segunda-feira, 17 de abril de 2023

Tergiversar


Lembrei-me do velho problema das pombas, mas também recordei saudosamente aquelas outras pombinhas da “Catrina” que andaram de mão em mão. Tudo, na minha idade, são recordações e associações de ideias, para distrair das obsessões causadas por tantas combinações que redundam nas densas frustrações… Fora um gavião que perguntara a umas pombas quantas elas eram e uma pombinha respondeu com muita argúcia: “Nós, e outras tantas como nós, e a quarta parte de nós e contigo, gavião, cem pombas farão”, o que perfazia 44 pombinhas apenas, se bem me lembro, o gavião permanecendo sempre o intruso no universo das pombinhas, embora simpático e sem segundas intenções ainda, porque não havia tacho, como hoje há, para se disputar com outros cálculos mais aparatosos. Hoje, de resto, todos pretendem ser gaviões, donos do tacho de importação, já nem há pombinhas que se prestem a cálculos algébricos de pouca monta, tudo no vaivém da sua ambição tachista. Este comentário sem eira nem beira foi apenas diversão de cansaço, em torno de um incisivo escrito de HELENA MATOS sobre esquemas políticos de amparo numerário e a centena de comentários sérios e de grande calibre que aquele justamente mereceu, sem grande esperança mas também sem álgebra, mesmo para principiantes que “sesse”.

E quando se demarca o PS do Chega?

Neste momento, em que tudo aquilo que depende do Governo parece desmoronar-se, a aposta na insuflação do Chega e a sua colocação no centro da discussão política tornou-se a táctica infalível do PS.

HELENA MATOS Colunista do Observador

OBSERVADOR; 16 abr. 2023, 01:08138

 Não vamos ter no Governo políticos racistas, nem oportunistas, nem populistas – declarou Luís Montenegro a Maria João Avillez que o entrevistava para a CNN. Daqui concluiu a Pátria escrita e falada que Luís Montenegro estava a dizer não a uma geringonça com o Chega. Convenhamos que ou a Pátria é ingénua ou Luís Montenegro é parvo. Que as duas coisas aconteçam em simultâneo também não é de excluir, porque em Portugal os azares costumam andar aos pares.

Comecemos pela ingenuidade da Pátria: “Não vamos ter no Governo políticos racistas, nem oportunistas, nem populistas” – diz Montenegro. Mas isto quer dizer exactamente o quê? Que Luís Montenegro está a excluir pessoas que tanto podem ser do Chega como doutros partidos? Como todos sabemos existem políticos racistas, oportunistas, e populistas no Chega e em todos os outros partidos, logo afirmar que  “Não vamos ter no Governo políticos racistas, nem oportunistas, nem populistas” é uma espécie de redondo vocábulo e nada mais.

Já se Luís Montenegro quis com isto dizer que não fará acordos pós-eleitorais com o Chega está a ser parvo porque não é aritmeticamente possível à direita governar sem os votos do Chega; porque, ao contrário do que gostaríamos que fosse verdade, o eleitorado de Ventura não o penaliza caso ele não viabilize um governo minoritário PSD; porque um acordo pós-eleitoral é a melhor forma de tirar o Chega do local onde ele cresce: a oposição pela oposição e, por fim mas não por último, se Luís Montenegro procura libertar-se da ratoeira da questão Chega com estas declarações bem pode preparar-se para o embate porque o PS não vai deitar fora a sua táctica de maior sucesso.

Neste momento, em que tudo aquilo que depende do Governo parece desmoronar-se, a aposta na insuflação do Chega e a colocação do Chega no centro da discussão política tornou-se a táctica infalível do PS. Mesmo que para tal se entre no terreno do absurdo, como aconteceu esta semana, quando na Assembleia da República, numa sessão igual a centenas de outras, Edite Estrela, que presidia aos trabalhos, interrompeu o deputado Pedro Frazão, do Chega, que perorava sobre a agricultura, ou mais precisamente sobre o que aquele deputado diz ser o desinteresse da esquerda pelos agricultores. A intervenção seguia sem nada de relevante até que Pedro Frazão proferiu o nome de Lula da Silva. Nesse momento, Edite Estrela interrompe-o. O deputado protesta. Num ápice Edite Estrela passou da citação enfatuada d’O Mostrengo de Pessoa “Aqui (…) sou mais do que eu” com que tentava calar Pedro Frazão para o pé de chinelo do “Esteja caladinha” dirigido à deputada Rita Matias.

