domingo, 13 de junho de 2021

O coração tem razões


Que a razão desconhece, disse-o Pascal, e essa máxima nos define, que nos regemos muito pela sensibilidade. Neste caso, por quem obtém para nós a possibilidade de uma sobrevivência de esmola sem tréguas, distribuída esta também sob o mesmo preceito pascaliano. Assim temos vivido, com as razões assentes não no cérebro, mas no órgão registo da nossa tendência para a lamúria e a alegria do nosso estar no mundo. Alberto Gonçalves cita dados suficientes para a rejeição de quem assim nos faz viver na abjecção, mas seguramente que não consegue desviar-nos desses caminhos da nossa penúria.

Em tempo de democracia, não se limpa o cérebro, o tal centro da razão - pelo menos nos seres dela dotados. Nós, alapámos, comodamente, no bem-estar de empréstimo e de desvergonha.

É disto que o meu povo gosta /premium

O mofo regressou, em versão maçónica, brejeira e analfabeta. A falta de oposição não explica tudo. Um estudo sugere que dois terços dos portugueses não desgostam de ditaduras. Parece-me optimista.

ALBERTO GONÇALVES

OBSERVADOR,12 jun 2021

Os incêndios de 2017. Os roubos e as aparições de Tancos. As golas contra o fumo que sufocavam os utilizadores. O fulgurante e pornográfico nepotismo nos cargos de decisão. O candidato a primeiro-ministro que esteve a centímetros de esmurrar um velho. O ucraniano torturado até à morte por funcionários públicos. A subvenção e a tomada dos “media”. O “sorteio” e os palpites do juiz Ivo Rosa. O currículo falsificado do procurador europeu. O “investimento” na TAP. Os “investimentos” na banca. As dívidas públicas e privadas que não são para pagar mas para gerir. O estado policial a pretexto da Covid. As falências. Os mortos por incúria do melhor SNS do mundo. A invasão armada do Zmar e a brutal detenção de imigrantes. O retorno da censura oficial. O ministro que tenta intimidar um empresário estrangeiro por questionar as escolhas desse exacto ministro. O riso permanente do dr. Costa, que nenhuma máscara esconde.

Em que nação tais peripécias, uma amostra mínima de cinco anos e meio de regabofe, não fariam cair o governo? Em muitos, do Burkina Faso à Nicarágua. No Ocidente, que ainda nos acolhe por lapso e imposição geográfica, a exigência costuma ser um bocadinho maior. Para felicidade do PS, por cá a exigência é nula. Talvez pelo contrário: por cá exige-se que o poder seja corrupto, prepotente e incapaz. Quanto pior, melhor para o PS, que sobe nas sondagens à medida que o país desce em todos os critérios económicos, sociais e, desconfio, psiquiátricos. Há dias, o PS roçava os 40% nas sondagens. De propósito, deixei de fora do rol de desgraças acima a semana vigente, que estabeleceu novos recordes nas modalidades do descaramento, despotismo e desnorte. A esta hora, é plausível que o PS tenha alcançado a maioria absoluta.

A semana começou com um programa da RTP destinado a louvar a referida lei da censura. Uma apresentadora de variedades garantiu aos – escassos – espectadores que a lei é fantástica porque permite punir e evitar a “desinformação”. Se a lei fosse levada à letra, os senhores que nos pastoreiam não voltavam a abrir a boca. Por azar, o objectivo é o oposto: condicionar opiniões divergentes da propaganda oficial, da qual o programa em questão é excelente exemplo. Para tirar dúvidas, a apresentadora de variedades perguntou ao criador da lei, o simpático leninista José Magalhães, se se pode falar em censura. Não se pode, esclareceu sem contraditório o deputado, que satisfez a apresentadora de variedades a ponto de ela se deitar no seu colinho. Poucos minutos decorridos, a senhora, que pelos vistos tem um padrão, já pousava a cabeça no colinho do prof. Marcelo, após breve entrevista em que ambos aplaudiram o combate às “fake news”. A piada estava feita. Já espreitei pedaços das televisões venezuelanas e norte-coreanas: essencialmente, não se distinguem disto.

A semana prosseguiu com a revelação, no Porto Canal, das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril. Ao que consta, são necessários três anos de preparativos e dois e meio para lavar a louça e aspirar o chão. A liderar a vital empreitada, arranjou-se o dr. Adão e Silva (é apenas um sujeito), vulto com carreira no comentário dependente de ordens superiores. Se a ideia era enxovalhar o golpe de Estado, missão cumprida. Por falar em missão, haverá uma “estrutura” adequada à dita, com resmas de assessores e motorista. Graças ao seu desprendido entusiasmo por “Abril”, o comissário Adão aceitou a encomenda a troco de simbólicos 300 mil euros. Perante os resmungos de alguns fascistas, que pagam a folia mediante impostos, democratas sortidos indignaram-se com razão. Naturalmente, o prof. Marcelo aprova.

