Mais um texto esclarecedor de Alexandre Homem Cristo que nos
informa seriamente sobre a “qualidade” dos Serviços de Saúde e sobre as
manobras dos principais responsáveis pela sua degradação. Ler para reter.
Alguns comentadores o apoiam, com igual hombridade.
Saúde: a geringonça tem as
mãos sujas /premium
Com o SNS à beira do colapso, importa
fixar isto: os que à esquerda hoje se posicionam na primeira fila para salvar o
SNS são os mesmos que passaram os últimos 4 anos a autorizar o seu
estrangulamento.
ALEXANDRE HOMEM CRISTO
OBSERVADOR, 28 nov 2019
Afirmar que o SNS está à beira do
colapso é insistir numa evidência que todo país já constatou. É preciso
salvá-lo, como tanto por aí se ouve? Sim, será. Mas, para o salvar, será antes
forçoso perceber o que fez o SNS aproximar-se tanto do abismo. É essa reflexão
política que PS-BE-PCP estão a bloquear, fazendo um spin de apelos
pela salvação dos serviços públicos de saúde e sacudindo fantasmas contra a
direita. Há dois dias, foi Francisco Louçã a
fazer o número de contorcionismo. Antes, do lado do PS, foi a vez de Ana Catarina Mendes e Carlos César. Desde
há um ano, outros dirigentes do BE têm
feito o exercício. Se o cinismo matasse, caíram redondos no chão, pois só a
cegueira ideológica faria alguém cair na narrativa de ocasião: os dados conhecidos
sobre a queda do SNS mostram a profundidade das responsabilidades do PS (no
governo) e da esquerda parlamentar (no apoio ao governo) nos últimos 4 anos.
Primeiro, essas
responsabilidades são financeiras.
De acordo com uma auditoria
do Tribunal de Contas, a dívida do SNS a fornecedores e
outros credores aumentou 51% entre 2014 e 2017 – de 1,9 mil milhões para 3 mil
milhões de euros. O facto é
particularmente preocupante se se tiver em conta que, entre 2011 e 2014, se
havia conseguido reduzir a dívida a fornecedores de 3615 milhões para 1930
milhões. Ou seja, com o PS, observou-se a uma espectacular regressão, porque o
agravamento da dívida teve particular incidência na passagem de 2016 para 2017,
aumentando 21,4% num só ano. Apontou o
Tribunal de Contas, ainda, que a raiz do problema estava na diminuição de
transferências do Estado para o SNS. Repare-se: no triénio 2015-2017 foi
transferido menos 6,1% do dinheiro que entrou no SNS durante o triénio
2012-2014 – com a particularidade de, nesse período, estar em curso o programa
da troika.
O
governo contestou
estes dados, informando sobre a sua aposta em reduzir a dívida a
fornecedores e de lançar um reforço orçamental no SNS para 2018 e 2019. O
balanço do cumprimento desses compromissos será possível em breve, nomeadamente
observando as verbas executadas no sector (por exemplo, há dias constatou-se
que a dívida aos fornecedores continua a ser um desafio,
mesmo após várias injecções de financiamento). Mas, mesmo aceitando
essas intenções, isso apenas significaria que 2018 e 2019 serviriam para
corrigir os erros de 2016 e 2017. Erros cujas consequências se arrastam e se
manifestam repetidamente, seja através do encerramento de serviços de urgência, seja
através de médicos que pedem escusas de responsabilidades (não
têm meios para assegurar os cuidados adequados aos seus doentes), seja através
dos alertas do Tribunal de Contas sobre a (in)sustentabilidade financeira da ADSE (em
vias de voltar a ter de ser financiada pelo Orçamento de Estado). Olhe-se
de onde se olhar, é impossível deixar de reconhecer que o SNS foi
financeiramente estrangulado nos últimos anos — e que, consequentemente, quem
aprovou os Orçamentos de Estado respectivos (PS-BE-PCP-PEV) na Assembleia da
República tem a sua quota de responsabilidade.
Segundo,
as responsabilidades de PS e de BE-PCP-PEV são também do domínio das políticas
públicas: nestes últimos anos, o SNS permaneceu estagnado e em gestão corrente.
Não se conheceu uma única visão reformista para modernizar o sector —
exceptuando-se, talvez, uma disponibilização mais
transparente dos dados de desempenho do SNS. É inegável que a situação do SNS é problemática há
muito tempo, com desafios diagnosticados há vários anos. De resto, é de
elementar bom-senso sublinhar que o envelhecimento da população portuguesa
representa uma pressão crescente sobre os serviços de saúde – e que,
inevitavelmente, as suas falhas se irão expandir se não se prepararem respostas
adequadas.
Não foi, contudo, esse o debate
estratégico que animou as hostes políticas nos últimos anos. Pelo contrário, a
prioridade política dos partidos à esquerda foi a revisão da Lei de Bases da
Saúde, num acto de propaganda alinhado com a comemoração dos 40 anos do SNS. E,
nesse processo de revisão, a bandeira da esquerda parlamentar foi a ruptura com
o sector privado, visando as PPP na saúde — por sinal, com excelentes
indicadores de desempenho. Ou seja, em vez de preparar o futuro, a grande
prioridade da esquerda parlamentar foi retirar da esfera pública os hospitais
privados que têm servido bem a população e que tanto dinheiro têm poupado ao
Estado — não só piorando a qualidade dos serviços prestados à população, como
aumentando os encargos do Estado com esses cuidados. É certo que a ambição não
foi cumprida na sua plenitude, mas esse caminho nefasto começou a ser
percorrido.
