sexta-feira, 30 de setembro de 2022

A Internet explica


Com a precisão adequada:

Significado de Cinismo: O que é Cinismo:

«Cinismo, palavra com origem no termo grego kynismós, é um sistema e doutrina filosófica dos cínicos. Em sentido figurado o cinismo tem uma conotação pejorativa, sendo que designa um homem agudo e mordaz que não respeita os sentimentos e valores estabelecidos nem as convenções sociais. Alguém considerado cínico também pode ser alguém que é desavergonhado, descarado, imprudente, impassível ou obsceno.

O cinismo foi uma escola filosófica grega, fundada por Antístenes, discípulo de Sócrates. O seu nome deriva, segundo vários testemunhos, do facto de alguns membros da escola se reunirem no Cinosargo, ginásio situado perto de Atenas. Segundo outros, a sua origem vem da palavra grega kýon (que significa "cão"), pelo facto de Diógenes de Sinope dormir no local que era usado frequentemente como abrigo para cães, para assim demonstrar o seu desacordo com o modo de viver dos homens.

A maior virtude para eles era a autarcia, o que se basta a si mesmo, e renunciar os bens e prazeres terrenos até conseguir uma total independência das necessidades vitais e sociais. O autodomínio permitia alcançar a felicidade, entendida como o não ser afectado pelas coisas más da vida, pelas leis e convencionalismos, que eram valorizados de acordo com o seu grau de conformidade com a razão.

O ideal do sábio era a indiferença perante o mundo. As origens da escola, que remontam aos séculos III e II A.C., com um ressurgimento posterior, nos séculos I e II d.C., foram objeto de discussão. Alguns filósofos a classificam como escola socrática, na linha de Sócrates-Antístenes-Diógenes. Outros negam a relação Antístenes-Diógenes, não a consideram uma escola socrática e vêem em Diógenes o seu fundador e inspirador

 

No breve texto da Internet encontramos, pois, a justificação de muitas das tais atitudes das gentes, de que trata PAULO TUNHAS, que pairam no alto de uma pretensa competência, porque de conceito contrário ao da norma, mesmo esse tal de Diógenes, que andava de candeia em pleno dia à procura do “Homem”. Provavelmente esses que apoiam Putin são os da singularidade, da convicção do seu pairar superior, indiferentes, pois, aos caminhos das dores e das normas cordatas, achando em Putin o homem Diógenes, embora possuindo – esses - outros méritos vivenciais - naturalmente repudiando a pipa onde aquele repousava, preferencialmente adoptada pelos sem-abrigo de hoje, indiferentes, estes, é certo, à candeia, e até servidos pelos generosos distribuidores do seu alimento da mândria diária. As conversas são como as cerejas. Acabam todas no caroço cuspido.

Os tais admiradores de Diógenes, que se julgam imaculados, outrora fixavam-se no Marx. Ou no Mao. Hoje é no Putin. Uma forma de se distinguirem. Com ou sem candeia. E sem sequer viverem em pipa.

 

O sofrimento e a mentira

O que me surpreendeu foi a reacção de alguma gente no Ocidente e particularmente em Portugal. O sofrimento da população ucraniana é como se não existisse, como se fosse fruto da acção dos seus líderes.

PAULO TUNHAS

OBSERVADOR, 29 set 2022, 00:1918

Há um certo número de condições necessárias para que um juízo político tenha lugar e, se essas condições não são satisfeitas, o juízo político não passa de uma fantasmagoria. Não pretendo aqui fazer a lista de tais condições, apenas notar duas que me parecem particularmente salientes: o sentimento de compaixão para com o sofrimento alheio e a sensibilidade bastante para distinguir a verdade da mentira.

São apenas duas das condições do juízo político, como acabei de dizer, mas são condições fundamentais. A insensibilidade ao sofrimento alheio e a incapacidade de distinguir a verdade da mentira designam uma patologia do comportamento político. Quem é incapaz de proceder a esse duplo reconhecimento sofre indiscutivelmente de um problema de cognição política.

Estas condições são, num certo sentido, pré-políticas. Referem-se a um fundo humano que precede o juízo político propriamente dito. A indiferença para com o sofrimento alheio e a incapacidade de distinguir o verdadeiro e o falso verificam-se na vida comum de múltiplas maneiras. Mas, quando transportadas para a vida política, ganham obviamente uma dimensão nova. Quanto mais não seja, porque o sofrimento passa a encontrar-se exposto aos olhos de todos e a mentira salta aos olhos com uma evidência irrecusável.