A semana acabou com o “caso” Medina, ou a entrega, pela câmara lisboeta, dos nomes e moradas de críticos de Putin à embaixada russa. Alguns dos denunciados, cujas vidas entraram em saldo, têm nacionalidade portuguesa. Uma, em Janeiro, contou o crime a “jornalistas”, que o ocultaram com zelo. Até que enfim a capital é mencionada no estrangeiro sem ser pelos “rankings” fajutos dos destinos turísticos. O indescritível sr. Medina, e os indescritíveis defensores do sr. Medina, que evidentemente incluem o prof. Marcelo, torcem-se em justificações: o procedimento é normal; tratou-se de um erro lamentável; não há problema nenhum; os russos juraram ter apagado os e-mails; a embaixada da Rússia não representa Moscovo; não se pode fazer “aproveitamento político”; etc. Dizem uns que não há memória disto acontecer em lugares civilizados, mas é porque sofrem de amnésia: o envio de informação confidencial ao KGB já fora inaugurado pelo PCP com os arquivos da PIDE. E considerarmo-nos um lugar civilizado é manifesto exagero.

Já não temos o que quer que achávamos que tínhamos. Sem surpresas nem sobressaltos, voltámos às “Conversas em Família”, a um presidente decorativo, às celebrações masturbatórias de quem manda, ao culto das denúncias, à proliferação de prostitutos e prostitutas, à radical impunidade de uns poucos à custa dos restantes. Ao sufoco sem alívio. O mofo regressou, em versão maçónica, brejeira e analfabeta. A falta de oposição, factual, não explica tudo. Um estudo fresquinho sugere que dois terços dos portugueses não desgostam de ditaduras. Parece-me um dado optimista. Fora uns excêntricos e umas excitações provisórias, o português médio prefere rédea curta e cabeça baixa a alternativas “modernas” e “libertinas”. O salazarismo durou 48 anos. A democracia, pobrezinha, não chegou a tanto. Houvesse aqui vestígios de dignidade e o PS, mais respectivas metástases, não estaria no poder. Boa parte estaria na cadeia. Em vez disso, essa sinistra gente vai organizar em 2024 a festa deles, e o velório do que havia em redor. Os meus pêsames.

POLÍTICA  PS  LIBERDADES  SOCIEDADE  MORTE

COMENTÁRIOS:

Pedro Pereira: Subscrevo, mas não gosto. Abraço           A Mas: Crónica magistral, como sempre.       Luís Marques: Triste Portugal!           Anibal Augusto Milhais: Mais um pratinho de comidinha retrasada, que a "Dreta Fassista" tanto gosta de lambusar.              Elvis Wayne: Olá a todos, gostava muito que alguém por favor, me explicasse de que modo é que se pode colocar fotos no perfil. Obrigado.          Maria Augusta > Elvis Wayne: As melhores pessoas para responderem são os avençados xuxarecos. Têm vasta experiência nessa matéria.         António Sennfelt: Um texto de antologia a rivalizar com as "Farpas" do Eça e do Ramalho e em que, a coberto da ironia e do sarcasmo, se dizem verdades tão certeiras como punhos!   Carminda Damiao. Óptimo artigo. Parabéns.           Ariete naUniãoEuropeia: Fabianitos, para confirmarem que o mofo nunca desapareceu deste outrora país soberano, nem precisam de ciências inexactas e repletas de charlatões com licenciaturas nulas e que são pagos para proferirem palavras "mágicas" que visam a persuadir e ocupar o imaginário dos mais crédulos... Segundo as últimas presidenciais, 40% dos portugueses, isto é, 40% do eleitorado, são de facto uns idiotas úteis, são os tais "analfabetos" mencionados pelo Alberto, esses 40% votam sempre na padronizada partidocracia pró-europeísta, subsídio-dependente e aniquiladora da cultura e da população portuguesa. Esses 40% que o Alberto considerou (e bem) analfabetos políticos, concederam nos últimos 47 anos, ininterruptamente, poder a um número reduzido praticantes de crimes, que, para além da prática e da exibição ao crime como se de um desporto e vaidade se tratasse, apenas cumprem directivas e tratados de Bruxelas. Praticantes de crimes, porém, auto-intitulam-se políticos, parlamentares e governantes, nada mais falso, na realidade, não passam de candidatos a funcionários da UE, corruptos e corrompidos pelo vil metal, e nutridos pelos analfabetos políticos do Alberto.           Nuno Santos: Estou totalmente de acordo. Helder Machado: Ao longo do tempo há quem perca a consciência de existir. As causas são muitas e longínquas. A farsa vai escondendo a realidade. Alberto convida a abrir os olhos, o melhor ainda está para vir. Hipátia Alexandrina: Um artigo esplêndido, uma denúncia certeira, um catálogo implacável das razões - das muitas razões - porque deveríamos ter vergonha. Desde que o sr. Costa, no Outono de 2015, inaugurou o PREC.2, um PREC cada vez com menos filtro e já sem nenhuma decência, o estado das coisas é este; e não digo estado de sítio porque é mais um estado de caverna de Ali Babá revista e aumentada. Em 1898 Zola publicou J'Accuse em L'Aurore, hoje AG publica este magnífico artigo no Observador. Il accuse, J'acuse, nous accusons. Quem se abstiver, ou não tem coluna ou é cúmplice.            Gastão Cunha Ferreira: Não me dou bem com ditaduras mas comparando a que cá estava antes sempre era menos nepotista e corrupta, e não se esperava que o Presidente da República tivesse opinião.          Alberico Lopes. É sempre com grande prazer que leio os artigos do Alberto! Obrigado! Diz em poucas palavras o que tantos - a maioria, com certeza - pensa mas cala! Quanto ao indiano e ao das selfies, melhor nem dizer mais nada!           Mario Almeida: Os portugueses não desgostam de governos autoritários e ele aí está. A máfia corrupta que nos governa já não precisa de maiorias absolutas. Bastam os votos da corte e da criadagem. António Costa conseguiu a rir o que Sócrates tentou fazer aos gritos. O Circo de Feras deu lugar aos palhaços ... a bem do bem estar animal. Aquela ideia de 1986 de que Portugal livre do fascismo e com o comunismo atirado para o caixote do lixo da história Iria ser um país europeu, livre e desenvolvido foi claramente sobrevalorizada.          Carlos Monteiro: As trapalhadas são tantas e tão frequentes, que as novas, vão fazendo esquecer as anteriores. AG  vai lembrando e mostrando, que grande parte dos portugueses gosta disso. Sendo assim, as últimas: Nomeação dum grupo grande para comemorar uma data, mais o caso da Câmara de Lisboa vão contribuir para que as próximas sondagens dê a maioria absoluta.ao PS. Dario Ferreira: Os portugueses tanto gostam de ditaduras, que já se encontram a estagiar para uma e segundo mostram as sondagens não estão nada descontententes.           Manuel Cesar: Muito assertivo, atendendo à situação complacente de um povo subserviente. Parabéns, sr. Alberto Gonçalves.          Luís Martins: É, voltámos às "Conversas em Família", o PR é decorativo, a censura actualizou-se às novas tecnologias, a imprensa está domada e é a lavandaria do peiésse, e até o mofo voltou. Estamos perto do maior dia do ano, e da noite mais curta, mas isso perdeu qualquer significado; por cá a noite é sempre longa. Infelizmente só não regressou o crescimento económico ímpar entre os países ocidentais.         