A precariedade da verdade histórica - de diversas
versões e tamanhos, segundo os critérios e as conjunturas do momento, nos
baldões da História. As “verdades” impostas nas versões dos poderosos. Reposição
– até ver - das verdades e de conceitos segundo os critérios dos heróis do
momento… apesar dos saudosistas – na roda-viva da mudança...
▲A
foice e o martelo estão entre os símbolos banidos em alguns países
PICTURE
ALLIANCE VIA GETTY IMAGE
Monumento a monumento, os Bálticos
querem acabar com a glorificação da ocupação soviética
Alguns dos
memoriais foram retirados logo após a declaração da independência, em 1991, mas
foi a guerra na Ucrânia que levou estes países a mudar a lei e acelerar a
retirada dos símbolos soviéticos.
VERA NOVAIS: Texto
OBSERVADOR, 27
ago 2022, 20:103
Índice
A grande intervenção no Parque da
Vitória de Riga na Letónia
Eliminar memoriais soviéticos
respeitando os restos mortais.
Trocar nomes de ruas e proibir fitas
Georgianas para pôr um fim à sovietização
Mudar a lei para cumprir a justiça
histórica e combater a desinformação
Nem os acordos bilaterais previnem a
destruição dos símbolos soviéticos
Dia da Vitória: as 24 horas que
separaram o ocidente da Rússia
O leste da Europa foi polvilhado com
dezenas de milhares de monumentos de homenagem aos soldados soviéticos do
Exército Vermelho que combateram na II Guerra Mundial. Mas a derrota e expulsão
dos nazis foi acompanhada pela ocupação de vários países pelos russos e a
incorporação na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas —
fundada a 30 de dezembro de 1922, há quase 100 anos. Os monumentos são,
assim, símbolos de libertação, mas também de ocupação, com o peso do
segundo a crescer consideravelmente depois da invasão da Ucrânia em fevereiro
deste ano.
O
atentado à soberania do Estado ucraniano reuniu iniciativas de apoio à Ucrânia
e repúdio às investidas russas, desde os Estados Unidos à Turquia, com os
países que fazem fronteira com a Rússia (ou que estão suficientemente próximos)
a recearem pela sua segurança. Para
os Estados Bálticos, agora com democracias ocidentais, a ocupação russa
não traz boas memórias e a invasão da Ucrânia veio abrir feridas mal saradas.
Como apoio à Ucrânia, mas também pela verdade histórica, Lituânia,
Letónia e Estónia estão a
retirar os memoriais soviéticos dos lugares de destaque que ocupavam.
Ao
longo do tempo, muitos dos monumentos soviéticos foram colocados de parte, não
tanto pela remoção, mas porque deixaram de ser cuidados e deixaram de ter
a importância simbólica que lhes havia sido atribuída. Alguns foram retirados após a dissolução da URSS, em
1991, outros numa nova vaga em 2015 — depois da anexação da Crimeia —, mas foi
a invasão da Ucrânia em fevereiro deste ano que motivou os Estados Bálticos a
criarem novas leis de proibição da glorificação do totalitarismo e autoritarismo e
a traçarem um plano para eliminar do espaço público todos (ou quase todos) os
monumentos soviéticos até ao final deste ano (alguns exemplos aqui).
A grande intervenção no Parque da
Vitória de Riga na Letónia
Entre
os alvos de remoção mais recentes está
o gigantesco monumento no Parque da Vitória, em Riga, capital da Letónia, com uma área de
intervenção de cerca de três hectares. O complexo, que inclui um obelisco de 80
metros de altura, várias esculturas, caves e um enorme lago artificial com 50
mil litros de capacidade, começou a ser demolido na segunda-feira, dia 22.
A
zona está vedada a peões e veículos, os ajuntamentos e manifestações estão
proibidos, mas 14 pessoas foram detidas esta quarta-feira por se recusarem a dispersar do
local, após ter havido confrontos entre as pessoas presentes. Quem se manifesta contra a demolição do monumento —
que não terá outro fim que não a destruição — relembra que o local era usado
para celebrar o Dia da
Vitória,
assinalado a 9 de maio segundo a tradição soviética (mas sobre este dia
falaremos mais à frente).
