segunda-feira, 4 de abril de 2022

O livre “alvedrio” é fundamental

 

Isento, forro, poderoso”, indispensável para libertar – ou não - das paixões das riquezas e vaidades, foi o que também disse o Anjo à Alma, disposta a seguir as fantasias traiçoeiras das paixões terrenas com que o Diabo a entreteve momentaneamente, com grande empenho. Mas o certo é que, não fora a ajuda preciosa do Anjo Salvador a convencê-la da inanidade dessas fantasias humanas – para mais apoiado pela Igreja e respectivos doutores - Sto. Agostinho, Sto. Ambrósio, S. Jerónimo, S. Tomás e lá cairia a pobre da Alma nas tentações do demónio, sem “livre alvedrio” que lhe valesse. Isto é o que diz a peça vicentina, para moralizar as gentes, apoiada na doutrinação católica da redenção. Suponho que o alvedrio de Putin é definitivamente pessoal, ” isento, forro, poderoso”, sem precisar da redenção para nada, ávido de sucesso terreno, indiferente ao “Mal” praticado. Na segurança tenebrosa dos seus esconderijos, bastando-se a si próprio, no esplendor da sua maldade desafiante de todos os pruridos de consciência ou mesmo de “Fé”. Borrifando-se para a predestinação, está visto. Indiferente, ou regozijando-se mesmo, com os monstruosos espectáculos de destruição e dor que vai semeando impunemente.

 

ESTÁ ESCRITO! (??)

 HENRIQUE SALLES DA FONSECA

A BEM DA NAÇÃO,  03.04.22

Hoje, começo por afirmar que é real a dicotomia entre a predestinação e o livre arbítrio. E essa dicotomia faz-se sentir no distanciamento das Civilizações por via das respectivas filosofias predominantes a que, assentes em dogmas, chamamos religiões. Claro está que me estou a referir a dogma como matéria indiscutível de fé.

Poderá não ter sido sempre assim, mas actualmente, o Cristianismo católico romano e o luterano têm o livre arbítrio como elemento fundamental da liberdade decisória da pessoa enquanto o islamismo toma a predestinação como algo contra que o homem nada pode fazer. Destas duas posições resulta a maior dignificação e responsabilização do cristão e a subordinação do islamita à dura «sorte» que lhe calhou nesta vida.

Eis mais uma razão a justificar o progresso das sociedades de génese cristã – em especial, a católica romana e a luterana – e o «medievalis«mo» islâmico, sobretudo o sunita.

Não estou com isto a querer lavar a História; estou apenas a referir-me ao que se passa actualmente (e, por isso mesmo, este texto vai datado).

E, a propósito de «hoje», o que terá o Patriarca de Moscovo a dizer sobre o livre arbítrio dos seus fiéis?

Lisboa, 3 de Abril de 2022

Tags: filosofia

  COMENTÁRIOS

 Anónimo  03.04.2022  15:01

Uma das cenas emblemáticas do filme “Lawrence da Arábia foi quando, após duas tribos árabes, capitaneadas por aquele, terem atravessado um deserto mortífero, se constatou que faltava um membro, que teria ficado no deserto, o que significava morte certa. O inglês logo se prontificou a voltar para trás, sozinho, a fim de o resgatar. Um dos chefes árabes tentou dissuadi-lo, dizendo que não valia a pena, pois estava escrito que tinha chegado a sua hora e nada poderia salvá-lo. Mas Lawrence fez o que desejava e conseguiu resgatar o árabe perdido. Quando passou pelo chefe árabe, mais morto do que vivo, murmurou: “Nada está escrito”. A triste ironia do destino (seria determinismo?) foi quando o inglês soube, passados uns dias sobre os acontecimentos acabados de descrever, que um árabe tinha roubado algo a um membro da outra tribo, e o castigo tinha de ser a morte do ladrão por alguém pertencente à outra tribo, o que seria suscetível desencadear um processo recíproco e sucessivo de vingança entre as duas tribos. Para o evitar, Laurence prontificou-se a executar o ladrão. Só soube quem era no momento em que ia matá-lo – era tão-só o árabe que ele tinha salvo dias antes. O Homem pensa, pode decidir sozinho, pelo que não será fácil sustentar que as acções humanas são reflexo da vontade divina, mesmo estando-se perante um Deus omnipotente. Aliás, como comentário a um post recente teu, transcrevi umas linhas dum livro do Papa João Paulo II em que ele enfatizava que o homem pode decidir sozinho, sem Deus, o que é bom e o que é mau. Outro tipo de determinismo – o histórico – foi também desmentido pela realidade.
Quanto à pergunta que fazes, Henrique, talvez o Patriarca esteja a dar graças a Deus, por a Igreja não perfilhar actualmente o determinismo religioso. Assim, é possível imputar os actos malignos exclusivamente aos agentes humanos. Abraço.
Carlos Traguelho

 António Justo  04.04.2022  10:02: Muito oportuno texto! De facto essa dicotomia com a aposta no livre arbítrio (dignidade da pessoa humana) é o foco do desenvolvimento humano e das nações e que torna os fundamentos católicos como estrutura base da cultura ocidental e ao mesmo como orientação para a História em geral!

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