segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

São esses que contam



Porque os bons serviços, como o que este texto de Salles da Fonseca implica, de alertar para as consciências dos políticos e dos portugueses autênticos, esses não contam. O país e o seu governo estão-se borrifando para a correcção linguística, continuando a ajavardar a língua, com os seus “há anos atrás e companhia, que nos põem no rubro do nosso espanto indignado, jamais desfeito, pese embora tudo o que de positivo se faz por cá, entre cujas obras sobressai o programa dos “got talent Portugal”, mau grado certas escorregadelas gramaticais como o “houveram” de um verbo outrora impessoal, o pobre, embora estes exemplos não façam parte do AO90, é claro, pois não têm a ver com ortografia. Têm, sim, a ver com boçalidade de que trata Salles da Fonseca, ou incultura, pois são erros de palmatória, sintomáticos deste nosso «país a “entristecer”» cada vez mais, se não se atalha.

HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 17.02.20
O Acordo Ortográfico de 1990 cabimenta aquilo a que antigamente chamávamos erros de ortografia, privilegia a fonia e ignora a etimologia. Ou seja, numa penada, a língua portuguesa perdeu o seu carácter maioritariamente erudito e transformou-se numa forma de expressão da boçalidade de caipiras, jagunços e outros iletrados. Claramente, o tão medíocre «nivelar por baixo».
Nestes últimos dois séculos, as tentativas de aproximação da nossa escrita à fonia são tão antigas quanto António Feliciano de Castilho cuja proposta «viu»[i] chumbada por quem então tinha poderes para decidir sobre esse tipo de matérias.
Muito mais recentemente, foi o brasileiro Paulo Freire que preferiu combater o flagelo do analfabetismo adulto por uma via de escrita fónica que os destinatários conseguissem entender, ou seja, uma forma despojada da erudição que os sertanejos não conseguiriam absorver.
Pessoalmente, aceito o método fónico como transitório, destinado a uma classe etária já avançada que não criará raízes nas normas oficiais mas que passa assim a ter um meio de comunicação de que anteriormente não dispunha. Contudo, se essa escrita fónica me parece aceitável quando dirigida aos mais velhos, já não a tenho como aceitável junto das crianças.
Foi precisamente o contrário que aconteceu em Portugal: nós, os adultos, preferimos usar a forma erudita e às crianças foi imposta a boçalidade.
Claramente, um mau serviço prestado à Nação.
Fevereiro de 2020                          
Henrique Salles da Fonseca
[i] - Castilho era cego


COMENTÁRIOS:
Francisco G. de Amorim, 17.02.2020: O trivial são governantes bocais.


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