domingo, 13 de outubro de 2024

Engalanando

 

As imagens da nossa grandeza.

MIGUEL PINHEIRO  Director executivo do OBSERVADOR

OBSERVADOR, 12 out. 2024, 00:22118

Nosso Senhor Jesus Cristo nos acuda: pelos vistos, temos uma intrusa no templo sagrado do jornalismo. Esta semana, Maria João Avillez entrevistou Luís Montenegro durante o Jornal da Noite da SIC e as virgens ofendidas começaram imediatamente a clamar por socorro. Luís Filipe Simões, que segundo percebi é presidente do Sindicato dos Jornalistas, ficou algures entre a apoplexia e a reacção vagal: “O primeiro-ministro diz de manhã que os jornalistas fazem perguntas encomendadas e à noite dá uma entrevista que as pessoas pensam que é feita por uma jornalista que viemos a saber que não tem carteira profissional de jornalista”. Depois do instinto de indignação veio a vontade de perseguição: “Os actos jornalísticos têm de ser feitos por jornalistas. Existe a figura da usurpação de funções”.

Estamos, portanto, assim: ao fazer perguntas ao primeiro-ministro, Maria João Avillez estava a cometer o crime de “usurpação de funções”. Tem graça porque Luís Filipe Simões nasceu em 1973. Quer isso dizer que, quando o presidente do Sindicato dos Jornalistas deu os primeiros berros na maternidade, já Maria João Avillez estava a fazer perguntas — e a fazer jornalismo. Tendo em conta esse inegável facto, a pessoa que transitoriamente lidera o sindicato da “classe” devia conhecer Maria João Avillez. Como, aparentemente, não a conhece, não me importo nada de os apresentar através deste texto.

Desde o 25 de Abril, Maria João Avillez entrevistou todos os políticos que alguma vez levantaram uma bandeirinha em Portugal. Para evitar transformar este artigo numa lista telefónica, basta falar nos três principais líderes partidários do começo da democracia. Francisco Sá Carneiro falou repetidamente e exaustivamente com Avillez, permitiu-lhe que o acompanhasse nos bastidores de campanhas, confiou-lhe informações, deu-lhe acesso. Já Mário Soares, fez mais. Além de tudo isto, ainda aceitou dar-lhe uma longuíssima entrevista biográfica que seria mais tarde publicada em três livros (e que foi agora reeditada em dois volumes — recomendo a todos, especialmente a Luís Filipe Simões, que comprem). E há Álvaro Cunhal. O líder do PCP recebeu Maria João Avillez para várias entrevistas entre 1976 e 2000. E não falaram apenas sobre política — Cunhal, que era reservado e desconfiado, aceitou conversar também sobre família, sobre comédia ou sobre televisão. Há um outro detalhe que junta Sá Carneiro, Soares e Cunhal: é que, além de terem dado inúmeras entrevistas a Maria João Avillez, todos eles, em algum momento, se incomodaram com ela. Ou seja: todos perceberam, sem que lhes fosse dada margem para confusões, que Maria João Avillez é jornalista, não é uma activista nem é um pé de microfone.

Eu já disse isto no início do texto, mas vou repetir, para que não restem dúvidas: dei os exemplos de Sá Carneiro, de Soares e de Cunhal, mas, nos 51 anos de vida do presidente do Sindicato dos Jornalistas, Maria João Avillez fez perguntas a muito mais pessoas. E não apenas a personagens que se movem na “corte lisboeta”. Uma das suas últimas “cachas” foi conseguir entrevistar o Papa Francisco, que seguramente não se impressiona com apelidos nem com árvores genealógicas. Imagina-se o sobressalto que terá percorrido os salões do Vaticano esta semana ao descobrirem, com pasmo e horror, que Maria João Avillez não colocou o seu nome na sacrossanta Comissão da Carteira Profissional de Jornalista.

Estes dias foram de inveja e de raiva reprimida. Em certo sentido, olhando para o currículo do alvo da fúria deles, eu percebo: quem lhes dera. Mas valeu tudo. Maria João Avillez foi acusada de não ser jornalista, foi acusada de ter feito carreira apenas por pertencer à “corte” desde o berço — e foi ainda acusada, claro, de ser “de direita”. É uma crítica interessante porque, durante quinze longos anos, a “classe” não se importou de ter como presidente do sindicato um jornalista que hoje é deputado eleito pelo PCP.

