segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Educação, precisa-se



E assim, sem isso, vamos resvalando na bestificação social, segundo a crónica grave e séria de Helena Matos, que os comentadores aplaudem, em idêntica preocupação. Mas não nos eximamos nós da culpa, a cobardia fazendo parte dos esquemas de actuação de todos nós, que cerramos os olhos.
O Processo de Grunhificação em Curso / premium
Algures entre chamar rei a Eusébio e sr. a Máŕio Coluna e guinchar diante de Marega, Portugal ajavardou. O PREC tornou-se no PGEC: Processo de Grunhificação em Curso. O amanhã que ia cantar é o hoje.
HELENA MATOS colunista do OBSERVADOR               OBSERVADOR, 23 fev 2020
Aqui fica o nosso Processo de Grunhificação em quatro passos.
1º passo: tudo é normal. Experimente-se segurar a porta de um centro comercial ou mais precisamente não repetir aquele gesto de a largar na cara de quem nos precede. Vale a pena a experiência: nem um obrigada. Passam e vão à vida e nós segurando na porta como se fôssemos uns porteiros invisíveis. Mas é normal, não é? E aquele carro mesmo ao nosso lado com o som no máximo? Não vamos dizer nada, pois não? Agora é assim, não é? Também vamos fazer de conta que somos transparentes quando viajamos de comboio e de repente um grupo entra e impõe as suas regras na carruagem: palavrões, pés nos assentos, encontrões… O melhor é mesmo fazer de conta que se estava a pensar sair na próxima estação. E até saímos, claro. Provavelmente é normal e mais normal ainda que aquelas crianças à porta da escola digam dois palavrões em cada três palavras. Ou até que insultem a professora que vai a passar (e faz de conta que não é nada com ela)… A normalização da boçalidade é fundamental num Processo de Grunhificação.
2º passo: a humanização. De repente os governantes estão aos pulos num qualquer estádio. Tem graça, não tem? Até parece que os humaniza! E os políticos que cozinham? E os que fazem de conta que são cabeleireiros? Ficam mais humanos, não é? O conceito de humanização usado nos processos de grunhificação nada tem a ver com humanismo mas sim com desresponsabilização. Um político não quer discutir o seu programa? Cozinha diante das câmaras ou pula nos estádios de futebol.
Quanto mais graves são os actos pelos quais os responsáveis devem prestar contas mais histriónicas são as performances da humanização e seus sucedâneos. Os portugueses morrem no meio do falhanço clamoroso do seu dito serviço de protecção civil? O PR muda de calções em público e vai nadar. Aprovam-se as 35 horas para a função pública sem fazer as contas ao impacto dessa medida no SNS? É a descrispação. A “humanização” e os seus superlativos “política dos afectos” e “descrispação” são os mecanismos através dos quais os responsáveis se desresponsabilizam fazendo de conta que têm responsabilidades idênticas aos demais cidadãos. Não é verdade, somos todos iguais e somos humanos mas temos responsabilidades diferentes. A encenação da humanização é uma forma de quem tem responsabilidades se desembararçar delas.
passo: o indignadismo. Porque é que uns factos geram ondas de indignação e outros igualmente graves passam de forma quase incógnita? Lembram-se quando as gravuras de Foz Côa não sabiam nadar e a barragem teve de ser interrompida? Agora para o aeroporto ser construído no Montijo não só os pássaros vão aprender outras rotas como o governo anuncia que se prepara para mudar a lei que obriga a que o aeroporto seja aprovado por todos os municípios abrangidos pela infraestrutura! E quando a notícia de que alguém morrera numa ambulância era suficiente para pedir a cabeça do ministro da Saúde? Agora morre-se nas urgências – naquelas que funcionam – à espera de consulta e a ministra sorri. O que mudou? A área política do governo. O monopólio da indignação está à esquerda e esta defende ferreamente o seu monopólio: não só gere com perícia as sucessivas indignações ou a falta delas como, não menos importante, define claramente o que pode ser ou não motivo de indignação: por exemplo, as agressões a polícias são recebidas num silêncio que contrasta com o ruído gerado pela mais simples suspeita de que as forças de segurança não procederam de forma correcta. O indignadismo selectivo mantém a sociedade num estado de frenesim constante, impedindo-a de parar para pensar. Não há PGEC sem indignadismo.
