A referência a José Pacheco Pereira, a propósito das ideologias próprias, por
vezes tendenciosas, como explicou ontem o Dr.
Salles da Fonseca, tem a ver com a leitura de uns “Públicos” de oferta
fraterna dominical, de prazo ultrapassado, é certo, mas que me permitem rever os
bons cronistas a que deixei de ter acesso on-line. Num desses artigos, de 26 de
Março – “O tempo não passa da mesma
maneira” – compara Pacheco
Pereira os 48 longos anos da ditadura fascista com os 48 da democracia
posterior, que vamos celebrar brevemente, mas que os canais televisivos vão
repescando antecipadamente em evocação de canções, heróis ou outras variações
em forma de reportagem há muito ultrapassadas, mas necessárias ao regozijo
próprio, - de proezas, todavia, bem diversas das que um povo inocente e
corajoso actualmente pratica, (contra um outro povo, ou os seus chefes,
impunemente criminosos) - e que bem pequenos nos faz sentir, no contraste entre
essa nossa efusão gloriosa de uma pequenez arrogante e a tal coragem e sentimento
pátrio reveladas pelo povo ucraniano. O tal artigo de Pacheco Pereira de 26/4 vem sofisticadamente
adornado com o quadro de Salvador
Dalí
“A Persistência da Memória”, de
simbolismo oportuno para o paralelo que P.P faz entre a lentidão pasmacenta desses tais 48 anos anteriores
ao 25 de Abril, próprios para derreter a paciência - à maneira dos oportunos relógios
surrealistas do Dalí - e a
rapidez dos 48 anos pós-salazarismo, que, pelos vistos, passaram num ai, merecendo
um outro quadro, todavia, em que os relógios retomassem uma estrutura de
retorno temporal mais firme, a equiparar-se à virilidade retomada a partir de
74, pelos Pachecos Pereiras da nossa praça, onde, não se percebe bem porquê, aquele
escolheu o PSD como partido da sua posição no tablado da sua estabilidade
nacional actual.
Sim, o texto de PP ressuma o habitual ardor crítico contra Salazar, figura inerte e impotente, estendida
no chão do quadro, representando o próprio pintor apático - se não o mesmo Salazar, segundo o pensamento desfeiteador de PP, cujo tempo psicológico varia, como o de
toda a gente, condição que Salvador
Dalí
traduziu magistralmente, como bem o fez sentir Pacheco Pereira, no seu rancor habitual contra um regime onde só
encontrou flacidez, ignorando propositadamente os condicionalismos a que o
sujeitaram as inépcias da primeira República, justificativas de uma contenção necessária,
que não significou necessariamente menor realização nacional – só que honestamente
tratada, pagas as dívidas anteriores e altivamente efectivada, com a contenção
da sábia honestidade e da ordem indispensável.
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