Além de mostrar incoerência, esta crítica selectiva mostra ignorância. Conheço profissionalmente Maria João Avillez há muitos anos, quase 20. Trabalhamos agora juntos no Observador e, antes, trabalhámos juntos na revista Sábado. Em todo este tempo, nunca vi Maria João Avillez a trocar um juízo jornalístico por um cálculo político: escreveu sempre o que tinha a escrever e fez sempre as perguntas que tinha a fazer. Mas, lá está, não precisam de acreditar no que eu digo. Nestas longas décadas de trabalho e esforço, Maria João Avillez nunca se escondeu: o trabalho que fez, pela sua própria natureza, é público. As entrevistas estão gravadas, os artigos estão publicados, os livros estão editados. Agora, ao fim de mais de 50 anos, querem convencer-nos que Maria João Avillez não é uma jornalista, é apenas uma usurpadora. A mim, dá-me vontade de rir. Suspeito que a ela também.

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COMENTÁRIOS (de 118)

Francisco Costa > Ruço Cascais: Disparate completo. A qualidade e criatividade da obra de nada interessam se não houver canudo ?! Defesa da mediocridade….                   Leopoldo Carvalhaes > Ruço Cascais: Ai Ruço. Esse pseudónimo assenta-te com uma luva. Agora um canudo faz um jornalista. Tem-se visto a mediocridade dos encartados…                   José B Dias > Ruço Cascais: Presumo que quando escreveu "cooperativismo" quisesse efectivamente dizer "corporativismo"! Claramente coisa de quem não se esforçou a tirar um curso de comentador ... ou, pelo menos, a prestar atenção nas aulas.               Marta Santos > Ruço Cascais: Eu não sou da área mas é sabido que antigamente não existia o curso de jornalismo ( foi uma coisa que se inventou em 1979) normalmente os jornalistas tinham curso de direito, economia, letras, etc), e a lei entretanto fez foi reconhecer quem tinha mais de 15 anos de jornalismo não precisava do curso e podia automaticamente tirar a carteira de jornalista. O curso só serviu para dar tachos no ensino a muita gente, e diminuiu muito a qualidade do jornalismo porque ter um licenciado em direito a fazer um artigo sobre justiça ou um economista sobre impostos é tendencialmente melhor que um jornalista que tanto faz sociedade como justiça ou economia              Maria Tavares > Pedro Diogo Vaz: Exactamente. Nunca vi esse sindicato se insurgir contra o LIXO que se produz, oral ou escrito, coitadinhos destes jornalistas, reconhecidos pelo sindicato, que nem um texto ou apresentação sabem interpretar. Desde que paguem a cota passam de mediocridade para estrelato. Não se espera outra coisa desta esquerda.             JOHN MARTINS: O que interessa é a clareza e profundidade das reportagens que não apenas informam mas também educam e envolvem os cidadãos. Ora, Maria João tem-no feito ao longo da sua vida. Depois desta entrevista  ao Pº Mº Luís Montenegro e antes tantas outras incluindo uma ao Papa, Maria João mostre a essa casta que tem credibilidade para poder entrevistar altas figuras nacionais e internacionais. Para inveja deles.             Tim do A: De que é que a AD está à espera para acabar imediatamente com a ERC e com todos esses órgãos censórios e pidescos compostos por parasitas da sociedade que pululam por aí?               Lupus Maris > Ruço Cascais: Pelos vistos, a "excelente" qualidade dos cursos de jornalismo, não possibilita aos seus diplomados o conhecimento suficiente para conhecerem o conceito de corporativismo, conforme demonstrado no texto, no qual é escrito cooperativismo...ah, foi o corrector automático!...ok... peço desculpa.              João Floriano: Aplaudo Maria João Avillez e a crónica de Miguel Pinheiro de quem tantas vezes discordo. A indignação destes guardiões do jornalismo não é  a falta de carteira, mas o facto de Maria João não ser de esquerda. Gostaria de saber quantos jornalistas de esquerda andam por aí e também têm  a falta da tal «carteira». O garrote que a esquerda nos está  a impor está  a ficar asfixiante. Os responsáveis pela classe profissional dos jornalistas deveriam preocupar-se mais com a qualidade da informação e sobretudo saber distinguir entre a notícia e a opinião.             Maria jose de castro: Toda esta estúpida polémica em torno de MJA só demonstra a importância que suas entrevistas e opiniões sempre tiveram desde o 25/4! Ela sempre foi isenta, coerente e inteligente naquilo que disse e escreveu! Agora vêm uns tantos dizer que lhe falta um papel qualquer! Ao que esta CS chegou!!!             