4º passo: o excepcionalismo. Digamos que a coisa foi mais ou menos assim: as excepções começaram por confirmar as regras. Depois as excepções passaram a valer tanto quanto as regras. Agora as excepções ditam as regras. A legitimar este absurdo em que os casos particulares ditam as leis gerais temos o culto das sempre particulares circunstâncias de um eu cuja felicidade implica invariavelmente que legitimemos o que sabemos trazer mais problemas que aqueles que vai resolver: é a mulher cuja felicidade passa por ser mãe e para ela ser mãe temos de aceitar que seja inseminada com o esperma do marido morto; é o casal que quer ter uma criança com material genético seu e como tal acha que pode encomendar uma criança a outra mulher, é a família que acha que o seu parente em estado vegetativo preferia morrer a estar assim (sim, achar que a Fátima quereria certamente morrer não nos pode autorizar a matá-la, não apenas por ela mas sobretudo pelas pessoas a quem esse argumentário poderia ser aplicado)… Individualmente todos estes “eus” estão cheios de razão mas pela mesma razão que não podemos tolerar que o pai a quem torturaram ou mataram um filho faça justiça por conta própria (não é que não tenha razões, não é até que não pensemos que faríamos o mesmo) não podemos aceitar que o sofrimento de cada um legitime a barbárie de um mundo em que o bem comum foi sacrificado à ditadura dos egos. Ou mais precisamente de alguns egos.
No fim acabamos tolerando o que acreditávamos intolerável. Calando o que nos indignava. Pactuando com o que sabemos ser um crime. O Processo de Grunhificação acontece muito rapidamente. Recuperar dele é que demora tempo.
COMENTÁRIOS
Maria L Gingeira: O relativismo é a ameaça que tudo levava a crer nos iria perturbar e confundir neste século. Porque a ética é o factor que verdadeiramente caracteriza e distingue os tempos e os povos. Sem ética vamo-nos transformando em gente para quem tanto faz e que vive ao Deus dará. Uns porque desistem, outros porque manipulam.
manel buiça: Há muito que não visitava o Observador. E a HM e o AG, entre alguns poucos outros opinadores, constituiam a única razão para ter assinado, só um ano, esta pífia promessa de um jornalismo diferente e alternativo. Desisti porque não dá para aturar este censor dos comentários e esta falta de rigor e seriedade do restante jornalismo geral,  que virou à esquerda e se mantém vassalo do politicamente correcto. Uma desilusão. Mas, pelo que leio nesta caixa de comentários, os comentários continuam agressivamente sob ataque de um censor qualquer, informático e humano, a afastar leiitores e assinantes. A cegueira e a burrice mantém-se, portanto,  iguais.  Toda razao HM. Basta olhar para as 3 primeiras figuras que representam este Estado corrupto e este regime podre e decadente. Está lá todo o processo de que fala. Até ao tutano desta moribunda falsa Democracia. 
José Ramos: O artigo de Alberto Gonçalves, de ontem, e este artigo de Helena Matos, de hoje, são a maior homenagem que se podia fazer à memória de Vasco Pulido Valente. Estes dois artigos valem mais que muitas comendas e medalhas porque são sérios. Já as medalhas, sobretudo depois do processo de "caricazação"(*) concluído, não o são.
Carlitos Sousa: A Helena Matos está cheia de razão na sua denuncia. Quando um grunho, para ultrapassar um obstáculo legal, afirma que solução é alterar a Lei (que foi aprovada pelo PS), batemos no fundo. Depois admirem-se que uma grande percentagem de votantes digam CHEGA.
