quarta-feira, 7 de abril de 2021

Fogo de vistas


Mero foguetório de quem não tem mais para oferecer do que isso, mais a lama dos seus discursos de ódio e insensatez à la page. Vamos esperando que muitos como João Pedro Marques, no rasto de Jaime Nogueira Pinto, vão ajudando a limpar as canas de tal foguetório e a lama dos discursos vazios, de quem não leu nada das histórias de antanho, os povos mais fortes alastrando ao longo dos tempos, em magnas invasões de domínio, como as tivemos por cá também, na Península. Preocupam-se com o passado e abandonam o presente, onde raptos, em África, de raparigas, e demais crimes, se cometem a cada passo, mas esses crimes de hoje não lhes pesam na consciência, fazem parte dos costumes, nada têm nem nada fazem contra isso. Denegrir a história de um povo que até contribuiu para alargar os espaços desses que protestam - acicatados, é certo, pela “ideologia” pedante e interesseira dos que os protegem, como manobras operatórias da sua actual situação de privilégio no Governo, que só um povo inerte como este nosso admite e estimula – é um abuso e uma infâmia a merecer palmatoadas. Na falta de um Hércules de força, a limpar as estrebarias de Augias, que haja muitos professores de História que não se acanhem de ignorar tais falácias no seu ensino. Como fez João Pedro Marques, nesta sua lição.

 

Espero que o Governo não vá na conversa

Há um enorme esforço para reinventar a História e a tornar politicamente “útil” e o mais alarmante é que isso conta com a passividade, o silêncio ou até mesmo com a conivência de muitos historiadores.

JOÃO PEDRO MARQUES, Historiador e romancista

OBSERVADOR, 06 abr 2021

De há uns anos para cá os activistas antirracistas têm reivindicado, com insistência, a alteração dos programas e conteúdos da disciplina de História. Que querem eles suprimir e que querem que se ensine, e porquê? Basta seguir com atenção as opiniões de alguns dos mais notórios activistas para ficarmos devidamente esclarecidos.

Recentemente o Expresso perguntou a Beatriz Gomes Dias se seria preciso reescrever a História. A activista e deputada do Bloco de Esquerda respondeu afirmativamente e explicou-se. Segundo ela “a História que foi escrita é uma narrativa mitológica que cristalizou uma memória selectiva. Essa narrativa veicula uma versão edulcorada do passado, que conserva os aspectos que considera dignos de glorificação e oculta toda a opressão de que esse passado foi feito”.

Lidas à letra estas afirmações de Beatriz Gomes Dias podem induzir em erro. Afirmar que “a História que foi escrita” é “uma narrativa mitológica” parece um disparate, tal como garantir que essa História “oculta toda a opressão”. Nada disso é verdade, mas eu suponho que Beatriz Gomes Dias não estava a pensar na História que os historiadores escrevem mas sim na que se ensina. E é essa, tal qual aparece nos manuais da disciplina, no ensino secundário, que a deputada quer à viva força mudar.

De que forma? Na sua resposta ao Expresso e numa entrevista posterior ao mesmo jornal a activista deixa várias indicações. Não quer que se glorifiquem os Descobrimentos nem que se apresente a expansão marítima portuguesa “como um acto de globalização e inovação”. Não quer que se coloquem os portugueses como “pioneiros desse processo” sem, em simultâneo, acentuar a sua “necessidade de explorar os territórios (descobertos), saquear as matérias primas e escravizar as pessoas destes territórios”. Quer, também, que se aborde a origem daquilo a que chama “supremacia branca” e a correspondente “inferiorização e desumanização” dos negros, correspondência essa que Beatriz Gomes Dias acha que decorre em linha directa do tráfico transatlântico de escravos e que, não obstante a abolição da escravatura, se terá, em sua opinião, prolongado até ao presente. Quer destruir aquilo a que chama “mitos lusotropicalistas da vocação miscigenadora e do colonialismo suave” — que relaciona de forma muito tendenciosa com o Estado Novo, quando, na verdade, essas ideias e sentimentos são muito anteriores.

Poucos dias depois de Beatriz Gomes Dias se ter pronunciado o também activista Mamadou Ba veio, no mesmo comprimento de onda e de uma forma ainda mais clara, afirmar o seguinte na sua página de facebook:Aos que nos acusam de querer reescrever a história, respondemos que queremos muito mais. Porque, merecemos muito mais, queremos reinventá-la para que todo o mosaico étnico da sociedade portuguesa nela se reflicta bem e com dignidade”.