Este
é apenas um dos cerca de 300 locais ou memoriais que
podem ser retirados pelas autoridades locais letãs, indica a Al Jazeera, mas é o maior e o que tem
maior simbolismo associado — tanto pela existência, como pela remoção. Outros
monumentos, em várias cidades letãs, têm sido retirados — de acordo com
uma lei aprovada este ano — ou vandalizados, ambos como forma de oposição à invasão da Ucrânia
pela Rússia.
"Considerando
o rápido aumento das tensões e confusão junto aos memoriais em Narva, temos de
agir rapidamente para garantir a ordem pública e a segurança interna."
Kaja Kallas, primeira-ministra da
Estónia
Poucos monumentos terão
a carga emocional deste complexo de Riga ou do Soldado de Bronze na Estónia,
disse Dmitrijs Andrejevs, investigador na Universidade de Manchester no Reino
Unido, ao canal Al Jazeera. E a sua retirada desperta igualmente
poderosas emoções contra e a favor. Retirar o Soldado de Bronze de uma
praça central para um cemitério militar na periferia de Tallinn (capital da
Estónia), em 2007, originou conflitos durante vários dias que levaram à
detenção de mais de 800 pessoas, uma vítima mortal e ainda 150 feridos.
As autoridades nos países bálticos
dizem ter aprendido com este exemplo, em particular a Estónia, que na semana passada procurou tirar de forma
pacífica (e quase secreta)
um marco importante da entrada russa no país: o tanque T-34 em Narva, a principal
cidade-fronteira a nordeste. Neste caso, ao contrário do monumento de
Riga, o tanque foi levado para um museu.
“Considerando
o rápido aumento das tensões e confusão junto aos memoriais em Narva, temos de
agir rapidamente para garantir a ordem pública e a segurança interna”, justificou
a primeira-ministra da Estónia, Kaja Kallas, citada num comunicado oficial. A
nota foi publicada na manhã de dia 16 e da parte da tarde o governo anunciava
que já tinha retirado o tanque
e mais cinco monumentos,
incluindo placas e memoriais sobre sepulturas de guerra, às quais foi
atribuída sinalização neutra.
Eliminar memoriais soviéticos
respeitando os restos mortais
Muitos
dos memoriais, estátuas e outras representações relacionadas com o fim da II
Guerra Mundial e com a antiga URSS, pretendem assinalar as sepulturas
dos soldados e homenagear aqueles que lutaram contra a Alemanha nazi. É
por isso que os familiares das vítimas e outros descendentes russos continuam a
prestar homenagem aos combatentes junto a estes monumentos, estejam em
território russo ou fora dele.
O
Soldado de Bronze também assinalava o local onde estavam sepultados os restos
mortais dos soldados que, tal como a estátua, foram retirados e levados
para o cemitério militar. A presença de restos mortais — numa sepultura
pré-existente (mais tarde identificada com um monumento) ou numa nova campa
para onde foram levados posteriormente para serem celebrados — tornou-os
locais “sagrados”, o que amplifica a repercussão do que aí acontecer.
“As
autoridades soviéticas utilizaram os mortos para dar a um monumento ideológico
a sacralidade de uma lápide”, disse Hellar Lill, diretor do Museu da Guerra na
Estónia, ao canal Al Jazeera. E
é por isso mesmo que os memoriais sobre sepulturas são muito menos vezes removidos ou destruídos, afirmou o historiador Mischa Gabowitsch, em 2021, na
altura investigador Einstein Forum (Alemanha).
O
director do museu estónio denunciou, no entanto, que uma escavação na cidade
de Otepää, no sul da
Estónia, revelou que ali não se encontravam sepultados quaisquer restos
humanos. Noutros
locais, o número de mortos anunciados no memorial pode não corresponder ao
número de sepultados no local.
