segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Ainda a electrólise

 

Só nos resta esperar para ver. Mas não devem esmorecer os que conhecem a questão. É claro que não vão resultar, as suas críticas. Como as do AC90, de resto. Por cá, é assim, mansidão é o lema, talvez esperemos também alguma benesse, se nos calarmos… ao contrário do que diz o Hino Nacional, tão megalómano em estimulação … Contra os canhões marchar

Ligar interruptores acima das nossas possibilidades/premium

A electrólise portuguesa é superior às outras. Além de separar hidrogénio de oxigénio, consegue ainda separar contribuintes portugueses de 7 mil milhões de euros.

JOSÉ DIOGO QUINTELA, Colunista do Observador    OBSERVADOR, 11 ago 2020

 Estou muito entusiasmado com a Estratégia Nacional para o Hidrogénio. Segundo percebo, vamos passar uma corrente eléctrica por água para separar o hidrogénio do oxigénio e ficar assim com combustível. Como a electricidade é gerada por painéis solares, na prática vamos usar energia cara para produzir energia caríssima. É um processo químico chamado electrólise que, pelos preços que têm sido noticiados, nos vai deixar electrolisos. Porque a electrólise portuguesa é superior às outras. Além de separar hidrogénio de oxigénio, consegue ainda separar contribuintes portugueses de 7 mil milhões de euros. (É o valor que o Governo diz que vai ser investido por privados, o que quer dizer que é o valor com que o Governo vai subsidiar os privados, para que possam investir sem risco).

O Governo diz que temos mesmo de apostar no hidrogénio por causa da descarbonização e do clima. Que é a mesma justificação que nos deram para apostarmos nas energias renováveis. Em Portugal, mais renovável do que a energia eólica e solar, só a lábia do Governo a vender banha da cobra. Que, se fosse uma venda literal, acabava por prejudicar menos, porque a banha sempre é uma fonte de energia mais barata.

Entretanto, 15 anos e muitas facturas de electricidade depois, os portugueses já puderam ver o resultado do grande investimento em renováveis que foram obrigados a fazer. Um sacrifício que teve grande impacto no aquecimento global, como sabe toda a gente que se lembra daquele dia, em Maio de 2017, em que esteve frescote de manhã. Fomos nós! Valeu a pena.

Mas não é apenas o imperativo ético que leva o Governo a avançar com o hidrogénio. Parece que também acha que é um bom negócio, porque hoje é uma tecnologia cara, pouco testada e pouco disseminada. E, como é evidente, é muito mais vantajoso meter mais dinheiro agora do que menos dinheiro quando a tecnologia já for barata e de uso corrente. É o raciocínio das pessoas que, numa loja, pedem ao vendedor para fazer “preço de inimigo”.

No fundo, é o equivalente a perguntar a alguém: “Se tivesses de levar um murro do Muhammad Ali, preferias levar a 25 de Fevereiro de 1964, quando ganhou o primeiro título mundial, ou a 3 de Junho de 2016, mesmo antes de morrer de Parkinson?” Está visto que o Governo optava pelo soco do jovem Ali. Custa mais, mas confere mais prestígio. É que dizer “levei um murro do Muhammad Ali” impressiona menos do que “leei uu muu do uaaa aui”, que é a mesma frase dita por alguém sem dentes.

Há outra forma de produzir hidrogénio, através da queima de gás natural. Sucede que é mais barata. Isso, como é óbvio, não nos interessa, porque não nos destaca. Queremos a mais cara, a que faz hidrogénio verde. Há quem julgue que se chama “verde” por ser a mais ecológica, mas é por ser a cor do dinheiro que é desperdiçado. É possível que, se queimarmos o dinheiro numa fornalha, a energia produzida seja mais barata. A ideia que dá é que só estamos a embarcar no hidrogénio para armar ao pingarelho na Europa. Já não bastava termos da energia mais cara da UE, agora temos a mais fina. Quando virem, os países do Norte vão deixar de criticar o que gastamos em vinho e passar a criticar o que esbanjamos em electricidade. Aliás, vão passar a ser compreensivos com o que gastamos em vinho: ao preço que está a energia para aquecedores, é graças ao álcool que nos mantemos quentes. Estamos a ligar interruptores acima das nossas possibilidades. Se o objectivo é sobressair, fomos bem-sucedidos. Portugal mostrou que é um país singular, o único país do mundo em que a Tabela Periódica funciona ao contrário e o hidrogénio só vem depois do ouro. Muito ouro.

Agora, quem diz que o hidrogénio é uma energia limpa, sem resíduos, nunca viu a conta de Twitter do Sec. de Estado da Energia. A sujeira que para ali vai. João Galamba tuíta insultos com uma cadência impressionante. Se calhar, era mais barato aproveitar a fúria com que bate nas teclas como fonte de energia. Em vez de hidrogénio, mau génio. No Twitter, João Galamba apresenta-se com uma foto sua em criança. Faz sentido. Pode estar a falar de assuntos de Estado, mas a postura é de um garoto brigão no recreio. Não tenho acompanhado sempre, mas é provável que já tenha sido usado o argumento “o meu pai é polícia e bate no teu”.

Não é a primeira vez que um profeta salva um povo através de um processo de divisão de água. Tal como João Galamba levará os portugueses até à plenitude energética, separando hidrogénio de oxigénio, há 4 mil anos Moisés conduziu os hebreus até à Terra Prometida, apartando as águas do Mar Vermelho. Moisés e Galamba, dois predestinados. Um acha-se numa missão divina; o outro foi resgatado das águas do Nilo pela filha do Faraó.

