De Raquel Abecasiz. Sobre uma síndrome
antiga, cá na “Casa Portuguesa de
cheirinho a alecrim”. Oxalá inspirasse outros jovens como ela. No sentido
do trabalho e da responsabilização.
A síndrome de Peter Pan
Nos últimos anos, linchámos um
Primeiro-ministro por ter tentado fazer a tempo uma reforma que agora chega
tarde. Passos Coelho sabia em 2015 que se não fizesse nada o dia de hoje havia
de chegar.
RAQUEL ABECASIZ
OBSERVADOR, 27 set
2022, 00:175
Em
matéria de Segurança Social e pensões, a nossa classe política vive em
permanente negação. Na verdade, da esquerda à direita, ouvimos os
discursos, as proclamações e lemos os cartazes e chegamos à conclusão de que os
nossos eleitos, todos eles, têm um comportamento infantil e irresponsável. São
como crianças a quem se diz que pôr os dedos na torradeira queima, mas que só
entendem no dia em que fazem a experiência e acabam com os dedos queimados.
Estamos
a chegar ao fim da farsa. Mais uma crise económica em cima de outras tantas que
tivemos nas últimas décadas e sem horizonte de futuro que se perceba, os dedos
estão mesmo a encostar na resistência da torradeira. A inflação acelerou um
processo que já se sabia inevitável e os cofres da Segurança Social estão a
esgotar-se a uma velocidade alucinante.
Perante isto, o PS, que vive dos votos
dos pensionistas, encontra-se num dilema: ou faz de conta que não se passa nada
e continua a aplicar a fórmula de cálculo das pensões, levando o sistema à
falência em muito pouco tempo, ou altera as regras e garante que durante alguns
anos o sistema pode ainda resistir.
Num
momento de rara lucidez, António
Costa tomou a decisão certa. É
verdade que usou um truque para aligeirar o impacto da notícia e, quem sabe,
manter a ilusão por mais alguns meses a alguns pensionistas. Mas, apesar de
tudo, foi responsável e fez o possível para garantir pensões durante mais
alguns anos a mais alguns futuros pensionistas, hoje pagadores de pensões. Fez
a sua obrigação, procurando causar o menor dano possível aos pensionistas de
hoje que não têm alternativa para encontrar recursos suplementares. Mas, por
uma vez, pensou no futuro de um país com cada vez mais velhos e cada vez menos
jovens. Não poderá ser acusado neste caso de ter privilegiado a navegação à
vista, deixando a fatura para os que vierem a seguir.
Andamos
há muitos anos a brincar com o fogo, como se isso não tivesse consequências. E,
nos últimos anos, muito por responsabilidade do Primeiro-ministro que agora
mostrou ser responsável, linchámos um antigo Primeiro-ministro por ter tentado
fazer a tempo uma reforma que agora chega tarde. Passos Coelho sabia em 2015 que se não fizesse nada o
dia de hoje havia de chegar. É certo que não tinha a habilidade política do actual
chefe do governo, mas tinha a frontalidade de não esconder os problemas aos
portugueses. Essa
fragilidade valeu-lhe a estocada final de António Costa, mas agora o país já
percebe quem dizia verdade na altura. A
história irá dizer que Passos Coelho estava certo em 2015 e António Costa
aprofundou o buraco das nossas futuras pensões entre 2015 e 2022.
Por
tudo isto, não se entende o mais recente cartaz que o PSD colocou nas ruas,
anunciando que, em nome da justiça social, o PSD defende nenhum corte nas
pensões actuais. Luís Montenegro, que até não se tem estreado mal como
líder da oposição, tem de evitar ultrapassar António Costa na
irresponsabilidade de um discurso político mentiroso e ilusório. Montenegro foi
líder parlamentar de Passos Coelho e, bem, não se envergonha do seu passado. Os
nossos pensionistas já passaram a fase Peter Pan e todos os que descontamos
para a Segurança Social também. Todos sabemos que o sistema precisa de levar
uma grande volta antes que acabe em falência. Mais vale explicar aos
pensionistas de hoje que, se não aceitarem mudanças, são os seus filhos que vão
sofrer no futuro. Mentir descarada e irresponsavelmente só serve para fazer o
barco afundar.
Assim
como se entenderam para pensar no aeroporto, Costa e Montenegro bem podiam
deixar-se de infantilidades e entenderem-se também em matéria de pensões. Se
não o fizerem de uma forma séria e adulta, o novo aeroporto só vai servir para
trazer turistas para passarem aqui alguns dias e levar portugueses que vão
embora para nunca mais voltar.
COMENTÁRIOS:
bento guerra: Morte
lenta ,de profundis Paulo Cardoso: Clarinho como a água. Muito bem. Pedro Sabido: São artigos destes que não fazem sentido. Ou
seja, os Portugueses passam a vida a criticar medidas em cima do joelho e tapa
buracos, e este artigo vem precisamente legitimar uma solução tapa buraco. Pois
bem, perante isto apenas dizer "its will get worse before it gets
better" Luis
Oliveira: A cronista que me desculpe, mas será que a Raquel ainda
não percebeu que o PSD aprendeu com o encantador de cobras e com passos coelho,
que se o psd quiser ser de novo, governo, terá que mentir aos portugueses e ser
muito demagogo? Acha mesmo que Montenegro, ou outro eventual líder, será
eleito se falar sempre a verdade? Nunca! Os portugueses foram infantilizados
pelos políticos e é isso que os eleitores esperam deles: promessas de mel e
leite, amanhãs que cantam, milagres dos pães, vacas que voam. É isso que os
portugueses querem ouvir: facilidades, subsídios, férias, pouca
responsabilidade. O português é o inverso do suíço; ontem houve um
referendo onde os helvéticos quiseram que se aumentasse a idade da reforma e
que se aumentasse o iva. Mostra bem os antípodas onde estão os dois povos. Fernando CE: Muito
bem. Certeira análise.
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