Não, não se trata de masoquismo. É mesmo
fado. Acrescido de timidez natural. E modéstia, muita modéstia, num “carpe diem”
que nunca nos faria actuar como esses ucranianos, está visto, a defender o
solo. Pátrio. Desde que haja quem nos garanta a côdea… Guerras para nós só a
descrita por Solnado, de 1908, com o convite ao inimigo: “Almoça cá ca gente”…
Temos as costas quentes. Com o Costa de barriga cheia, a gerir a “bazuca”
alheia. Almocemos com Costa, para a côdea. Ou mesmo a migalha, sejamos modestos.
Um funeral na Ajuda
Sem esperança nem revolta, os
portugueses preferem a pobreza garantida à prosperidade incerta. E ninguém
melhor que o dr. Costa para lhes garantir a pobreza e negar qualquer hipótese
de prosperidade.
ALBERTO GONÇALVES Colunista
do Observador
OBSERVADOR, 02 abr 2022, 00:232
Desde a invasão da Ucrânia que, a
julgar por sondagem, a taxa de aprovação do sr. Putin não pára de subir: andava
nos 69% em Janeiro, anda nos 83% em Março. E a percentagem de russos que acham
que o país está no bom caminho cresceu de 52% para 69% apenas no último mês. Os
que acham o inverso são agora 22%, e eram 38% em Fevereiro.
Vista
de fora, e consideradas as sanções e o isolamento, a tendência parece absurda. Os russos não sabem que deslizam apressadamente para
uma pobreza que, pese os hábitos locais, boa parte das gerações recentes nunca
conheceu? Não sabem
que a propaganda do Kremlin é falsa por definição e particularmente falsa por
vício? Não sabem que, seja qual for o
desenlace desta história, e os custos para a Ucrânia e para o mundo em redor, o caminho da Rússia está longe de ser risonho? Uns saberão, outros não querem saber. E o controlo da
informação, hoje parcial em última instância, não explica tudo. O que explica? Talvez a falta de tradição
democrática, que os predispõe a desprezar os valores “racionais” que o Ocidente
consagrou em favor de aconchegos vagos e, em última instância, um bocadinho
suicidas. É verdade que mesmo a racionalidade ocidental já conheceu melhores
dias. É sobretudo verdade que não serão os portugueses a explicar a atracção
dos russos pelo abismo. Quem nos dera perceber a nossa.
Esta
semana, afazeres profissionais forçaram-me infelizmente a assistir à tomada de posse do novo governo do dr.
Costa. Felizmente, assisti pela televisão,
porque não fui convidado (fiquei espantadíssimo, confesso) e porque as
recomendações do famoso “distanciamento social” aplicam-se principalmente ao
convívio com gente daquela. Isto para dizer que ouvi o discurso do prof.
Marcelo, que deambulou uma meia hora pelo leste europeu antes de aterrar por
cá, e o discurso do dr. Costa.
No
caso do dr. Costa, devidamente autopsiado por Rui Ramos, não se tratou bem de
um discurso, mas do típico rol de patranhas.
Para enxovalhar os que duvidam do seu domínio da língua, o dr. Costa afiançou
que lê muito. Pelo menos, vira muitas páginas, e acaba a enxovalhar os
analfabetos que o levam a sério. O dr. Costa virou a “página da
austeridade”. O dr. Costa encontra-se a virar a “página da pandemia”. O dr.
Costa vai virar a “página da guerra”. Não tarda, chega ao posfácio. Para que o
livro faça sentido, vamos a uma página de cada vez.
A
“página da austeridade”. Face aos
membros da UE, o PIB per capita caseiro vem caindo aos trambolhões.
Naturalmente, o poder de compra e o consumo acompanham-no e lançam-nos rumo aos
braços solidários da Bulgária. O fisco devora o que pode e o que não devia
poder. Os aumentos salariais dão vontade de pegar em armas perante o aumento do
custo de vida. A vida não alcança o fim do mês e é melancólica no princípio. E
o governo tempera o massacre com trafulhices de nomes finos, tipo e-voucher,
decerto para efeitos de gozo adicional. Virou-se a “página da austeridade” para
se entrar no longo capítulo da miséria.
A
“página da pandemia”. Portugal
liderou internacionalmente na vacinação e lidera na perpetuação de
proibições que negam a eficácia das vacinas. Em determinado momento,
batemos o recorde de mortes diárias, que só não foram mais graças à bendita
proibição de se adquirir água em take away. À revelia da generalidade
do planeta, continuamos a impor o decisivo açaime nas escolas e nos restaurantes
(aqui se estivermos de pé, que sentados o bicho não se atreve). À imagem de
metade do planeta, estrafegou-se a economia para conter um vírus que não se
conteve de fintar as “regras”, suponho que a rir. Vira-se a “página da pandemia” para se consultar o
índice da prepotência e da superstição.
