei de Biologia para além de que a maçã tem lagarta;
2.
A de que há gente muito mais inteligente e sabedora do que eu que há-de vestir
o «rei que vai nu».
No mundo livre, o mal não há-de ter a última palavra. Entretanto, eu vivo entre
a gratidão (pela bondade alheia) e a compaixão (para com o que e quem me
rodeia).
Continuemos...
NOTAS DA INTERNET
A origem das palavras testemunha e testículo
«Testigos, também é testículos.»: …..”É
verdade que há uma relação entre as palavras testemunha e testículos. No latim
havia duas palavras homónimas testis, ambas masculinas. Uma designava a
testemunha; outra, o
testículo; esta
segunda surgia quase sempre no plural sob a forma testes.
A
palavra testiculu-, nos dicionários de latim Gaffiot, Hachette e
da Porto Editora, por exemplo, é apresentada como diminutivo
do segundo verbete de testis, indicado como testis 2,
ou seja, diminutivo de testículo…
Mas também devia ser usada para designar testemunha, pois só assim se explica que a palavra principal para
referir testemunha no castelhano
seja testigo, palavra que, aliás, José Pedro Machado, no Grande Dicionário da Língua Portuguesa,
também indica para o português (embora
pareça contestável que a sua origem seja castelhana, pois ela tem exactamente
a mesma evolução que artigo,
a partir de articulu. Pode muito bem ter evoluído a partir do latim e depois ter caído
em desuso…).
No português moderno verificou-se um
fenómeno de divergência entre as palavras:
para designar testemunha criou-se
uma palavra feminina
a partir do neutro testimoniu, e o diminutivo testículo
deu origem a testículo por via
erudita (quem diria?). Os espanhóis, por seu lado, aproveitaram a palavra que
evoluiu por via popular – testigo – para indicar a testemunha e, tal como nós, usam a que nos chegou por via
erudita para referir testículo.
As línguas têm destas coisas. Por isso são tão apaixonantes!
As
palavras testículo e testemunha têm, afinal, uma origem próxima: «testis 1
– testemunha; testis 2– testículo.»
Por via das dúvidas, acrescento a versão
italiana, mais explícita a respeito do “testemunho” da tal virilidade:
Testìcolo (Vocabolario on line)
Testìcolo s. m.
[dal lat. testicŭlus, dim. Di testis (che ha lo
stesso sign.), propr. «testimone» (della virilità, o dell’atto sessuale)].
– 1. In anatomia e in fisiologia umana e comparata, la
gonade maschile nella quale ha luogo la spermatogenesi e la produzione degli
ormoni sessuali maschili.
Nenhum comentário:
Postar um comentário