Convenção de Genebra protege restos
mortais de vítimas de conflitos armados
A
Convenção de Genebra (em particular o Protocolo I Adicional,
de 1977) obriga os membros signatários a respeitarem as sepulturas das
vítimas da guerra e assinalá-las devidamente. Com as novas resoluções, os
Estados Bálticos entendem que os monumentos erguidos sobre estas campas não
estão incluídos nesta proteção — sobretudo quando se tornaram símbolos de
violência — e que “proteger as sepulturas” não significa “mantê-las inalteradas”.
A
Estónia, por exemplo, justificava (já antes de 2018) a retirada dos restos
mortais de praças centrais para outros locais onde fosse mais adequada a sua
comemoração, escreveu
Mischa Gabowitsch na Politika, uma plataforma de partilha de investigação sobre ciências
políticas, com
informação recolhida até 2018. Na Rússia e na Bielorússia, pelo contrário,
continuam a erguer-se monumentos de celebração que fiquem mais acessíveis a
quem os queira visitar, acrescenta.
O Soldado de Bronze em Tallinn,
capital da Estónia, foi retirado porque além de enaltecer a invasão russa era
palco de confrontos
“Estes
locais de enterro são muito diferentes”, disse Vidmantas Bezaras, director do
Departamento de Herança Cultural lituana, à emissora nacional LRT. “Alguns
deles são muito moderados e realmente respeitosos, enquanto noutros [os
soviéticos ou autores dos memoriais] tentaram acrescentar esculturas
agressivas, parafernália da era soviética, bandeiras, metralhadoras,
etc..”
Foi
esta apropriação dos símbolos que justificou a decisão de retirar seis
esculturas em granito de soldados do Exército Vermelho do lugar de destaque que
ocupavam no cemitério Antakalnis, em Vilnius, capital da Lituânia. “Apesar
de um cemitério ser um cemitério e de, na civilização ocidental, ser
normalmente um lugar intocável. É claro que os soviéticos sempre gostaram de
ultrapassar as marcas e fazer dos cemitérios coisas ideológicas“, disse Remigijus Šimašius, presidente do Município de
Vilnius, ao serviço noticioso do Báltico BNS. As esculturas serão retiradas e,
eventualmente, colocadas num outro lugar.
Trocar nomes de ruas e proibir fitas
Georgianas para pôr um fim à sovietização
A
Lituânia apressou-se a retirar todas as estátuas que não marcavam
locais de sepulturas — nomeadamente de Lenine, Estaline e outras figuras
soviéticas — logo após a dissolução da URSS, em 1991, não tanto por uma decisão
do governo central, mas por iniciativa dos governos locais que queriam apagar
estas marcas das suas praças. Também na Estónia, durante os anos 1990, foram
retiradas dezenas de memoriais
leninistas.
"Alguns monumentos e alguns outros
símbolos vão desaparecer da nossa vista. Dificilmente sentirei muita
falta deles."
Nos
últimos meses, vários municípios estónios expressaram oficialmente a vontade
de deslocar os restos mortais dos soldados de Exército Vermelho de locais
públicos para cemitérios de guerra. Foram também as autoridades locais
lituanas, depois da invasão da Ucrânia, que pediram ao Departamento de Herança
Cultural para retirar o estatuto de
protecção aos memoriais soviéticos sobre
as sepulturas para poderem retirá-los.
A “de-sovietização” (numa
tradução livre, sem sinónimo em português) da Lituânia inclui dar um novo nome
a tudo o que lembre a era Soviética. “Estamos a falar dos nomes dos monumentos
que restam, das praças e ruas e também das escolas. É muito importante que
haja uma segunda parte desta lei, que discuta quem foram as pessoas que deram
nome às ruas, o que significam para o nosso estado e para a nossa história”, disse Paulė Kuzmickienė, presidente da Comissão para
as Lutas pela Liberdade e Memória Histórica, à LRT. A Ucrânia
também aproveitou o dia do aniversário da independência para mudar o nome
em 95 ruas de Kiev que eram alusivos à herança soviética.
