E consciência crítica, é o que me parece
ser Alberto Gonçalves, que oxalá permaneça longos anos por estas “praias”, que
bem necessitam de inteligências assim, desassombradas - embora o nosso mal, sendo
de raiz, não apresente previsão de cura.
Bilionários, refugiados e psicopatas
Os virtuosos falam em “prioridades”. O
ideal talvez fosse estabelecer uma hierarquia de abertura de telejornais e
urgência em salvamentos de acordo com a declaração de rendimentos e escalões de
IRS.
ALBERTO GONÇALVES Colunista
do Observador
OBSERVADOR, 24
jun. 2023, 00:205
Antigamente, os exploradores do desconhecido e os conquistadores do
inútil eram heróis ou aparentados. De
Magalhães a Armstrong, de Colombo a Scott, de Cook a Hillary, as proezas desses
raros espécimes mereciam celebrações e os seus fracassos inspiravam lamentos. Até os
anónimos que não procuravam nada de partilhável e não encontraram nada excepto
a morte, como Everett
Ruess, Michael Rockefeller e, ainda há 30 anos, Chris McCandless, viram-se mitificados apenas porque arriscaram perder-se
e contribuir um bocadinho para o mistério que torna a nossa existência
interessante. Todos beneficiavam de privilégios. Nenhum foi
depreciado à conta disso, pelo menos à escala global e com um milésimo do fel
despejado sobre as vítimas do Titan.
As “redes sociais” ajudam. A cotação
do ódio, que está barato, também. Milhões
de indivíduos decidiram condenar a cobertura noticiosa e as buscas pelos cinco
“bilionários” que se enfiaram numa traquitana – desenvolvida sem apoio de
“tipos brancos de 50 anos”, que “não são inspiradores” – e desapareceram nas
profundezas geladas do Atlântico. Capricho de ricos, disse a sentença da
opinião pública, que aproveitou para fingir virtude e preocupação com os
refugiados que desaguam no Mediterrâneo e onde calha. Não
importa que ambas as realidades não sejam mutualmente exclusivas. Não importa
que os virtuosos não costumem acolher desgraçados em casa. Não importa que a
culpa pela miséria do Terceiro Mundo não caiba aos capitalistas que viajavam no
“submersível” mas aos regimes que os anti-capitalistas veneram. Não importa que o relevo concedido pelos “media” à
“elite” seja igualzinho ao que, para efeitos de sentimentalismo e audiências,
se concede a crianças sumidas, jovens encurralados e russos pobres e presos
noutro submarino. Importa que qualquer pretexto é um óptimo
pretexto para desfilar compaixão e berrar ressentimento.
O ressentimento é o verdadeiro motor da história da esquerda, a
esquerda de militância e a esquerda de coração. Se o sr. Saramago, exemplar
típico da seita, tinha por hábito velho manifestar-se contra os avanços na
pesquisa espacial, incluindo o programa Apolo e os “rovers” em Marte, não
custava imaginar o que inúmeros saramaguinhos fariam com os sujeitos que
pagaram 250 mil dólares a troco de uma viagem breve e um fluxo reforçado de
adrenalina: exactamente o que fizeram. Primeiro criticaram os gastos dos
sujeitos. Depois criticaram a despesa das tentativas de resgate. A seguir fabricaram
graçolas com a tragédia previsível e, entretanto, confirmada. Por fim, com a
alma em repouso, jantaram bem e beberam melhor, sem oferecer uma simples
garfada aos 10% da população mundial que não têm o que comer. Os virtuosos já
cumpriram a sua missão, que passa pela retórica grandiosa e não, até porque
estavam à mesa, por sujar as mãos com casos autênticos. Eles, convém relembrar,
não praticam a “caridadezinha”.
É
injusto acusar a esquerda de só desumanizar os ricos de modo a que, na boa
tradição dos totalitarismos, se defina
um inimigo exterminável: a esquerda desumaniza igualmente os miseráveis, que
reduz a uma abstracção instrumental e confortável. Os infortúnios dos ricos constituem um justo
castigo. Os infortúnios dos miseráveis
fornecem o que nas cabeças dessa gente se confunde com um excelente “argumento”
para legitimar o fanatismo. E para
odiar, embora essa gente prefira o verbo
“lutar”. O célebre leite da ternura não corre nas artérias dos virtuosos, mais
próximos da psicopatia que do seu, digamos, semelhante.
