Em toadas simples de vidas simples de
sofrimentos e alegrias normais… Com os José Régios dos sofrimentos e alegrias
normais, em Toadas brilhantes dos seus “Portalegres” das dores e das pequenas
alegrias normais ou mesmo outras. O pesadelo que estamos vivendo – por enquanto
a distância dos que verdadeiramente o sofrem, quase não dá para os
debruçamentos sobre os nossos egos ou alheios, e menos ainda sobre os prazeres
que as belas leituras nos causam, para mais na opressão causada pelo retrato
severo dos Tunhas críticos dos falsos ledores da cartilha humanística, e são
tantos! Mas antes que chegue o final, releiamos, sim, esses prazeres simples,
pela escrita brilhante do nosso José Régio, a dar-nos ainda esperança no
crescimento de novas acácias:
«………………….
E era então
que sucedia
Que em
Portalegre, cidade
Do Alto
Alentejo, cercada
De serras,
ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros
Aos pés lá da
casa velha
Cheia dos maus
e bons cheiros
Das casa que
têm história,
Cheia da
ténue, mas viva, obsidiante memória
De antigas
gentes e traças,
Cheia de sol
nas vidraças
E de escuro
nos recantos,
Cheia de medo
e sossego,
De silêncios e
de espantos,
- A minha
acácia crescia.
Vento suão! obrigado...
Pela doce
companhia
Que em teu
hálito empestado
Sem eu sonhar,
me chegara!
E a cada raminho novo
Que a tenra
acácia deitava,
Será
loucura!..., mas era
Uma alegria
Na longa e
negra apatia
Daquela
miséria extrema
Em que vivia,
E vivera,
Como se fizera
um poema,
Ou se um filho
me nascera. (Toada de
Portalegre – José Régio)
Os novos amigos de Job
Conhecem as causas que os outros
ignoram. Não se deixam, ao contrário do vulgo, enganar. São mais inteligentes,
mais perspicazes, mais advertidos. Não caem na esparrela em que o comum cai.
PAULO TUNHAS
OBSERVADOR, 14 abr 2022, 00:1940
Há assuntos propriamente infinitos, onde, mesmo quando
pensamos que já nada nos pode surpreender, nos arriscamos a descobrir novas
coisas: o sofrimento e a loucura, por exemplo. Deixemos de lado o sofrimento – o Livro de Job não precisa de ser reescrito, embora esteja sempre a ser actualizado – e
pensemos um pouco na loucura. Mais exactamente, num tipo de
loucura
particular, aquela que quase se confunde com a estupidez elevada ao grau de arte
sistemática.
Certas reacções à invasão da Ucrânia pela Rússia oferecem-nos
um vasto fresco deste singular tipo de loucura. Tudo aí se encontra: o amor desmesurado pela força bruta; o desprezo
incontido pela debilidade das democracias; a transformação metódica e
disciplinada das causas em efeitos e dos efeitos em causas; a sofisticação de
pacotilha a que uma certa aparência de “realismo” permite ascender; a
ridicularização altaneira do heroísmo, e de Zelensky em particular; e por aí
adiante. Em tudo isto, vemos uma certa esquerda e uma certa direita, os filhos
de Cunhal e os filhos de Salazar (mais os inconscientes do que os conscientes),
de mãos dadas, exibindo a comunidade de valores que em muitas coisas os
caracteriza.
Como em relação a um quadro, convém procurar descobrir
o tema que une as suas diversas partes, ou, se se preferir, o ponto de vista
que engloba o maior número de percepções. É importante para se perceber o que há de comum a tantos indivíduos que
manifestam particularidades tão extremas como as figuras que povoam certas
telas de Bosch. O que é que une o
homem-peixe, o homem de bico de ave, o casal que navega no peixe voador, para
lá da loucura que palpavelmente os habita?
Cada um terá, no capítulo, a sua ideia própria.
Ofereço a minha, tentativamente. O que há de
comum ao tipo de reacções enumeradas no segundo parágrafo é o todas elas
suporem, em maior ou menor grau, a convicção de que o facto bruto em si mesmo,
a invasão da Ucrânia pela Rússia, só pode ser encarado se tivermos em conta
alguns movimentos invisíveis que as descrições públicas dos factos e as imagens
que as acompanham não só não revelam, como têm por missão essencial ocultar.
