Foi a propósito do “Caso Mondego”.
Com fotografia expressiva.
Uma longa tirada no facebook de
LUIS SOARES DE OLIVEIRA,
recebida por email. De passagem, um texto de Vasco
Pulido Valente, outro de Eça,
transcrito de Henrique Borges, de
actualidade perene, hélas!
BATALHA NAVAL
Navio Mondego avaria-se e
deita fumo negro. Almirante ao fundo.
Todas as reacções:
2626
9 comentários
Mais relevantes
"5 de Junho
...
«Quanto
à "crise do regime", começa a ser visível a sua verdadeira essência:
a miséria do país. Um mal que não se resolve com leis eleitorais, com a reforma
moral dos partidos ou o milagroso desaparecimento da corrupção. Disparates que entretêm
os opinantes do costume. O PS não diminuiu a pobreza e a desigualdade,
disfarçou-as durante uns tempos. No fim continuámos com os mesmos problemas: a
dificuldade de pagarmos o Estado que temos e, sobretudo, o Estado que
desejamos; a impossibilidade de vivermos como se vive na Europa, ou sequer
perto disso; a baixa produtividade; uma pequeníssima poupança; um investimento
fraco; um crescimento que não acompanha as expectativas da maioria dos
portugueses.»
PÚBLICO. Sábado, 8.6.2019 . Página 5
VASCO PULIDO VALENTE
(Lisboa, 21.11.1941- Lisboa,
21.2.2020)
78 anos
Nuno Miguel Pereira: Já
tem idade pra ter juízo
Comunicação do amigo
Henrique
Borges:
Como sempre, Eça já disse tudo o que havia a dizer
sobre o assunto. Só não antecipou o almirante-palerma.
«Mas, meus senhores, antes de tudo, nós não temos
Marinha!
Singular coisa! Nós só temos Marinha pelo motivo de termos colónias – e
justamente as nossas colónias não prosperam porque não temos Marinha!
Todavia, a nossa Marinha, ausente dos mares, sulca profundamente o
orçamento.
Gasta 1 159 000$000.
Que realidade corresponde a esta fantasmagoria das cifras?
Uns poucos de navios defeituosos, velhos, decrépitos, quase inúteis, sem
artilharia, sem condições de navegabilidade, com cordame podre e mastreação
carunchosa, a história obscura.
É uma Marinha inválida.
A D. João tem
50 anos, o breu cobre-lhe as cãs: o seu maior desejo seria aposentar-se como
barca de banhos.
A Pedro Nunes está
em tal estado, que, vendida, dá uma soma que o pudor nos impede de escrever.
O Estado pode comprar um chapéu no Roxo com a Pedro Nunes – mas não pode
pedir troco.
A Mindelo tem
um jeito: deita-se. No mar alto, todas as suas tendências, todos os seus
esforços são para se deitar.
Os oficiais de Marinha que embarcam neste vaso fazem disposições finais.
A Mindelo é um
esquife – a hélice.
A Napier saiu
um dia para uma possessão. Conseguiu lá chegar. Mas, exausta, não quis, não
pôde voltar. Pediu-se-lhe, lembrou-se-lhe a honra nacional, citou-se-lhe
Camões, o Sr. Melício, todas as nossas glórias. A Napier, insensível, como
morta, não se mexeu.
Das 8 corvetas que possuímos são inúteis para combate ou para transporte –
todas as 8.
Nem construção para entrar em fogo, nem capacidade para conduzir tropa.
Não têm aplicação.
Há ideia de as alugar como hotéis. A nossa esquadra é uma colecção de
jangadas disfarçadas! E este grande povo de navegadores acha-se reduzido a
admirar o vapor de Cacilhas!
.Têm um único mérito estes
navios perante uma agressão estrangeira: impor-se pelo respeito da idade. Quem
ousaria atacar as cãs destes velhos?
Já se quis muitas vezes introduzir nas fileiras destes vasos caducos alguns
navios novos, ágeis, robustos. Tentou-se primeiro comprá-los.
Sucedeu o caso da corveta Hawks.
Era esta corveta uma carcaça britânica, que o Almirantado mandava vender
pela madeira – como se vende um livro a peso.
Por esse tempo, o Governo português – morgado de província ingénuo e
generoso – travou conhecimento com a Hawks, e comprou a Hawks. E quando mais
tarde, para glória da monarquia, quis usar dela, a Hawks, com um impudor
abjecto, desfez-se-lhe nas mãos!
Estava podre! Nem fingir soube! Tinha custado muitas mil libras.
Tentou-se então construir em Portugal.
Sabia-se que o Arsenal é uma instituição verdadeiramente informe: nem
oficinas, nem instrumentos, nem engenheiros, nem organização, nem direcção.
Tentou-se todavia – e fez-se nos estaleiros a Duque da Terceira. Foi meter
máquina a Inglaterra. E aí se descobre que a tenra Duque da Terceira, da idade
de meses, tinha o fundo podre!
Foi necessário gastar com ela mais cento e tantos contos.
Nova tentativa. Entra nos estaleiros a Infante D. João. 87 contos de
despesa. Vai meter máquina a Inglaterra. Fundo podre! O Arsenal perdia a
cabeça! Aquela podridão começava a apresentar-se com um carácter de insistência
verdadeiramente antipatriótica!
Os engenheiros em Inglaterra já se não aproximavam dos navios portugueses
senão em bicos de pés – e com o lenço no nariz. As construções saídas do
Arsenal sucumbiam de podridão fulminante.
A Infante D. João custou em Inglaterra mais cento e tantos contos!
O Arsenal, humilhado no género navio, começou a tentar a especialidade
lancha. Fez uma a vapor. Lança-se ao Tejo, alegria nacional, colchas, foguetes,
bandeirolas… E a lancha não anda! Dá-se-lhe toda a força, geme a máquina, range
o costado – e a lancha imóvel! Mas de repente faz um movimento…
Alegria inesperada, desilusão imediata! A lancha recuava. Era uma brisa que
a repelia.
Em todas as experiências a lancha recuava com extrema condescendência:
brisa ou corrente tudo a levava, mas para trás. Para diante, não ia.
O Arsenal tinha feito uma lancha a vapor que só podia avançar puxada a
bois.
O País riu durante um mês.
A nossa glória,
inquestionavelmente, é a Estefânia. Parece que poucas nações possuem um
vaso de guerra tão bem tapetado! O orgulho daquele navio é rivalizar com os
quartos do Hotel Central. É um salão de Verão surto no Tejo.
E no Tejo, realmente, dá-se bem.
No mar alto, não! Aí tem tonturas. Não nasceu para aquilo: um navio é um
organismo, e como tal pode ter vocações: a vocação da Estefânia era ser
gabinete de toilette. É pacata como um conselheiro. É uma fragata do Tribunal
de Contas!
Por isso, quando a quiseram levar
a Suez, quantos desgostos deu à sua Pátria! Quantas brancas fez à honra
nacional!
É verdade que os cabos novos,
da Cordoaria Nacional, quebraram como linhas, e ninguém lhes pode contestar que
tivessem esse direito.
A marinhagem também não quis
subir às vergas (opinião respeitável, porque a noite estava fria).
Alguns aspirantes choraram de
entusiasmo pela Pátria.
O capelão quis confessar os
navegadores.
O caso foi muito falado nesse
tempo. Mais celebrado que a descoberta da Índia. (…)
O facto é que desde então brilha
no Tejo, tranquila, reluzente, vaidosa – a Estefânia, corveta mobilada pelos
Srs. Gardé e Raul de Carvalho.”
Posso transcrever?
Nenhum comentário:
Postar um comentário