Ora,
o resultado destas opções (orçamentais e não-reformistas) no terreno foi um SNS
de funcionamento débil e com indicadores de desempenho no vermelho. Dos dados
disponíveis, sabe-se que, em 2018, os tempos de espera para
consultas e cirurgias pioraram muito face a 2017, e nos vários
graus de prioridade — para os “não-urgentes”, tal aconteceu também porque o
governo decidiu redefinir para baixo os tempos máximos de espera, mas não deu
meios aos hospitais para os cumprir.
E, de resto, nem os dados são inteiramente fiáveis, visto que o Ministério da
Saúde é suspeito de ter executado uma limpeza administrativa das listas de
espera — um alerta do Tribunal de Contas (2017) acerca da
qual escrevi aqui e que, mais recentemente, foi avaliado por
um grupo de trabalho, que acusou a Administração Central do Sistema de Saúde
(ACSS) de bloquear a informação necessária para assim impedir a avaliação do impacto
dessa exclusão de doentes das listas.
Sim,
fazer o diagnóstico do que está a corroer SNS é crucial para o melhorar — e
todos esperamos que o próximo Orçamento de Estado responda a essas necessidades
com seriedade. Mas o diagnóstico político é igualmente indispensável e nenhum
exercício de retórica politiqueira poderá apagar as responsabilidades de
PS-BE-PCP-PEV no actual estado do SNS. É, claro, elementar apontar o dedo ao
PS, no governo, porque é o primeiro responsável. Mas o PS não fez nada disto
sozinho. Os que à esquerda hoje se posicionam na primeira fila para salvar o
SNS são, precisamente, os mesmos que passaram os últimos 4 anos a autorizar o
seu estrangulamento. Por mais que sacudam responsabilidades, as suas mãos
permanecerão sujas.
COMENTÁRIOS
Ana Brito: O PS gere o país como um motel de beira de estrada: entra quem quer, faz-se
dinheiro com tudo, o dinheiro entra aos rodos, mas para os mesmos. Quando
desaparece, só fica terra queimada.
Maria Carmo: Excelente artigo. A esquerda miserável apoiou todos os orçamentos e
cativações que levaram a esta tristeza. O sector privado não tem falta de
médicos por uma razão simples: paga o que é justo!
Ana Brito: O país
está a ser governado como um bordel: entra quem quer, ganha-se dinheiro com
tudo, não se salvará ninguém!
Carlos Chaves: Caro Alexandre obrigado pelo seu artigo, por enquanto parecem só números o
pior é quando esses números começarem a revelar o agravamento dos indicadores
de mortalidade (e já começaram), do acesso aos cuidados de saúde, de diagnóstico,
de medicação… no fundo de atraso no progresso que se quer na nossa sociedade.
Enquanto nós pioramos, outros melhoram e o fosso não para de aumentar. São os
resultados que a esquerda tem para apresentar!
Stra. Anabela Faísca: Adianta muito estes artigos a criticar o que está mal, quando antes os
mesmos criticavam ainda mais quem queria reformar o país e tornar mais
transparentes as instituições.
Leopoldo Palha: Não é só na saúde, o mesmo se passa nos transportes e na educação.
A concordância com as cativações, a canalização do
dinheiro para "seu público" (leia-se funcionários públicos), fazem do
BE e do PCP cúmplices de tudo o que está a acontecer e não virgens ofendidas do
estado capitalista, como gostam tanto de fazer.
José Montargil: O SNS tornou-se numa maldição para os portugueses!
Tem decaído a olhos vistos. Em plena
crise, em 2012 e 2013, fui variadíssimas vezes como acompanhante a hospitais
públicos e posso garantir que os doentes tinham todos os cuidados que os
médicos consideravam na altura necessários. Nunca
percebi que algum tratamento ou operação não eram feitos para evitar despesas. Em 2019 é completamente o inverso. Os doentes
passam mal porque acima de tudo há que evitar gastos. Não se fazem operações
para não gastar dinheiro em material. Não foram os médicos nem os
enfermeiros que mudaram, pois continuam os mesmos. Foi a política desgraçada
que esta esquerda sinistra tem feito na Saúde e que os doentes ficam em último
lugar. Este governo, esta política por ele
desenvolvida é criminosa. O orçamento de Portugal é completamente manipulado em
função de interesses partidários, tendo em consideração apenas motivos e
crenças políticas. Portugal está entregue a
políticos oportunistas que apenas pretendem obter dinheiro, poder à custa dos
doentes que são os contribuintes, os que pagam esta política de terra queimada.
Maria Mateus: Se isto fosse no tempo de P Coelho havia manifestações de rua e protestos à
porta dos hospitais. Mas, com a ajuda conivente de uma CS amestrada,
tenta-se varrer todos os males para debaixo do tapete. Aposto que ainda
há gente a dizer que a culpa é do Passos Coelho. Gente hipócrita e sem
vergonha. Mas temos que reconhecer que os Portugueses que votaram nesta
corja (e também os que não se deram ao trabalho de votar) têm muita culpa
nisto.
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