Com a precisão adequada:
Significado de Cinismo: O que é Cinismo:
«Cinismo,
palavra com origem no termo grego kynismós, é um sistema e doutrina
filosófica dos cínicos. Em sentido figurado o cinismo tem uma
conotação pejorativa, sendo que designa um homem agudo e mordaz que
não respeita os sentimentos e valores estabelecidos nem as convenções sociais. Alguém
considerado cínico também pode ser alguém que é desavergonhado, descarado, imprudente, impassível ou obsceno.
O cinismo foi
uma escola filosófica grega, fundada por Antístenes, discípulo de Sócrates. O seu nome deriva, segundo vários testemunhos, do facto
de alguns membros da escola se reunirem no Cinosargo, ginásio situado perto de
Atenas. Segundo outros, a sua origem vem da palavra grega kýon (que
significa "cão"), pelo facto de Diógenes de Sinope dormir no local que era usado frequentemente como abrigo para
cães, para assim demonstrar o seu desacordo com o modo de viver dos homens.
A
maior virtude para eles era a autarcia, o que se basta a si mesmo, e renunciar os bens e
prazeres terrenos até conseguir uma total independência das necessidades vitais
e sociais. O autodomínio permitia alcançar a felicidade, entendida
como o não ser afectado pelas coisas más da vida, pelas leis e
convencionalismos, que eram valorizados de acordo com o seu grau de
conformidade com a razão.
O ideal do sábio
era a indiferença perante o mundo. As origens da
escola, que remontam aos séculos III e II A.C., com um ressurgimento posterior,
nos séculos I e II d.C., foram objeto de discussão. Alguns
filósofos a classificam como escola socrática, na linha de
Sócrates-Antístenes-Diógenes. Outros negam a relação Antístenes-Diógenes, não a
consideram uma escola socrática e vêem em Diógenes o seu fundador e inspirador.»
No breve texto da Internet encontramos, pois, a justificação de muitas
das tais atitudes das gentes, de que trata PAULO
TUNHAS, que pairam no alto de uma pretensa competência, porque de conceito
contrário ao da norma, mesmo esse tal de Diógenes, que andava de candeia em
pleno dia à procura do “Homem”. Provavelmente esses que apoiam Putin são os da
singularidade, da convicção do seu pairar superior, indiferentes, pois, aos
caminhos das dores e das normas cordatas, achando em Putin o homem Diógenes,
embora possuindo – esses - outros méritos vivenciais - naturalmente repudiando a
pipa onde aquele repousava, preferencialmente adoptada pelos sem-abrigo de hoje,
indiferentes, estes, é certo, à candeia, e até servidos pelos generosos
distribuidores do seu alimento da mândria diária. As conversas são como as
cerejas. Acabam todas no caroço cuspido.
Os tais admiradores de Diógenes, que se julgam imaculados, outrora fixavam-se
no Marx. Ou no Mao. Hoje é no Putin. Uma forma de se distinguirem. Com ou sem
candeia. E sem sequer viverem em pipa.
O sofrimento e a mentira
O que me surpreendeu foi a reacção de alguma gente no Ocidente e
particularmente em Portugal. O sofrimento da população ucraniana é como se não
existisse, como se fosse fruto da acção dos seus líderes.
PAULO TUNHAS
OBSERVADOR, 29
set 2022, 00:1918
Há
um certo número de condições necessárias para que um juízo político tenha lugar
e, se essas condições não são satisfeitas, o juízo político não passa de uma
fantasmagoria. Não
pretendo aqui fazer a lista de tais condições, apenas
notar duas que me
parecem particularmente salientes: o sentimento de compaixão para com o
sofrimento alheio e a sensibilidade bastante para distinguir a verdade da
mentira.
São
apenas duas das condições do juízo político, como acabei de dizer, mas são
condições fundamentais. A insensibilidade ao sofrimento alheio e a
incapacidade de distinguir a verdade da mentira designam uma patologia do
comportamento político. Quem é incapaz de proceder a esse duplo reconhecimento
sofre indiscutivelmente de um problema de cognição política.
Estas
condições são, num certo sentido, pré-políticas. Referem-se a um
fundo humano que precede o juízo político propriamente dito. A indiferença para
com o sofrimento alheio e a incapacidade de distinguir o verdadeiro e o falso
verificam-se na vida comum de múltiplas maneiras. Mas,
quando transportadas para a vida política, ganham obviamente uma dimensão nova. Quanto mais não seja, porque o sofrimento passa a
encontrar-se exposto aos olhos de todos e a mentira salta aos olhos com uma
evidência irrecusável.
