sábado, 8 de junho de 2019

Então, esclarecerei


Salles da Fonseca termina em grande, neste seu propósito de esclarecer a res publica da actualidade, recuando aos seus inícios nietzchianos, de nihilismo e manipulação, que breve descambou em guerras de prepotência e governos de ditadura – nazismo, fascismo, comunismo, aparentemente para benefício dos povos, mas retirando-lhes valores imutáveis de dignificação humana, como Camus faria sentir a Sartre, condenando o existencialismo sem preconceito (e sem Deus) deste último, que causou o arrefecimento de relações entre eles. Sim, talvez se esteja a criar uma sociedade de prepotência governativa, o povo deixando-se manipular, no engodo dos aumentos e outras resoluções aparentemente reais, enganado por protestos de sinceridade que não contêm senão hipocrisia, falsidade e ambição de poder, deste “homem novo”, liberto do preconceito de honestidade, como demonstrara, ao apoderar-se, em tempos, do governo pela fraude.

Salles da Fonseca adverte, e traduz, do inglês, obra sábia, para melhor esclarecimento nosso. O nosso reconhecimento pela riqueza da sua informação, que poderia, de facto, tornar-nos mais conscientes, caso não se sobrepusessem, em nós, outros interesses, que a esquerda, unida ou não, mostra defender, está visto que por interesse nas migalhas com que Costa a aliciou. Salles da Fonseca sente-se ainda com garra para defender o seu país, se este descambar para uma ditadura de esquerda, mas seria um homem só, acomodados que somos, de longa data a vergar a cerviz…


