Que naturalmente provocou as reacções
previstas, em inúmeros comentários, de contestação à sua doutrinação radicalmente
conservadora. Mas o P. Gonçalo Portocarrero
de Almada sabia ao que se arriscava e não se importa com ataques
e ironias dos que habitualmente cospem nos valores que ele defende, como o seu
Cristo também sofrera, embora por outras causas.
Crónica de um país alienado /premium
Os velhos não contam, os doentes que
aguardam uma cirurgia urgente também não. Os profissionais de saúde e os
bombeiros também não interessam nem preocupam os deputados, nem os governantes.
P. GONÇALO PORTOCARRERO DE ALMADA
OBSERVADOR, 22 ago 2020
Parece mentira, mas é verdade: pela
resolução nº 69/2020, aprovada a 10 de Julho e publicada no Diário da República
nº 154/2020, Série I, de 2020-08-10, a Assembleia da República “recomenda ao Governo o apoio às
associações e colectivos de pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis,
transexuais, transgéneros e intersexuais no âmbito da crise pandémica”. Não só se exige que se “garanta o
financiamento” dessas entidades, “enquanto se manifestarem os efeitos da crise
sanitária, social e económica” (nº 1), mas também se “amplie, ao abrigo de
protocolos a celebrar com as associações e colectivos LGBTI, programas de
sensibilização, informação e combate às discriminações, priorizando temáticas
LGBTI” (nº 3)!
Apesar
das estatísticas oficiais sobre a pandemia só referirem óbitos de homens e
mulheres – o que é estranho, havendo, segundo dizem, tantos géneros … –
o Parlamento entende prioritário o apoio às “associações
e colectivos de pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais,
transgéneros e intersexuais”, não obstante a sua aparente imunidade ao vírus. Já lá vai o tempo em que a esquerda se ocupava
das causas sociais, porque agora, como se vê, dedica-se a questões marginais.
Com
certeza que as pessoas – não as ‘associações e colectivos’ que, à sua conta,
vivem da subsidiodependência – que
sofrem qualquer disforia de género, merecem toda a consideração e respeito e
devem ser apoiadas pelo Estado, mas não de uma forma que obviamente as
discrimina, esquece os mais necessitados e ofende o princípio constitucional da
igualdade.
Como,
na primeira página do Público do passado dia 17 se noticiava, “mais
de 40% dos doentes esperam por uma cirurgia já fora do prazo aceitável”, ao mesmo tempo que se recordava que
“há 242 mil doentes na lista de espera para cirurgia, dos quais cem mil viram
ultrapassado o prazo recomendado para a sua patologia”. Devido a este
monumental atraso, os “Hospitais já emitiram mais de 143 mil vales-cirurgias”. Esta é, infelizmente, a crónica de um país
adiado.
Não
é menos preocupante a situação das pessoas internadas nos lares, de que o caso
de Reguengos de Monsaraz é tristíssimo exemplo. Foi com consternação que o país
se inteirou das 18 vítimas mortais, mas foi com ainda maior estupefacção que
soube que o Governo, ao contrário do Presidente da República, nem sequer leu
todos os relatórios sobre esta tragédia, que deixou o país perplexo e
amargurado.
Na
mesma edição do Público, Stefano Scarpetta, director da OCDE para os assuntos laborais,
recomenda o que, afinal, é uma medida do mais elementar bom-senso: “sectores
ainda muito afectados têm de continuar a ser apoiados”.
Tendo em conta a enorme crise social e laboral provocada pela pandemia,
Scarpetta entende que “no curto prazo, o que se pode tentar é
fazer garantir que estas pessoas recebem pelo menos o subsídio de desemprego.
Não se consegue evitar que percam o emprego, mas pelo menos assegurar que,
ainda que não tenham contribuído por um longo período de tempo, podem mesmo
assim aceder ao subsídio de desemprego”. Está
em causa a coesão social, mas também a sobrevivência de muitas famílias e
pessoas, sobretudo “aqueles que não têm contratos sem termo, os empregados por
conta própria, os mais jovens, os que têm poucas qualificações, os imigrantes”. Neste contexto, este director da OCDE entende que é
imperioso “garantir alguma forma de protecção mínima a toda a gente”. É óbvio,
não é?!