Apesar
de poderem ter valor histórico, cultural e patrimonial, os monumentos
soviéticos representam também um potencial palco de confrontos, especialmente
nos Bálticos onde uma parte importante da população é russófona. A colagem de
Vladimir Putin à era Soviética só aumenta a vontade dos governos da Europa de
leste retirarem a importância a estes monumentos, ao mesmo tempo que
classificam a acção como uma “medida de segurança”.
O Presidente russo, os seus aliados e
os media estatais referem-se àquilo que chamam de “operação militar especial”
como uma forma
de desnazificar a Ucrânia e comparam
a recente invasão do país com a luta que foi travada contra os nazis nos anos
1940, refere um artigo na plataforma The Conversation. Nesta tentativa de
enaltecer os feitos e ignorar as atrocidades cometidas, Putin e os aliados
têm-se apropriado dos símbolos e memoriais soviéticos como forma de apoio ao
governo russo e à sua ofensiva sobre a Ucrânia, conforme acusam líderes e
autarcas nos bálticos.
Um destes exemplos é a fita
de São Jorge (com três riscas pretas e duas laranjas) que
fazia parte da decoração das fardas militares soviéticas e que se tornou um
símbolo dos veteranos da II Guerra Mundial. A fita era também usada durante as
homenagens aos soldados mortos. Mas desde a ocupação da Crimeia, a fita
passou significar o apoio da agressão russa contra a Ucrânia. Na
Lituânia, esta fita Georgiana foi proibida em espaços públicos e
alvo de punição, tal como a exibição de símbolos nazis ou outros
símbolos soviéticos.
Mudar a lei para cumprir a justiça
histórica e combater a desinformação
A
Convenção de Genebra determina a protecção dos restos daqueles que morreram
durante a guerra — qualquer
uma —, mas alguns países também assinaram com a União Soviética (e, por
legado, com a Rússia), acordos sobre a gestão das sepulturas de guerra e
outros monumentos. Dos três Estados Bálticos, a Letónia foi o único a
assinar este tipo de acordo bilateral, em 2007, mas nem isso impediu a mudança
da lei este ano.
A
invasão da Ucrânia tornou as coisas bastantes claras para o governo letão: “Ou
se está a favor do regime de Putin ou se está contra o regime de Putin”, disse Arvils Ašeradens, presidente da comissão
parlamentar que supervisiona a mudança da lei sobre os monumentos, sem dar margem a uma terceira hipótese. O respeito pelas vítimas da II Guerra Mundial é
universal, mas a
Letónia “não quer ter monumentos de propaganda que glorifiquem o Exército
Vermelho”, acrescentou
em entrevista ao canal Al Jazeera.
No
dia 12 de maio, o parlamento letão decidiu pela suspensão do artigo 13.º
do acordo entre o Governo da Federação Russa e o Governo da República da
Letónia que visava, por exemplo, garantir que a Letónia preservava os memoriais
soviéticos. A decisão entrou em vigor no dia 16 — e assim ficará até
que a Rússia abandone a ofensiva contra a Ucrânia. Mas logo no dia 13, o
município de Riga aprovava a demolição do monumento no Parque da Vitória.
Letónia. Nova
lei defende democracia e justiça histórica
Cerca
de um mês depois, o mesmo parlamento aprovou uma lei “sobre
a proibição
de exibir objectos que glorificam o regime soviético e nazi e o seu desmantelamento no território
da República da Letónia” — com excepção
daqueles localizados nos locais de enterro de soldados e vítimas —, conforme
comunicado no site oficial do Saeima. A lei quer
também “evitar coberturas falsas, imprecisas e tendenciosas de eventos
históricos”.
A
Lituânia não assinou nenhum acordo bilateral com a Rússia, mas a herança
cultural no território, que seja importante para outros Estados, é alvo de
legislação especial. No mesmo
país, uma outra lei proíbe desde 2008 o uso de símbolos comunistas, como a
foice e martelo, entre outra simbologia soviética.
Estes
dois princípios legais corriam o risco de representar decisões opostas sobre
uma mesma situação (o que chegou a acontecer), mas a nova proposta de lei
“sobre a proibição de promover regimes totalitários e autoritários e as suas
ideologias” pretende acabar com o problema.
