sábado, 1 de abril de 2023

Mas um verdadeiro herói


Surgiu, com a “distracção” da NATO, que não acudiu a tempo à Ucrânia, um herói que hoje a NATO “venera” (só podia!), mas não se apressa, mesmo assim,  em receber nas suas fileiras, temerosas da reacção putinista. E nós por cá discutimos, de papo cheio, protegidos – por enquanto – com o sacrifício ucraniano, e nem sequer o referindo… Talvez por vergonha…

A invasão russa da Finlândia é certa?

Ao contrário do que nos têm tentado convencer muitos pseudopacifistas, a Rússia não invade países porque eles estão bem armados. Pelo contrário, invade e anexa países vizinhos mais fracos e isolados!

BRUNO CARDOSO REIS Historiador e especialista em segurança internacional

OBSERVADOR, 31 mar. 2023, 00:1927

Poderá haver quem me acuse de alarmismo. Na hipótese remota de algum finlandês ler esta coluna peço desde já desculpa pela ironia que lhe dá título. Mas a Finlândia parece estar – felizmente – à beira de ver terminado o seu processo de adesão à Aliança Atlântica. O parlamento húngaro deu a sua indispensável aprovação esta semana. O parlamento turco acabou de o fazer ontem. O que irá acontecer a seguir e que conclusões tirar? A acreditar nas teses de alguns a invasão russa deveria ser certa e iminente. Se não acontecer, como espero, veremos se se tiram as devidas conclusões.

A NATO é uma aliança voluntária

Uma primeira conclusão fundamental é que, ao contrário do defunto Pacto de Varsóvia, comandado pela igualmente defunta União Soviética, a NATO é uma organização de adesão realmente voluntária, e em que cada Estado tem realmente um voto e um veto. Isto significa que só com o acordo de todos é possível a adesão de novos membros à Aliança Atlântica. Os EUA têm muito peso por serem de longe quem mais contribui para a defesa colectiva, mas estão longe de poder simplesmente impor a sua vontade. Isso ficou evidente, aliás, em 2008, quando vários Estados europeus vetaram a proposta americana de adesão da Ucrânia. Esta foi uma de múltiplas tentativas de acomodar as sensibilidades russas e chegar a um compromisso negociado, pacífico com Moscovo. Outra foi o facto de, até à anexação russa da Crimeia, em 2014, não haver tropas de outros aliados nos novos membros da NATO. A adesão dos antigos membros do Pacto Varsóvia foi apenas uma forma de lhes dar uma robusta garantia de segurança colectiva e de os ajudar a reforçar os seus meios de defesa próprios para dissuadir agressões. E ainda há quem venha falar de dilema de segurança russo!

O dilema de segurança e o tango

Haveria muito que dizer a respeito de fachadas académicas para teses duvidosas, mas para já basta insistir em dois pontos fundamentais sobre o conceito de dilema de segurança. O primeiro é que, como o nome indica, é um dilema. Um Estado arma-se para se defender, uma vez melhor armado pode decidir atacar, e outros Estados não podem estar seguros sem também cuidarem de se armar melhor. Ou seja, este dilema, como qualquer outro, não têm uma solução simples. Não é uma solução séria para um eventual dilema de segurança russo ceder sempre à Rússia ou desarmar unilateralmente o Ocidente. O segundo é que, tal como no tango, tem de haver pelo menos dois num dilema de segurança. Ou seja, ele não é exclusivo do Kremlin. Na verdade, os países vizinhos da Rússia têm muito mais razões objectivas – pelo volume de armamento russo e pelo seu repetido uso agressivopara se sentir inseguros. A resposta racional a isso é procurar reforçar as suas defesas e as suas alianças. Ou seja, o tão falado dilema de segurança não impede ou desaconselha o alargamento da NATO, é até fundamental para explicá-lo.