Galamba é incansável no ataque a quem discorda dele. Nunca pára. Parece mesmo o coelhinho da Duracel. Dura, dura, dura. A diferença é que a energia que o coelhinho da Duracel vende é barata.

ENERGIA  ECONOMIA  POLÍTICA  GOVERNO

COMENTÁRIOS:

João Soares: Que coisa tão rara neste lugar de desespero silencioso: uma crítica mordaz e feita com humor inteligente. Obrigado.   : Manuel Antoni: muito bem, quintela.

Ivone Rocha: Acho que antes de escrever devemos ler e recolher a informação sobre a qual escrevemos. As alterações climáticas são um assunto demasiado sério. Não há soluções perfeitas, todas são passíveis de críticas e todas têm prós e contras. Mas em vez de afirmações generalistas ainda que com humor, era bom ver este tema tratado com responsabilidade.       Hugo Conquistador > Ivone Rocha: As alterações climáticas não passam de um embuste para nos imporem uma sociedade Marxista.     Rui Lima > Ivone Rocha: Quais das alterações climáticas? Escolha uma das que foram “previstas” desde o início da década de 70...

José Santos > PAULO PINTO: Quando se faz humor com a religião, não é assunto sério. Quando se faz humor com os políticos, não é assunto sério. Quando se faz humor com Portugueses, não é assunto sério. Quando se faz humor com humor, não é assunto sério. Mas quando se faz humor por causa do hidrogénio já é um assunto sério. Não sorrir!       Paulo Silva > PAULO PINTO: Quem percebe? O Galamba? Você é comediante :))))

Procure por: Why hydrogen fuel cell cars are not competitive — from a hydrogen fuel cell expert É só um exemplo. A eficiência é uma porcaria quando comparado com o armazenamento em baterias. Ninguém quer. Mas nós vamos a correr para dar uma cabeçada na parede.     Vasco Matias > PAULO PINTO: Se vamos deixar assuntos sérios para quem entende, o que faz o Galamba no governo?

Portugal, que Futuro: José Diogo Quintela, Certamente por culpa minha, não fui capaz de perceber se está a questionar o ROI do investimento (no hidrogénio), ou o ROE (ou ambos). Mas deixo uma sugestão: que tal contactar os investidores privados, como a GALP, a EDP ou o Salvador Caetano, que enviaram ao governo intenções de investimento para o hidrogénio no montante de dezasseis mil milhões, conforme o Observador noticiou em 19.07.2020 na notícia com o título (só tem de pesquisar): "Concurso do hidrogénio. 74 candidaturas totalizam 16 mil milhões em investimento"? Eles sabem responder-lhe de certeza!     Carlos Nicolau > Portugal, que Futuro: Esses investidores sabem-na toda. Nós também. Sendo o contrato bem feito, como é habitual, é renda garantida.     José Santos > Portugal, que Futuro: Nós também sabemos, há muita depilação a fazer ou muita delapidação a fazer em Portugal. ”Descoberta há mais de 100 anos, a Electrólise (ou Depilação Eléctrica), continua a ser a única técnica aprovada pela FDA (US Food and Drug Administration), para a eliminação definitiva de qualquer pêlo.”     Mario Silva >Portugal, que Futuro: O autor está obviamente a questionar o ROI (return on investment) do projecto do hidrogénio. Não pode questionar o ROE (return on equity) porque não se sabe quanto dos 16 mil milhões de € de "intenções" são capital (equity) que essas entidades privadas vão efectivamente investir. A avaliar pelos excelentes projectos de energias renováveis que foram feitos no tempo do Eng. Sócrates o ROE é sempre elevado pois o capital investido pelas entidades privadas tem retorno garantido pago com os impostos dos portugueses, quer haja receitas ou não (como o autor refere logo no primeiro parágrafo). Tais negociatas só são possíveis porque os legisladores ajudam os privados a lesar o Estado, ou seja temos "a polícia a ajudar os ladrões a roubar". Certamente que não o fazem de borla (tipo os sacos azuis do Eng. Sócrates). O que ainda me surpreende (mea culpa) é haver mentecaptos como o senhor que continuam a defender tais práticas de corrupção. Acho que fica tudo dito sobre a sua ética e honestidade intelectual.         José Paulo C Castro > Portugal, que Futuro: Se os privados querem tanto investir nisso porque vamos nós, o Estado, investir ?  Deixem-nos meter eles lá todo o dinheiro. No fim, o Estado cobra impostos. Ou isenta no início.

Carlitos Sousa: O sector da energia é aquele onde a corrupção e o esbulho ao contribuinte é mais evidente. As Rendas Excessivas, os CMECs, as negociações entre Manuel Pinho, Mexia e Manso que tramaram os consumidores em muitos milhões, as Energias Eólicas que deveriam ser uma mais valia e acabaram por ser um encargo duplicado para os consumidores, para além de continuarem a ser subsidiadas.

E agora o Hidrogénio. Com potencialidades para ser defendido, mas também com potencialidades para ser a energia mais cara produzida, e um novo encargo para o bolso do contribuinte. E mais uma vez Galamba na jogada… este tipo será multimilionário em breve.

Paulo Silva: 7 MIL Milhões é apenas o custo de 2 Aeroportos novos. Mas pela calada o governo PS já aprovou tudo. As empresas lobistas já sorriem ao dinheiro público que vão receber dos impostos dos pobres Portugueses garantidos por décadas futuras. O Galamba, sob o efeito Dunning-Kruger julga saber mais que os outros e gasta rios de dinheiro numa tecnologia em que ninguém na Europa acredita.

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