terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

Somos demasiado brincalhões


Para que surtam efeito estas lições magistrais, da pena de Jaime Nogueira Pinto, que, devendo salientar-se no processo, se limita a expor um pensamento rico de conteúdo, mas já nulo em eficácia.
 Sinais do tempo /premium
O tempo não é de guerra político-partidária. Para as não-esquerdas e para as direitas o tempo é de contra-cultura, de guerra cultural, aquela que sempre prepara o terreno para as grandes transformações.
JAIME NOGUEIRA  PINTO   OBSERVADOR, 31 JAN 2020, 00:1435
São pequenos sinais mas são significativos. A eleição de deputados pelo Chega e pela Iniciativa Liberal e agora a vitória de Francisco Rodrigues dos Santos no Congresso do CDS marcam a quebra de alguns tabus na vida partidária portuguesa e a hipotética chegada de alternativas. Ou a tímida chegada a Portugal de um tempo em que a direita e as direitas deixam de ser definidas pela negativa, como a não-esquerda.
O modelo de combate é agora cultural, gramsciano, já não é leninista; até porque a luta política deixou de ser um capítulo da luta armada, da “guerra civil europeia” inaugurada há um século pela revolução bolchevique, que gerou as respostas do fascismo italiano e depois do hitlerismo alemão – ou as intervenções e ditaduras militares na Península, nos Balcãs e na Europa Oriental.
E nesse modelo de combate, as várias esquerdas da Europa e dos Estados Unidos ainda dominam, porque souberam criar bases na Academia, nos media e nas burocracias culturais de distribuição de ideias, princípios e recursos. E induziram uma espécie de monopólio ou ditadura intelectual que, sob a aparência de uma singularidade convergente de opiniões, ou até de “contra-cultura”, afina, na verdade, por um diapasão certificado, que entretanto se tornou hegemónico e abertamente moralista e inquisitorial, com o policiamento do pensamento e do vocabulário, a intimidação dissuasora, a cooptação e marginalização de amigos ou inimigos destinados ao céu ou ao inferno, à fama ou ao opróbrio. Os processos não são sequer subtis, mas como são usados com permanência e persistência sistémicas, cansam e dissuadem os adversários ou os não-alinhados.
Em Portugal, a esquerda histórica criou uma “lenda negra” à volta do Estado Novo e branqueou a República dos Democráticos; e, além de se atribuir o monopólio da inteligência, incutiu na Terceira República, fundada em Abril de 74, um controlo ideológico regulado pelo Pacto MFA-Partidos, que foi um prólogo pretoriano à Constituição de 1976. E como Deus-Pátria-Família era a trilogia do “fascismo-salazarismo”, passou a ideia de que, em democracia, os valores religiosos, patrióticos e familiares não podiam nem deviam constar dos ideários políticos.
E foi de tal modo assim que os partidos à direita do PS acabaram por adoptar uma semântica de prudência e autocontrole, e a metade do país que não era de esquerda mas que também não se revia nos “centros” do compromisso histórico do regime foi votando resignadamente nesses centros como “mal menor”, ou foi ficando em casa, contribuindo para os lusos records de abstenção eleitoral.
A única reacção anti-esquerdista tolerada aconteceu na economia; e assim se deu a amálgama entre “a direita” e “os liberais”. Por isso, porque os valores políticos nacionais, os valores sociais conservadores, os valores de uma economia social de mercado estavam banidos e eram, para os “mandarins” da Academia e dos media, uma anomalia perigosa ou o “fascismo a espreitar”, em Portugal nada de novo aconteceu no campo político-partidário. E isto numa democracia estabilizada e num tempo de renovação e transformação do tecido partidário europeu e de revivalismo nacional.
É essa ditadura intelectual e moral que, na teoria gramsciana, modela o Zeitgeist cultural, que está, pela primeira vez, a ser contestada. Dois casos a eleição de André Ventura e a escolha do 28º Congresso do CDS no fim-de-semana de 25-26 de Janeiro – marcam essa ruptura com as ditaduras do “consenso anti-fascista” e do progressismo civilizacional decadentista. André Ventura e Francisco Rodrigues dos Santos são as caras dessa mudança.