Lamento insistir no óbvio, mas a desinformação russa é persistente: nunca houve o indispensável acordo de todos os membros da NATO para a adesão da Ucrânia. Isto não é uma questão em aberto. É um facto histórico. A Ucrânia nunca sequer viu iniciado o processo de adesão que está agora quase concluído para a Finlândia. Mais, em 2014, quando a Rússia ocupou e anexou a Crimeia, a Ucrânia até tinha na sua constituição – desde 2010 – o compromisso com a neutralidade e com não aderir a alianças como a NATO. Esta cláusula só foi revogada em dezembro de 2014. Portanto a propaganda russa de procurar justificar a invasão da Ucrânia com a ameaça temível que a sua adesão à NATO representaria não passa disso mesmo, propaganda. Infelizmente alguns dos nossos colunistas– de Boaventura Sousa Santos a Miguel Sousa Tavares – parece que acreditam e difundem essa versão. Até alguns líderes mundiais parecem atribuir algum mérito a esta tese russa, temos agora um verdadeiro teste da mesma.

Uma invasão iminente?

Em suma, se a propaganda russa relativamente às razões da invasão da Ucrânia for para levar a sério, a invasão russa da Finlândia é inevitável e iminente. Veremos o que acontece. Nunca estou absolutamente certo de nada relativamente ao futuro, ninguém de bom senso está. De Putin pode-se esperar quase tudo. Apesar disso, e tendo em conta o histórico de acumulação de poder e riqueza de Putin, dos seus familiares e amigos, bem como o trabalho que teve para garantir que poderá manter-se no poder até 2036, não vejo razões, para já, para acreditar que vá dispersar forças militares ou deliberadamente provocar uma Terceira Guerra Mundial potencialmente suicida. Mas claro que se a adesão à NATO é que é o cerne do problema russo, e não uma Ucrânia pluralista e pró-ocidental, então Putin deveria concentrar as suas forças, mesmo enfraquecidas, não a combater ucranianos, mas sim os finlandeses, antes que seja tarde demais.

É claro que, até ver, a Rússia não tem invadido países porque eles podem aderir à NATO, ou porque efectivamente aderiram à Aliança Atlântica. Não invadiu a Polónia. Não invadiu os Bálticos. Porquê? Porque, ao contrário do que nos têm tentado convencer muitos pseudopacifistas, a Rússia não invade países porque eles estão bem armados com o equipamento militar ocidental avançado, porque fazem parte da NATO, porque beneficiam da sua garantia de segurança e defesa colectiva. Pelo contrário, a Rússia de Putin invade, conquista e anexa países vizinhos mais fracos e isolados! É por perceberem isto mesmo que suecos e finlandeses decidiram abandonar uma longa história de neutralidade. Os suecos e finlandeses, entre os povos mais educados do mundo, sabiamente procuram a segurança da Aliança Atlântica porque, na sua grande maioria, perceberam a verdadeira natureza da ameaça duma Rússia putinista, mais agressiva e imprevisível do que a Rússia soviética. Parece-me, por tudo isto, felizmente pouco provável que a Finlândia seja invadida. Outra coisa são ataques híbridos russos, de que aliás o país já foi alvo frequente no passado. Não é por acaso que fica em Helsínquia o centro de excelência da União Europeia para conflitos híbridos.

Veremos o que acontece. E veremos o que dirão então estes líderes eminentes e estes eminentes comentadores. Se a Rússia não invadir a Finlândia na iminência de aderir à Aliança Atlântica, espero ver estes líderes e comentadores a retirar publicamente a conclusão lógica. Afinal o problema não era a NATO! Isto, claro, se não estiveram – como insistem – simplesmente a reproduzir acriticamente propaganda russa e a criar falsas equivalências em nome de um suposto rigor. Vou ficar a aguardar, mas confortavelmente sentado, e não por muito tempo.