A tarefa de trazer à luz esses movimentos invisíveis
faz de quem se dedica à tarefa um verdadeiro testemunho, um mártir no sentido
literal da palavra. E, como convém aos mártires, são criaturas que se sentem perseguidas
pelos que confiam nas aparências visíveis, como, por exemplo, as imagens das
cidades destruídas, e daí deduzem uma distinção nítida entre o agressor e o
agredido, tomando partido pelo agredido.
Sabemos quais
são para eles os movimentos invisíveis que a visibilidade aparentemente oculta. São os movimentos levados a
cabo pelos E.U.A. e pela NATO, sendo que os primeiros, mentores da segunda, são
a verdadeira e única causa responsável pela invasão da Ucrânia pela Rússia de
Putin. Esta doutrina da causa única – e repito algo que já disse num artigo
anterior – é uma doutrina comum a todas as teorias conspiratórias. Os
actuais mártires, que não se deixam enganar pelas aparências e que conhecem
de ciência certa o invisível, sejam eles de esquerda ou de direita, são, no
fundo, vulgares adeptos de teorias conspiratórias. Conhecem as causas que
os outros ignoram. Não se deixam, ao contrário do vulgo, enganar. O
benefício narcísico que dessa posição retiram é indisputável: são mais
inteligentes, mais perspicazes, mais advertidos, e, como gostam de sublinhar,
mais sabedores que os outros. Não caem na esparrela em que o comum cai.
(Haveria aqui a lamentar que o pouco de marxismo,
como coisa distinta do leninismo, que sobrevive no pensamento da esquerda
contemporânea – é, de facto, pouquíssimo – tenha, para que essa mesma
sobrevivência seja possível, de se apresentar sob as vestes de uma teoria
conspiratória. Não há talvez sinal tão óbvio da decomposição de uma
doutrina como a necessidade de se caricaturar a si mesma, ao ponto do grotesco,
para se manter presente na sociedade.)
Quer isso dizer que os nossos queridos mártires se concebem
como indiferentes aos sofrimentos dos ucranianos? Não, de modo algum. Pelo
contrário. São eles que melhor compreendem o sofrimento, até porque lhe
conhecem as verdadeiras causas e as podem em detalhe explicar. Sabem de cor e salteado todas as manobras da ganância e do terrível apetite
do lucro que se praticam no universo invisível do qual possuem um mapa
detalhado que não se cansam de exibir. Conhecem em detalhe todos os demónios
que habitam o invisível e o poder imenso de que gozam e que lhes permite terem
o mundo ao seu dispor. Tudo o que sirva para contrariar tal poder é, por
definição, bom. Tanto saber concede-lhes, como disse, a possibilidade da
compreensão e explicação do sofrimento e a autoridade para pedirem aos
ucranianos que se submetam ao poder russo em nome desse bem incondicional, a
paz, que não cessa de lhes sair da boca.
Os adeptos desta curiosa loucura fazem lembrar os antigos amigos de Job.
Recordar-se-ão que, certos de que o seu saber era maior do que o de Job, estes
lhe explicavam que o seu sofrimento fazia sentido, que as causas deste eram
inteligíveis e compreensíveis. Nenhuma coisa acontecia no mundo sem que um
motivo a justificasse. A sua verdadeira estupidez ontológica (vale a pena
utilizar a palavra) face ao sofrimento alheio manifestava-se na sua tagarelice
pedante e obscena. A única grande diferença entre os velhos e os novos amigos
de Job é que Deus apareceu aos primeiros e lhes censurou a soberba de lhe
pretenderem conhecer os desígnios. Duvido que apareça aos segundos. Duvido mesmo que alguém os
puxe pelas orelhas até Mariupol, Bucha, Kharkiv ou qualquer um dos vários
locais da Ucrânia que as tropas russas impiedosamente destroem e onde os
cadáveres juncam as estradas e apodrecem nas valas comuns. Num certo sentido, é
pena: às vezes o contacto directo com o visível cura as loucuras da alucinação
do invisível.
GUERRA NA UCRÂNIA UCRÂNIA EUROPA
MUNDO
COMENTÁRIOS:
Paul C. Rosado:
Excelente. É que é isto mesmo
que eles são. servus
inutilis: Magnífico! Até
lhes oiço a ranger as meninges para te entender. The Lobby Club: Tunhas lá aparece semanalmente
como o bonzo cá do sítio... Cisca Impllit: Cada vez melhor - este Pauli Tunhas!
