Já tinha escutado Marques Mendes, profundamente indignado com o caso que também
descreve Sónia Sapage - de não
atribuição de “tempo de antena” parlamentar aos parlamentares únicos dos
partidos pequenos – Chega, IL e
Livre - que Sónia Sapage considera sob uma designação de “slow democracy”,
embora no PS final pareça contestar tal designação. Eu alinho mais
na atitude crítica de Marques
Mendes, achando antes o facto como pertencendo a uma “bad”, “sad” democracy”,
que não respeita o “povo” adepto desses partidos, pois não dá voz aos seus
representantes.
OPINIÃO: Slow democracy
O conceito de slow democracy existe. Pressupõe maior envolvimento dos cidadãos,
valorização da tomada de decisões a nível local, política de proximidade.
SÓNIA SAPAGE PÚBLICO, 11 de Novembro de 2019,
De
há uns tempos a esta parte, a palavra “lento” (em inglês slow) entrou no léxico
comum como um sinónimo de qualquer coisa boa. Não só boa: fora de série. Slow
food e slow journalism são, por oposição a fast food e fast journalism,
dois conceitos com sentido muito positivo. Pressupõe-se que existe tempo para
comer, confeccionar e saborear o que se come e tempo para investigar, escrever
e apreciar o que se está a ler.
Dei comigo a pensar nisto depois do
caso em que a Assembleia da República decidiu não deixar os deputados únicos intervirem no primeiro
debate quinzenal. Os debates quinzenais não serão o momento
parlamentar mais importante (contribuir no processo de fazer uma lei ou
integrar uma comissão de inquérito pode ter mais repercussões na sociedade),
mas são um instrumento de escrutínio da actividade do Governo com bastante
relevância e peso, desde logo pelo seu mediatismo.
A
conferência de líderes não decidiu só impedir os deputados únicos de participar
no debate, também deixou no ar a possibilidade de alterar o regimento para mudar as
regras. Com “urgência”, pediu
Eduardo Ferro Rodrigues, que
esteve ao lado do PSD, CDS e PAN a defender que os parlamentares do Chega,
Iniciativa Liberal e Livre
deviam ter os mesmos direitos de
tempos e de estatuto de observador na conferência de líderes conferidos a André
Silva, do PAN, em 2015. A decisão foi remetida para a Comissão de Assuntos
Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e é nessa sede que será
discutida quando for debatido o projecto de lei da Iniciativa Liberal para alterar o
regimento. E foi neste ponto da questão que a ideia de slow
democracy me passou
pela cabeça. O Presidente
da Assembleia da República pode até ter pedido “muita urgência”, mas é bem possível
que o processo venha a ser lento, porque as comissões têm as suas próprias
convenções, obrigatórias para garantir a regularidade do processo democrático.
Pode a democracia (ou a justiça) ser
lenta? Deve sê-lo para evitar precipitações ou arrependimentos? Quanto tempo
é aceitável que se leve a decidir se é possível aplicar a três deputados a
flexibilidade que já antes foi aplicada a um único? E, ao longo desse tempo que
demora a tomada de decisão, o que se ganha em calá-los?
Passaram
quatro anos desde que o anterior Parlamento aceitou que André Silva tivesse alguns (não todos) dos direitos, como
deputado único, que tinham os grupos parlamentares. Foi tempo suficiente
para se debater a questão em comissão parlamentar, alterar (ou não) o regimento
existente e “legalizar” (ou não) a excepção aberta para o PAN. Mas a
verdade é que ninguém se preocupou com isso. Quatro anos
depois, creio que não ouvi ninguém criticar a Assembleia da República por
ter possibilitado a André Silva
ter o estatuto de observador na conferência de líderes ou permitir-lhe
intervenções em debates quinzenais.
Por outras palavras: todos aceitámos a excepção, considerando-a uma boa
prática democrática. Aliás, essa foi com certeza uma das razões que permitiram
ao PAN crescer ao ponto de ter agora quatro deputados e morder os calcanhares
ao CDS. É disso que temos medo?
PS: O conceito de slow democracy existe. Não tem nada a ver
com o assunto tratado neste texto nem com o tempo da tomada de decisões. Está,
sim, relacionado com o maior envolvimento dos cidadãos, a valorização da tomada
de decisões a nível local, a política de proximidade.
COMENTÁRIOS:
P Galvao: 11.11.2019: Já há muito que a
forma de participação dos cidadãos na política, designadamente a democracia
directa (ou sucedâneos de uma participação nesses moldes) em contraste com a
representativa, vem sendo equacionada, discutida, e teorizada. A matéria
dispensa a nova designação pós- moderna. Cumprimentos. ricardo.andre, 11.11.2019: Também dispenso o
neologismo / anglicismo. Mas o artigo parece-me ser sobre melhorar a democracia
representativa (melhorar o contacto com os representados, melhorar a capacidade
de representar), não sobre democracia direta (sem representantes permanentes).
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