quarta-feira, 26 de junho de 2019

Uma mulher de hoje



Um fino humor provocatório nesta bombástica defesa dos direitos das mulheres às maternidades a tempo inteiro, já que o nascimento das vidas não estabelece horários de programação. Os comentadores de Helena Matos a reconhecem na inteligência do seu discurso irónico e ajudam a esclarecer o que por aqui se passa em termos de probabilidade de encerramento de maternidades, pura “boutade” de um pobre país sem nexo. Leiamo-la e aos seus comentadores, ou se preferirmos, façamos como outros, que preferem esperar do céu as soluções – (o que não é o caso de HM, integrada no seu papel de mulher moderna, que sabe defender paridades com os homens, nos direitos - não no caso presente, é certo, até ver). De facto já ultrapassámos o «Quando a tristeza me invade Canto o fado…», é preciso estar, é claro, com HM.
Crónicas do Portugalistão /Premium
HELENA MATOS          OBSERVADOR, 23/6/2019
Ou a minha comunicação ao futuro congresso em que as esquerdas vão fazer o balanço dos muitos anos de poder socialista em Portugal.
Camaradas, deixem que recue a esse já distante ano de 2019 em que ainda não tínhamos aprofundado a sociedade evoluída que hoje somos e em que eu percebi que não havia alternativa ao governo esclarecido das esquerdas. Discutia-se então em Portugal o fecho das urgências obstétricas durante o Verão. E eu, camaradas, aqui confesso que num momento em que ainda não estava devidamente esclarecida sobre a grandiosidade do pensamento socialista, até recordava como anos antes, em 2012, a possibilidade de transferência dos serviços de partos da Maternidade Alfredo da Costa para o Hospital Dona Estefânia trouxera para a rua centenas de pessoas que davam abracinhos entre si e abracinhos à MAC, gritando “A MAC é vida! A MAC não pode ser destruída!” e como até uma juíza decidira que a MAC tinha de funcionar como maternidade sob pena de sanção.
Estava portanto eu nessa busca nem digo de um cordão humano mas tão só de um pequeno ajuntamento de profissionais de saúde, membros da família Campos-Louçã dando conta da sua angústia pelo destino das grávidas, quando uma afirmação proferida por “fonte hospitalar” me fez ver a luz, ou melhor dizendo o esplendor do socialismo: Ainda não estamos como nos Estados Unidos em que se rejeita atender doentes se, por exemplo, não tiverem seguro de saúde. Não teremos, com certeza, grávidas a ter filhos na rua”.
Nesse momento de Junho de 2019, eu percebi duas coisas. A primeira é que eu tivera os meus filhos em pleno capitalismo, ou seja naquele tempo em que se a urgência não funcionava se acusavam os governos de Portugal. A segunda é que no socialismo não se contesta, agradece-se.
De facto, numa abordagem progressista da questão, uma mulher em trabalho de parto (pergunto ao congresso se a linguagem inclusiva de género ainda nos permite dizer “uma mulher em trabalho de parto” ou se não será isto discriminatório?) errando ao longo do IC19-2ª Circular sem saber se é atendida no Amadora-Sintra ou em Santa Maria, deve perguntar-se sobre o que de estranho está a acontecer nos hospitais públicos portugueses ou pelo contrário agradecer por não estar no Wisconsin ou no Ohio? Depois do parto com dor e sem dor, do parto na água, do parto em pé, em casa, deitada, sentada… passámos para o “parto não se sabe onde vai acontecer mas com o pensamento nos EUA” que representou toda uma nova abordagem obstétrico-ideológica. Perante este raciocínio esmagador só me restava concluir que não há alternativa a esta forma de mandar. Ainda hoje me interrogo porque demorei tanto a perceber a superioridade da linha justa. Porque não fui sensível ao fim das taxas moderadoras, ao perdão das multas por atrasos no pagamento das rendas aos residentes nos bairros sociais, ao abaixamento do preço dos passes e das propinas, ao anúncio de mais cobrança de IRS e de mais controlo das empresas privadas… Em cada anúncio desses eu só via compra de votos, transportes que pioravam, centros de saúde que não atendiam os utentes, universidades sem dinheiro para funcionar, bairros sociais transformados em ghettos de gente desincentivada de progredir socialmente e de cumprir com as suas obrigações… Em resumo, um país em que em nome do combate às desigualdades sociais se criava um regime de castas.
Mas perante a imagem de uma mulher em trabalho de parto que não sabe onde e quando será atendida mas que se deve congratular por não estar nos EUA eu percebi: o socialismo não é ideologia, é sim atitude perante o exercício do poder.
Camaradas, tudo é possível a um governo desde que legitime as suas escolhas segundo um pensamento de esquerda.
PS. A propósito “do Miguel” disse Marcelo Rebelo de Sousa não perceber “como se pode criminalizar a ajuda ao próximo.” Mesmo que o próximo mais directamente ajudado pelo Miguel e por essas ONG’s que ninguém sabe como são custeadas sejam os traficantes de seres humanos?
COMENTÁRIOS