E
que dizer do cansaço dos médicos, enfermeiros e auxiliares que lutam nos
hospitais contra a pandemia, que não dá tréguas, nem sequer no verão?! Famílias
que se viram obrigadas a prescindir das suas férias, profissionais da saúde
impedidos de conviver habitualmente com os seus familiares e sempre sujeitos a
contrair a infecção, contra a qual tão heroicamente lutam.
Também
neste verão, temos o país a arder.
Já se sabe que acontece sempre que chega o tempo quente e também que os meios
humanos e materiais são escassos. Mas não é de ânimo leve que se
assiste ao tristíssimo espectáculo das populações aflitas, a combater o fogo
que ameaça as suas casas e culturas, os bombeiros exaustos a lutar horas a fio
contra as chamas atiçadas pelo vento, as magras poupanças de uma vida a
desaparecer na voragem de uma labareda, talvez provocada por uma mão criminosa
e impune.
Este
quadro, embora pintado com traços sombrios, não ignora o extraordinário exemplo
dos médicos, enfermeiros, auxiliares e capelães hospitalares; nem o dos que
prestam assistência nos lares, sendo tantas vezes família dos que não têm
família; nem o dos bombeiros; nem o dos párocos, que infundem esperança junto
das famílias em luto, confinadas, ou ameaçadas pela miséria e pela fome, a que
a crise condena tantos lares.
E, ante este cenário, qual é a reacção do Parlamento? Que preocupa os
deputados? Que recomenda ao Governo a geringonça parlamentar, a ampla
maioria de esquerda que nos governa?
Será que a sua prioridade é a saúde, tendo em contas os infectados, os
confinados e os milhares de doentes que aguardam, há meses, uma intervenção
cirúrgica urgente? Serão as famílias de luto? Serão os lares da terceira idade,
cujos utentes deveriam merecer a atenção do país, agradecido pelas suas vidas
gastas ao serviço de todos nós? Serão os desempregados, os jovens sem trabalho,
os imigrantes, talvez condenados a engrossar as fileiras dos sem-abrigo que
dormem ao relento, sob as arcadas ministeriais do Terreiro do Paço? Serão os
profissionais de saúde, que dispensam campeonatos de futebol, mas que merecem
mais condições, para melhor servir o país?
Nada disso! Para o Parlamento os
velhos não contam, os doentes infectados, confinados, ou que aguardam uma
cirurgia urgente, também não, nem os desempregados, nem as famílias enlutadas,
nem os pobres. Os profissionais de saúde, ou os bombeiros, também não
interessam, nem preocupam os deputados, nem os governantes. Os jovens sem
emprego, os imigrantes, os refugiados, os sem-abrigo, os trabalhadores em layoff,
os alunos sem aulas, não contam para a Assembleia da República, nem para o
Governo. Importante
mesmo é o “apoio às associações e colectivos de pessoas lésbicas, gays,
bissexuais, travestis, transexuais, transgéneros e intersexuais”!
Afinal,
esta não é apenas a crónica de um país adiado, mas de um Portugal alienado.
MAIORIA DE
ESQUERDA GOVERNO POLÍTICA CRÓNICA OBSERVADOR
COMENTÁRIOS (155):
Von Galen: Quando um socialista vier
dizer, com aquele arzinho de pessoa responsável, que não dá para baixar
impostos, que essa ideia é populista, que não há margem, lembrem-se sempre
deste tipo de gastos. Nunca vai dar para baixar impostos porque quanto mais
dinheiro o Estado amealha mais esbanja nestes joguinhos políticos.
Fugir aos impostos não é um direito. É um dever
cívico. De cada vez que o senhor do restaurante recebe o meu pagamento em
dinheiro, sem factura, pode evitar alimentar tanto estes parasitas, esta
pornografia. Haverá o dia em que as pessoas dirão chega a este esbulho.
……….
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