Estávamos as duas – a nossa amiga e eu,
embevecidas, pendentes do relato que a minha irmã nos fazia de um telefonema
que fizera a uns amigos ultimamente muito renhidos na devoção a Deus, pois
rezam o terço, de manhã, à noite e não sei se em mais alguma hora do dia, além
das missas. A minha irmã contava que telefonou e foi atendida pelo marido, em
surdina, explicando que a mulher estava a rezar o terço, o que levou a minha
irmã, comprometida, a desligar, também em surdina. E a minha irmã estranhava
tal devoção e saiu-se mesmo com uma pergunta que considerei de extrema
irreverência, sobre o excesso das rezas, e logo ali lho transmiti! Foi a
seguinte, a pergunta: Mas isto dá algum
resultado?
A nossa amiga riu-se, também pouco
convicta do resultado das rezas, mas o meu modo de ser e de estar, de profunda
amplitude liberal, fez-me condenar, embora suavemente, que não sou pessoa de
azedumes, o precipitado da sua pergunta.
A verdade é que a minha irmã é pessoa
equilibrada e mede tudo por uma bitola de rigor, onde os excessos não entram -
por isso mantém o peso de sempre e condena rigidamente o meu aumento no
capítulo, que se deve muito às guloseimas irresistíveis que fortalecem a minha
doçura natural. Quanto à religião que cada um pratica, é adepta do paralelo do
Bispo Alves Martins entre aquela e o sal da comida, que, aliás, é usado com
cada vez maior parcimónia, o que justifica talvez a tendência da minha irmã
para a diminuição da sua fé, com condenação do excesso de terços diários.
Mas o problema é complexo e nem teólogos
nem positivistas chegaram ainda a um consenso. O certo é que gostaria de
encontrar no Além os pais que lembro sempre com saudade e que continuasse ali
mais tarde a presença da família que tenho hoje e que me custa deixar.
Mas mais vale rir com a minha irmã dos
exageros – desses do terço e dos meus sem terço.
Tanto mais que neste dia, há 56 anos,
nasceu o meu filho João. Rions, donc.
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