Pela extraordinária análise (em youtube) da canção “Construção” de Chico Buarque, que me deixou
siderada, pela fluidez do seu verbo - de Clara - desconstruindo
progressivamente o extraordinário texto da Canção, como se a exposição de “Clara mostra língua” fosse também uma canção de uma riqueza
analítica progressiva, começando na análise fonética, com o significado das
proparoxítonas da rima, e seguindo pela especulação semântica, em conjunção com a gramatical, finalizando na
literária – com a divisão em actos da “peça” narrativa de Chico Buarque, para
extrapolar seguidamente sobre as intenções políticas e sociais do autor da
canção. E tudo numa fluidez discursiva admirável.
Deus te pague, Ricardo, que me enviaste tal peça de arte
genial, que me proporcionou este tempo de recreação repetida e a repetir,
juntamente com a canção de Chico Buarque, que conhecia distraidamente, embalada no monocórdico da entoação.
Youtube:
«Construção»
Canção de Chico Buarque
Amou daquela
vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a
construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra
descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no
céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego
como se fosse
o último
(Beijou sua mulher) como se fosse a única
(E cada filho seu) como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a
construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra
descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no
ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público
Amou daquela
vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no
ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contramão atrapalhando o sábado
Por esse pão
pra comer, por esse chão pra dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir
Deus lhe pague
Pela cachaça
de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça, desgraça que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair
Deus lhe pague
Pela mulher
carpinteira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir
Deus lhe pague
Fonte: Musixmatch
Compositores: Buarque Chico
Wikipédia
Construção é um
disco do cantor e compositor
brasileiro Chico Buarque, lançado em 1971 e
composto em períodos entre o exílio de Chico na Itália e sua volta ao Brasil. Liricamente,
o álbum é carregado de críticas ao regime
militar vigente, principalmente no que concerne à censura imposta
pelo governo ("Cordão") e pelo estado indigno no qual as condições
individuais se encontravam no país ("Construção"), além de
algumas canções mais clássicas e pessoais ("Valsinha" e "Minha História").
O disco marca o aguçamento da
vertente crítica da poética do autor. Se antes ele harmonizava Bossa Nova com
composições veladamente críticas à ditadura brasileira, em "Construção" o
cantor mostrou-se mais ousado - como indicam os versos iniciais de "Deus
lhe Pague", faixa que abre o LP ("Por esse pão pra comer, por esse
chão pra dormir"). Em "Samba de Orly", parceria com Toquinho
e Vinicius de Moraes, Chico canta abertamente sobre
o exílio - o que fez com que a canção fosse parcialmente censurada. A faixa-título é uma crítica
sobre um homem que trabalhou arduamente até sua morte. Não faltaram também o
lirismo característico do artista, como demostrado em "Olha Maria" e "Valsinha". O álbum conta com arranjos de Magro, então integrante do grupo MPB-4,
e do maestro Rogério Duprat.
Construção
teve grande sucesso comercial. Nas
primeiras semanas após seu lançamento, o LP chegou a ter uma demanda de 10.000
discos por dia, o que levou a Philips a contratar duas gravadoras concorrentes para
prensá-los, além de obrigar o trabalho em turnos de 24 horas por dia durante
quase dois meses. Até então, a gravadora nunca havia vendido tantos discos em
tão pouco tempo - 140 mil cópias nas primeiras quatro semanas.
Construção
foi considerado um marco na música brasileira e na carreira do cantor. Em 1972, uma reportagem da revista Realidade elogiava o álbum, considerado
"o melhor disco feito nos
últimos vinte anos no Brasil", que "devolvia a Chico o sucesso
de 'A Banda'" e o colocava como "nosso
artista mais importante, na luta que se travava contra o 'som importado'".
Na década de
2000, o LP foi eleito em uma lista
da versão brasileira
da revista Rolling Stone como o terceiro melhor disco brasileiro de todos
os tempos. O álbum também se encontra no livro "1001
Discos Para Ouvir Antes de Morrer", feito por jornalistas e críticos de
música internacionalmente reconhecidos. Em setembro de 2012, foi eleito pelo
público da Rádio Eldorado FM, do portal Estadao.com e do
Caderno C2+Música (estes dois últimos pertencentes ao jornal O Estado de S. Paulo) como o sexto melhor disco brasileiro da história.
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