Embora se possa pensar que, tanto para o Chega como para o Centro Democrático Social, o triunfo de João Almeida, o candidato dos “notáveis” e da continuidade centrista, tivesse sido melhor para efeitos de contraste e de escaramuça política, no que nos deve interessar, que é a criação de um movimento nacional amplo que junte as várias direitas, este quadro é o mais favorável. O terreno das ideias e dos princípios alternativos a uma esquerda dominante há já quase meio século é suficientemente vasto para que estas direitas tenham por onde crescer e se multiplicar – ideologicamente, sociologicamente e politicamente – sem terem de se hostilizar na disputa por fatias do eleitorado. Até porque, com a linha de renovação nacional-conservadora que agora saiu vencedora do Congresso, a sua tradição e os seus quadros, o CDS pode bem reconquistar o seu eleitorado tradicional e crescer para os sectores conservadores da classe média; e o Chega, ocupar o espaço de um nacionalismo mais popular ou populista, na linha dos partidos da nova direita francesa, italiana e espanhola.E se em Portugal não existem, por agora, comunidades migrantes culturalmente hostis com minorias agressivas, como em França, ou problemas de separatismo que ponham em questão a união do Estado, como em Espanha, existem dois campos de combate e de alternativa: uma corrupção endémica, quer de cumplicidade pelo encobrimento, quer por acção directa; e uma agenda baseada em ideias delirantes e desfasadas do país e da realidade sobre a natureza do homem e da sociedade, com consequências catastróficas para o presente e para o futuro. Ideias simplistas que muitos nos querem impor como “cientificamente comprovadas” ou como inevitáveis passos na “marcha do progresso”.
O tempo não é, assim, de mera guerra político-partidária. Foi nos “salões” do iluminismo francês que se forjou o espírito da Revolução e nos “think tanks” americanos que se abriram caminhos para a revolução conservadora dos anos 80. O tempo, para as não-esquerdas e para as direitas, é de contra-cultura, de guerra cultural, a guerra que sempre prepara o terreno para as grandes transformações. As suas munições são outras, os seus quartéis também, e os seus líderes e fileiras não podem perder-se em escaramuças pessoais.35
Jaime Nogueira Pinto          A SEXTA COLUNA   CRÓNICA   OBSERVADOR
COMENTÁRIOS
Maria Emília Ranhada Santos: A diferença entre André e Francisco, sendo os dois jovens, é a frontalidade! O discurso de Ventura é sempre frontal e transparente, e as medidas do seu partido, são as que fazem a diferença total entre a esquerda e a direita. Já Francisco, na mini-entrevista, não teve coragem para se declarar contra o aborto, como um crime! Os portugueses esperam dos novos políticos esta confirmação da defesa da vida humana em vez da obsessiva preocupação com os cães e gatos. As pessoas sabem cuidar dos seus animais, não precisamos de ocupar espaço legislativo com futilidades. Substituir os temas fundamentais por banalidades, significa não saber governar.
Francisco Lobo de Vasconcellos: Excelente análise, mais uma vez. O que se tem passado é um enorme abandono da participação dos que se identificam com a "direita" (em todos os seus matizes)  ou num conservadorismo (na linha do pensamento de Roger Scruton) na vida pública, na sociedade civil e acima de tudo, nos media. Seria interessante reflectir sobre isso: medo?, desencanto?, desinteresse?...se uns desistem, outros ocupam o lugar.
