Fico entristecida com o teor da crítica
da maioria dos comentadores de VPV,
e
como não são muitos, desta vez, julgo que a maioria emudeceu talvez por receio
de ferir as susceptibilidades de uma esquerda que não se ensaia em despejar o
seu desagrado, como alguns fizeram. E, na verdade, só o primeiro o apoiou com a
expressão “A sempre jovem e clara voz de
Vasco Pulido Valente”, que logo mereceu deselegâncias rebarbativas. Julgo que VPV
é
ainda dos poucos portugueses corajosos que se atreve a confrontar a parcimónia assertiva
dos discursos de um Salazar modesto mas indispensável a uma nação doente então,
com a suavidade melíflua de um Centeno orgulhoso e, afinal, essencialmente
falso nas afirmações de êxito que os mais conhecedores reconhecem como fictícios,
numa nação mais doente agora, sem perspectivas de equilíbrio moral. A frase que
o Público destaca em epígrafe “Quando
apareceu, Salazar não prometia muito mais do que contas certas. E, ao
princípio, podia gabar-se de muito maiores façanhas do que as de Centeno” é
prova dessa voz “jovem”, por aguerrida, e temerária de VPV que os demais
comentadores devem deplorar, e que por isso arrancou tão poucos comentários e
só dos que vêem nesse nome odiado do “ditador” um tabu a ignorar.
O que VPV afirma a respeito de Nuno Bragança e do seu sentido de humor parece-me justo também,
relativamente, pelo menos ao seu dito de espírito. De resto, as notícias às
pinguinhas têm subentendido um amplo saber de quem se basta, por vezes, com simples metáfora
“afiada”, como essa do “testamento” de Rui Rio. Quanto à observação de AndradeQB,
do Porto, a respeito da
frase de VPV em torno da questão sobre a responsabilidade de Trump na morte de um
pai e sua filha, o discurso de VPV parece-me
claro, e confuso o de AndradeOB. Retomando: Se não há o direito de fugir
da morte, a culpa é de quem instigou à fuga. Se há esse direito, a culpa é do
Trump, que não o admitiu, causando, com isso, a morte. Parece claro, embora
sucinto, VPV não se envolve, apenas aponta o caminho. Quanto à lição do Iraque,
a respeito da Guerra do Vietnam, está subentendida a condenação dos EU.
Serão dados às pinguinhas, talvez para
os que dominam bem as questões. Para mim, são um prazer, por uma inteligência
que sobressai sempre, com uma certa verrina que nos seduz, exterior à objectividade do historiador, mas não do cronista, que ele não deixa de ser, ainda que a conta-gotas.
OPINIÃO
Diário
Quando apareceu, Salazar não prometia
muito mais do que contas certas. E, ao princípio, podia gabar-se de muito
maiores façanhas do que as de Centeno.
PÚBLICO, 29 de Junho de 2019
Esta
manhã, a ler a revista do Expresso, tropecei na fotografia de um homem, que
ocupava mais de meia página. Esse homem era-me familiar. Quem seria? O
Tengarrinha? Olhei para o rodapé e percebi: era o Nuno Bragança. Estou velho:
entre 63 e 67 vi o Nuno duas ou três vezes por semana.
Devo
dizer que, ao contrário da maioria dos católicos que fizeram O Tempo e o Modo,
nunca gostei muito da personagem. O artigo do Expresso vinha a propósito da
reedição comemorativa do 50.º aniversário do romance A Noite e o Riso. Pedro
Mexia, encarregado de fazer a apologia da
coisa, não se coibira. Mas não consigo partilhar do seu entusiasmo. A graça
do Nuno e a graça do livro não têm, para mim, graça nenhuma.
Pedro
Mexia talvez veja alguma virtude na piadinha: “tango + orango = orangotango”.
Eu não, porque a ouvi sob várias formas, infinitas vezes, apresentada como se
fosse uma descoberta histórica. O Nuno era um exibicionista e julgava que
tinha sentido de humor. Escrevia, por exemplo, na agenda do Pedro Tamen, sob o
título: sábado, 22 de Junho, 11:30 da manhã – “ir ao c... ao Lindley Cintra”. Toda
a gente achava isto uma prova de génio, como também as pérolas de originalidade
de que ele se aliviava para provar que era um grande pensador: “A minha
dificuldade portuguesa em encontrar a prosa certa, não a desligo eu dessoutra
que é a maneira de dar com a maneira certa de ser eu em Portugal.” Que esta
espécie de reflexões à mistura com orangotangos ainda hoje sejam veneradas
excede a minha credulidade.