A
lei não só pretende proibir símbolos e propaganda destes regimes, como impede
que pessoas que ocupam ou ocuparam cargos políticos, militares ou em estruturas
repressivas, usem o espaço público para promover estas ideologias, de
acordo com a LRT. As celebrações relacionadas com pessoas ou datas que remetam para a ocupação
soviética ou nazi também ficam proibidas.
A
informação não desaparecerá: vai continuar a estar presente nos museus,
arquivos e bibliotecas; vai ser usada para informar as pessoas sobre as
ideologias destes regimes e as consequências passadas, presentes e futuras; e
será, naturalmente, usada com objetivos educacionais, científicos e artísticos.
Nem
os acordos bilaterais previnem a destruição dos símbolos soviéticos
A
União Soviética assinou acordos bilaterais com vários países onde ficaram
enterrados os seus soldados e onde fez questão de glorificar a vitória
soviética sobre a Alemanha nazi, mas o tipo de acordos pode ser muito
diferente de país para país, explica Mischa Gabowitsch no seu artigo.
Na Polónia,
por exemplo, os municípios pediam à embaixada russa que assinasse uma
autorização de relocalização de qualquer monumento — mas só até 2015.
Desde a anexação da Crimeia, o Conselho para a Proteção dos Sítios de Luta e de
Martírio deixou de parte o seu papel de intermediário e disse que esta coordenação com as autoridades russas não era um
requisito legal exceto
para as sepulturas. Em 2016, a lei que proíbe a propaganda comunista foi
alterada para incluir os monumentos soviéticos.
Para
outros Estados tidos como sucessores do regime, incluindo a Ucrânia, Geórgia e
Usbequistão, terá ficado no ar a ideia de que não seriam precisos acordos de
proteção adicionais, descreve o historiador. E ainda foi preciso algum tempo
até se tornar claro que as atitudes face aos monumentos soviéticos poderiam ser
muito diferentes e altamente voláteis.
Para
a Ucrânia, as leis anti-comunismo em vigor desde 2015-2016 focaram-se
sobretudo nas estátuas dos líderes soviéticos, mais fáceis de interpretar como
símbolos da ocupação soviética. Os memoriais aos soldados mortos e as
sepulturas, por sua vez, tinham também soldados ucranianos que lutaram ao
lado dos russos e tornaram-se mais difíceis de eliminar — o que não quer dizer
que não tivessem sido alvo de remodelações e reinterpretações.
Mas a
mais impressionante — e mais trágica — destruição de um monumento soviético
aconteceu na Geórgia, a 19 de dezembro de 2009. O Presidente Mikheil
Saakashvili (de 2005 a 2013) num gesto simbólico de “de-sovietização” mandou
explodir o Monumento da Glória Militar em Kutaisi para aí construir um novo
parlamento. A explosão da estrutura de ferro de 40 metros lançou destroços por
centenas de metros, matando uma mulher e a filha e ferindo várias pessoas,
algumas com gravidade.
Dia da Vitória:
as 24 horas que separaram o ocidente da Rússia
Para os países da Europa de leste
poderem reescrever a sua história denunciando a ocupação soviética e deixando
de adorar os seus símbolos será preciso mais do que retirar estátuas e
monumentos ou mudar nomes de ruas e escolas, é preciso adotar outras medidas: chamar
II Guerra Mundial ao
conflito global dos anos 1940 e não “Grande Guerra Patriótica” como o
definia a União Soviética; e admitir que a guerra teve início quando a Alemanha
invadiu a Polónia a 1 de setembro de 1939.
A invasão que marca o início da
guerra aconteceu cerca de uma semana depois de assinado o pacto de não agressão
entre os ministros das Relações Externas da União Soviética, Vyacheslav
Molotov, e da Alemanha nazi, Joachim von Ribbentrop — um pacto com um
acordo secreto para dividir a Europa (e a Polónia) em dois, metade para
cada um dos Estados totalitários. A Rússia assinalou
o aniversário do tratado a 23 de agosto e voltou a omitir esta parte da história.