Daniel Morgado: O Jaime identifica aqui na perfeição o cenário hodierno onde se joga a salvaguarda da nossa liberdade. Sendo um facto incontestável que estamos a chegar a esta nova luta com décadas de atraso — o totalitarismo, na sua veste gramsciana, refugiou-se neste novo teatro operações logo após o derrota definitiva do estalinismo —  pergunto : como foi possível a tanta gente estar distraída, ao mesmo tempo, durante todo este tempo, permitindo que se atingisse um ponto tal, que só como de verdadeira asfixia, muito próximo da capitulação, pode ser descrito ? Um outro aspecto carecido de urgente reflexão e intervenção situa-se no domínio tecnológico. Em duas facetas diferentes mas complementares. A primeira prende-se com as chamadas "social media". Campos de batalha onde exércitos de totalitaristas têm logrado estabelecer um devastador império de terror. Cujas vítimas são diárias e incontáveis. Centrando-se o outro esteio do terror, de todos o mais nocívo, nas grandes empresas tecnológicas americanas. Domínios do mais absoluto marxismo cultural e centros da sua irradiação com uma amplitude demolidora.
Joao Moreno:  É sempre um prazer ler os artigos do Professor Nogueira Pinto. 
Oliver Klein: Cultura… Eis a dimensão que à direita moderna sempre foi avara ou mesmo ausente, nas palavras lúcidas de Raymond Aron...
antonyo antonyo: Completamente de acordo.
Luís Martins: A mudança, a acontecer, levará muito tempo. A esquerda tem a enorme vantagem de ter imposto os seus dogmas pela força das armas, num golpe militar. Como libertar o espaço mediático desta ditadura da esquerda? Como libertar o "contribuinte" deste estado de servidão-escravatura a que a esquerda o sujeita (a troco de miséria!)? Como libertar a escola pública do espartilho que condiciona o potencial criativo e a coragem de assumir o risco? Como mudar se o debate é proibido-condicionado?
Jorge Maria Soares Lopes de Carvalho: Obrigado cá estaremos presentes mais uma vez na batalha contra os renegados canhestros e seus lacaios da descomunicação insocial. Viva Portugal
Adelino Lopes: Perspectiva interessante. Mas, (existe sempre um mas) eu sou dos que acredita que sociologicamente o povo Português é socialista. Sente-se mais confortável numa estrutura centralizada no estado. Até pode jogar aqui e ali no risco, mas iniciativa consistente quase não existe e a inteligência fica guardada para o chico-espertismo. Pense bem, quais foram as individualidades (de 2019) mais admiradas neste país. Consegue mencionar alguém com iniciativa empresarial? Só música, futebol, políticos, advogados, Rui’s Pinto, etc, não é? Portanto ….
Carlitos Sousa > Adelino Lopes: Pelos votos escrutinados, é verdade que o país é socialista. Mas se pensarmos que há quase 50% de abstencionistas, acreditando que a grande maioria será eleitorado não fidelizado ou da direita desiludida e descrente; verificando que no passado já houve várias maiorias de direita, e até presidenciais, não me surpreenderia uma grande reviravolta.
Luís Martins > Adelino Lopes: Sociologicamente o povo português está manietado desde há 50 anos
antonyo antonyo > Adelino Lopes: houve e há uma lavagem ao cérebro
Carlitos Sousa: Muito bom!!  A chamada de atenção oportuna, para a pequena picardia entre André e Chicão, que não precisam disputar o “mesmo” eleitorado, mas eleitorado distinto da direita. Assim como o PSD.  Ao contrário do que tenho lido a vários colunistas do Observador, em vez de criticar 3 dos 4 partidos não esquerdistas em favor do outro, Jaime Nogueira Pinto apela à conjugação de esforços para abranger o maior leque de opções políticas no centro direita.  A direita só volta a ser poder se somar uma maioria de votos. Muito bem.
António Sennfelt: Curiosa, e simultaneamente muito reveladora, a ausência de qualquer menção ao IL!
Vitor Batista > António Sennfelt: Faz parte das mesmas direitas que ele menciona.
Maria Nunes: Excelente como sempre. 