RÚSSIA            MUNDO        NATO         FINLÂNDIA      EUROPA

COMENTÁRIOS:

Filipe Costa: Os Russos, são 145 milhões, estão a matar os jovens numa guerra que não interessa a ninguém, a sua pergunta é nada. Estamos bem entregues a malucos, os governantes governam-se e eu pago. Venha a eutanásia.                  José Miranda: Excelente artigo: curto e certeiro.             Paula Barbosa: Não gosto nada de ver os comentadores dizerem que a Ucrânia vai DERROTAR a Rússia. Isto quase pressupõe que entraram em guerra. Será mais certo usar expressões como Expulsar a Rússia, Recuperar o seu território, voltar à sua Soberania. É uma expressão humilhante, e quando se lida com broncos ou animais ferozes, não se deve humilhá-los, pois reagem à tarrascada como os touros malinos, como se diz aqui no Alentejo, minha terra de reforma.         Carlos Dias > Paula Barbosa: A Ucrânia não vai derrotar a Rússia certamente mas vai libertar os Russos e o mundo de um tirano execrável e com alguma sorte de um conjunto alargado de discípulos que o acompanham

Ricardo Lacerda Dias: Assim mesmo. É preciso identificar todos os que são equívocos em matérias de liberdade e independência. E nenhum é ingénuo.                    Andrade QB: A solidez da lógica e clareza de exposição deveriam ser suficientes para que todos os que aproveitam a liberdade para apoiarem a versão de ditadores ganhassem alguma vergonha. Infelizmente, mais logo lá voltarão apoiantes dos invasores fazer a sua defesa nas televisões.                Pedro M.: A tese é tão flagrantemente estúpida que os autores só podem estar a agir voluntariamente (ou a soldo?) em prol da propaganda Russa. Não sendo isso, ficam em dúvida as qualidades intelectuais de quem a defende.           Fernando Fernandes: Excelente análise como as a que sempre nos tem habituado. Sobre a Rússia espero verdadeiramente que se transforme numa outra Coreia do Norte onde em vez de comida à mesa a população admire aquelas ridículas paradas militares e o seu querido líder anão de corpo e mente.               Carlos Chaves: Caríssimo Bruno Cardoso Reis, fez uma boa escolha ao ter decidido “sentar-se confortavelmente”, pois os comentadores de que fala, arranjarão uma outra falsa versão que justifique a anterior que andaram a propagar… esta gente não se recomenda! Obrigado pela a sua análise baseada em factos e não em teorias ao serviço sabe-se lá de quem, feita por quem se aproveita do espaço público e do mediatismo que lhe dão!              Francisco Almeida: Bem observado. Não há que esperar qualquer invasão da Finlândia mas apenas um novo tema para a propaganda russa. A desnazificação, a protecção das populações de língua ou de origem russa outra qualquer. E os Boaventuras logo mudarão de discurso. O futuro, especialmente na Ucrânia, é como diz imprevisível mas Putín já conseguiu o seu objectivo. Passar-se-ão ainda muitos anos antes da Ucrânia volte a ser uma sociedade que cause inveja aos russos e lhes inspire ideias de revolta. E, se o fôr, será claramente por uma ajuda ocidental massiva, que os russos nem esperam nem desejam. Por isso não ficaria surpreendido se se chegar a um acordo que replique Minsk 2.               bento guerra: Mas, segundo uns generais que falam nos telejornais, a Rússia não vai ser derrotada pela Ucrânia na "contra-ofensiva" de Verão? E a seguir, ia meter-se com a Finlândia, um país proto-Nato?              Ricardo Lacerda Diasbento guerra: Generais vermelhos                  NLB >bento guerra: Homem, não desvie a conversa. Sabe muito bem o que andam os seus amigos majores-generais Carlos Branco e Agostinho Silva a dizer desde o início da invasão. E também sabe muito bem o que você próprio passa a vida a papaguear aqui. Já está preparado para defender os seus amigos russos quando começar a operação especial na Finlândia? Não precisa, porque não vai acontecer. O seu amigo Putin só se mete com os fracos e isolados.                   