Balanço na balança
Derrotismo, nosso modelo de estar na
vida, acomodados – ou não - aos do momento, desconfiados dos seguintes, que seguirão,
sem dúvida, os moldes egocêntricos habituais…:
«A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa,
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.»
Á. Campos – “Tabacaria”
O cúmulo da imprevisibilidade
Ou se torna Portugal prioritário na
“agenda” eleitoral ou não se torna. Não há outro critério para avaliar da
bondade de um projecto político nacional.
MARIA JOÃO AVILLEZ OBSERVADOR, 06 jan 2022
1A
passagem não podia ser fácil, nunca apetece abrir portas incertas e 2022
além de incerto é imprevisível. Não é a mesma coisa, o que amplia o
pessimismo e a mochila já vinha suficientemente carregada. Talvez por isso
tenhamos acreditado aqui há uns meses e mesmo que por breves momentos, que a
vida voltaria ao que era para nos darmos conta da armadilha: o inimigo voltara com nova cara de outro nome. E apesar de muito mais habilitados hoje a tourear
quer os vírus quer excesso de limitações, proibições, contradições das
autoridades, de quantas mais doses de vacinas vamos precisar mais?
Um
caso muito mais que sanitário: talvez nunca nenhum polvo tenha tido tantos
braços, a fazer tantos estragos, de tão variada natureza.
2É preciso ser
claro e se possível decente: a pandemia não explica tudo nem redime tudo.
Não subestimo a gravidade que a Covid já representou, a perturbação que causou
aos governantes, a preocupação que volta a suscitar. A governação é que saiu
pouco de trás desse biombo. Uma espécie de álibi quando o andar político
e institucional da carruagem de 2021 convence pouco e anima menos. Assim de
repente, num Portugal cada vez mais empobrecido e envelhecido: uma dissolução
apressada e talvez inútil do parlamento; o atraso indecoroso em arredar de vez
Eduardo Cabrita da vista do país; os (erradicáveis?) erros e omissões da
Justiça, num universo que parece infectado de alto abaixo com o que nos mostra,
por capítulos; a Educação aos tombos e solavancos com o que lhe compete e não
cumpre – falta de professores, computadores que não chegam,
avanços e recuos de datas e calendários, penalizando e confundido; os “surtos”
de incapacidade das autoridades de Saúde para prevenir em vez de remediar; as
doenças que vão ficando por tratar, os cachos de demissões das direcções
hospitalares; as Forças Armadas enroladas em embaraçantes questões que não deviam
nunca ter chegado a sê-lo; não se percebendo aliás com a suficiente clareza o
gesto de assentimento do Chefe de Estado e Comandante Supremo não evitando o
vexatório – grave, batoteiro e feio – despedimento antecipado de Mendes Calado,
apesar das reticências que antes publicamente manifestara.
A
despedida de 2021 deixa um amargo de boca e uma ameaça velada: e se nada mudar no dia 30 de Janeiro? Ou se mudar tão incipientemente que logo antecipemos
que não pode senão haver um remake destas eleições daqui a dois anos?
Alterar
nunca foi o mesmo que mudar.
3Ou
se torna Portugal prioritário na “agenda” ou não se torna. Não conheço outro
critério para avaliar da bondade de um projecto político nacional. O que é
outra maneira de perguntar quem vai, sim ou não, pôr de uma vez por todas o
país a crescer, adubando a economia e revitalizando o tecido empresarial? Quem
será capaz, contra ventos e marés que logo se agitarão de emagrecer
drasticamente o Estado?
Face
ao dramático envelhecimento da população quem está disposto a fazer o
impossível para que o país assegure fins de vida dignos aos portugueses que
trabalharam toda a vida, quando chegarem à reforma? Como vir a pagar uma conta
que só crescerá na razão inversa dos pagantes?
Fala-se
muito da inflação que aí está (e Portugal já é o campeão da Europa na perda do
poder de compra), da divida pública, dos efeitos da pandemia nas economias e
nas sociedades, da incerteza dos dias. Chora-se esse caminho minado mas não
parece haver candidatos satisfatórios para trocar o queixume pela vontade
política. A
pergunta é: alguém se olha como agente político desta mudança de paradigma,
arredando o país dos humilhantes últimos lugares europeus da escala do
desenvolvimento económico e social? Há mais portugueses disponíveis para tomar
parte activa e efectiva na empreitada ou são muito mais os que preferem uma
cepa torta paga pelo Estado?
Quem
numa palavra se aflige com o declínio? Não
há maior imprevisibilidade que isto.
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