Basta ver duas horas do canal parlamento para perceber que nada justificava a interrupção por parte de Edite Estrela da intervenção do deputado Pedro Frazão (muito menos a forma como se dirigiu à deputada Rita Matias). Intervenções similares são produzidas com as devidas adaptações ideológicas todas as sessões por todas as bancada. Mas este momento aparentemente absurdo torna-se num facto lógico se o virmos como parte de uma táctica particularmente bem-sucedida do PS: fazer crescer o Chega. A repetição de incidentes desta natureza é mais que certa. (Para já a 25 de Abril e com o alto patrocínio do Presidente da República, a vinda de Lula da Silva ao parlamento será o pretexto para mais um destes momentos.)

Não é o PSD que tem de se demarcar do Chega. É o PS que tem de deixar de fazer do Chega o eixo da vida política portuguesa. Mas não o fará. Nos filmes os cobardes escondem-se atrás de quem podem para se proteger. Na política há quem se esconda atrás dos radicais para conseguir passar por corajoso e, mais perversamente ainda, por imprescindível ponto de equilíbrio.

Infelizmente para nós é isto que estão a fazer aqueles a quem o voto dos portugueses colocou em Belém e em São Bento.

Ps. Não sei se Boaventura Sousa Santos é culpado de assédio. Espero sinceramente que a justiça burguesa que tanto criticou lhe valha para dar a sua versão dos factos. Sobre o Centro de Estudos Sociais é que não tenho dúvidas: trata-se de um caso de assédio à inteligência e ao dinheiro dos contribuintes. Uma espécie de máquina falante do patois do politicamente correcto em que não se consegue identificar nada de cientificamente relevante.

PS    POLÍTICA    PARTIDO CHEGA

COMENTÁRIOS:

Cisca Impllit: Bordoada bem dada neste texto. Discutir política, e outras cousas, com inteligência          Maria Paula Silva: Montenegro não é parvo, quer dizer não sei se é parvo, é capaz de ser, mas sei que é fraco e que, tal como RRio, obedece aos mesmos poderes a quem obedece o PS. Por isso é que não há oposição. Boa crónica, obrigada HM!                  C. Soares: A hesitação do Montenegro é de certa forma legítima, até porque com o andamento desta telenovela mexicana, que é a política portuguesa, fica difícil antever cenários, pelo menos todos os cenários hipotéticos nesta e noutras realidades que venham a surgir. Custa aceitar, mas neste momento é a única hipótese que lhe resta, ficar por repudiar o racismo e outros "ismos" costumeiros do auto flagelado André! É sempre perigoso acordos com radicais, assim como foi com a geringonça, e talvez as recentes experiências nos sirvam para aprender algo.                Manuel Fernandes: Quando é que Montenegro se demarca do PS? Ou o objectivo é afinal uma união de facto PSD/PS? Era bom sabermos (nós, eleitores) para não fazermos de novo o papel do marido enganado...                      João Floriano > Manuel Fernandes: «Em caso de dúvida vota CHEGA!» Bem que pode ser uma boa frase para outdoor eleitoral.                   C. Soares > João Floriano: Também lá está um chicote, no tal cartaz? O castigo dos pecadores? Andamos de fundamentalismo para fundamentalistas! Não estará na hora de deixarmos de ser as criancinhas intelectuais á espera dum papá para nos dizer como devemos fazer as nossas escolhas e dirigir as nossas vidas? Retrocessos civilizacionais, uns atrás de outros!               João Floriano > C. Soares: Essa do chicote pode ser um pormenor com interesse. Tem potencialidades. Concordo completamente com a referência a retrocessos civilizacionais: há exemplos por todo o planeta. Entre nós a qualidade da democracia está pior (afirmado por observadores externos) e há sinais de censura. Eu sou do tempo do lápis azul. Quanto aos «papás» que nos dizem como escolher, a tendência vai ser não para diminuir mas para aumentar, tendo em conta a quantidade de influencers que nos manipulam na propaganda política e não só.               Manuel Fernandes > C. Soares: Para nos obrigar ( não é dizer, é mesmo obrigar) a fazer as nossas escolhas e para dirigir as nossas vidas já temos o senhor Costa. Pela via fiscal e pelo controle da CS. Não percebi o chicote: ele já está, de facto, na propaganda do PS, e levamos com ele todos os dias.                   C. SoaresManuel Fernandes: Aí levamos, levamos. E o André vai pôr os impostos em que nível? O que é que ele disse sobre isso? É nisto a que eu me refiro a programa político, acções concretas previstas para melhorar a vida económica, quais são as áreas estruturais que ele acha devem ser prioritárias e como as vai desenvolver? Ele e os outros? Aeroportos, ferrovia, tecnologia de ponta, hubbs, ciência, quais são os planos dos partidos e a demonstração financeira para desenvolver as áreas de actividade de um país? Como vamos reter os jovens portugueses em Portugal? Ou vamos continuar a preferir trocar os nossos jovens por nómadas? Qual o planeamento para a habitação? André onde estão os teus planos para resolver estes problemas? Isto é que conta, não é os "ismos", e as palhaçadas do Trump e do Bolsonaro! Poupem-nos!                 Maria Rita Menezes: Muito bom, e cheia de razão! PARABÉNS!                Rui Cotrim: Carissima Helena, Desta vez não estou consigo. O vocabulário utilizado por si contra Montenegro é desequilibrado e intelectualmente desonesto. Não é seu costume. Ainda que as sondagens o indiquem não é liquido que numa perspectiva de alternativa e mudança a direita vote no Chega. Com este discurso de Montenegro está aberto o campo do centro descontente do PS e que pode ao fim de 8/10 anos cair para o lado da direita. Quanto ao PS nada a dizer. Concordo plenamente. Quanto ao professor Má-ventura temos mais um Comuna Burguês de carne e osso como os normais mortais seres humanos de direita. Quanto ao CES, dinheiro dos contribuintes a voar. Uma questão. O que se passa com as acusações de assédio sexual na Academia de Lisboa...?

