quinta-feira, 29 de setembro de 2022

Pena

 

Que não tenha sido convidado para Ministro da Agricultura. Ou pelo menos para conselheiro do ministro. E dos mais ministros da Economia. Uma panorâmica económica que afasta encómios, é claro. Mas não afasta espantos, apesar dos muitos avisos. E assim vamos resvalando no desfiladeiro, onde jazerão estilhaçados os herdeiros malogrados das Tágides secas de agora.

«...E VÓS, TÁGIDES MINHAS...» - 5

 HENRIQUE SALLES DA FONSECA

A BEM DA NAÇÃO,  29.09.22

O MUNDO VISTO A PARTIR DE LISBOA

 Hoje, começo com um axioma: «O dinheiro só foge de onde se sente em perigo».

Digo, perigo de falta de liberdade ou de nacionalização por confisco ou por carga fiscal excessiva. Limitações à livre circulação dos capitais, situações de instabilidade política ou custos de contexto asfixiantes são motivos para a drenagem financeira com destino a paragens consideradas mais benignas.

Em Portugal, já passámos por todos estes cenários em singelo e conjugados. Actualmente, bem gostaríamos de ver uma descida significativa na carga fiscal. Aliás, esta redução pode mesmo constituir um bom instrumento de combate à economia paralela (v. «QUANDO IRÁ O FISCO AO LUPANAR?»  https://abemdanacao.blogs.sapo.pt/128218.html ).

«Paraísos fiscais» aparte e partindo do pressuposto de que o Plano Oficial de Contas Europeu já é uma realidade consolidada, interessa considerar a concorrência fiscal dentro da União Europeia onde já só parece faltar a harmonização dos métodos de cálculo das matérias tributáveis para que - então e só então - as taxas sejam o grande parâmetro da tão desejada competitividade fiscal. (Usar a disparidade dos métodos de cálculo das matérias tributáveis como parte integrante da concorrência fiscal, pode ser politicamente muito interessante, mas à U, E. não caberá o epíteto «União»).

O tratamento discriminatório dado pela negativa ao investimento nacional relativamente ao estrangeiro fez com que a política de internacionalização da nossa economia se traduzisse na venda de empresas portuguesas a investidores estrangeiros. Uma vez na posse dessas empresas, os novos proprietários fechavam-nas e passavam a abastecer o nosso mercado a partir das respectivas sedes localizadas «lá fora». Também os processos de reprivatização de empresas pareceu hostil aos capitais nacionais optando pelas alienações em grandes blocos a interessados estrangeiros. Como se em Portugal não houvesse Bolsa(s) de Valores. Tudo, num processo que, afinal, teve como consequência o desbragamento da nossa economia e a destruição de importantes unidades fabris. Se a isto somarmos o encerramento de empresas para «partir os dentes aos Sindicatos» … dá para imaginar o caminho que nos resta percorrer para voltarmos a ser uma economia competitiva na produção de bens transacionáveis.

E hoje não refiro a questão da clarificação do método de formação dos preços agrícolas pois isso quase pareceria um Programa de Governo e eu não sou candidato a Ministro da Agricultura. Nem sequer fui convidado.

Lisboa, 29 de Setembro de 2022

Henrique Salles da Fonseca

Tags:: "economia portuguesa

·        COMENTÁRIO:

 Adriano Miranda Lima  01.10.2022  00:07:  O Dr. Salles da Fonseca deixa-nos aqui uma reflexão sobre uma matéria de magna importância e de gritante actualidade. Não é assunto da minha especialidade e por isso sinto-me grato pelo carácter didáctico da sua abordagem. Parece ficar evidente que a uniformização completa das políticas fiscais dentro da UE não será meta alcançável num horizonte temporal mais próxima dadas as disparidades entre as economias. E será alguma vez possível? Depois, fica claro que o problema que coloca relativamente à discriminação entre os investimentos nacionais e estrangeiros deixa as economias mais frágeis ainda mais vulneráveis, donde se conclui que uma internacionalização geradora de equilíbrio e justiça é uma miragem. Quanto aos paraísos fiscais, que ninguém parece interessado em extinguir, não serão eles o paradigma do que há para corrigir no sistema global?

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