Tem a sensibilidade e o
intelecto ligados!
Vasco Silveira: "...os filhos de Cunhal e os filhos de Salazar
." Caro Senhor Os primeiros viam na história
um caminho para um inevitável destino; os segundos vêem-na, à história, como
uma repetição do castigo de Sísifo, o que permitirá alguma aprendizagem, e
justificará precauções. Por outro lado, compreender, não é justificar: aliás a
ciência é isso mesmo - compreende as leis da gravidade, mas não as justifica. Melhores cumprimentos José Silvestre: Excelente crónica, que eu, se
tivesse essa capacidade, teria gostado de escrever. Não resisti a partilhar. João Afonso: ...Num certo sentido, é pena:
às vezes o contacto directo com o visível cura as loucuras da alucinação do
invisível. No que toca à comunada e aos filhos do ditador, tenho
a certeza de que não cura coisa nenhuma. alberto freitas: Para se analisar uma guerra há
que separar as causas das consequências. As causas têm dois pontos de vista e a
discussão por terceiros exige empatia ora com um lado ora com o outro. As consequências, essas, são
terríveis e de indignar todos, exigindo apoio ilimitado às vítimas. No entanto, mesmo os que em
cada frase incluem a palavra democracia, demonizam quem não pense como eles,
entendendo que liberdade de expressão só se aplica para as pessoas do bem. Mas para Tedros Adhanom da OMS,
essas pessoas do bem são racistas. Sim, racistas, porque lastimam as mortes de
brancos na Ucrânia e estão silenciosos relativamente às mortes de negros na
Etiópia, que em 2021 morreram mais de 200.000 de fome. Como vêem, tal como um feitiço
que se volta contra o feiticeiro, um ex-guerrilheiro comunista apoiante do
regime chinês e que participou 11 anos num governo genocida etíope, demoniza
como racistas as pessoas que se consideram superiormente do bem. Miguel Ramos: Palmas para o artigo e asco
para os pedantes iluminados e para a sua propagandoska insuportável manuel soares Martins: A filosofia, como sabe, dá para
tudo excepto para nos apercebermos da nossa própria loucura - esta é sempre dos
outros, dos que não pensam como nós. Miguel Ramos > manuel soares Martins: Se mantiveres os olhos fechados
um morto até dança o vira manuel soares
Martins > Miguel Ramos Mas há muito quem consiga
resultado semelhante mesmo de olhos abertos. Paulo Castelo: "Iluminado" PT em que
as aparências são evidências. " ... os movimentos
levados a cabo pela [Rússia] (...) são a verdadeira e única causa responsável
pela invasão da Ucrânia (....). Esta doutrina da causa única (...) é uma
doutrina comum a todas as teorias conspiratórias" António Pais: Excelente crónica! Paula Barata Dias: Texto absolutamente certeiro de
um dos melhores comentadores do Observador. Só lê-lo vale a assinatura! Jorge Reis O fervor tresloucado bélico do
autor!
Maria Augusta: Jorge Reis: ahahahahahahahah
ahahahahahahahah ahahahahahahahah ahahahahahahahah fervor
tresloucado"...ahahahahahah ahahahahahah ahahahahahah...logo tu!....um
xuxo-comuna!
