Ou exibicionismo. Ou vontade de emergir
da nossa pequenez, mostrando as coisas que sabemos, que podem atrair bênçãos
sobre nós, de reconhecimento alheio. Uma forma de valorização, talvez por falta
da outra, a do estudo e leitura, que contribuiriam para outro tipo de
crescimento interior. Não mereceu muitos comentários - talvez pelo monótono da
repetição incomodativa, este texto de AB...
OPINIÃO
Dois casos longe demais
Vigiar as “narrativas” e as
comunicações dos cidadãos é tão vil e tão despótico quanto entregar dados
pessoais às polícias e às embaixadas. Mesmo políticos que parecem cultivar o
valor das liberdades, dos direitos e das garantias dos cidadãos, mesmo eles
submetem tais valores à sua duração e ao seu interesse.
PÚBLICO, 19 de
Junho de 2021
Foram
entregues dados pessoais de manifestantes a várias
dezenas de embaixadas, de esquerda e de direita, umas de países
amigos, outras de países assim-assim. Esta variedade é suficiente para dizer
que o Governo e a Câmara de Lisboa não tiveram um comportamento sectário. Mas
também para revelar um condenável grau de subserviência perante os Estados
estrangeiros, o que quer dizer que os direitos dos cidadãos são secundários.
Depois
de um longo silêncio por parte do Governo e de um crispado nervosismo do
presidente da Câmara de Lisboa, houve finalmente explicações. A extensa e notarial explicação de Fernando Medina não
é convincente. Defende a
irresponsabilidade. Apoia-se numa auditoria feita pela própria câmara, não por
entidade externa. E remete as responsabilidades para os serviços
administrativos. É verdade que, em vez da tradicional negação, ele
escolheu a via da condenação dos factos (“procedimento
inadequado”).
Considerou que a câmara fez mal. Mas a afirmação repetida da sua inocência
não é convincente. Ora, a sua responsabilidade é indiscutível: ou por
acção deliberada e conhecimento; ou por desconhecimento e indiferença.
Sabemos
agora que, nos últimos anos, as embaixadas estrangeiras em Lisboa foram
informadas da ocorrência de mais de 150 manifestações de carácter político, das
quais 52 desde 2018. Essas
manifestações dirigiram-se às embaixadas, ou
tiveram lugar noutros sítios, mas tinham países ou governos estrangeiros como
alvo. Além destas, realizaram-se mais umas centenas ou milhares de
manifestações que motivaram comunicações semelhantes, mas não a embaixadas.
Segundo
o presidente da Câmara de Lisboa,
que mudou de atitude relativamente a estes factos, os dados
pessoais eram transmitidos às embaixadas, tal como ao Ministério da Administração
Interna, à polícia, a instituições e empresas. Estes procedimentos foram
habituais, durante perto de 20 anos. Segundo o presidente da câmara, os responsáveis
políticos não sabiam o que se passava e o ex-presidente António Costa terá
mesmo assinado um despacho alterando as regras. Durante dez a 20 anos, os responsáveis políticos não
se interessaram pelo assunto, nem pela lista de destinatários. Nem sequer pelo
cumprimento das instruções.
Segundo
o presidente da câmara, estes procedimentos foram inadequados e devem ser
imediatamente corrigidos. Para já,
o responsável pela protecção de dados foi exonerado. E o Gabinete de Apoio ao
Presidente foi transformado em Direcção de Serviços de Expediente. Assim é que culpa os funcionários, por desatenção e
inconsciência, e isenta os políticos de responsabilidades.
As
declarações do presidente da Câmara de Lisboa constituem facto notável e
inédito na história política portuguesa. Têm excepcional valor, pois confirmam a delação e
a denúncia. Além de
desculpas, que já tinha pedido, o político reconheceu a ilegalidade e
condenou os comportamentos. Em vez de negar, como outros fazem,
reconheceu o carácter inadequado, para utilizar a sua expressão preferida.
Menos notável e muito menos inédito é o facto de ter culpado os subordinados,
que castigou. Não muito original é também o facto de se ter ilibado de qualquer
responsabilidade política.
Há
duas hipóteses a considerar. Primeira: o presidente da câmara e os vereadores não sabiam o
que se passava, pela simples razão que algumas questões de direitos dos
cidadãos lhes eram indiferentes. Não
sabiam, nunca souberam, não são culpados de delação deliberada, de traição ou
negligência. Mas são culpados de indiferença perante os direitos dos
cidadãos seus compatriotas.
Segunda hipótese, bem mais
grave: o presidente da câmara e os vereadores sabiam o que se passava,
estavam informados das rotinas e consideravam normal que assim se
procedesse, pela simples razão de que alguns direitos dos cidadãos lhes são
indiferentes. As
declarações do presidente da câmara sobre estes factos não são esclarecedoras.
A ausência do Governo deste processo é notável. Para o primeiro-ministro, o assunto é meramente administrativo e camarário. Ele e os seus ministros da Justiça, da
Administração Interna e dos Negócios Estrangeiros, nada têm a ver com isto.
Não têm responsabilidades, nem competências. Nada foi esclarecido. Nem se sabe
quantas câmaras em Portugal fazem o mesmo.
Mas há outro problema, o da entrega de dados às polícias. Mesmo às polícias portuguesas, tal gesto é condenável.
Trata-se de cidadãos que se querem exprimir ou manifestar. Não se trata de
criminosos, foragidos, terroristas ou procurados pelas polícias. A presença
numa manifestação não é assunto de polícia. A
entrega desses dados às polícias é tão condenável quanto a entrega às
embaixadas. Pela mesma razão: os nomes são entregues a essas entidades para que
estas controlem, vigiem e exerçam poder sobre cidadãos.
O mais confrangedor, quase
arrepiante, é a reacção do Governo e do autarca perante as críticas e as
objecções. Ficaram crispados e ofendidos. Mostraram-se despóticos e nem sempre
verdadeiros. Acusaram os seus críticos de fazer política… de mentir… de
oportunismo, epítetos que lhes servem a si próprios. Ridicularizaram os
críticos e os que fizeram perguntas. Na verdade, reagiram com o nervosismo dos
mentirosos e dos apanhados em flagrante.
Mas
há também o caso dos “direitos na era digital” e das tentativas
de monitorização das ideias, do pensamento e da opinião. A coincidência temporal dos dois acontecimentos, a
delação e o
controlo da expressão, é curiosa e irónica. Não há, evidentemente, uma relação factual e
causal entre os assuntos. Mas há uma cultura comum. A do controlo da
informação. A do controlo da expressão. A ideia de que se pode e deve invadir
as áreas privadas ou pessoais dos cidadãos em defesa do Estado. E dos próprios
cidadãos, segundo alguns mais atrevidos.
Seja
como rotina administrativa, seja como decisão política, é claro que a
transacção de dados traduz uma ideia e uma cultura para as quais a privacidade,
o recato e a confidência têm pouco valor e significado. Vigiar as “narrativas” e as
comunicações dos cidadãos é tão vil e tão despótico quanto entregar dados
pessoais às polícias e às embaixadas. Mesmo políticos que parecem cultivar o
valor das liberdades, dos direitos e das garantias dos cidadãos, mesmo eles
submetem tais valores à sua duração e ao seu interesse.
Sociólogo
TÓPICOS: CÂMARA
DE LISBOA FERNANDO
MEDINA ANTÓNIO
COSTA PRIVACIDADE CENSURA RÚSSIA GOVERNO
COMENTÁRIOS:
pintosa:
EXPERIENTE: Há
dois grãos de poeira que persistem nos olhos: 1 - Os emails que eram enviados
às embaixadas, iam para muitos destinatários. Ao longo de 52 remessas de dados
pessoais (alegadamente) durante vários anos, em que todos os OUTROS
destinatários puderam ver que as embaixadas também estavam entre os
destinatários, nunca ninguém notou, nem estranhou, essa inclusão das embaixadas
no grupo de destinatários? Medina explicou que os 52 casos foram seleccionados
por terem pelo menos o nome dos promotores das manifestações. Porém, para
efeitos de facilitar a vigilância dos manifestantes pelos serviços secretos
estrangeiros, é diferente enviar o nome às Embaixadas, ou enviar nome, morada e
contactos (telemóvel e endereço de e-mail)! Para que embaixadas foram enviados
estes dados todos? Eng.
Jorge Simões INFLUENTE: Esta situação foi mais que indigna, foi criminosa. Mas
o povo que não se revolta contra o artigo 6o. da nova lei da "pouca
vergonha" que volta a criar a censura, aceita e engole. O sistema político
da 3a. República está de facto agonizante. joaquim.trindade0503.1025117
INICIANTE: O
que se passou é indigno. Mas o Dr. António Barreto que já foi Ministro, não de
boa memória, tem o poder, digo poder, da sua opinião chegar facilmente a
milhares de pessoas e nunca cuidou de saber o que se passava sobre esta
questão? Isto também é indigno Dr António Barreto. Magritte
EXPERIENTE: É a
primeira vez que concordo com Barreto: tem toda a razão quando diz que os
políticos/órgãos públicos estão-se a marimbar para direitos fundamentais dos
cidadãos, quando diz que os procedimentos revelavam a subserviência do nosso
país, quando condena que os dados sejam sequer enviados à polícia e quando
critica Medina e o PS, principalmente o governo, por fazerem uma triste figura.
É nesta altura que uma direita forte e democrática na oposição dava jeito. Mas
em vez disso temos o Rio seco, o Chicão desaparecido e o louco. Jose
MODERADOR: Propaganda
viciada e requentada.
nunos
EXPERIENTE: Um
exemplo paradigmático da miserável hipocrisia do Ocidente, sempre a encher a
boca com direitos humanos e protecção de dados e a contradizer-se a cada
esquina. Mário
Guimarães EXPERIENTE: Medina é indigno do cargo que ocupa. Cada atitude que
toma só o desmascara mais. Uma personalidade negligente, maldoso (culpa os
inferiores) sem noção da gravidade e respeito pelos cidadãos. A conferência é
um chorrilho de frases confusas, sem ideias, sem clareza que se exigia.
Vergonhoso num partido de Mário Soares, Manuel Alegre, Jorge Sampaio que devem
estar a vomitar, coitados. É vermelhos de vergonha. Decoro não há.
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