Combate aos BURROS e ANALFABETOS do Observador: Jaime Nogueira Pinto, Não é a mudança de líder do CDS ou a eleição de André Ventura em Lisboa, que matematicamente só aconteceu porque o número de deputados naquele círculo eleitoral passou de 47 para 48 e ele foi o último a entrar para a AR, que vai mudar o que quer que seja. O problema do PSD e do CDS é que o seu espaço político foi ocupado pelo PS, bastando para isso olhar para as políticas económicas propostas por cada um: quem quis dar mais aos professores ou agora quer dar mais na redução do IVA da electricidade? O PS? Não. O PSD e o CDS. O verdadeiro partido de Centro em Portugal em termos de política económica e financeira (rigor nas contas públicas, enorme credibilidade nos mercados internacionais de dívida e controlo do défice orçamental) passou a ser o PS que em termos de política económico-financeira foi capaz de concretizar o que PSD e CDS sempre sonharam (desde os tempos do Professor Cavaco Silva - lembra-se dos seus défices orçamentais superiores a seis por cento do PIB?) mas nunca foram capazes de implementar.
Manuel Barradas: Claro, oportuno e firme !
Pedro Santos da Cunha: Jaime . Mais uma vez muitos Parabéns pelo teu artigo. Grande Abraço Amigo! Pedro
António Marques Mendes: Esta conjugação das direitas reaccionárias defendida pelo autor é uma espécie de ancien régime que continuaria a atrofiar o país. Partidos como o PSD, IL e CDS? precisam de se mobilizar para erguer as bandeiras da direita moderna e progressista e isso também passa por se demarcar da direita reaccionária.
Ana Ferreira: Precisamente pelas razões aqui elencadas por JNP, é absolutamente imprescindível um PSD claramente da Direita conservadora tradicional, o que, tudo indica, parece ser o objectivo do pragmático Rui Rio!
Rui Delvas > Ana Ferreira: Tudo o que o RR não é, já que se situa claramente no podre centrão.
Luís Martins > Ana Ferreira: RR já disse e repetiu várias vezes que não é de direita
Sound Garden  > Ana Ferreira; O PSD nunca vai ser de Direita. Não existe isso na Social Democracia, muito menos conservador. A social democracia é centro esquerda, aqui e em qualquer parte do Mundo. O único partido que teve essa oportunidade durante estes 45 anos depois do 25 de Abril foi o CDS e nunca quis ocupar esse lugar, por isso, o único que é de Direita Conservadora e ao tem medo de o assumir é o CHEGA.
antonyo antonyo > Luís Martins:  Infelizmente 
victor guerra: Felizmente que há mudanças. Pequeníssimas, em relação ao que este país e a sua podridão bafienta precisaria. E ainda virão mais mudanças, mas de fora, impostas pelos tempos e pelos credores- Se querem vencer esse combate, não se esqueçam também de comprar uns tantos jornalistas. Mas para isso é preciso dinheiro.
O Famoso Faisão: Olho por olho dente por dente.... A esquerda tem este ascendente sobre nós todos porque ninguém lhe fez frente por medo. O CDS já morreu, pois teve o tempo para mostrar os dentes e colocou o rabo entre as pernas. O pussy que foi eleito este fim de semana vai servir apenas para fechar a água, desligar a luz e fechar a porta. O tempo agora é do Ventura....
Luís Rodrigues: Artigo lúcido, que em particular explica por que Rui Ramos não tem razão na sua crónica de hoje.
MCMCA Utilizador Removido: Diga antes uma direita covarde
Pedro Ferreira: Excelente artigo, doutrina da boa. Parabéns!
Sound Garden: Eu não acredito no CDS, nem no líder do CDS. O CDS é um partido do sistema, já o é desde a sua fundação e não é agora que vai mudar. O tempo agora é do CHEGA. André Ventura está a mostrar uma dignidade incrível, está a demonstrar um sentido de responsabilidade enorme. Vejo o André Ventura como Primeiro Ministro e a representar muitíssimo bem Portugal e o povo português dentro e fora do pais.
José Alves: Excelente texto. Primeiro ganha-se o combate das ideias e só depois se ganham eleições e o poder sustentado para as aplicar. Cumprimentos.

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