Catarina Alves Análise soberba Helena. Nos tempos que correm, a sua magnífica conclusão não pode, porém, ser aceite como correcta! O que objectivamente é não é nem pode ser ! Não se trata nada da óbvia grunhificação que identifica. Nada disso. Trata-se, sim, de um novo estádio superior de evolução civilizacional ! Deixando para trás as medonhas, obscurantistas e, mais do que tudo, claro, intolerantes, permissas éticas e culturais que conduziram a civilização ocidental ás trevas grotescas em que nos encontrávamos até agora. Felizmente chegou o progressismos marxista, e o seu gémeo liberalismo-eutanasista, para nos libertarem das trevas e sobre nós generosamente derramarem a luz do progresso, da justiça social e ambiental, da civilização e da grande educação do pensamento e da palavra, que, por manifesto lapso, identifica como grunhificação. Se ainda a deixarem escrever e publicar, para a semana cá estaremos. Bem haja.
António Coimbra: Adoro ler os seus artigos e a forma, por vezes caustica, com que descreve as situações, até parece estarmos a ver um filme. Na verdade o 25A foi importante para o país, até porque aconteceu e não há Nada a fazer, contudo não era necessário ter destruído toda a instituição de Boa Educação, Respeito e Autoridade, criando-se uma libertinagem, apelidada de liberdade individual, que pode em todo o momento passar por cima dos outros e ofende-los, sem olhar a meios. Continue a escrever desta forma e a colocar o dedo na ferida da libertinagem e impunidade política que se vive neste nosso pais.
aac 666 : Excelente mais mulheres assim
Jorge Maria Soares Lopes de Carvalho Obrigado Helena por esta sarcástica selfie deste PGEC conduzido pelos esquerdosos e sua guarda pretoriana da “comunicação social” lambe botas de seus chefes supremos na desconstrução da nossa querida Pátria. Morte aos renegados!
Ping PongYang: Tenho que admitir que nutro uma certa simpatia pelo grunhus portucalensis. O grunho não nasce grunho nem escolhe ser grunho: é vítima dum ambiente desestruturado em tenra idade, passa completamente "ao lado" do sistema educativo e de saúde (mental), não desenvolve empatia nem camaradagem, falha miseravelmente na carreira
Joaquim Moreira: Este Processo de Grunhificação em Curso ou PGEC (ou seja o PREC aburguesado pela esquerda que pronuncia mal os "R"), é o retrato muito fiel, de uma sociedade que já teve uma formação de Quartel. Passamos do "respeitinho é muito bonito" do passado,à situação em que o grunho é que é o "bem educado". Não admira, por isso, que a grunhificação em curso, seja um processo bem pensado. Pela esquerda e pela sua extrema, que foi acolhida por uma certa direita, por cobardia e medo dessa seita. Não é por acaso que defendo os que, dizendo que não são de direita, nunca em tempo algum aceitam fazer parte da dita seita. Porque, não tenhamos ilusões, pior que ser do centro, é ser dessa direita que não tem nada dentro. Só tenho pena que a guerra entre essa direita e o centro, esqueça de que o mais importante, no momento actual: dar combate a esta esquerdalha que quer Grunhificar Portugal. 
Vicente Évora > Joaquim Moreira: Parabéns pelo seu comentário. Concordo com tudo quanto certeiramente diz a propósito da "certa direita" e da sua ignóbil posição. Não posso porém aceitar o salto que daí dá, sem fundamento factual, para apoiar aquele que "diz não ser de direita". Como sempre, as acções e os factos falam por si e são para mim o único critério que valorizo. Assim, a verdade histórica, nua e crua, que nem mesmo a argúcia argumentativa com que o meu caro aqui nos brinda pode ultrapassar, é que o que "diz não ser de direita" vota na AR, com a esquerda, a sua extrema e a "certa direita", a favor da grunhificação de Portugal. Processo que, hoje por hoje, se encontra já quase totalmente consolidado.
Urubu Mouche: O PGEC: Processo de Grunhificação em Curso, assim baptizado pela Helena Matos define com acutilância retrato fiel de um “povo de merda” … como lhe chamou Lobo Antunes. Aliás, já em 1886, Guerra Junqueira se referia à nossa gente como: " Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas..."Vejam lá se estes ingredientes não são os mais apetecidos para repasto dos políticos corruptos … mais de toda a “ladroagem” que por aí anda a meter as mãos nos bolsos alheios !!!
