Um movimento revolucionário decisivo, em
tempo de crise, que poria fim à Primeira República, de uma Pátria em desordem.
Sem flores na botoeira. Texto do Facebook de LUÍS SOARES OLIVEIRA.
LUÍS SOARES OLIVEIRA:
O HOMEM CONDENADO A CHEFIAR O GOVERNO
Obra
na forja XII OBRA DE SOLDADOS
Como
ficou expresso no Episódio anterior, para Mendes Cabeçadas, articulador do levantamento militar "28 de Maio",
a adesão da forças aquarteladas em Estremoz e Évora era de importância
capital. Para tanto, enviou vários intermediários que DO se recusou a receber,
até que o capitão Jaime Baptista, adepto de Cabeçadas, se lembrou de confiar a missão ao capitão Abel
Moutinho que era amigo do meu tio Augusto, filho
mais velho de DO.
Quem
conta a história é Moutinho .
"No
dia 26 de Maio, pela
tardinha, apareceu-me em casa, na Rua Viriato, em Lisboa, o capitão
Jaime Baptista que dias
antes se havia evadido da Torre de São Julião e, desde então, vivia escondido
no palacete do sr. Paiva e Pona, na Praia das Maçãs. Vinha pedir-me pousada
e ajuda para fazer chegar ás mãos do Coronel Domingos de Oliveira, em Estremoz, importantíssimos documentos
do Comandante Cabeçadas com instruções para cooperar com as forças do seu
comando no movimento militar a eclodir naquele dia.
Eu
disse-lhe:
-
Pousada têm, mas peço-lhe para não contar comigo para essa missão.
Respondeu-me:
- Porque negas missão tão honrosa e urgente?
Acrescentei:
-
Com toda essa mistela de conspiradores, é de prever que, após o triunfo, vão-se
comer como ratos, visto não existir um grupo numeroso de homens às direitas que
possa vir a governar o país, dando-lhe rápido e acelerado progresso material
indiscutível, a par dos actos morais.
Baptista acusou-me de cobardia e eu
acabei por aceitar a incumbência e pus-me em contacto com o coronel Raul
Esteves que me garantiu que Passos
e Sousa, em Elvas, e Domingos d' Oliveira, em Estremoz, já estavam em ligação com o movimento.
Mais
sossegado, fui pedir a um amigo o seu automóvel «Buick» para a minha rápida deslocação a Estremoz,
pedindo-lhe que o armasse em táxi e me cedesse o motorista ao seu serviço.
Embarquei no vapor da Parceria deveriam ser umas 4 da tarde. Com as estradas de
terra batida em mísero estado e apesar de não ter parado em Vendas Novas - para
não levantar suspeitas - acabei por chegar Estremoz às 0 horas. Procurei em primeiro lugar o capitão Caeiro
Carrasco. Encontrava-se de cama com uma terrível
gripe, cheio de febre. Levantou-se imediatamente e pôs-me em contacto com
tenente Bivar de Brito, ajudante do Comandante da Brigada (DO). Recolhi a um
Hotel e pelas 9 horas do dia seguinte, B de Brito veio anunciar-me que o
Comandante da Brigada me receberia às 12,00, no Quartel-General. Este
acolheu-me e disse : «depois de tantos mensageiros que me recusei a receber,
recebo-o a si porque sei pelo meu filho, de quem é amigo, das suas qualidades
morais e patrióticas»."
Entreguei-lhe todo a documentação que levava que ele leu atentamente e
disse-me:
- «Eu não tomei qualquer compromisso com o comandante Cabeçadas quando, a
seu pedido, me encontrei com ele em Lisboa».
Informei-o
então da minha conversa com o Coronel Raúl Esteves e ele disse-me que
poderia regressar ao Hotel que me mandaria recado pelo ajudante. No dia
seguinte, 27, chamado de novo ao Quartel-General, fui ali informado que oficiais
da guarnição de Évora tinham tentado sublevar a praça, sem êxito, e se haviam
refugiado em Estremoz. Domingos d'Oliveira aconselhou-me a regressar
imediatamente a Lisboa e disse-me «pode informar o comandante Cabeçadas que
estou em ligação com o general Carmona e com o coronel Passos e Sousa. Se o
Governo me mandar seguir com a brigada para Lisboa para reprimir o movimento,
ao chegarmos ao Barreiro, nos revoltaremos».
Com esta visita Cabeçadas conseguiu evitar o pior, ou seja, a contra
revolução com base no Alentejo. Já antes, Gomes
da Costa tinha
mandado o seu adjunto a Horácio Ferreira, comandante do Grupo de Metralhadoras Pesadas, com um
papel escrito à mão com a pergunta «Com que é que posso contar»? O
coronel respondeu também por escrito «É só dizer dia e hora, senhor General».