O objectivo é, pois, assumidamente, reinventar a História. Para pessoas como Beatriz Gomes Dias, Mamadou Ba e muitas outras a História enquanto campo do saber e memória a transmitir é mitologia, e isso, a seus olhos, legitima duas coisas: em primeiro lugar, a rejeição dessa (suposta) mitologia; e, em segundo lugar, a sua substituição por uma outra, mais adaptada aos interesses e preferências dos grupos de pressão de que fazem parte.

Ora, como sabemos a História não é mitologia e o seu ensino não deve ser feito à vontade do freguês. É verdade que esse ensino implica sempre uma selecção — nenhuma história pode contar tudo, muito menos ao nível do ensino secundário. Mas o que importa é que a narrativa seja rigorosa e equilibrada. E aí radica a principal objecção às reivindicações dos activistas porque a narrativa que querem impor não respeita essas duas exigências básicas. Em primeiro lugar porque querem suprimir ou dissolver as dimensões positivas dos Descobrimentos (a façanha, a descoberta, a inovação, a benevolência) para acentuar, em seu lugar, a extorsão, a violência e outros aspectos negativos ou sangrentos da expansão portuguesa; em segundo lugar porque os activistas têm demonstrado, ao longo destes anos de debate público, que não têm o mínimo respeito por factos e números. Usam-nos de forma bombástica, para produzir um efeito político, mas sem qualquer exactidão. Pense-se, por exemplo, na afirmação por eles frequentemente repetida de que Portugal terá transportado quase seis milhões de escravos de África para as Américas. Já mostrei por várias vezes que essa afirmação é falsa pois esses quantitativos correspondem aos números agregados de dois países (Portugal e o Brasil independente), mas é o mesmo que clamar no deserto. Os reivindicantes da nova narrativa histórica continuam a martelar nessa tecla, que sabem ser falsa — se non é vero é ben trovato — e aplaudem quando ela é reproduzida lá fora.

Porquê esta insistência, este apego a um número errado? Porque falar em seis milhões lhes dá jeito já que inflaciona o horror e sugere uma analogia com os seis milhões de judeus mortos no Holocausto, induzindo, por essa via, o mesmo tipo de juízos de valor e de criminalização. O esforço para fazer uma ligação entre ambas as coisas é muito óbvio e julgo que bastará um exemplo para ilustrá-lo. Numa entrevista há pouco mais de um ano Joacine Katar Moreira assumiu, como vários outros activistas têm assumido, o desejo de alterar o ensino da História em Portugal e apontou aspectos concretos do que pretende ver mudado. Disse, nomeadamente, que quer que a palavra escravatura seja escrita em maiúscula: “Por que razão” — perguntou — “continuamos a escrever ‘escravatura’ com ‘e’ minúsculo se aceitamos escrever ‘Holocausto’ com ‘h’ maiúsculo?”.

Poderá parecer a muita gente que pretensões como estas são inócuas e que poderiam facilmente ser atendidas. Todavia, são coisas que contendem com a razoabilidade e falseiam a verdade histórica. Pegue-se, a talhe de foice, nesta tentativa de fazer uma analogia ou equiparação entre a escravatura e o Holocausto. É incontestável que foram ambas situações horrorosas que levaram sofrimento e morte a muitos homens, mulheres e crianças. Mas a analogia detém-se aí. Entre meados do século XV e meados do XIX embarcaram-se, nas costas de África, cerca de 12,5 milhões de pessoas escravizadas e cerca de 15% dessas pessoas morreram na viagem através do Atlântico. Outros 15 a 20% não terão resistido aos primeiros anos nas Américas. Mas, no que se refere ao tráfico transatlântico, e ao contrário do que geralmente se pensa, muitas dessas pessoas morreram por razões que escapavam à vontade e ao controle dos transportadores, e que não tinham que ver directamente com as terríveis condições a bordo, mas, como Joseph Miller mostrou, com doenças contraídas ainda em África. Era frequente que ao cabo de poucos dias de viagem marítima surgissem entre os africanos vários casos do chamado mal de Luanda — isto é, escorbuto — que não poderiam atribuir-se a factos ocorridos a bordo, pois as manifestações clínicas da doença só aparecem após meses de carência de vitamina C. O objectivo do tráfico negreiro era transportar as pessoas através do Atlântico, vivas, se possível, para poderem ser vendidas no ponto de destino. Pelo contrário, o objectivo do Holocausto era, como toda a gente sabe, matar as pessoas. São esses dois horrores, de natureza claramente diferente, que devem ser explicados aos alunos do secundário. A “Solução Final” dos nazis foi um genocídio e um assassinato em massa, um crime perpetrado por gente que montou e utilizou uma estrutura industrial para eliminar pessoas. Misturar o Holocausto com a escravatura, equiparar ambas as coisas através da subtileza de escrever as duas palavras em maiúscula, ou por outro estratagema qualquer, é convocar ardilosamente para a avaliação histórica da escravatura ideias e sentimentos que associamos à matança dos judeus, o que é abusivo e uma distorção da verdade.