Isto que acabo de dizer vale para a vida política em geral. Mas vale certamente com mais força para os casos de agressão em grande escala, sobre os quais dispomos de abundante e constante informação. Vale nomeadamente para a invasão russa da Ucrânia e para tudo o que se lhe seguiu.

Houve certamente muitas coisas que me surpreenderam desde o início da invasão. A maneira como ela escapava a hábitos que dávamos por adquiridos. A brutalidade russa. A tentativa de destruição sistemática de um país a mando de Putin. A extraordinária tenacidade dos ucranianos em defenderem a sua pátria e o exemplo de coragem e perseverança em que Zelensky, desde o primeiro momento, se tornou. O sucesso na resistência ao invasor. E por aí adiante.

Mas, confesso, o que, num certo sentido, mais me surpreendeu, foi a reacção de vária gente a tudo isso. Não a reacção, sublinho, de muitos russos. Que seria de esperar de uma grossa fatia de um povo que não conheceu, ao longo da sua existência, nenhuma contribuição para a história da liberdade que é constitutiva do chamado Ocidente? E que não conheceu nunca, permito-me acrescentar, qualquer tradição filosófica digna desse nome, que, desde os Gregos, foi constitutiva da experiência ocidental da liberdade? A indiferença para com o sofrimento alheio e a incapacidade de distinguir a verdade da falsidade encontram-se inscritas nesse modo multisecular de ser, no conjunto das significações imaginárias sociais, como diria um filósofo, que fazem parte daquela sociedade.

O que me surpreendeu realmente foi a reacção de alguma gente no Ocidente e particularmente em Portugal. O sofrimento da população ucraniana é como se não existisse ou como se fosse o fruto da acção dos seus líderes, ou do Ocidente através deles, sendo a invasão russa a consequência estrita dessa mesma acção. Não ver o sofrimento que toda a gente vê, não ver as suas causas, que estão dispostas ao olhar de todos, releva de uma patologia moral magnificada em patologia política.

O mesmo se dirá da incapacidade em reconhecer a colossal e sistemática mentira que salta aos olhos em tudo o que vem da Rússia de Putin, desde o argumentário para a invasão e do nome – “operação militar especial” – escolhido para a designar até aos recentes referendos nas zonas ocupadas pelos russos, passando por tudo o que ocorreu entre uma coisa e outra. Não se medita suficientemente sobre a corrupção do espírito que preside a essa cegueira face à mentira. Volto ao que disse atrás: há uma patologia moral que se desdobra numa patologia política.

Estamos muito longe do conflito de argumentos que é constitutivo da vida ética e política. Só na aparência se pode julgar que o que temos face a nós prolonga tal conflito. Na verdade, trata-se da negação do fundo racional comum, por mais aproximativo que seja, que subjaz a esse conflito. O poder de não ver – a alucinação negativa que nos impede de ver o copo que está, ao olhar de todos, pousado sobre a mesa – releva de uma patologia singular para a qual não parece haver cura possível.

A incapacidade de distinguir a verdade da falsidade, no caso em que a distinção não oferece o mínimo vestígio de dúvida, é talvez o exemplo por excelência de uma má-fé que tomou conta do ser na sua integralidade. Face a um tal grau de má-fé, confinando com a loucura, toda a conversa se torna impossível. Resta a repugnância que se sente por quem se coloca decididamente fora do patamar da decência humana.

GUERRA NA UCRÂNIA   UCRÂNIA   EUROPA   MUNDO

COMENTÁRIOS:

Teresa Figueiredo: Excelente e sucinta abordagem desta sociedade em que vivemos. Felizmente há ainda alguns lúcidos por cá. A indiferença de certa gente neste Portugal face ao conflito na Ucrânia é talvez um dos sentimentos que mais me aflige. Vivemos num confortável alheamento para com os que morrem, sofrem nesta guerra injusta, mas também para os que mentem compulsivamente. Invade-me a tristeza de pouco poder fazer.

Jorge Carvalho: Excelente artigo. Obrigado                    Carlos Quartel: As nossas sociedades foram resvalando para um egoísmo endémico, para a construção de universos minúsculos, onde a escolha da marca das sapatilhas merece muito mais atenção do que a tragédia ucraniana, a fome na Etiópia ou as inundações no Paquistão.  Algo falhou  e o resultado está à vista, comodistas, cobardes, mendigos, sempre com receio de que algo ou alguém perturbe o seu pequeno mundo.                 S Belo: Muito bem!  Paulo Tunhas focou um  bom tema para bem necessária reflexão.              Cisca Impllit: Porque vale a assinatura no Observador.  Entre uma coisa e outra, Paulo Tunhas nos convoca o pensamento e a atenção! E de forma simples, própria de quem sabe.

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