23 de Junho: A direita não fala em eleições, só fala no que se vai
passar depois das eleições. Um testamento de Rui Rio.
24 de Junho: Há quem acuse este governo de não ter outro objectivo,
excepto o de controlar o défice. Quem
acha isso devia pensar duas vezes. Afinal, quando apareceu, Salazar não
prometia muito mais do que contas certas. E, ao princípio, podia gabar-se de
muito maiores façanhas do que as de Centeno.
25 de Junho: Os portugueses podem não ter memória histórica, mas
os jornalistas do liberalismo americano têm; e, tendo, lembraram-se de uma
fotografia que virou a opinião pública contra a guerra do Vietname: foi a célebre
fotografia da execução de um viet cong no momento em que a bala lhe
entrava na cabeça.
Desta
vez, descobriu-se a fotografia não menos atroz de um pai e
de uma filha de dois anos afogados no Rio Grande. O que não livra
ninguém de responder a uma pergunta simples: há ou não há um direito absoluto
de qualquer ser humano a fugir da fome ou da opressão, migrando para onde quer?
Se não há, quem promove ou aplaude a migração do “triângulo” da América Central
para a América do Norte é o responsável moral pelas vítimas do Rio Grande. Se
há, o responsável é Trump.
26 de Junho: Viseu decidiu
dar a João Félix um Viriato de Ouro. Enquanto ele recebia este
“galardão”, cá fora juntaram-se umas centenas de crianças e de adolescentes,
para o ver e lhe tocar.
Ele
é a Cinderela no mundo real.
28 de Junho: As guerras no Médio Oriente são guerras de
religião como as da Europa no século XVI e no século XVII. Nenhum muçulmano se
intrometeu nessas querelas, como nenhum cristão se deve intrometer na
antiquíssima querela entre sunitas e xiitas. Parece que não bastou à América a lição do Iraque.
Colunista
COMENTÁRIOS
Colete Amarelo, Aqui mesmo: Com prazer, Sima Qian. Vasco Pulido Valente
confessa-se velho, a 22 de julho, no entanto sempre o li com a mesma voz. Essa
não envelheceu, mantém-se jovem.
Ferrel, Lamaros: Concordo. Mas mudando a forma. Afinal sempre foi
velho. Quando o conheci, na altura do divórcio da M Cabral, já era assim velho
e de hálito estranho.
Fernando Luz: Ressabiamento contra tudo e contra todos. Valerá a
pena?
Espectro, Matosinhos: O grande problema de Pulido é, ao cabo e ao
fim, o problema de todos os humanos (utilizo esta palavra para não ferir os
bloquistas. Se falo em homens, dizem que sou machista e esqueço as mulheres, se
digo mulheres, ficam a faltar claramente os homens, assim…vai humanos), é não
conseguirem ser originais em nada, porque já tudo foi pensado e dito, todos os
quadros necessários à compreensão da arte pintados (Picasso percebeu isso muito
bem e por isso desconstruiu a arte) e todas as partituras escritas. Só resta,
mesmo, desfazer o que foi feito há tantos séculos. O Pulido não está imune a
esta fatalidade espectral, daí que seja semana após semana, repetitivo, banal e
enfadonho. Calado é um poeta, porque todos o somos, desde que não abramos a
boca nem mexamos a caneta. LOL
AndradeQB, Porto: Penso que na referência à fotografia de pai
e filha afogados, onde está a culpa é de Trump, a ideia seria "não
é". Só assim percebo o sentido e com ele estou de acordo. Não tendo ainda
ouvido ninguém defender que não deveria haver fronteiras e a entrada nos países
fosse livre, presume-se que existam para alguma coisa e que quem governa
garanta que cumprem o seu papel. Que culpa tem Trump? Não ter adivinhado que se
iam afogar e ter mandado dar-lhes entrada? Ou, não podendo adivinhar, mandar
abrir a fronteira e os guardas todos para casa?
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