Luis Eduardo Jardim: Tal e qual.          joaquim silva: Acorda Portugal           Carlos Castro: Alberto Gonçalves ainda tem muita sorte, escreve muito bem e o que lhe apetece. Eu como treinador de bancada vejo por muito menos o “algoritmo observador” enviar o meu pensamento e as minhas opiniões para moderação. Já sabemos que o nosso presidente foi escolhido pelo nosso povo por ser um tipo que gosta de selfies e de larachas. É um popularucho (poderia dizer-se populista) é muito bem visto no exterior abaixo da linha do equador onde se situam os mais desgraçados dos palops (desgraça de acrónimo e desgraçados de palops cuja desgraça resulta da desgraça do 25A) onde costuma ser recebido em êxtase. Não espanta por isso que aprove as romarias ao 25A (ele é geneticamente católico, mesmo sendo divorciado e vivendo em união de facto exibir catolicismo ainda rende votos) e será um dos romeiros mais felizes. Não só porque falará para as rádios e TVs como fará o exorcismo das suas origens salazar-marcelistas. Caro Alberto Gonçalves, o salazar-marcelismo (o fascismo do PS para a esquerda) não acabou no 25A. O salazar-marcelismo continua por outros meios. Um desses meios chama-se MRS é adorado pelo seu povo como foi adorado o Marcelo que terá sido seu padrinho de baptismo católico e como foram adoradas quase todas as figuras mais ou menos podres desses tempos excepto por um grupo de perigosos (perigosos sim) comunistas. Costa é um político se sucesso porque segue a máxima de Salazar. Os portugueses gostam que se lhes minta desde qua a mentira agrade. Por aqui se vê que o salazar-marcelismo irá cumprir 100 anos e o mais se verá. A sociedade que resultou do 25ª é a mistura de dois grupos antagónicos. O grupo que ocupava o poder sem legitimidade que se juntaram no PSD e CDS e o grupo dos que se legitimam na ilegitimidade dos primeiros. Dessa amálgama há-de sair um dia no futuro, eventualmente, um país decente. Antes disso é necessário que os portuguese se tornem num povo decente. O primeiro sinal de decência seria acabar com festejos de assassinatos, seja de uma família real, seja de todos os assassinatos, guerras, desgraças, ultrajes, a que fora condenados vários povos em consequência do 25 A e de que parece proibido falar. Já agora espero que uma geração decente mude a bandeira para o azul do céu e o branco da pureza, bandeira de todos os tempos desde a primeira alvorada.            Maria Nunes: Muito bem AG. É a deprimente realidade do nosso país. Carlos Sousa: Um estudo sugere que dois terços dos portugueses não desgostam de ditaduras. Gostaria de ver a exacta pergunta que foi feita nesse estudo. O que os 2/3 dos inquiridos disseram, é que o país precisa de alguém com pulso e força, para : - Acabar (ou diminuir) a Corrupção. - Colocar a Justiça a funcionar e deixar-se de figuras tristes como a que fez Ivo Rosas, e não permitir que os maiores criminosos de colarinho branco andem à solta. - Libertar a Comunicação Social do controlo governamental. - Fazer com que as Entidades Reguladoras não dependam do Estado. - Responsabilizar politicamente os ministros (com as respectivas exonerações) quando cometem actos graves que afectam profundamente os cidadãos e o nome do país.... isto só para falar de uns poucos aspectos. Para fazer isto, é preciso alguém com poder, com força, sem tibiezas. Se é isto, então também estou nos 2/3. Foi você que votou neste governo ?!           Censurado Censurado > Carlos Sousa: Foi só substituir o forte por autoritário na pergunta “Ter um líder forte que não precisa de se preocupar com o Parlamento e eleições”. Que até dava para voltar para uma Ditadura sem Parlamento ou eleições. Não fosse alguém ainda interpretar que no limite o que os inquiridos expressaram foi a vontade de ter um governo de maioria absoluta no Parlamento. Como aliás já expressaram outras vezes. Concorde-se ou não com essa vontade como é o meu caso. Já que 9 em cada 10 inquiridos consideram positivo ter um sistema político democrático. Que ainda é o mais importante e afasta por completo o cenário de qualquer Ditadura sem Parlamento ou eleições a que o colunista alude.        Carlos Monteiro > Carlos Sousa: O grave é que enquanto a constituição ao determinar um PR eleito por sufrágio universal, foi para permitir que a governação fosse controlada. Nunca pensaram certamente, que poderia haver um PR tão colaborante. Eu votei. …………..Maria Augusta > Censurado Censurado: Eu imagino que para um radical da extrema-esquerda populista, um texto desta natureza incomode bastante. Explica-se deste modo o chorrilho de ataques ao autor.    Manuel Magalhães: AG sempre bem, pobre país!!!              Francisco Tavares de Almeida: Excelente resenha e futuro nenhum que não seja trágico.            Fernando PitéElvis Wayne: Se o País há vinte anos não progride, isto pode significar que não havendo mais rendimentos a redistribuir, a malta mais nova tende a procurar no estrangeiro as oportunidades que não encontra por cá, desde que tenha habilitações que sejam aceites lá fora, e com o fim da Covid as possibillidades de emigrar para nacionais e estrangeiros tendem a aumentar…          Maria Alva: Implacável. AG a voltar ao seu melhor após terminar a sua campanha pessoal anti-confinamento algo ortodoxa.

Henrique Costa: Ovação de pé          lulu lemon: magistral!         Elvis OnFire: Na introdução falta honrosa menção ao acto democrático do querido líder censurar um programa do "6a às 9" ir para o ar mesmo antes de um acto eleitoral e uma deputada ter falsificado documentos para proveito próprio de recebimento indevido de verbas no Valor de dezenas ou centenas de milhares de euros e a consequência de ter sido apanhada multada em.. mil euros. Passa tudo.         Maria Pedro: Está coberto de razão. Vejamos: em agosto sobem as pensões, em outubro há eleições, os pensionistas vendem-se por uma esmola. Dia das eleições 50% abstêm-se. Isto não muda, e é com isto que o ps conta para continuar a desgovernar Portugal.           Maria Melo: Tudo verdade, lamentavelmente! E a solução é…?.................

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