MCMCA: Bravo HM, as suas crónicas de um Portugal urbano e progressista são lidas e relidas sobretudo por uma esquerda que a censura mas que avidamente a cada domingo a lê. Eles sabem, que nós sabemos, que eles sabem que andam a vigarizar meio mundo para tratar da vidinha deles  
João Brandão: Ele é as maternidades de Lisboa, ele é as da região do Porto e Trás os Montes, ele é a maternidade de Portimão, etc, etc, … todas fechar. Eis o esplendor luminoso das melodias dos amanhãs que cantam, após o miraculoso fim da austeridade. (os amanhãs estão algo roucos … coitados!) E tudo isto com a aquiescência benevolente dos socialistas do psd e da direitela lgbt do cds. 
Antonio Fonseca: " o socialismo não é ideologia, é sim atitude perante o exercício do poder."  Os Grandoleiros perceberam isso há muito, Helena. Por isso entraram em hibernação à espera que o poder mude. 
Joaquim Moreira: Ainda me lembro quando, em 2012, se murmurou o encerramento da Maternidade Alfredo da Costa, cinquenta mil poetas saíram dos seus buracos para compor sonetos à instituição. Eles tinham nascido ali, diziam e cantavam, e só uma entidade maléfica, como Passos Coelho, podia manchar esta proeza. Passos foi embora. Costa está no governo há quatro anos. E Lisboa não terá urgências no verão para grávidas: quatro dos maiores hospitais da capital, MAC incluída, têm falta de médicos. Os poetas, inexplicavelmente, regressaram aos seus buracos. E o BE que era sempre o primeiro a imolar-se pelo fogo, anda entretido a discutir com fanatismo uma Lei de Bases da Saúde, ao mesmo tempo que a Saúde – a Saúde que conta, para seres humanos reais que habitam no Planeta Terra – cai aos pedaços ali ao lado. O país aguenta tanta austeridade? Quando é a esquerda a mandar, ai aguenta e até aplaude. Estas são palavras de João Pereira Coutinho na sua crónica da “Nação Valente” e que tinha o título sugestivo: “Ai aguenta, aguenta”. Que aqui reproduzo, por achar que vem mesmo a propósito e que me permite acrescentar: tentar fazer oposição neste cenário, só para políticos do tipo-canário.
Carminda Damiao: Óptimo artigo.
António Sennfelt: Os "Miguéis" que tanto afligem S. Exa. PR são meros despachantes de carne humana ao serviço dos actuais negreiros deste nosso admirável mundo do politicamente correcto!
antonyo antonyo > josé maria: A “ lucidez e inteligência “ deve vir das novelas e do futebol que vêem compulsivamente ... Realmente bastava ver um telejornal ou ocasionalmente ler um jornal para compreender o pântano onde estamos actualmente
MCMCA >  Rui Manuel Tostões: Ninguém fica à porta de um hospital sem ajuda, nos USA. Tem é de a pagar bem caro, depois de ser servido, se não tiver seguro de saúde. Mas TODAS as empresas americanas têm obrigatoriamente de ter seguro de saúde para os seus trabalhadores e daí que desde há muito exista um incipiente seguro de saúde para os desempregados (aliás melhorado pelo Obama para os desempregados e velhos sem seguro, mas com efeitos perversos para os que trabalham).
Pedro Ribeira: Subscrevo. Só questiono onde anda a nossa comunicação social, os fantásticos comentadores que temos e mais ainda a nossa sociedade civil. Tudo em letargia. O que interessa é andar de metro por 40 euros às cavalitas de alguém, depois de esperar nas escadas pois as plataformas estão esgotadas.
Carla Nunes: Magnífico! E, infelizmente, real.
Maria Alva: Premonitória ficção, com a ironia fina que HM nos habituou. Quanto aos bitaites populista-demagógicos do nosso Catavento de estimação, infelizmente, de excepção estão a passar a regra. Até prá semana, HM 
André Silva: Em cada anúncio desses eu só via compra de votos, transportes que pioravam, centros de saúde que não atendiam os utentes, universidades sem dinheiro para funcionar, bairros sociais transformados em ghettos de gente desincentivada de progredir socialmente e de cumprir com as suas obrigações… Em resumo, um país em que em nome do combate às desigualdades sociais se criava um regime de castas.” E quando está tudo dito, nada mais resta para acrescentar.
Maria José Melo > Stra. Anabela Faísca: Não se condena o Miguel por salvar pessoas de morrerem afogadas, mas sim por contribuir para imigração ilegal e o tráfico humano. A ONG deveria levar as pessoas para o país de partida.
William Smith > Maria José Melo: Exacto, o que se condena no negreiro Miguel é estar a lucrar com semelhante tráfico que se pensava ter acabado no século XIX.
palavras ao vento: Cuidem da chuva para que não haja incêndios.  Cuidem do humor para manter a sanidade mental. Usem a inteligência e acordem os que se deixaram embalar pelas vozes dos populistas que mandam em Portugal. Parabéns Helena.  Escreva enquanto o sistema de controle e vigilância  não  inibir a liberdade em nome da virtude do politicamente correcto. 
Maria Nunes: Como é que é possível num país europeu, estar a acontecer esta situação? Nem quero pensar na aflição de uma mulher, com dores de parto, à procura de um hospital  que a receba. Acorda Zé Povinho! No mínimo, o que se pede a este povo é dignidade.

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