A
“página da guerra”. A dimensão
da intrujice não merece comentários.
Tamanha colecção de mentiras não
classifica unicamente o perpetrador, o qual, reconheça-se, possui um desplante
raro até para os padrões do PS. As
mentiras também definem o público a que são dirigidas. À semelhança dos russos,
alguns portugueses acreditam nas mentiras. E alguns não se maçam com elas. No
Palácio da Ajuda, o dr. Costa poderia ter anunciado a cura do cancro que o
escrutínio seria idêntico: nenhum. O homem diz sempre o que quer na medida em
que, não tendo escrúpulos, tem um público que lhe permite todas as humilhações
e ainda agradece por cima, através do voto e da reverência. Sem esperança nem revolta, os portugueses preferem a
pobreza garantida à prosperidade incerta. E ninguém melhor que o dr. Costa para
lhes garantir a pobreza e negar qualquer hipótese de prosperidade.
O “comentariado” perdeu excessivas
horas a debater os ministros. Os ministros
são insignificâncias ao serviço do dr. Costa e do partido e da distribuição da
popular “bazuca”, afinal a solitária motivação do governo. A tomada de posse é uma redundância: aquela gente
tomou conta disto há muito. Por isso, dispensavam-se os salamaleques de
quarta-feira, a retórica ordinária e uma cerimónia com criaturas pouco dadas à
dita. De resto, nas formalidades, na estética, nos risinhos e no negrume, a
cerimónia pareceu-se demasiado com um funeral. Não o daquela gente: o do país.
COMENTÁRIOS:
Jose Costa: Muito bem AG. Os portugueses estão velhos e sempre foram medrosos, os novos
emigram. Por isso se mantém o status quo. Isto é um banquete em que os que mais
têm vão pagando a conta e os outros comem à "pala". O problema é que
os que têm algum já não conseguem dividir a conta e os que podem vão embora.
Carlos Silva: Aqui deve
haver um grande engano do AG. De certeza. Mas afinal de quem é o
"velório" ? Isto está mesmo complicado em termos de "sofrimento
institucional". Vá lá, não seja tão "choramingas"! josé maria: os portugueses preferem a pobreza garantida à
prosperidade incerta. Olhe que não,
dr. Gonçalves, olhe que não... Os
portugueses preferem a prosperidade incerta de 2022 à pobreza garantida de
2015... Vitor
Batista > josé maria:
Os únicos a prosperar são os xuxas como tu, porque todos
os outros definham a cada dia que passa. Hoyo de Monterrey > josé maria: Pobreza garantida de 2015? Qual? Aquela que teve origem
na bancarrota em que o país estava em 2011? Aquela que o Passos Coelho herdou
do governo anterior? Aquela que era impossível reverter numa legislatura com o
país dominado pela Troika (cá metida pelo governo de Sócrates)? Aquela que foi
causada pelo mesmo partido que já tinha posto Portugal na bancarrota duas vezes
antes dessa? Luis
Martins > Hoyo de Monterrey:
O quê? O Peiésse? Não posso, o Peiésse é
que nos levou à bancarrota em 2011 e, ainda por cima, repetiu a proeza
anteriormente? O Peiésse esse partido que tanto faz pelo povo e pela nação, não
pode ser, isso devem ter sido os malandros liberais (a julgar pelas declarações
recorrentes de Costa), esses malandros que vá-se lá saber porquê promovem
riqueza em TODOS os outros países mas que são terríveis para nós.
Aqui o Peiésse é que é o partido do
progresso, não vê o que se tem passado desde 95, ano a partir do qual o Peiésse
praticamente se tornou o dono e sr do país? Crescimentos magníficos todos os
anos, ultrapassagem de n países nos rankings europeus, qualidade de serviços
públicos sempre a subir, listas de espera cada vez menores, dívida pública
quase inexistente, médicos de família para todos, praticamente 0 portugueses
abaixo do limiar da pobreza, escolaridade a ameaçar os tops europeus,... Que
partido é este meu Deus! Palmas, muitas palmas para um partido que tanto
progresso nos tem trazido, roam-se de inveja Polónia, Rep Checa, Irlanda,
Eslováquia, etc, etc, por não terem qualquer hipótese de nos alcançar com o
Peiésse e sobretudo Costa ao comando, somos os maiores e até vamos ao
mundial
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