Os virtuosos falam em “prioridades”. O
ideal talvez fosse estabelecer uma hierarquia de abertura de telejornais e
urgência em salvamentos de acordo com a declaração de rendimentos e os escalões
de IRS. Em situação de desastres simultâneos, os “meios” disponíveis começariam
por auxiliar os imigrantes subsarianos sem rendimentos nem IRS. Prosseguiriam
no socorro aos usufrutuários do rendimento mínimo. Se sobrasse tempo, lá se
salvariam por desfastio os membros da classe média-alta, que em Portugal são os
que ganham 2 mil euros. Milionários, somente os que o são à custa de negociatas
com o PS. E bilionários, se tivéssemos algum, não teriam salvação possível,
assim na Terra como no Céu.
A propósito de bilionários, e dado que estamos em maré (desculpem)
de humor negro, era engraçado comparar as fortunas dos vilões do Titan com as
de tantos semideuses da esquerda conscienciosa, os abundantes tiranos latinos,
asiáticos e africanos que nunca deram um dinheirão para descer ao fundo do mar.
Em geral, os tiranos ocupam-se à superfície, a roubar e a matar de bala ou fome
os respectivos povos, cujos sobreviventes partem em fugas desesperadas rumo ao
capitalismo selvagem e egoísta. A natureza humana é insondável, mesmo com
sondas moderníssimas.
MILIONÁRIOS DINHEIRO ECONOMIA SOCIEDADE ACIDENTE TITANIC HISTÓRIA CULTURA COMPORTAMENTO REFUGIADOS MUNDO
COMENTÁRIOS
Pedro Gonçalves: Gostei do
artigo! O ponto mais relevante é mesmo o do aproveitamento de realidades que
não são exclusivas uma da outra para capitalizar o ódio, ou então se promoverem
como mais virtuosos. Agora Carlos
Alberto, só tem que esperar que personagens como Clara Ferreira Alves e Ricardo
Araújo Pereira, os verdadeiros campeões dos miseráveis, dos que não conseguem
pagar renda em Lx, dos que ganham mal, por se lhes assemelharem em estilo de
vida, venham também chamar-lhe nomes a si - em igualdade com os ricos!...e
ainda dizem que não há elevador social...na recepção de insultos, facilmente
passamos todos a ricos. Alexandre
Barreira: Pois. Caro AG. É isso mesmo. "estão
verdes....senhor"....!
Fernando Estêvão: Muito bem, caro Gonçalves. Os comentários dos tristes
sobre os “miseráveis ricos” são reveladores do nosso país socialista, e,
curiosamente, muita direita encostou-se a esta análise política. Sim, é uma
questão política. A raiva aos ricos é um dos pilares ideológicos da esquerda
“soviética” que defende a igualdade entre os homens também nas suas bolsas.
Portugal é um país socialista, mas, mais pela inveja do que pela ideologia. Ser
rico é o caminho para o inferno, porque todo o valor acrescentado deve ser
distribuído por aqueles que não têm capacidade de gerar valor e que afogam esta
frustração com minis nas esplanadas dos cafés. Ser rico é também uma aventura
que precisa de muita coragem, e, é por isso que muitos milionários são
aventureiros e se metem nestas viagens radicais. O funcionário público ou
funcionário de um notário não tem a coragem para deixar o estado ou o emprego
seguro e sair da sua zona de conforto para abrir um negócio. E se corre mal? É
preciso coragem para querer ser rico. Jorge Mendes, por exemplo, o empresário
de futebol, começou do nada e podia hoje estar atrás de um balcão de uma
repartição de finanças ou de uma conservatória, mas, teve coragem e
aventurou-se em querer ser rico. Foi corajoso, e a coragem que traz na vida não
é comparável àqueles que vivem no medo e criticam os “miseráveis ricos”. O medo
nunca levaria ninguém numa viagem ao espaço. Nunca poderiam ser ricos, porque,
o medo é um dos principais requisitos para a “miserável vida” sem a coragem de
mudar de ser aventureiro. Resumindo; a política, o sonhar e a coragem estão
muito subentendidas nas críticas que ouvimos nestes dias sobre os ricos das
aventuras no submergível.
Henrique Mota: Que pena não existirem mais “ Alberto’s Goncalves”
para denunciar esta pseudo esquerda que diz gostar tanto da humanidade , mas
que despreza o vizinho do lado se ele cheirar mal. Ainda ontem no Eixo do mal
se assisti ( parcialmente diga-se ) a um pranto de falsas carpideiras revelador
do mais perfeito cinismo . “ shame on them” servus inutilis:
buscas pelos?!
mas que raio de portinglês é este? Alexandre Barreira > servus inutilis: Pois. Depende dos "pelos". E da "busca"....!
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