bento guerra > NLB: És tão ignorante ,que até lhe chamas Agostinho da Silva,.E sabes em que clube joga?                NLB >bento guerra: Agostinho Costa. Estás a ver como reconheceste o teu amigo putinista mesmo com o apelido trocado? Essa figurinha rastejante, verdadeiro réptil que vai aos noticiários despejar o seu veneno comunóide. Percebe-se logo a vossa afinidade.                  Eduardo L: Assumindo que concorde que a guerra não pode durar para sempre, que o ocidente não vai pôr tropas no terreno e que a Rússia não vai voltar às fronteiras de fevereiro de 2022, pergunto o que sugere para se acabar com o conflito? Penso que neste momento em que parte da Ucrânia está completamente destruída e milhares de jovens de um lado e outro morrem todos os dias, a paz deveria ser o objectivo mais importante. Mas comentar no conforto da paz no ocidente, sentado ao computador e a beber um cafezinho é mesmo muito fácil. Não sou nem deixo de ser 'pseudo pacifista' (??) mas penso que incitar a guerra à custa de vidas alheias, neste caso dos ucranianos, não me parece muito honesto. PS: sugiro que tenha uma conversa com o Prof Mearsheimer da Universidade de Chicago - mas sem lhe chamar nomes!             João Alves > Eduardo L: Tendo em conte as premissas de que parte e o objectivo prioritário que defende, a paz, o que está a defender é rendição incondicional da Ucrânia às exigências do imperialismo mafioso de Putin              José Tomás > Eduardo L: Essa tese encalha num detalhe. Os ucranianos querem combater e estão a combater. E, enquanto for assim, o Ocidente tem a obrigação de os ajudar.              Joaquim Lopes: A questão da Crimeia foi o facto mais relevante que levou a Rússia apoiada pela RPC a se tornar atrevida, a História não justifica nada, como querem fazer crer os ressabiados como Sousa Tavares, velho e a destilar ódio quando contrariado. A Alemanha, foi um dos países que apenas olhou para si, Merkel afinal ainda era parte da elite da Alemanha de leste e foi um engano de casting de Helmut Kohl, o bom Chanceler cristão e conservador, mas Merkel traiu o pai político com as alianças com a Rússia que se comporta com um novo estalinismo, Stalin é o pai de Putin, como torcionário de profissão e de baixa patente, tornou-se num indivíduo das elites do poder na Rússia como no tempo do PCUS, riqueza e luxo para os do topo e miséria para um povo que gosta de ser tiranizado e admira a tirania de assassinos, na esmagadora maioria e na crença da mãe Rússia, Dostoievski conhecia bem a natureza humana e no caso, bem a natureza chorosa do povo russo. Sobre o caso, a NATO falhou à Ucrânia e é bom que se perceba que a Rússia nunca invadiria a Ucrânia se não fosse autorizada pela RPC, sendo a Rússia hoje um seu satélite com tudo o que necessita.                  Maria Clotilde Osório: Não entendo muito de geoestratégia mas, tudo indica, a Rússia vai tentar continuar a expandir a sua influência para sul em direcção às antigas repúblicas socialistas Moldávia, Azerbaijão, Cazaquistão e, quiçá, Arménia. Com a neutralidade chinesa e a garantia de apoio à anexação de Taiwan.               Tristão: Mas o maior país do mundo com o maior arsenal nuclear do universo e arredores tem medo que algum país o invada?! Claro que o problema nunca foi esse, a questão sempre foi territorial, trata-se simplesmente de anexação de parte da Ucrânia, objectivo esse que a que se somava a implantação de um regime fantoche pro-Kremlin - esse parece que teve o resultado inverso.          vitor gonçalvesTristão: Mas se os Russos nem conseguem derrotar os Ucranianos que á partida nem tinham Exército, como podem pretender originar novos conflitos; estão exaustos no momento. E ao contrário do que dizem alguns comentadores acerca das potências nucleares não poderem ser derrotadas o facto é que foram: URSS no Afeganistão e U.S.A no Vietname.é um gigante com pés de barro com um PIB idêntico ao da Coreia do Sul ou da Itália. Têm recursos mas não tecnologia para os poder transformar! 

Nenhum comentário: