Que a jovem premiada pelo seu trabalho
científico sobre o cancro da tiróide – Márcia
Faria, de 28 anos – venha a receber a atenção necessária do
governo português, no sentido de valorização monetária para um percurso
científico em condições. A ela, o contentamento de todos os portugueses, com
toda a certeza.
I- BIOMEDICINA: Jovem cientista portuguesa recebe prémio europeu com
trabalho sobre cancro da tiróide
Márcia Faria tem 28 anos e recebeu o Young
Investigator Award 2021 atribuído pela Sociedade Europeia de
Endocrinologia a 12 jovens cientistas.
PÚBLICO, 15 de
Abril de 2021
FOTO: Há um milhão de pessoas no país com distúrbios
associados a esta glândula essencial para o metabolismo que tem forma de
borboleta e que se encontra na base do pescoço DR
Um estudo que procura encontrar formas
de aumentar a eficácia do tratamento de cancro da tiróide com
metástases valeu a Márcia Faria, investigadora da unidade de biologia molecular do Serviço de
Endocrinologia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, um prémio da
Sociedade Europeia de Endocrinologia. Com 28 anos e ainda a fazer o seu
doutoramento, a cientista portuguesa foi distinguida com o Young Investigator
Award que será entregue em Maio a
12 jovens no início das suas carreiras.
“Este prémio diz respeito a apenas uma parte de um
trabalho de uma linha de investigação que temos desenvolvido no laboratório nos
últimos anos”, começa por explicar Márcia Faria ao PÚBLICO. A linha segue
de perto o cancro da tiróide e esta parte do trabalho é especialmente dedicada
a uma das etapas do tratamento destes carcinomas e
que está associada ao recurso do iodo radioactivo. Começando pelo problema
para depois chegarmos à exploração de soluções, o estudo premiado centra-se na “proporção significativa de doentes com cancro
avançado da tiróide que não responde à terapia com iodo radioactivo” que
normalmente é usada após a cirurgia para tratar as metástases e eliminar as
células remanescentes.
Para
que esta terapia com iodo radioactivo tenha bons resultados, “é preciso que
as células tenham a capacidade de captar o iodo”, uma competência que
depende da presença de uma “porta de
entrada” no local certo. A porta chama-se “importador de sódio e iodo” (uma
proteína que transporta o iodo do exterior para o interior das células e que é
conhecido pela sigla NIS) e o local certo para a encontrar (de forma a
garantir a eficácia da terapia) é na membrana das células. O problema é
que, realça Márcia Faria, “em alguns casos, em
formas mais avançadas dos tumores, as
células podem perder esta capacidade de captação do iodo, seja porque deixam de
expressar o NIS ou porque esta proteína não está a ser expressa no local
certo”. Aí, acrescenta, “as células deixam de
responder à terapia com iodo radioactivo e nessa altura as alternativas
terapêuticas são escassas”.
FOTO: Investigadora Márcia Faria tem 28 anos e trabalha na unidade de biologia
molecular do Serviço de Endocrinologia do Centro Hospitalar Universitário
Lisboa Norte DR
“Neste contexto de tumores refractários que deixam
de ter a capacidade de captar iodo, o que procuramos saber no laboratório é quais são os
mecanismos que regulam a expressão do NIS”, diz a investigadora. Entre os possíveis parceiros que ajudam a criar esta porta de entrada
funcional nas células encontram-se diversas proteínas que condicionam esta
presença no lugar certo, na membrana da célula.
Este
trabalho premiado de Márcia Faria centra-se em apenas um dos muitos alvos
identificados e que estão a ser validados, uma proteína conhecida como “Gy12”. O
estudo confirmou que esta proteína específica
(entre outras) interfere directamente na abundância do NIS na membrana das
células.
As
proteínas que ajudam a abrir portas
“Neste momento, esta proteína foi uma das que já
conseguimos validar, mas obviamente que haverá outras”, confirma a investigadora. A forma encontrada para validar o papel desta proteína
foi através da sua retirada. Através de uma técnica específica, foi induzida uma
redução (de cerca de 30%) dos níveis desta proteína que foi o suficiente para
causar um efeito de diminuição na quantidade do NIS que se encontra
especificamente na membrana da célula.
Este
é um pequeno passo de um trabalho que, segundo Márcia Faria, tem como objectivo encontrar um alvo que possa ser
farmacologicamente controlado para aumentar os níveis de expressão do NIS neste
local da membrana – ou seja, um meio que abra estas portas de entrada do iodo
radioactivo, numa curta janela de tempo
antes da aplicação da terapia, para aumentar a eficácia deste tratamento.
Sobre
possíveis efeitos secundários destas manobras para promover esta proteína a
cientista explica que o NIS existe noutras células do nosso organismo, mas em
níveis muito basais que, à partida, impedem que o iodo radioactivo cause danos
noutros locais fora da tiróide, o alvo desta terapia específica.
Os resultados desta investigação
premiada serão apresentados no Congresso Europeu de Endocrinologia que se
realiza em Maio, durante uma sessão especialmente dedicada aos 12 projectos
distinguidos. O prémio vale mil euros, mas Márcia Faria
sublinha que “o mais importante é o reconhecimento do trabalho”. Um
trabalho que “tem vindo a ser desenvolvido há bastante tempo”, diz a
investigadora, que há seis anos se dedica à área de estudo da tiróide.
