O nosso. Mas já o antigo era assim,
simbolizado no canto das sereias, que o Ulisses bem ouviu, atado ao poste, os
marinheiros impávidos e serenos, por via da cera com que o Ulisses lhes tapou
os ouvidos, enquanto remavam. Hoje, andamos todos à solta, sem cera nos
ouvidos, por via das cotonetes ou das gotas, agradados da sereia, que até nos é
compincha, pois podia aboletar-se com todo o pecúlio que recebe de fora e não!
Distribui como prometeu, embora leve nas vendas, que a vida está má para todos,
além de que ele tem que prestar contas, para ter oportunidade de continuar a
receber de fora, nós, de facto, é que somos uns ingratos. E exigentes a dar com
o pau.
Aumentos que são cortes
Explorando a sua iliteracia
financeira, geram-se expectativas enganadoras nas populações carenciadas sobre
os apoios que o Estado presta — prometendo-lhes aumentos quando afinal lhes
aplica cortes.
ALEXANDRE HOMEM CRISTO Colunista do Observador
OBSERVADOR, 06
abr. 2023, 00:2114
Um dos truques mais tentadores na política consiste em lançar
anúncios de apoios ou promessas de reforços orçamentais pelas várias áreas
sectoriais. Chega a ser irresistível: como
ninguém gosta de ouvir falar em cortes, os governantes desdobram-se a anunciar
mais dinheiro a cada vez mais gente, para depois difundir notícias sobre essas
iniciativas e gerar uma percepção positiva sobre o seu desempenho. E, se for
preciso, depois cortam mesmo o orçamento a eito. Muitas vezes, a diferença
entre o que se diz e o que se faz parece um abismo, pelo que importa escrutinar
e procurar respostas à pergunta: afinal, os anúncios passaram a realidade?
Na análise de medidas políticas, uma abordagem para responder a esta
pergunta está na distinção entre o dinheiro prometido (a dotação inicial) e o
dinheiro efectivamente utilizado (o montante executado). O
raciocínio é simples: se o governo anunciar uma medida de apoios que custa 50
milhões de euros, mas executar apenas 10 milhões de euros, importa perceber
porque guardou o dinheiro no cofre.
E, quando esse desalinhamento é surpreendentemente enorme, torna-se legítimo
concluir que houve uma deliberada manipulação dos valores para fins
de marketing político.
Aqui
vai um exemplo. Se olharmos para as dotações iniciais para bolsas
de estudo no ensino superior (acção social directa), constatamos que, entre 2015 e 2021, mais do que
duplicou: entre 119
milhões de euros (2015) e 243 milhões de euros (2021), o aumento foi de
+104%. Aliás, a partir de 2018, o reforço
orçamental subiu em flecha: de 2018 (143 milhões de euros) para 2021 (243
milhões de euros) observou-se um aumento de 100 milhões de euros na dotação
inicial, atingindo valores nunca antes alcançados, e que tanto orgulharam o
então ministro Manuel Heitor — que salientou o carácter
“inédito” do reforço da acção social naquele
que qualificou de “melhor orçamento” dos últimos anos. Mas será que é mesmo assim?
A história muda radicalmente se, em vez de se analisar a partir das
dotações iniciais (o dinheiro prometido), a análise for feita com os dados dos
montantes executados (o dinheiro efectivamente gasto). Hoje, em
2023, essa análise já é possível de fazer quanto a 2021, o ano em causa. E os números são reveladores. É que, apesar de a
dotação inicial aumentar +104%
entre 2015 e 2021, o montante executado diminuiu -8,8%. E repare-se no intervalo temporal de
2018 a 2021: enquanto a dotação inicial aumentou em +100 milhões de euros, o
montante executado caiu -16 milhões de euros.
Sim, é mesmo extraordinário constatar o desfasamento entre o discurso de
Manuel Heitor e a realidade. Afinal,
o governo (que alegadamente bateu recordes históricos de investimento no apoio
aos estudantes) apresentou montantes executados inferiores aos de 2015, o
último ano do governo PSD-CDS, ou inferior até a qualquer um dos anos da
geringonça.
A
tendência mantém-se mesmo quando aplicada a toda a acção social no Ensino
Superior, juntando às bolsas as despesas com alimentação, alojamento e outros
apoios: em 2021, o
montante executado foi inferior ao de 2015 (-22 milhões de euros), mesmo se nas
dotações iniciais constava um espectacular aumento de +129 milhões de euros. É uma nova espécie de novilíngua: no governo, prometer
enormes aumentos corresponde, afinal, a aplicar cortes. E para quem quiser confirmar com os seus próprios
olhos, tanto estes como os números acima
têm fonte nos organismos oficiais e estão compilados
na PORDATA.
Enfim, confio que, nas mãos do actual Secretário de Estado do Ensino
Superior Pedro Teixeira, esta
pouca-vergonha orçamental tenha fim. Mas
o caso serve de exemplo de uma actuação que vai muito além do Ensino Superior. Na semana passada, expus dados que provam como, nos
últimos 20 anos, aumentou
a população em risco de pobreza e dependente de apoios do Estado. Esta
semana, pareceu-me oportuno lembrar isto: Portugal não é apenas um país onde aumentou a
dependência da população nos apoios sociais para fugir à pobreza, é também um
país que gera expectativas enganadoras sobre os apoios que o Estado presta às
populações carenciadas — prometendo-lhes aumentos quando lhes aplica cortes,
sem ninguém protestar. Portugal é um multiplicador de pobres também por isso:
na sua iliteracia financeira, escrutina pouco e escrutina mal os seus
governantes.