«««»»»
O hábito que adquiri no serviço diplomático de ler o que consta dos
comunicados e - sobretudo - o que lá não consta (área do desacordo persistente)
levou-me a reparar que nas instruções de Cabeçadas - escritas ou ditadas, mas assinadas pelo próprio - abaixo reproduzidas, há uma omissão de grande
significado. Nenhuma referência ao general Carmona que era então o chefe
militar revolucionário de maior prestígio. Cabeçadas atribui ostensivamente o
comando a DO, «ou outro oficial mais graduado ou antigo»". Quer dizer,
Carmona tinha o seu lugar reservado, mas Cabeçadas estava ciente que Carmona
tinha ideias diferentes das
suas e aspirações conflituantes com as suas. O comandante considerava pois o
general mais perigoso dentro do esquema do que fora do mesmo.
Como
resultado, a situação em Évora estava algo confusa. O governo
de António Maria Pereira tinha
retirado o comando da Região Militar a Carmona punição por este, como promotor
publico, ter elogiado - em vez de acusado - os revolucionários da revolta do
ano anterior (Abril de 1925). Foi aí que Carmona pronunciou
o seu famoso «A Pátria está doente» enunciado que inspirou a mobilização para o
28 de Maio. A punição de Carmona não recebeu,
claro, agrément militar. Entretanto, o coronel Pires Viegas assumiu o comando interino da Região Militar e
mostrava-se pouco decidido a envolver-se em polémicas. Perante isto, DO
enviou o seu ajudante de campo, tenente (e futuro genro) Carlos Chaby a Évora
para recomendar a Carmona que se deslocasse subrepticiamente para Montemor-o-Novo.
A Cavalaria faria o resto. DO confiava na prontidão dos seus homens porque lhes
impunha constantes exercícios.
A
28, ao final do dia, DO deu ordens para se abrirem os paióis de armamento e
distribuir armas e munições à tropa. Em 29, ao romper do dia, formou-se uma
coluna que, sob comando de DO, marchou até Évora. Ao recolher, o comando da
Região tentou dispersar a força militar por vários quartéis mas foi-lhe
prontamente respondido que "a coluna bivaca mas não dispersa". (DO não esquecera como Wellington
venceu Massena ).
E
assim foi. No dia seguinte, a coluna coesa retomou a marcha para
Montemor-o-Novo - onde Carmona
assumiu nominalmente o comando - e daí para Vendas Novas. O comandante em Vendas Novas - Escola Prática de
Artilharia - era o coronel Bilstein de Meneses, homem culto, (ao tempo, proprietário da quinta e da casa
senhorial em Cascais, onde hoje está instalada a Biblioteca Municipal).
Carmona apresentou-se-lhe e declarou:
-
"Sou um revoltado. O senhor Comandante tem duas alternativas: ou me prende
ou me obedece."
Bilstein respondeu:
-
«Revoltado, não…revoltoso, meu General». A semântica
para ele era mais importante do que a disciplina militar.
Entretanto
juntou-se ao grupo o coronel Pires Viegas, o tal comandante interino da Região Militar.
Reuniu os oficiais e fez a seguinte declaração que nos chegou graças ao relato
de major Mário Pessoa:
_
«Toda a gente me dizia «Se o exército
quisesse!!!»...E parece que
o Exército quis." Depois, virando-se para Carmona,
acrescentou:
- Tome V. Exª, meu general, o
comando da Divisão e seja o que Deus quiser» .
Escreve
Mário Pessoa: «Só então soubemos que uma coluna da Marinha
tinha sido enviada para interromper a marcha da nossa. Vinha de comboio pelo
que lhe cortámos a via férrea em Bombel e ali montámos a emboscada. Ao darem
conta do sucedido, os marinheiros decidiram que o Alentejo não era o seu mar e
regressaram ao Arsenal de Marinha".
DO
não precisou marchar até ao Barreiro. Carmona foi chamado a
Lisboa e logo integrado no directório revolucionário. Eram dois - Gomes
da Costa e Cabeçadas - passaram a ser três. Cabeçadas lera correctamente a mensagem da Cavalaria
sob comando de Domingos d'Oliveira.
Está na natureza das cousas, que os três iriam ficar reduzidos a um, mas,
agora, Carmona era uma das hipóteses. (continua)
COMENTÁRIOS.
Isabel
Themudo Gallego. Que
interessante! Começou a acção e traz com ela uma frase de enorme actualidade:
“A Pátria está doente” Gosto Francisco G. de Amorim. Muito, muito boom, como sempre. Obrigado. Um abraço – Gosto
Fernando Figueiredo: É necessário
conhecer o passado para compreender o presente e preparar o futuro.
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