Fernando ce: Tenho 68 anos e meio. Sempre gostei de Política, e pelo menos desde os meus 19 anos (em 1975) que acompanho o percurso de MJA. Considerava-a a nossa Oriana Falacci, pela forma como exercia a sua profissão. Sempre gostei de MJA, talvez também por ser segundo penso de centro-direita, identificando-me com muitas das suas análises. É alguém que nunca precisou da política nem do jornalismo para sobreviver, o mesmo se passando com a sua irmã  a saudosa Maria José Nogueira Pinto que não precisava da política para nada, e que eu também admirava e respeitava pelo desassombro , inteligência e independência.                João Ramos: Muito bem, Miguel Pinheiro, fica-lhe bem esta atitude pois a Maria João bem a merece, este texto devia ser, e de certa maneira é, esfregado na cara de tanto «jornalistas encartados» que mais não são do que incompetentes e facciosos advogados de posições políticas que bem nos têm conduzido à mediocridade deste país…              Jorge Freitas: E, além disso, escreve belissimamente, ao invés de 80% dos jornalistas encartados que, após licenciaturas e mestrados, continuam a mal saber juntar duas letras.              Marta Santos: Diria que faltaram argumentos a demostrar que isto foi uma perseguição direccionada. E o Ricardo Araújo Pereira que entrevista candidatos às eleições numa programa de televisão? ou o Globo de Ouro da SIC que premiaram o Guilherme Geirinhas pelo podcast “Bom Partido” onde foram quase todos os cabeças de lista das Europeias? E todos os influencers e bloguistas que fazem entrevistas a políticos? É que se vão pôr um processo à MJA que dêem o exemplo e processem todos              Andrade > BG: Estava à espera que os meus filhos acordassem para lhes fazer algumas perguntas, mas agora percebo que, antes disso, precisarei tirar a carteira de jornalista. Considerando a qualidade linguística, o domínio dos temas e a dicção de muitos dos que ouvimos diariamente, parece que não será uma tarefa tão demorada. Quem sabe, talvez eu até consiga comprar uma carteira profissional da mesma forma que se adquire um passaporte falso: em quinze minutos e por 500€.              António Soares: A entrevista que MJA deu a Montenegro, caiu como um pedregulho no esgoto onde chafurda uma grande parte da nossa CS. O agitar das águas putrefactas, causou um fedor nauseabundo...                     João Floriano > Coxinho: O problema é que esses «pobres lacaios» não são tão pobres assim e estão a dar cabo do nosso futuro. Veja por exemplo o caso do Bloco. Não consigo encontrar gente mais preconceituosa, arrogante e donos da superioridade moral. Totalmente errados. No entanto veja o poder que continuam  a ter sobretudo  a nível da CS.                  Nuno Alves: Foi assim que tramaram o António Abreu e o Noticias Viriato, lembram-se? Estaline e os seus sequazes, no seu melhor.                Coxinho: Não faço ideia se MJA é de direita ou de esquerda ou de alguma outra orientação política ainda por baptizar. Provavelmente limita-se a ser uma pessoa honesta -- qualidade que vai rareando nos dias que passam e cuja falta se nota mais na classe política. O que sei é que ela preenche e excede todos os requisitos suficientes para a elevar a um plano de excelência inusitado no jornalismo português. Quanto a esse tipo do sindicato, seja ele politicamente convicto ou apenas ganancioso, coitado...                        Paul C. Rosado: Figurinha ridícula, a deste sindicalista. Cheira tanto a inveja...                Graciete Madeira: Completamente de acordo com este artigo.                  Carlos Chaves: Sempre fui crítico (e continuo a ser), da tentativa de entronização de Mário Soares (um político pernicioso para Portugal), que a Maria João Avillez, tem feito durante a sua vida jornalística. Dito isto, esta minha posição não me impede de ter por ela uma enorme consideração, admiração e agradecimento pelo seu trabalho jornalístico exemplar, e pelo tratamento de luxo que sempre deu, e dá, à nossa grande língua Portuguesa. Obrigado Maria João (permita-me a familiaridade da linguagem). Este ataque vil, vindo de dentro da classe jornalística é prova da sua degradação, um péssimo sinal para a qualidade da nossa democracia. Obrigado Miguel Pinheiro, por vir pôr os pontos nos ii.                