advoga diabo: Que seria do mundo se os seus principais decisores
embarcassem nos facilitismos do encarneirar! Acontece saberem que não podem nem
devem. Isso é coisa para escribas de andar por casa sacarem o deles! Carlos Quartel: Anda muito de pedantismo, do
querer ficar bem com a tribo, do politicamente correcto que despreza o lucro, o
dinheiro, o individualismo, as liberdades, mas que vive comodamente nas
sociedades capitalistas. O que se pode acrescentar ao que se sabia, é que
perderam a humanidade, a solidariedade e vêem com indiferença o sofrer e o
calvário de todo um povo, supostamente nazi, e que se desculpa a agressão, a
bomba, a violação e se encara a deslocação de populações para regiões inóspitas
(um novo gulag) como a medida adequada, para corrigir os atrevidos que se se
supõem com cabeça para pensar. Andava por ali muito ódio,
velho e recalcado e cada míssil russo num hospital ou numa maternidade dá uma
satisfação e um gozo imensos. Pobres Job's .........Maria Augusta >
Carlos Quartel: 100% razão! A falta de humanidade de toda
esta cambada xuxo-comuna que por aqui se arrasta é de facto de relevar. Não
admira no entanto num país maioritariamente de xuxo-comunas que se lambuza no
conforto proporcionado pelo capitalismo. Gentinha hipócrita, desprezível e bastante limitada. João Floriano: Excelente crónica com a qual
concordo da primeira à última palavra. Só iria um pouco mais além na
caracterização dessas mentes superiores e conhecedoras, infalíveis a apontar os
verdadeiros culpados e a deslindar as teorias da conspiração: são almas muito
sensíveis e um tanto preguiçosas. Perante o horror de cidades em escombros,
cadáveres nas ruas, violações de inocentes, gente esfomeada em fuga, é muito
mais fácil e menos doloroso acreditar que é tudo uma encenação mediática. A
empatia custa, dói, dá trabalho e ninguém gosta de sofrer. José Paulo C Castro > João Floriano: Também há uma explicação mais
racional nessa falta de empatia: pode ser apenas o desejo de manter o gás
barato e não vir a sofrer consequências. Aí, já roçamos o egoísmo puro. João Floriano > José Paulo C Castro: Uma hipótese a considerar. Só
que os portugueses segundo consta são dos menos dependentes do gás russo. O
punho vingativo de Putin cairá sempre sobre nós, independentemente dos
amigalhaços que tem por todo o lado. Fazemos parte da UE, vamos encerrar os
nossos portos aos navios russos, já somos considerados hostis. Eu acho que é
mesmo preguiça emocional. José Paulo C Castro: A 'loucura' da explicação
invisível é uma forma de paranóia. A forma como tentam justificar as escolhas
democráticas dos povos - nos países que aderiram e querem aderir à NATO - como
sendo fruto de manipulação mediática e interesses invisíveis, é reveladora do
desespero em tentar encaixar a realidade numa explicação invisível de ameaças
inexistentes. Daí passam para a desvalorização da democracia e defesa da
autocracia como forma superior, ficando de acordo com Putin. Um salto em frente
nessa lógica. A paranóia recusa distinguir o visível como realidade
quando esta colide com a explicação invisível. É uma forma de manter a
coerência da irrealidade. O resto prossegue daí. Como já disse antes, é altura
de começar por lhes perguntar se acham que a Ucrânia invadiu a Rússia e decidiu
dizimar as suas próprias cidades. Depois, consoante a resposta, e até a rapidez
da resposta, talvez se possa avaliar o grau de 'amigo de Job'. Maria Augusta: Aguenta, camarada Paulo Tunhas. Dr. Feelgood: No boys for the Jobs.......É
isso ? Olha, meti água.
bento guerra > Dr. Feelgood: Se calhar não meteu ,o Tunhas é
filósofo ,está aberto.
Américo Silva: Não tenho comentado os artigos de José Milhazes da
mais boçal propaganda, hoje gostaria de abordar Orwell, e os comentários estão
fechados, como Paulo Tunhas se tem vindo a colocar ao mesmo nível, uso este
espaço. Orwell foi um comunista que teve uma visão como S. Paulo, quando esteve
prestes a ser morto pelos camaradas, e o que escreveu em"1984" aplica-se na perfeição
ao capitalismo, seja na campanha covid, seja na propaganda destes dois
cronistas.
bento guerra > Américo Silva: O boçal Milhazes comentou
jocosamente as entrevistas feitas a Putin pelo Oliver Stone e que a RTP3 emitiu,
com oportunidade. Também estava o "doutor sabe tudo" Rogeiro. Quantos
chefes de estado se sujeitariam a tal exercício? LP > bento guerra: Sim o Oliver Stone esse grande
director, mas muito neutral em tudo o que diz, escreve ou filma sobre Putin. Como
dizer que Putin não é responsável por assassinatos políticos que é tudo feito
sem o seu aval. Só um cego ideologicamente afirma uma coisa destas. Ou que não
vê nada de anormal, ou que o considera um "democrata". Sem dúvida,
tudo afirmações muito verdadeiras e não fanáticas de um adepto até ao osso, de
putin. Tudo o que seja contra o EUA o Stone está em todas. É conhecer a fundo o
seu historial. Mas como é mais fácil escrever bacoradas na internet, ou frases
soltas, sem conhecer um todo da nisto... bacoradas. José Paulo C Castro > bento guerra: Qualquer autocrata com desejo
de publicidade se sujeitaria a tal exercício depois de escolher o
entrevistador.
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