São frequentemente distorções destas, coisas que à primeira vista parecem plausíveis ou de pouca importância, mas que dão uma tonalidade falsa ao que aconteceu, que os activistas querem introduzir nos conteúdos da disciplina de História. Ora, o ensino da História não procura dar uma visão militante, nem panfletária, do passado, mas sim um olhar justo e bem informado sobre o que aconteceu e o Governo deve velar para que assim continue a ser, apesar da pressão dos activistas dentro e fora do país. De facto, Beatriz Gomes Dias, Joacine Katar Moreira e Mamadou Ba não estão sozinhos na sua cruzada. Nos dias que correm há um enorme esforço para reinventar a História, para a tornar politicamente correcta ou politicamente “útil” e o mais alarmante é que isso conta com a passividade, o silêncio ou até mesmo com a conivência de muitos historiadores. Não obstante, os nossos governantes têm o dever e a enorme responsabilidade de resistir a este assédio político porque a História que se ensina numa sociedade livre e aberta não é mitologia nem deve servir para fazer lavagens ao cérebro. Os activistas não querem o ensino de História, mas sim uma versão invertida e tenebrosa do que eram os conteúdos da disciplina no Estado Novo. Querem passar o negativo desse filme e o Governo não deve consentir uma coisa dessas.

HISTÓRIA  CULTURA  ENSINO BÁSICO   EDUCAÇÃO   POLITICAMENTE CORRECTO   SOCIEDADE

COMENTÁRIOS

Artur Morais: Muito bem, sr. Marques. É disso mesmo que se trata. História militante. Já a tivemos na Ditadura, não a podemos ter em sentido inverso numa Democracia. Esses que querem uma História à medida são tão ignorantes que nem leram o "Império Colonial Português" do Boxer, grande historiador britânico, obra escrita antes do 25 de Abril, sem tendências nem para um lado nem para o outro. Porque estou a mencionar este livro? Simplesmente, porque já aborda essas questões mais desumanas da época. Acontece que aquilo que de bom ou mau foi feito pelos portugueses, nada mais era do que "fruta da época". Nada que outros não fizessem também, incluindo os nativos das terras descobertas pelos europeus. Então, os "activistas" não descobriram a pólvora, os historiadores já fizeram o seu trabalho ao longo de séculos. Os "activistas" só estão a usar essa pólvora para atingir os objectivos que todos sabemos. Idiotas úteis de extremistas, que só querem prosseguir o caminho da cultura "woke", da putrefacção dos valores tradicionais, etc... não vale a pena repetir aquilo que tem sido amplamente escrito e comentado.            Zacarias Bidon: Descolonização, já! Sem isso nunca mais teremos paz. Diogo Oliveira: Obrigado por mais um excelente artigo. É sempre com enorme interesse que leio os seus artigos. Não desista nunca de afirmar a verdade histórica, e sobre a natureza da história, onde ela quer ser torpedeada.          rebimbo malho: Uma pena a escravatura ter acabado. Caso não tivesse acontecido atava o Mamado mai-la Jaquelina a um arado,  para abrir galeiros e plantar batatas.       José Paulo C Castro > rebimbo malho: Esse comentário é depreciativo para os camponeses...          rebimbo malho > José Paulo C Castro: Também já acabaram os camponeses, nem o PCP fala neles. Agora são empresários agrícolas com direito a subsídio.        Daniel Salgado Santos. Muito bem. Parabéns pelo excelente artigo. Naturalmente que mentes menores, «poluídas», hipócritas e de baixo jaez não serão capazes de compreender as suas palavras, nem compreender a verdade dos factos. São os verdadeiros mentecaptos.... Ui ele há tantos.         Carminda Damiao: Obrigada e parabéns por este excelente artigo.          advoga diabo: Basta analisar a História de Portugal oficial do fascismo para perceber que é sempre a versão de quem a conta. A História é um processo dinâmico pelo que está permanentemente a ser reescrita em função do conhecimento que lhe vai estando subjacente. Outra coisa é querer crucificar hoje aqueles que então agiram à luz de realidades completamente diferentes. Justificar uma coisa com a outra é má fé.              VICTORIA ARRENEGAadvoga diabo: Concordo com o seu comentário. Diferentes ideologias darão origem a diferentes perspectivas. Mas para a História ser credível tem de haver uma série de factos que estão acima de contestação. Depois há lugar para as interpretações. Quando lemos um relato histórico sobre a bomba atómica em Hiroshima feito por um historiador americano e um japonês parece que falam de coisas e locais diferentes. Já agora lembrei-me de um facto da nossa História. Como é que um espanhol conta o que aconteceu em Aljubarrota? Poderá ser interessante. E concordo igualmente consigo quando fala de má fé.           josé maria: João Pedro Marques, de historiador tem muito pouco, mas era capaz de funcionar como branqueador panfletário da parte da História mais escabrosa, que não lhe convém.               