Maria Nunes: Excelente artigo de HM. Pergunto a mim própria, o que virá a seguir?
Rui Guimarães: E muitos mais exemplos se poderiam juntar. Por estes e por outros, é que um homem íntegro, educado e civilizado, foi afastado para dar lugar aos grunhos. A cereja no topo do bolo, foi a eleição do actual Presidente que, para nossa desgraça, ameaça prolongar-se.
José Montargil: Excelente artigo. Concordo com tudo, Já passei por experiências semelhantes como julgo que à maioria das pessoas também lhes aconteceu. O dia-a-dia destas coisas é habitual e por isso tapo os olhos fecho a boca e ponho algodões nos ouvidos como o macaco. Torna-se um acto de cobardia colectivo. Fazemos de conta que nada se passa que o mundo continua igual conforme Deus o criou. O que lemos nos jornais e ouvimos nas televisões é chumbado, é chinês, fazemos de conta que não existe. Eu, por ex, vejo as notícias na TV de Espanha, leio jornais estrangeiros e vivo num mundo de problemas que não me atingem tão directamente. É uma fuga, eu sei, uma maneira de não querermos enfrentar esses problemas, mas se tudo à minha volta se está a tornar intolerável, sem escapatória, como um alien no meio disto tudo que fazer para não dar em doido?
Domingas Coutinho: H.M. tocou na ferida. Ainda esta noite houve um brutal acidente na segunda circular porque uns jovens andavam a brincar as corridas a alta velocidade e a seguir como se não bastasse o problema causado pelo acidente e consequente limpeza da via, uns pais e familiares ou amigos foram para lá causar ainda mais confusão e claro toda a gente teve de aguentar. Isto é mais uma das provas do caos em que se tornou o País.
Rui Lima: O povo nunca se eleva ao padrão do seu melhores mas quando quem nos governa são os piores da turma . Teremos sociedades cada vez menos tolerantes a nossa coexistência era baseada na confiança mútua , não serão leis nem polícias ou tribunais que farão as sociedades melhores.
MCMCA A: Parabéns HM e continue assim. Quando num país as leis se baseiam em casos individuais, seja na morte ou na construção de um aeroporto, e não em valores de um colectivo passamos a viver na barbárie dos interesses individuais que relegam para segundo plano os interesses colectivos. Estranhamente é a esquerda do Bloco Estouvado que afirmando-se colectivista se empenha num frenesim a esbulhar as leis baseadas nos valores colectivos para introduzir as leis baseadas no egoísmo individual. De facto, ao contrário da velha Albion ninguém nos segura a porta, como ninguém dá o seu lugar a um idoso ou uma grávida com uma criança ao colo: somos todos iguais na imbecilidade com que o ensino e a TV educaram as últimas gerações de Portugueses e no modo como os nossos representantes banalizaram as suas idas às latrinas de consumo, tudo em nome do seu supremo egoísmo vulgo conquista de simpatia e votos.  Cecil Rodhes dizia dos portugueses que nunca se conseguiam impor porque não se sabiam dar ao respeito com os de baixo, e isso manifesta-se na arrogância com que os de baixo olham os outros. Sim, enquanto nos tempos idos o Eusébio era rei e não se chamava F daquela senhora a um agente da autoridade hoje o insulto é o verbo e quanto mais ferir mais feliz se sentem porque a sua baixa auto-estima assim o exige. Quando um estado não reconhece o mérito individual a bestialidade colectiva vence.
Liberal Impenitente: Ainda não largou completamente a eutanásia, a Helena Matos, mas faria bem se o fizesse. Tem bastante razão na sua descrição do PGEC, mas não fala nas consequências políticas do PGEC. Um dia um vivaço aparece a gritar "vergonha, vergonha, eu assim, eu assado", e muita gente, cansada de grunhice, vai atrás do vivaço, não percebendo que está apenas a completar o PGEC: com um Estado de grunhos!


Nenhum comentário: