Um retrato saudável de Luís Montenegro sobre conceitos partidários pessoais de
que nunca mais se falara, em termos da velha doutrina… Que os mantenha como aqui se descreve, com a coragem do
desafio contra o pedantismo de tanta simpatia falsamente humanitária, na realidade,
desafiadora do senso comum…
A direita voltou ao PSD pela mão de Montenegro
O poder fez Montenegro colocar as
causas direitistas no fundo do cacifo, mas agora é útil recuperá-las para
firmar as diferenças para o PS e não deixar o Chega sozinho à direita do centro.
RUI PEDRO ANTUNES Editor de Política do Observador
OBSERVADOR, 22 out. 2024, 00:2240
O
PSD teve um líder, Rui Rio, que durante quatro anos e meio negava que o partido
fosse de direita. Garantia que era de centro e nem sequer concedia a designação
mais consensual do ponto de vista da ciência política: centro-direita. É inegável que, no espectro político
nacional, o PSD é o grande partido de direita como — com as devidas distâncias
históricas e geográficas — é o PP em Espanha ou o Partido Conservador no Reino
Unido. Os líderes fazem oscilar o posicionamento do partido numa matriz
invisível e, depois de Rio, não havia grandes dúvidas que Montenegro puxaria o
PSD mais para a direita.
Na sua vida política, Luís Montenegro
esteve sempre mais próximo do lado das causas da direita e até da ala mais
conservadora do partido. Em 2004,
quando a não-discriminação em função da “orientação sexual” foi colocada na
Constituição, o então deputado do PSD assinou uma declaração de voto ao lado de
Isilda Pegado e de mais 42 deputados do PSD (numa bancada que tinha na altura
tinha 105) que queria deixar claro que alteração não abriria caminho para o
casamento entre pessoas do mesmo sexo ou adoção homoparental.
Sobre esse particular, dizia a declaração de
voto, que os “institutos
jurídicos, de secular formação, onde a complementaridade sexual entre homem e
mulher são exigidos, não claudicam perante tal afirmação de igualdade” e que
“estão entre estes institutos jurídicos o casamento e a adopção, cujos
superiores interesses e pressupostos de facto não se compaginam com orientações
sexuais que perfilhem a homossexualidade como forma de vida.” O mesmo voto lembrava que o PSD firmava
“convictamente o casamento como expressão de uma relação entre um homem e uma
mulher, figuras parentais, que contribuem para o saudável crescimento dos
filhos.”
No
outono de 2013, Hugo Soares dava a cara por uma proposta de referendo à adopção
por casais do mesmo sexo, mas Luís Montenegro, seu líder parlamentar e mentor,
deu-lhe todo o respaldo possível. O Tribunal Constitucional travaria a proposta
de referendo, mas em 2015 o próprio Luís Montenegro voltava à carga e admitia
vir a incluir uma proposta de referendo no programa eleitoral do PSD nas legislativas
desse ano. Quando a proposta para a adoção foi aprovada, Luís Montenegro,
alinhado com Passos Coelho, deu liberdade de voto à bancada, mas em coerência
com o que pensava votou contra a coadopção.
Ainda
em julho de 2015, a bancada do PSD, liderada por Luís Montenegro, aprovou
alterações à lei da Interrupção Voluntária da Gravidez que dificultaram o
acesso ao aborto ao incluir, por exemplo, taxas moderadoras e outros obstáculos
ao processo.
Já
depois de chegar à liderança do PSD, Luís Montenegro defendeu um referendo à
eutanásia. Ainda mais distendido, quando era candidato à
liderança do PSD defendeu em entrevista ao
Observador em maio de 2022 que votaria
contra a despenalização da eutanásia e contra qualquer despenalização das
drogas leves. Na mesma
entrevista defendeu que a disciplina de Cidadania fosse despolitizada e
deixasse de ser obrigatória: “[A disciplina de cidadania] deve ser facultativa,
completamente despolitizada e não deve ser usada com intuitos mais ou menos
subreptícios como tem acontecido com os governos de esquerda.”
Ao
longo da sua vida, sempre que teve de se posicionar em causas da direita,
Montenegro nunca hesitou. Ficou
sempre do lado mais conservador ou, no mínimo, menos progressista. Mais perto
da direita do que do centro. E o mesmo se pode dizer relativamente à economia,
tendo sempre um posicionamento mais liberal e menos estatizante — logo mais
próximo da direita económica.
Mas o poder, ou o simples facto de
estar próximo, fez Luís Montenegro colocar as causas da direita, senão na
gaveta, no fundo do cacifo. Quando Paulo Núncio defendeu que a lei do aborto
devia ser revertida logo que possível, Montenegro não só ficou furioso com o
parceiro CDS como se apressou a dizer que era um “assunto arrumado” e
colocou-lhe uma pedra em cima: “Não
vamos mexer na lei do aborto”. Na pré-campanha das Europeias, já sem
estar em causa a sua eleição, Montenegro disse ser contra a integração do
aborto como um direito na Carta dos Direitos Humanos da União Europeia, mas,
mesmo aí, alegou uma razão jurídica. Ou seja: destacou a conflitualidade entre o direito à autodeterminação da
mulher e o direito à protecção da vida do nascido, mas não disse qual, na sua
análise, prevalecia.
Agora que o seu Governo garantiu mínimos
de estabilidade, assegurando um prazo de validade até ao verão de 2026, Luís
Montenegro libertou-se das amarras e assumiu o seu lado mais direitista. Nem no
programa eleitoral, nem no programa de Governo, constavam alterações à
disciplina de cidadania. Mas
Montenegro, no Congresso do partido do último fim-de-semana, garantiu “reforçar
o cultivo dos valores constitucionais e libertar esta disciplina das amarras a
projetos ideológicos ou de facção.” Foi o maior aplauso entre as sete
medidas, com congressistas a levantarem-se, o que mostra que uma parte do
partido estava sedenta de ter qualquer-coisa-de-direita do seu líder.
Para
este novo ciclo, Luís Montenegro também trouxe uma postura mais securitária
(logo, mais à direita), ao defender a visibilidade dos polícias na rua, o
aumento dos sistemas de videovigilância e enviar equipas de várias polícias
para combater no terreno a criminalidade violenta. Isto quando, há poucos
meses, tinha uma ministra da tutela a dizer que “não é que haja mais
insegurança, é o sentimento”.
Em
matéria de imigração, Montenegro também anunciou a construção de “dois centros
de instalação temporária”, em Lisboa e no Porto, que não serão meros centros de
acolhimento para imigrantes sem-abrigo, uma vez que o primeiro-ministro reforça
que são destinados a “acolher casos de imigração ilegal ou irregular.” Ou
seja: a tónica não está focada na vulnerabilidade dos imigrantes, mas na
legalidade da sua permanência do país.
A
afirmação destas causas de direita é estratégica para Luís Montenegro. Num
momento em que PSD e PS estão em sintonia no rigor das contas públicas, que
viabilizam em conjunto um orçamento, que unem esforços para o PRR e que pensam
da mesma forma em assuntos de política externa, o líder
do PSD quis marcar as diferenças para o PS em matérias com uma componente mais
ideológica.
O novo posicionamento é assim
intencional. Num momento
em que André Ventura assenta o discurso em provar que PSD e PS são iguais,
Montenegro contrapõe com políticas mais à direita que já eram do PSD (e mais
ainda do CDS) antes do Chega existir ou de quando Ventura ainda estava no PSD.
Além disso, claro, vai piscando o olho ao eleitorado mais à direita, que foi
fugindo para o Chega.
Ao mesmo tempo, Montenegro dá, voluntária e intencionalmente,
discurso ao PS. Depois de forçados a viabilizar o Orçamento da AD,
os socialistas estavam com dificuldades em ter uma mensagem mobilizadora e
agora passam a tê-la. Já não têm de centrar os ataques à AD em matérias
orçamentais, pois têm pano para mangas em outras matérias (mais ideológicas) em
que o PS de Pedro Nuno até está mais confortável para atacar a direita. Tudo
isto ajudará a passar a tensão do debate orçamental, que será intenso na
especialidade, para o velho binómio esquerda-direita em matéria de costumes. Que
pode ser mais agressivo, mas não perturba a aprovação do OE.
O líder do PSD ainda vai tentando
equilíbrios como, por exemplo, ter uma direcção paritária, dar nas orelhas a
André Ventura por associar criminalidade a etnias ou chamando para primeira vice-presidente uma defensora da igualdade de
género, mas reafirma o PSD como um partido de direita. É nesse
facto (como comprovado pela reação do Congresso) que os militantes mais gostam
de ver o partido. E é o que assenta melhor na historial político do
primeiro-ministro. A direita voltou ao PSD, o verdadeiro Montenegro também.
CONGRESSO DO PSD POLÍTICA PSD LUÍS MONTENEGRO
COMENTÁRIOS (de 40)
OHN
MARTINS: Muito bem. foi exactamente, por defender os seus princípios e com bom senso
e intuição política, que defendeu as suas causas, no lugar certo, o congresso,
e assim foi aclamado por todos os congressistas. Força, Montenegro, nos 50 anos
de vida do PSD o povo português continua a confiar no partido, desde Braga até
á Madeira e aos Açores, Continente e Capital. Formidável... Ana Cristina: Basta analisar o histórico de
governação do PSD com Cavaco ou Passos, para se concluir que é um partido de
direita. O Chega para se afirmar faz outra versão e vai sempre buscar o Rio,
este nunca governou por isso não tem história. O Chega dependia da miséria
socialista! Agora Ventura vai ter que apresentar uma real alternativa, não vai
ser o mar de rosas que foi até aqui. João Floriano: «A direita voltou ao PSD, o
verdadeiro Montenegro também.» Vamos ver se será assim. Vai uma grande distância
entre o dizer e o fazer. Sobre a segurança e o estado de Direito, o que ontem
aconteceu na Cova da Moura, prova que de facto não será a esquerda que
trará o sossego e a ordem nas ruas. Os tempos não correm de feição porque
os portugueses estão cansados das rixas, dos motins, da violência, mas se fosse
há uns tempos atrás já teríamos a extrema-esquerda em peso a condenar a
brutalidade policial sobre «pacatos cidadãos trabalhadores». Mesmo assim, as
redes sociais falam de racismo. António Lamas: E ainda bem. Como dizia o
outro, habituem-se.
bento guerra: Este Antunes parece um daqueles auxiliares de treinador de futebol, que
desenham esquemas em cima de um quadro. A imigração é um problema na Europa e
Bruxelas já produziu decisões, mais próximas das ideias do Chega do que dos
hipócritas nacionais. Eduardo
Cunha: quando leio artigos como este fico a pensar que a esquerda defende o quê? a
bandalheira? mas o que é a esquerda afinal? acho que nem o cronista sabe. Sara Alexandre: Artigo completamente
tendencioso, com críticas constantes ao "ser de direita". Para este
autor, o referencial deve ser a esquerda, sendo que tudo o resto é de
"direita", como se esta fosse nebulosa, radical, pouco humanista.
Nunca vi nenhum artigo seu "sobre políticas de esquerda, ou radical de
esquerda" relativamente às políticas/ medidas do AC. O Observador já
era... e desilude paulatinamente quem o lê e tem uma visão da sociedade menos
maniqueísta. Fernando
ce: Não é uma
má análise, e porque em vez de direita em relação aos costumes porque não dizer
que simplesmente está a representar metade do povo português de que eu faço
parte? Por outro lado, todos “ evoluímos” em matéria de costumes e
o que era “ verdade” há 20 anos não o é hoje. Até em política. E em sentido
contrário. Atribui-se uma expressão a Willy Brandt que diz mais ou menos isto:
aos 20 anos era comunista, aos 30 socialista e aos 40 social-democrata. Em relação às mulheres, na
política até tem sido a direita com mais mulheres de destaque: manuela ferreira leite, teresa patrício gouveia,
maria josé nogueira pinto, assunção cristas , e muitas outras. É muito novo, por isso não se
deve lembrar do desafio que carlos
Candal do PS fez a paulo
portas, do ataque na imprensa a pedro Canavarro do PRD (e não terá vindo da direita) , e até das “bocas” de Mario soares sobre a situação marital de Sá Carneiro. Espero tê-lo ajudado a ser mais equilibrado nas suas
análises. Carlos
Chaves: E ainda bem, se for o caso, isto é, se o PSD finalmente se volte a situar
na área da direita conservadora! Portugal precisa de renegar o
socialismo/comunismo como de pão para a boca! E depois a democracia só ganha
com a diferenciação clara entre o PS e o PSD, entre a esquerda e a direita! Se
a “direita” tiver juízo e puser esta secular Nação a funcionar, deixarão os
socialistas/comunistas a falar sozinhos! Era o melhor que nos podia acontecer,
a Portugal e aos Portugueses! Ricardo Ribeiro: Segundas, Quartas e Sextas é
Chipicau Terças, Quintas e Sábados é Bolycau Aos Domingos descansa... É
conforme o vento, se está de Nordeste ou Sudoeste... unknown
unknown: Comecei o artigo a pensar que era mais um auto de bajulação ao Montenão.
Mas depois fiquei a saber que Montenegro não tem espinha. Tanto é
fervorosamente homofóbico e pró-vida como mal perceba que isso lhe pode custar
votos, manda a coligação calar a boquinha e não fazer ondas. Tanto é a favor
dos referendos que lhe dão jeito como se recusa a fazer os que não são. Diz que
quer mais polícia mas quando é altura de lhes aumentar o ordenado - ou aceitam
o que vos dou ou não levam nada – assim, em modo chantagem. E onde está a
preocupação com o País e com o Povo? Não sabemos… irá depender do contexto e do
que mais lhe convier. Hoje é uma coisa e amanhã é outra. PS e PSDois - as
jibóias do regime. Alberico
Lopes: Este menino por muito que se esforce não consegue deixar de soletrar a
cartilha que os queridos associados ao largo dos ratos lhe têm pedido para
continuar a brandir neste jornal que já foi verdadeiramente de direita! Para
mim, é um dos avençados do largo das ratazanas e que aqui veio parar para
subverter tudo o que catapultou este Jornal para a sua essência! Claro que o Luiz
Montenegro é e sempre foi de direita! Claro que o Rui Rio foi um verdadeiro
sabotador do trabalho de Passos Coelho! Só faço votos para que o Luiz
Montenegro nunca se desvincule das suas origens e nunca se esqueça de que quem o
lançou no estrelato foi o Pedro Passos Coelho que, para mal do país, continua
em bom recato, talvez a aguardar que seja todo o País e não só o PSD, a clamar
pelo seu regresso, pois já está mais que demonstrado que seria o único
estadista com capacidade para dar volta a esta pasmaceira!
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