Isto
que acabo de dizer vale para a vida política em geral. Mas vale certamente com
mais força para os casos de agressão em grande escala, sobre os quais dispomos de abundante e constante
informação. Vale nomeadamente para a invasão russa da Ucrânia e para
tudo o que se lhe seguiu.
Houve
certamente muitas coisas que me surpreenderam desde o início da invasão. A maneira
como ela escapava a hábitos que dávamos por adquiridos. A brutalidade russa. A
tentativa de destruição sistemática de um país a mando de Putin. A
extraordinária tenacidade dos ucranianos em defenderem a sua pátria e o exemplo
de coragem e perseverança em que Zelensky, desde o primeiro momento, se tornou.
O sucesso na resistência ao invasor. E por aí adiante.
Mas,
confesso, o que, num certo sentido, mais me surpreendeu, foi a reacção de
vária gente a tudo isso. Não a reacção, sublinho, de muitos russos. Que
seria de esperar de uma grossa fatia de um povo que não conheceu, ao longo da
sua existência, nenhuma contribuição para a história da liberdade que é
constitutiva do chamado Ocidente? E que não conheceu nunca, permito-me
acrescentar, qualquer tradição filosófica digna desse nome, que, desde os
Gregos, foi constitutiva da experiência ocidental da liberdade? A indiferença para com o sofrimento alheio e a
incapacidade de distinguir a verdade da falsidade encontram-se inscritas nesse
modo multisecular de ser, no conjunto das significações imaginárias sociais,
como diria um filósofo, que fazem parte daquela sociedade.
O que me surpreendeu realmente foi a
reacção de alguma gente no Ocidente e particularmente em Portugal. O sofrimento
da população ucraniana é como se não existisse ou como se fosse o fruto da
acção dos seus líderes, ou do Ocidente através deles, sendo a invasão russa a
consequência estrita dessa mesma acção. Não ver o sofrimento que toda a gente
vê, não ver as suas causas, que estão dispostas ao olhar de todos, releva de
uma patologia moral magnificada em patologia política.
O mesmo se dirá da incapacidade em
reconhecer a colossal e sistemática mentira que salta aos olhos em tudo o que
vem da Rússia de Putin, desde o argumentário para a invasão e do nome –
“operação militar especial” – escolhido para a designar até aos recentes
referendos nas zonas ocupadas pelos russos, passando por tudo o que ocorreu
entre uma coisa e outra. Não se medita suficientemente sobre a corrupção do
espírito que preside a essa cegueira face à mentira. Volto ao que disse atrás:
há uma patologia moral que se desdobra numa patologia política.
Estamos
muito longe do conflito de argumentos que é constitutivo da vida ética e
política. Só na aparência se pode julgar que o que temos face a nós prolonga
tal conflito. Na verdade, trata-se da negação do fundo racional comum, por mais
aproximativo que seja, que subjaz a esse conflito. O poder de não ver – a alucinação negativa que nos
impede de ver o copo que está, ao olhar de todos, pousado sobre a mesa – releva
de uma patologia singular para a qual não parece haver cura possível.
A
incapacidade de distinguir a verdade da falsidade, no caso em que a distinção
não oferece o mínimo vestígio de dúvida, é talvez o exemplo por excelência de
uma má-fé que tomou conta do ser na sua integralidade. Face a um
tal grau de má-fé, confinando com a loucura, toda a conversa se torna
impossível. Resta a repugnância que se sente por quem se coloca decididamente
fora do patamar da decência humana.
GUERRA NA UCRÂNIA UCRÂNIA
EUROPA MUNDO
COMENTÁRIOS:
Teresa Figueiredo: Excelente e sucinta abordagem desta sociedade em que vivemos. Felizmente há
ainda alguns lúcidos por cá. A indiferença
de certa gente neste Portugal face ao conflito na Ucrânia é talvez um dos
sentimentos que mais me aflige. Vivemos num confortável alheamento para com os
que morrem, sofrem nesta guerra injusta, mas também para os que mentem
compulsivamente. Invade-me a tristeza de pouco poder fazer.
Jorge Carvalho: Excelente
artigo. Obrigado Carlos Quartel: As nossas sociedades foram
resvalando para um egoísmo endémico, para a construção de universos minúsculos,
onde a escolha da marca das sapatilhas merece muito mais atenção do que a
tragédia ucraniana, a fome na Etiópia ou as inundações no Paquistão. Algo
falhou e o resultado está à vista, comodistas, cobardes, mendigos, sempre
com receio de que algo ou alguém perturbe o seu pequeno mundo. S Belo: Muito bem! Paulo Tunhas
focou um bom tema para bem necessária reflexão. Cisca Impllit: Porque vale a assinatura no
Observador. Entre uma coisa e outra, Paulo Tunhas nos convoca o
pensamento e a atenção! E de forma simples, própria de quem sabe.
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