EXECUÇÃO ORÇAMENTAL ECONOMIA ENSINO SUPERIOR EDUCAÇÃO APOIO SOCIAL SOCIEDADE
COMENTÁRIOS:
Maria Tejo: Mas sabe o que é triste e
desanimador? A oposição ter tanto para desmistificar com dados concretos e
indesmentíveis e não ser capaz de o fazer na Assembleia da República. Maria Clotilde Osório
> Maria Tejo: Na mouche. A oposição que temos é fraca,
fraquíssima. Já há que tempos se anda a pedir para não se olhar para os números do
Orçamento mas para a sua execução. Se eu disser que vou dar bife todos os dias ao almoço e depois servir só
nos dias de festa, estamos a ver a felicidade dos comensais. Nos restantes dias
ponho a fotografia do bife no prato com ervas à volta. É por não vislumbrarmos
uma saída que o desânimo aumenta Censurado sem
razão: Um jornalismo
decente é que devia fazer esse serviço público. Por exemplo a CNN é uma
vergonha. Socialista do Carvalho. É de ir ao vómito. Nem disfarçam a esquerdice
militante. Espere sentado. Com jornalismo deste calibre nada vai mudar. observador censurado
> Censurado sem razão Relativamente a este assunto,
salvo melhor opinião, pelo menos: 1. O Ministro do Ensino Superior; 2. Os deputados da Comissão de
Educação (deviam fiscalizar a execução das verbas da Educação); deveriam ser responsabilizados
criminalmente de forma a apresentarem uma fundamentação válida para os desvios
mencionados pelo autor. Carlos Fernandes: Finalmente! Foi preciso um
artigo de opinião para aqui no Observador se levantar a ponta do véu das
diferenças entre o anunciado e o efectuado em termos orçamentais pelos governos
de António Costa, quando seria uma tarefa mínima e obrigatório de um jornalismo
que pretenda escrutinar o poder. Um jornalismo que, como os outros nesta terra,
acorre sempre a todos os anúncios de medidas e os relata. E quando estes se
repetem pela enésima vez, o artigo com o novo anúncio dispensa-se de o referir.
Entenda-se, referi-lo seria tão só matéria de facto, não de opinião. João Ramos Depois de tanta vergonha será
que a própria comunicação social completamente servil ao “poder” não terá
vergonha de si própria… Carlos
Carvalho: Como sabemos, o comunismo, e este ps, além de incompetente, quer ser
bloco de esquerda, é fabricante de pobres e dependentes. Todos iguais e
todos pobres. Até já tentam mudar voos comerciais para agradar à camarilha.
Isto só nas ditaduras Carlos Chaves Caríssimo Alexandre,
sinceramente não percebo como é que consegue rotular este comportamento,
apenas, como “pouca-vergonha orçamental”! Se a isto juntar os sucessivos
orçamentos maravilha, cheios de criminosas cativações, continua achar que é
só pouca-vergonha? Eu tenho outros nomes para isto, mas não os posso escrever
aqui! Luis Freitas: É como na habitação: António Costa
prometeu mais de 12 mil casas para habitação social e só construiu 17 casas por
ano nos últimos 7 anos. Como diz o ditado popular, muita parra e pouca uva,
estes governos de António Costa são dos mais vigaristas e mentirosos de toda a
história de Portugal e quem mais empobreceu Portugal neste século XXI, mas a
grande maioria do povo adora esmolas e a classe empresarial subsídios, dessa
forma Portugal fica mais pobre e dependente de um regime comandado pelo PS e
que teve o apoio do PCP e BE. S N: Basta olhar para a "boa
notícia" da imprensa de hoje: governo vai "dar" um
"aumento suplementar de 1%" a todos os funcionários públicos,
"desde 1 de janeiro, não apenas a partir de abril". Sem esclarecer que é um "aumento" apenas
nominal, ou seja, muito negativo em relação aos cortes reais provocados pela
inflação (cerca de 20% nos últimos dois anos, podendo no entanto ultrapassar os
30 ou 40% nos mais pobres devido ao peso dos alimentos, cujos preços aumentaram
em alguns casos mais de 50% ou 60% (cebolas, cenouras, leite, carne, bolachas,
etc.) Alexandre
Barreira: Pois. É a velha
história:- Empresta-me 1000€ - É pá só tenho 500€ - Ok ficas a dever 500€....! Maria Correia: Mas acaso alguém recebeu o tal
acerto das pensões de 22 ou os fantásticos apoios especiais aos
"vulneráveis"? Não era para começar em Abril? Gostava de saber se
pagaram ou se foi mais outra patranha observador
censurado: "... Portugal
é um multiplicador de pobres também por isso: na sua iliteracia financeira,
escrutina pouco e escrutina mal os seus governantes." Parece que o autor
quer dizer que os órgãos de soberania estão podres. Como o autor mostrou, o governo de Portugal faz
publicidade enganosa. Os contribuintes passam dificuldades para pagar os
elevados salários dos governantes e de quem os devia fiscalizar. E
consequências? Um cidadão enganar na sua declaração de IRS comete um crime mas
os governantes e quem os devia fiscalizar parecem estar isentos de qualquer
responsabilidade e, consequentemente, acção criminal. F. Mendes: O artigo até é interessante. Só
que, não acredito que estas práticas de embuste cristalizado, mudem
significativamente com o actual Secretário de Estado, ou com qualquer outro
membro do governo. Por uma razão simples: Costa só recruta aldrabões ou
"yes men"; mais frequentemente uma combinação de ambos. Os resultados
estão à vista de todos. Atente-se ao artigo de hoje do Paulo Tunhas, e conclua-se a que ponto tudo
"isto" desceu.
Nenhum comentário:
Postar um comentário