Já
foi há dois domingos. De repente, sem avisar, ou eu, pelo menos, não estava na
onda, embora sentada ao seu lado, ouço da nossa amiga, espampanante na
amplitude dos seus gestos e das suas falas:
-A
D. Dolores? Está a começar a carreira agora.
- Hein!?
Mas quem é a D. Dolores? – pergunto, intrigada.
Éramos várias
pessoas à mesa, eu ainda não me sentia integrada nas temáticas da nossa
recreação dominical desse dia, toda no enternecimento da presença da Paula e da
Catarina, chegadas pouco antes, e já sentadas nas respectivas cadeiras
retiradas de outras mesas vazias, nem sei quem levantara a referência, se a
minha irmã, se a Anita, que a essas também nada lhes escapa do que vai no
mundo...
A nossa amiga
continuava, grandiloquente e altissonante, como sempre indiferente às minhas
perguntas de ignorância pura, quando se encontra lançada no seu desenvolto
discurso de um firme saber, não de “experto
peito”, todavia, como o do outro, do Restelo:
- Eu vejo a
D. Dolores, a Dolores está a começar a carreira agora!
Sufoquei:
- Hein? Outra
vez? Mas quem é a Dolores?
E a Catarina, de
acentuar:
- Ela deve
tomar conta das lojas.
Fiquei arrumada.
Já as conversas, pela mesa, andavam noutra onda, desisti de compreender. E a
Paula pedia, entretanto, que eu escrevesse as falas da nossa amiga, forneceu-me
mesmo uma folhinha do seu ínfimo bloco quadriculado, para os números, e nele
tomei nota, com palavras, das falas acima, para contar o caso posteriormente,
como ela entendia que fizesse.
Este domingo,
perguntou-me se fizera o texto sobre o tal tema em torno da D. Dolores, mas
referi que me esquecera de telefonar à nossa amiga para o meu esclarecimento
indispensável à elucidação dos factos. Mas até trouxera o coto do quadriculado,
para acrescentar o que necessário fosse, de maior precisão noticiosa.
Afinal,
tratava-se da mãe de Ronaldo, de quem eu ouvira falar em tempos, mas tudo agora
me esquece, não sei se da idade, não havia vislumbre de nenhuma Dolores nos
meus horizontes espirituais, por mais abrangentes que já tivessem sido. E a
nossa amiga, ao que eu soube ontem, no café onde o Ricardo e o João também
compareceram, vê – ou tinha visto – a D. Dolores na TVI, publicitando. Daí a sua
referência à tal ascensão da sua visibilidade por premonição sua.
Passei, assim, à
Paula, o coto do quadriculado dela, onde guardara os meus dados, no domingo
anterior, a qual nele acrescentou o que segue, reparei que com muitas paragens
e interrupções, pois simultaneamente dava o seu parecer, nas conversas connosco
– mais com elas e eles, aliás, da nossa mesa, pois eu sou mais de ouvir e
calar:
«Geria a
fortuna do filho.»
«Criou os
netos e agora, que tem tempo livre, faz publicidade na TVI.»
Foi, repito, o
que acrescentou a Paula, sobre a D. Dolores no folheto que lhe passei, dado por
ela, no domingo anterior, para transcrever as falas da nossa amiga
sobre a D. Dolores em ascensão.
Tenho de
perguntar à nossa amiga a que horas é o anúncio da D. Dolores na TVI, para lhe
seguir a carreira publicitária.
Com júbilo. Pois
inveja não é coisa que me corroa o espírito. Nem o fígado, apesar de alguma
pedra na vesícula, que já me aconselharam a extrair. Mas acho que temos que ser
antes uns para os outros, como disse o Herman, cuja doutrina devemos seguir.
Eu, é mais bolos
- como também ele, em tempo, disse à Helena Isabel que era com ele, lembro-me
bem, e, aliás, vem no Youtube, - a justificar-nos o peso. E a pedra da vesícula.
Mas também a generosidade do pensamento, afinal, resultante da democracia que tanto
nos eleva a mente.
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