Do Dr. Salles, no seu tema matinal sobre a corrupção, como
característica das sociedades mais fechadas, de que é exemplo a da ditadura que
precedeu a democracia, entre nós… Como vivemos em democracia aberta, a corrupção devia ser
menor, ou mesmo nula, o que, pelos vistos, não é verdade, segundo demonstração
rebuscada, que define matematicamente o infinito da ganância, justificativa daquela, como coisa
incomensurável, mesmo hoje, na dita democracia. Assim, o infinito, sendo
desmedido, segue-se que a corrupção também o será, tal como a ganância de que depende.
Postos entre duas premissas – a da corrupção e a da democracia – conclui o Dr.
Salles maliciosamente sobre a inexistência de ambas, embora em alternativa. Mas,
revelando-se a democracia tantas vezes pura balela mascarada, opto pela
inexistência de corrupção, embora também não passe de um desejo utópico, em
qualquer regime que seja, pois que depende de formação moral e mental. O que também
é tantas vezes utopia.
HENRIQUE SALLES DA
FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 30.04.22
A propósito da luta de Zelenski contra a
corrupção na Ucrânia, acordei
hoje a tentar modelar matematicamente os efeitos da dita prática sobre a
evolução do PIB do país. Daquele ou de qualquer outro... Mas ao chegar ao
terreiro da parada para assistir ao toque da alvorada, já tinha concluído sobre
a inutilidade de um tal esforço. Porquê? Porque um dos factores
determinantes da corrupção – seja ela activa ou passiva – é a ganância cuja expressão
matemática é o infinito e este não é modelável. Vai daí, pensei que a
corrupção acontece sobretudo em sociedades pouco transparentes, modeladas por
secretismos, sem pluripartidarismo, sem liberdade de imprensa, em suma, não democráticas.
Daqui concluo que em Portugal ou não há corrupção ou não há
democracia. A menos que o meu raciocínio esteja
errado e seja mesmo conveniente encontrar o modelo matemático que defina a
corrupção.
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avulso
COMENTÁRIOS:
Rui Bravo Martins
01.05.2022 11:05: Caro Dr
Henrique Salles Fonseca. Muitos Sinceros Parabéns.
Um dos seus mais brilhantes e incisivos textos. Completamente de acordo com a
sua conclusão e considerações relativos ao nosso actual momento que vivemos em
Portugal. Sobre a Ucrânia não sei como deve ser resolvida a situação a que
"todos estamos sujeitos", a vários níveis.
Cumprimentos Rui Bravo Martins
Anónimo 01.05.2022 11:57: Aprendi
em Mafra, a levantar-me, a arranjar-me, a tomar o pequeno- almoço, a correr
para a parada com o corpo meio a dormir e o cérebro todo a dormir, mas pelos
vistos tu chegas à parada com raciocínio elaborado. Temos tido a sorte, pelo
menos desde a Revolução do 28 de maio de 1926, com uma eventual excepção, de
esse fenómeno da corrupção não ter atingido as figuras gradas do Estado –
Presidente da República e 1º Ministro (ou Presidente do Conselho).
É óbvio que ela será tanto menor quanto mais democrático e transparente for
o regime, quanto melhor e mais eficaz for o Estado de Direito, quanto
mais independente e escrutinador for o 4º Poder – jornalismo e meios de
comunicação. De acordo contigo, Henrique. Mas
também quanto mais a censura social se manifestar contra o fenómeno, isto é,
quanto menor for a tolerância da sociedade à corrupção. Sobre este aspecto tenho bem presente o que
os Paulistanos diziam, no século passado, do seu Prefeito e Governador do
Estado Paulo Maluf: “Rouba, mas faz”, e não creio que esse sentimento se
confine apenas ao Brasil, no século XX, não, ele é ainda capaz de estar
presente no século XXI e igualmente em outras latitudes e longitudes. A
corrupção é também menos susceptível de ocorrer quanto menor for o “quinhão” do
Estado na Economia. Tens aqui a lista de algumas variáveis para o teu
modelo matemático. Todavia, tem em conta que poderás encontrar
contraexemplos que dificultarão a elaboração desse modelo. Pensa só o que
tem acontecido no País vizinho, em regime democrático. Poderás dizer que
ainda não é uma Democracia suficientemente madura. Mas então olha para outras
democracias mais maduras, como a italiana, que viu o seu Primeiro-Ministro
Bettino Craxi a fugir da Operação “Mãos Limpas” para a Tunísia (onde
morreu) para não ser preso, ou o que está a ocorrer com o ex-Presidente
francês Nicolas Sarkozy. Abraço. Carlos Traguelho
Adriano Miranda Lima 02.05.2022 20:16: Dr. Salles, o problema é que se o toque da alvorada nos
acorda para o dia, umas quinze horas depois chega o toque do recolher sem que
as meninges tenham conseguido elaborar o pretendido modelo matemático para
definir a corrupção. E tudo fica ainda mais complicado quando, conforme
reconhece, a ganância é que está na origem da corrupção e ela tende para o
infinito. E, assim sendo, logo se poderá concluir que o problema da corrupção
pouco ou nada tem a ver com a democracia e o escrutínio dos actos públicos e privados
que ela proporciona em grau variável com a natureza e a intensidade dos seus
propósitos. A democracia pode ser a fórmula para a prevenir, combater e punir,
mas não para a desencorajar. Pode refrear ou desencorajar os comportamentos
escrutináveis, mas não transforma a natureza humana, que é onde reside a
ganância. Por isso, as ilusões já se lhe tinham esfumado quando chegou ao
terreiro da parada e já convencido da inutilidade do esforço.
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