Por outro lado, os países da Europa
de leste também urgem os colegas da União Europeia a combaterem juntos a
tentativa da Rússia de reescrever a história e a desinformação e propaganda
russa nesse sentido. “A carta
conjunta sobre a memória europeia” foi assinada pelos Presidentes da Lituânia e Roménia e pelos
primeiros-ministros da Estónia, Letónia e Polónia.
"Precisamos fortalecer os esforços
no nível da UE para combater as tentativas da Rússia de reescrever a história e
usar as falsas narrativas imperialistas para legitimar sua guerra brutal contra
a Ucrânia."
Krišjānis
Kariņš, primeiro-ministro da Letónia
Outra
data que opõe a União Soviética (e agora a Rússia) aos restantes países
ocidentais é a que marca o fim da II Guerra Mundial e, como tal, o Dia da
Vitória dos aliados contra a Alemanha nazi.
Os nazis capitularam e a 7 de maio de 1945 assinaram um um “Acto de
Rendição Militar” incondicional e um cessar-fogo que entraria em vigor no final
do dia seguinte — 8 de maio, o Dia da Vitória no
ocidente — em Reims, na
França, como lembra a National Geographic.
Estaline,
no entanto, exigiu uma nova rendição em Berlim, na presença de
oficiais graduados tanto do lado nazi como do lado soviético, como aconteceu no
dia 8 (e o cessar-fogo no dia seguinte). É por isso que a comunidade
russófona celebra o dia 9 de maio como o Dia da Vitória — aliás, a
rendição de Reims só foi anunciada na URSS depois de conhecida a rendição de
Berlim.
Os
monumentos usados para celebrar a vitória soviética sobre o nazis no dia 9 de
maio são, muitas vezes, o palco dos confrontos entre os que falam em libertação
e os que dizem que foi o início da ocupação soviética nos países da Europa de
leste. Na Letónia, por exemplo, o dia deixou de ser celebrado oficialmente
com a declaração da independência.
Nos
quatro anos que se seguiram, de 1991
a 1994, o dia 9 de maio serviu para lembrar as vítimas da II
Guerra Mundial e fazia parte do calendário de feriados nacionais — mas
isso acabou. Desde 1995 que é celebrado o dia 8 de maio, “O Dia da
Destruição do Nazismo e o Dia das Vítimas da Segunda Guerra Mundial”. No ano seguinte, o dia 9 de maio passou a ser
celebrado com o Dia da Europa. A comunidade russófona, porém, nunca celebrou
este dia e continua a celebrar a Grande Vitória nos símbolos
soviéticos, como o
agora parcialmente destruído monumento do parque de Riga.
Na Lituânia, onde os soldados do
cemitério de Antakalnis eram o local de celebração soviético, o Dia da Vitória
passou a ser celebrado a 8 de maio, tal como nos restantes países da União Europeia. A
mudança aconteceu em 2005, um ano depois de os três Estados Bálticos se terem
juntado à UE.
GUERRA NA UCRÂNIA UCRÂNIA EUROPA MUNDO ESTÓNIA UNIÃO EUROPEIA LETÓNIA LITUÂNIA MONUMENTOS HISTÓRIA CULTURA UNIÃO SOVIÉTICA
COMENTÁRIOS:
Fernando Fernandes: Quem sofreu a violência do comunismo, não o quer, nem aos símbolos da foice
e martelo. Nós por cá até temos a "festa do avante" que glorifica
bovinamente a ideologia totalitária que mais mortos causou a toda a humanidade.
Condenamos o nazismo e aceitamos o comunismo. Até quando? Filipe Costa: Fazem bem, acabem com a URSS. João Eduardo Gata > Filipe Costa: URSS essa que afinal ainda vive na cabeça de Putin e do seu regime de
gangsters corruptos, imperialistas, criminosos e ladrões. Só quando os povos da
Rússia se sujeitarem a um processo de Des-sovietização, como a Alemanha se
sujeitou a um processo de Des-nazificação, é que a Rússia poderá vir a ser um
país normal.
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