Desde
que detectado precocemente (como em todos os tumores), o cancro da tiróide tem
um prognóstico bastante favorável. Nos últimos anos a incidência deste cancro,
que afecta mais mulheres do que homens, tem
vindo a aumentar e actualmente são detectados cerca de 500 novos casos por ano
em Portugal, de acordo com o Registo Oncológico Nacional. Os dados referem
ainda que há um milhão de pessoas no país com distúrbios associados
a esta glândula essencial para o metabolismo que tem forma de
borboleta e que se encontra na base do pescoço.
TÓPICOS
CIÊNCIA BIOMEDICINA CANCRO SAÚDE TIRÓIDE IODO TERAPIA
COMENTÁRIO:
OGB INICIANTE: Parabéns à
Márcia Faria pelo seu trabalho e pela distinção!
II - Cancro da tiróide: uma doença silenciosa
O cancro
da tiróide pode não causar qualquer sintoma de início, mas ao crescer pode
provocar dor ou uma saliência no pescoço. Pode ainda ser causa de alterações na
voz, rouquidão ou engasgamento fácil.
FILIPE SÁ SANTOS
PÚBLICO, 24 de
Setembro de 2020
Nos
últimos anos tem vindo a aumentar o número de casos de cancro da tiróide. Desde 1975, a incidência (aparecimento de novos
casos) deste tipo de cancro em Portugal aumentou 10 vezes: de cerca de 50 casos
por ano para perto de 500, de acordo com o Registo Oncológico Nacional.
Esta é
uma doença muitas vezes silenciosa, pelo que a informação e vigilância são
fundamentais. Hoje, Dia da Sensibilização para o Cancro da Tiróide, importa
alertar para a importância do diagnóstico precoce desta doença e saber
reconhecer os sinais.
A
tiróide é uma glândula com várias funções no nosso organismo: regula o
ritmo cardíaco, a tensão arterial, a temperatura corporal, o peso, o humor. São vários os
problemas que podem afectar o seu bom funcionamento, entre os quais os de
origem cancerígena.
O cancro da tiróide pode não causar
qualquer sintoma de início, mas ao crescer pode provocar dor ou uma saliência
no pescoço. Pode ainda ser causa de alterações na voz, rouquidão ou
engasgamento fácil. A maior parte dos nódulos que podem surgir na tiróide
são benignos, e são cerca de quatro vezes mais frequentes no sexo feminino.
Se notar algum destes sintomas ou sinais deve
consultar o seu médico. Ele deverá fazer todos os anos uma palpação local e do
pescoço, e poderá neste caso requisitar exames como análises de sangue ou
ecografia. Só com a avaliação médica saberemos se os nódulos da tiróide em cada
caso são benignos ou malignos.
O cancro da tiróide tem tratamento. Exige um
diagnóstico precoce e orientação por equipas hospitalares diferenciadas, com
Endocrinologia, Cirurgia Endócrina, Radiologia, Anatomia Patológica, Patologia
Clínica e Medicina Nuclear. O tratamento
consiste, em regra, numa cirurgia para remover a glândula tiróide, que na maior
parte das vezes será curativa sem necessidade de tratamentos adjuvantes. Pode,
contudo, ser necessária uma cirurgia mais extensa para remover também gânglios
do pescoço, ou um tratamento médico com Iodo 131, nos casos em que células
malignas se tenham disseminado para além da tiróide.
Os resultados são, em geral, muito bons. Comparativamente a outros tipos de cancro, o cancro da tiróide tem uma das melhores taxas de
sobrevivência. A taxa de mortalidade é de cerca de 1% aos 25 anos
após diagnóstico. Provavelmente já se questionou: “E depois da cirurgia? Ouvi dizer que vou engordar se retirar a tiróide.”
Depois de uma cirurgia de remoção
completa da glândula tiróide, o doente terá de tomar uma medicação oral (apenas
um comprimido por dia) para o resto da vida. Irá ser vigiado regularmente pelo seu médico
assistente, e as análises de sangue permitirão aferir a dose adequada de
medicação para cada caso, de modo a que não venha a acontecer nenhuma alteração
no peso nem na actividade física ou intelectual.
Não é conhecida a causa da maior parte
dos tumores malignos da tiróide. As pessoas que vivem num raio de 20 quilómetros de
instalações nucleares devem contactar as autoridades de saúde ou de Protecção
Civil da área. E deverão ter consigo uma medicação (iodeto de potássio) que
bloqueia em parte os efeitos da radiação sobre as células da tiróide, para
tomarem na improvável eventualidade de uma fuga nuclear.
O que
todos devemos fazer é cuidar sempre da nossa saúde e da dos nossos familiares,
estar atentos aos sintomas e sinais, e procurar aconselhamento médico.
Mesmo em tempos de pandemia, as outras doenças não esperam. A falta de
avaliação ou de tratamento fará que o cancro nos apareça de forma mais grave ou
mais disseminada mais tarde, com risco de maiores danos para a saúde. Não
adie! Os hospitais são locais seguros, pelo que não deve ter receio de procurar
o seu médico. Olhe-se ao espelho. Palpe o seu pescoço.
Cuide da sua tiróide.
Cirurgião Endócrino do Hospital CUF Porto -
Unidade de Tumores da Tiroide
TÓPICOS
ÍMPAR OPINIÃO MEDICINA CANCRO SAÚDE BEM-ESTAR
Nenhum comentário:
Postar um comentário