Diogo Andrade Ribeiro  > Fernandesjosé maria: Acha que sim? Aproveite para dar uma olhadela ao cv do autor, e já agora consulte as referências que encontram nas suas obras. Sabe que este é o procedimento normal na discussão académica, certo?  Ah, mas claro, já se sabe! A academia encontra-se dominada pela burguesia conservadora, motivada apenas pela protecção dos seus próprios interesses egoístas.     A academia, como se sabe, faz parte do sistema (seja lá o que isso for), sistema esse que é, todos o sabemos, racista e xenófobo (a nova cassete). Ora, isto teria tudo muita graça se não existisse a prova do contrário: o Estado promove activamente a atribuição de qualificações e graus de ensino a indivíduos envolvidos nas franjas mais obscuras e menos sérias das humanidades e das ciências sociais, acolhendo nas universidades certos cursos e atribuindo bolsas e financiamento a projectos com o dinheiro dos contribuintes. Uma boa maneira de identificar esses cursos é a seguinte: quando não estamos perante qualquer tipo de área/actividade cientificamente orientada, é usual (salvo as devidas excepções) empregar a expressão 'estudos'. Daí os 'estudos de género', 'estudos afro-orientais', 'estudos étnico-raciais 'estudos europeus', etc. Repare-se, há pessoas que se licenciam realmente nestas coisas!josé mariaDiogo Andrade Ribeiro Fernandes: Acho que sim, que o colunista devia aprender com Nietzsche em que é consiste o perspectivismo, como elemento filosófico essencial para perceber que não existe uma visão unívoca da História e muito menos daquela que se compraz com objectivos desviantes de mero pendor laudatório. Quanto ao cv do autor, a falácia do apelo à autoridade vale zero. Já conheci eruditos que eram ignorantes e anafalbetos que eram sábios.             Diogo Andrade Ribeiro  > Fernandesjosé maria: Não imagina o quão feliz me faz o seu comentário. QED.            Miguel Sanches: Excelente lição. No se los puede dejar solos...         VICTORIA ARRENEGA: Artigo muito bom. O ensino da História no nosso sistema educativo foi sempre mau. Os alunos nunca foram ensinados e relacionar causas e efeitos. Parece que querem ainda piorar as coisas. E o governo não se interessa porque não quer ter chatices com um parceiro da geringonça. Deixa-os andar que estão entretidos. Nos anos pós 25 de Abril o PCP tentou uma coisa parecida. Quem abrisse um livro de Língua Portuguesa só achava textos de Alves Redol, Soeiro Pereira Gomes, Manuel da Fonseca. escritores belissimos mas carregados de ideologia e simpatia pelo comunismo. Agora o que se pretende é pior.          bento guerra: Essa gentalha não merce uma linha e só é mencionável porque a chamada "imprensa séria" lhe dá guarida. São, em primeiro, ignorantes, depois hipócritas. A História são factos, a serem compreendidos no contexto e no tempo em que ocorreram          Coronavirus corona: Quem não tiver tempo de grandes leituras e estudos e quiser assistir a uma forma sintética de desmistificação do "português mau que explorou o negro", reservem 25 minutos para ver o magnífico vídeo: "o tráfico de escravos e a origem da escravidão no Brasil", do canal do Youtube "Impérios AD" Ensinar a História sem torções ideológicas é ensinar o papel da Igreja Católica na formação do mundo ocidental. Aquilo que hoje denominamos de "mundo ocidental" é obra da Igreja Católica Apostólica e Romana. É obra de Jesus Cristo e dos seus seguidores: é obra de São Paulo e São Pedro, é obra de Santo Agostinho, é obra de São Bento, é obra de São Tomas de Aquino e é obra dos milhares de estudiosos que, no interior dos mosteiros. desenvolveram todas as áreas do saber, moldando a civilização onde a palavra de Cristo chegou. A escola torce isto e pinta uma realidade completamente diferente.       Maria Nunes: JPM, obrigada por mais um excelente artigo.      António de Mendonça: Parabéns, excelente artigo. As escolas têm o dever de ensinar ou instruir  correctamente e não de educar. Educar educam os pais, dentro dos valores de cada família e das suas tradições. Se se pretende "educar" nas escolas, então é lavagem ao cérebro. Toda esta nova vaga de tentativas de actuar sobre os mais novos é um acto ilícito e cheira ao livrinho vermelho do Mao. Politica fora das escolas. Ensinem matemática , história e português como deve ser e já ficamos satisfeitos. 

 

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