M Vicente: Felicito o Miguel Pinheiro, por este artigo. Não conheço pessoalmente a Sra. M João Avilez, mas conhecedor do seu trabalho, não a vejo merecedora de críticas tão mesquinhas e comichosas. MJA, não precisa de fazer fretes a ninguém e, tomaram muitos, muitas e "muites" jornalistas ter a postura, conhecimento e elevação da Sra. (Só para acrescentar ao descrito pelo Miguel Pinheiro, se me permite: Acompanhei o trabalho feito por MJA, recentemente aqui o Observador a 50 convidados, acerca dos 50 anos do 25A). Nem é preciso referir mais nada, tudo o mais, o Miguel Pinheiro, tem no texto...               Afonso Soares: Tem que ser jornalistas do "yes  man" para terem a aprovação dos "independentes de esquerda". Infelizmente é o que temos e depois queixam -se que ninguém os lê.                Fernando ce: Adoro a Maria João Avillez. Não precisa de fazer fretes para sobreviver. Obrigado, Miguel Pinheiro.              josé cortes > Ruço Cascais: Tenha juízo. E cuidado. Se o ridículo matasse... Mas não se passa nada, é só mais um comissário do PCP no sítio certo, como há anos se esforçam por estar. Mas eles próprios estão em extinção. Agradeçam "mazé" ao Montenegro por não se ir agora para eleições              ALMA: Maria Joao Avillez, prepara as entrevistas de forma competente, dá trabalho, mas o resultado é Bom. Mete Sindicato de Jornalistas e o seu chefe manifestaram a sua " dor de corn." e estupidez ao criticar uma Jornalista que lhes lembra , ainda hoje , a sua incompetência. Leiam, aprendam português e ganhem algum sentido crítico e, talvez, cheguem aos seus calcanhares. Comecem por deixar de publicar notícias falsas ...             Maria Rita Menezes: Muito boa, justa  e correcta defesa de uma óptima  jornalista! A inveja "mata"! Cpts                    Bernardo Vaz Pinto: A mediocridade dos canudos e dos Srs drs professores…ridículo total …o papelinho do corporativismo         João Angolano: O alimento da esquerda é a inveja o ressentimento e a pedra no sapato e depois tem várias derivas uma delas é o ridículo                      JOHN MARTINS > Ruço Cascais: Não discuto o conteúdo da entrevista, o modo e o tom; o que vi foi um Montenegro muito descontraído e certamente satisfeito com o trabalho feito em marcha acelerada em prol da comunidade. Quanto à organização da entrevista, os seus assistentes fizeram o que deviam...     Nota: não vejo o porquê do seu comentário ter outro destino!               afonso moreira: A reacção da "classe" é bem o espelho do que tem sido a comunicação social nas últimas décadas. Estão mais preocupados consigo-mesmos do que com o serviço que deviam prestar. São também culpados pelo nosso subdesenvolvimento na medida e desde que se conluiem com o Poder instalado que lhes distribui benesses várias. Só um ex: Ruela na comissão de inquérito das gémeas.               Maria Tejo > Jorge Tavares: Ora aí está uma excelente pergunta? Suspeito de que o PS tem umas interpostas correias de transmissão muito úteis, aparentemente ligadas à “extrema-esquerda” , que nos momentos de aperto e perda arranjam faits-divers, que à falta de melhores argumentos, passam pela detracção de factoides sem sentido. São propagandistas natos.     João Fonseca: MJA tem muito que ensinar para quem quiser aprender. Tem uma carreira e é uma profissional a sério! O jornalismo em Portugal na sua maioria das vezes são a “voz do dono” e por isso está na maioria dos casos falido à espera de sinecuras e serviços encomendados, que permita a esses jornalistas vendidos uma vida dentro da zona de conforto a que se habituaram.                 Pertinaz > josé cortes: Tocou no ponto criativo crítico…               Pedro Lucas: Não me lembro dessa criatura sindical queixar-se da inexistência de jornalismo em certos pasquins e Canais de M. na TV (got it?) com muita carteira para dar...e vender (got it?). Os cães ladram, a caravana passa.       Ruço Cascais > Francisco Costa: A esta hora já devias estar a fazer ó ó, senão ficas birrento e com pouco alcance intelectual.  “O canudo não interessa para nada. O que interessa são a qualidade e a criatividade, valores inatos que dispensam a formação,” Deves ter razão, andam as pessoas a estudar para quê? Pois é, ainda vou criar a NASA portuguesa com meia dúzia de habilidosos e criativos que gostem de astrologia.  Vai dormir para acamares melhor essas ideias. 

 

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