Rafael Valverde: Nunca percebi porque é legítimo que o PS se alie com comunistas estalinistas e trotskistas, por definição antidemocráticos, e o PSD não se pode aliar à direita com quem quiser e necessitar para tentar sacar esta corja xuxalista da teta dos contribuintes!                   João Floriano > Rafael Valverde: O PS e a esquerda não deixam, não autorizam. O PSD obedece, e aqui é que eu não percebo a razão de toda esta reverência. Já viram aonde foram parar com Rui Rio e persistem no mesmo erro. Da maneira que isto anda, as sondagens deveriam dar uma intenção no PSD de voto muito mais substancial. Algum significado deve ter o motor custar a arrancar.             Maria Paula Silva > João Floriano: Caro João, se vir as listas dos Bilderberg em PT percebe porque todos obedecem ao poder.               João Floriano > Maria Paula Silva: De acordo. Compreendo o seu ponto de vista. Mas há muitos outros países igualmente com representação no grupo e não se enquadram na degradação em que tudo isto caiu.               Sérgio Rodrigues: O CHEGA nasceu porque o PSD nunca se assumiu como um partido de direita e quer ficar eternamente em cima do muro. Como é que se pode dizer que o crescimento do CHEGA é estratégia do PS? Desde quando ao PS lhe interessa o crescimento de um partido verdadeiramente de direita? Não é difícil prever que o espaço político do PSD se esgota de uma forma notória. Para quem até agora vota num PSD tendencialmente socialista provavelmente balançará o voto entre o PS, IL e PSD e para quem tem votado num PSD mais à direita tendencialmente votará no CHEGA. Há uns anos uma descida de 15% do PS nas sondagens corresponderia a ter o PSD/CDS a liderarem claramente as intenções de voto. Se o PSD quer contar com o apoio do PS para viabilizar um governo minoritário mais rapidamente ficará de fora de qualquer solução governativa futura, porque aí terá mesmo de ser um PS2.

Já todos percebemos que PS, PSD, IL, BE, PCP, CDS, etc, passaram os últimos anos a demarcar-se do CHEGA, perguntar “E quando se demarca o PS do Chega?” a resposta é simples: todos os dias, mas ao menos não enrolam tanto o discurso como o PSD, ou seja, ou se é de direita ou de esquerda. Resumindo cada partido faz o seu jogo político e o CHEGA já demonstrou que corre em pista própria - o único exclusivamente à direita - basta ver o que passou na eleição do Vice-Presidente da Assembleia da República.                  C. SoaresSérgio Rodrigues: O Chega nasceu porque o povo português ainda espera um D. Sebastião! Custa muito a este povo pôr o Tico e o Teco a comunicar, depois queixam-se e vão sempre queixar-se porque andam de escolhas radicais para escolhas radicais. É a iliteracia total da escolha política, usam o voto para se vingarem de outros políticos e não como escolha consciente, fazer o quê? Continuaremos a pagar, a ver futebol e a queixar-se da nossa própria burrice!

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