 HENRIQUE SALLES DA FONSECA        A BEM DA NAÇÃO, 07.06.19
IN FINE
Eu às vezes temo ...
Eu às vezes temo que as pessoas pensem que o fascismo chega em trajes extravagantes usados por personagens grotescas e monstros como actores em peças teatrais nazis. O fascismo chega como se fosse um amigo, dizendo que restaurará a honra, fará sentirmo-nos orgulhosos, protegerá as nossas casas, dará empregos, limpará a vizinhança, lembrar-nos-á de quão grandes já fomos, escorraçará os corruptos, removerá qualquer coisa que nos incomode. Mas certamente não dirá que "O nosso programa significa milícias, prisões em massa, deslocação de populações, guerra”. 23 de Abril de 2014
Michael Rosen. Minha tradução a partir do original inglês em https://michaelrosenblog.blogspot.com/2014/04/i-sometimes-fear.html * * *   «Uma vez que o velho Deus abdicou, governarei o mundo doravante» - assim apregoava Nietzsche, o pai do niilismo.
* * *A era niilista manifestou-se muito antes do que o filósofo imaginara: catorze anos depois da sua morte iniciou-se a Primeira Guerra Mundial e depois dela a Europa ficou nas garras do fascismo, do comunismo e do nazismo. E pouco tempo depois da primeira, sofreu outra guerra pior ainda que a anterior. Desprezada a Civilização no que ela continha de valores perenes dando corpo à dignidade humana, a violência triunfou sobre a verdade e sobre a bondade. Dezenas de milhões de vidas foram aniquiladas sob o aplauso de dezenas de milhões de admiradores da violência. Sim, porque o niilismo só pode conduzir à ditadura, à violência e à aniquilação.
E como começou ele?
Perante o igualitarismo, todos têm razão, a ninguém é reconhecido o estatuto de sábio e tudo o que se apresente difícil é considerado antidemocrático; morto o conceito de que «o peso material determina o valor do oiro e o peso moral determina o valor do homem», a matéria reina e o dinheiro é a divindade suprema. Moral? A cada um, a sua.
- O que é bom para o oiro é bom para ti! Comercializa-te, adapta-te! Tudo o que te torna mais rico é útil; o que não for divertido é inútil e pode desaparecer.
Cada um que se valha a si próprio e os outros que «se virem» se conseguirem e, se não, tanto melhor pois mais fica para o vencedor entesourar.
Eis um conjunto de indivíduos que tudo fazem para vingar individualmente em prejuízo do próximo. A inveja ganha adeptos. Só que isto não é uma sociedade e muito menos uma Civilização. E onde não há coesão social, todos se sentem desamparados. Mas o desamparo é desconfortável. O desconforto gera a queixa e sempre acaba por conduzir à busca de soluções para se regressar a alguma situação assemelhável a conforto.
Assim se reúnem os ingredientes suficientes para que apareça um caudilho com promessas cujos méritos os desamparados não querem sequer questionar. E a ditadura, sempre radical, gera a violência e esta é a destruição.
Foi depois de muita desgraça que na tarde de 29 de Outubro de 1946, Albert Camus perguntou ao anfitrião André Malraux e ao grupo de outros convidados em que se destacava Jean-Paul Sartre – todos nascidos no niilismo e no materialismo histórico - se não achavam serem eles próprios, naquela sala, os maiores responsáveis pela falta de valores na Europa ocidental e se não estaria na hora de declararem abertamente que estavam errados, que os valores morais existem realmente e que doravante tudo fariam para restabelecer e clarificar esses princípios perenes e quiçá eternos. «Não acham que seria o princípio para o regresso de alguma esperança?»
E hoje?
Ah!, hoje, a História é a mesma que há muito Camus descreveu, a do triunfo do niilismo a que muito provavelmente se poderá seguir o fascismo. E isso, nós, os filhos dos ventos cálidos, não queremos. Cumpre-nos evitá-lo meditando…
* * *
Com a História aprende-se, mas é preciso conhecê-la; quem não conhece a História, corre o risco de repetir os erros do passado em vez de os evitar.
E o que nos conta a História?
Conta-nos que à amoralidade se segue a brutalidade, à lassidão se segue o aperto, ao esbanjamento se segue a austeridade, à autocracia se segue a volúpia populista.
E se de todos estes parâmetros já temos que baste, atentemos nas soluções que se impõem:
Reponhamos a formação política como missão essencial dos Partidos democráticos se não quisermos cair no fascismo;
Ponhamos à prova o que cada Partido (democrático) entende ser o bem-comum se não quisermos continuar a entediar os cidadãos e a engrossar a abstenção;
Reponhamos a ética da compaixão nas relações individuais e a de sentido de Estado nas relações colectivas se não quisermos cair nalguma sharia que nos seja imposta por estranhos radicais;
Criemos uma democracia muito mais directa nos Partidos do arco democrático se não quisermos dar força ao populismo. * * *
Nós, os filhos dos ventos cálidos, nascidos na paz e criados no sonho, não estamos preparados para a queda de mais um ideal e já não temos idade para nos envolvermos directamente nas cenas de estalada brava se aí vier o fascismo, mas…
TENHO DITO!
(por enquanto…)
Junho de 2019
Henrique Salles da Fonseca
COMENTÁRIOS:
Henrique Salles da Fonseca, 07.06.2019:  E disse VEXA muito bem. António Palhinha Mahado
Henrique Salles da Fonseca 07.06.2019: Parabéns pelo seu excelente texto. António Souza Cardozo
Manuel Menezes, 07.06.2019: Bem pensado e bem dito, Henrique. Um abraço. M
Francisco G. de Amorim 07.06.2019: Estou em crer que já houve alguém, há muito tempo que disse algo parecido. Seria Thomas More? E mudou para melhor ou isto vai de "vento em proa", d'arrecuas para trás?
Henrique Salles da Fonseca  07.06.2019: As considerações de um apolítico são o diário de Thomas Mann durante a primeira guerra de mundo. Pela primeira vez, ele se comprometeu na luta ideológica para exaltar os valores que lhe pareciam ameaçados. Thomas Mann defende aqui uma "certa ideia da Alemanha" que segurou fortemente no coração. Ele vai para os lugares virtuosos comuns da propaganda dos aliados, campeões da democracia, e ele afirma que há uma oposição irredutível entre a cultura como ele ouve e a "civilização" de seus adversários. A cultura cuida da alma, é específica do país e atende ao indivíduo. A civilização, preocupada com o progresso material e técnico, é internacional e só está interessada nas massas. Ela nos leva directo ao reinado do cupizeiro. Este panfleto antidemocrático às vezes se transforma em uma defesa altamente questionável do nacionalismo alemão, mas também contém um elogio de ironia e páginas impressionantes sobre filósofos como Schopenhauer e Nietzsche, músicos como Wagner e Bizet, escritores como Tolstoi, Dostoievsky, Flaubert, Claudel, Romain Rolland - e sobre Thomas Mann ele mesmo, que confidenciou suas intenções escrevendo o Buddenbrook, Tonio Kröger, Alteza real e Morte em Veneza. No total, um livro que se presta a discussão e protesto, um documento crucial sobre uma crise da civilização.
Francisco Gomes de Amorim

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