sábado, 16 de novembro de 2019

O certo é que se converteu



Em “natureza”. Disse Duarte da Gama, nas Suas “Trovas às desordens que agora se costumam em Portugal” apontando, em 30 estrofes, o descalabro na moral e nos costumes que as riquezas marítimas provocaram em Portugal: «Não sei quem possa viver   neste reino já contente,   pois a desordem na gente   não quer leixar de crecer:   a qual vai tam sem medida   que se nam pode sofrer:   nam há i quem possa ter  boa vida.(estrofe 1) …..
As riquezas foram usadas em luxos e não em esforço de trabalho e dignificação cultural, o próprio Duarte da Gama o explica:
(Estrofe 25): «A cidade de Cartago   depois de ser destruída,   fez em Roma mor estrago   que antes de ser perdida.   Os Romãos, dês que venceram,   foram dos vícios vencidos,  e seus louvores crecidos   pereceram.»
(Estrofe 26): Assi, por nam perecerem   os tam antigos louvores   dos nossos predecessores   convém de nos reprenderem   dos vícios e da torpeza   em que queremos viver,   antes de se converter   em natureza.
Nos nossos tempos, a riqueza veio por conta do empréstimo, mas a pobreza real permanece, convertidos a torpeza e os vícios em natureza nossa, por muitos, acarinhada. Alberto Gonçalves bem nos quer mudar esse status actual, com a sua crítica certeira, mas não há, para os nossos vícios e torpeza, emenda possível, transformados que foram em natureza própria.

São os loucos de Lisboa (e do resto do país) /premium
Portugal está repleto de imbecis, dos quais os maiores enchem as televisões a dar palpites, e os ligeiros servem de coro nas redes sociais (aparentemente os indivíduos equilibrados vivem no manicómio)
ALBERTO GONÇALVES, Colunista do Observador
PÚBLICO, 16 nov 2019
Há oito dias, numa daquelas erupções emotivas em que é pródigo, o prof. Marcelo subiu a um palco e declarou: “Conseguimos! Portugal tornou-se no país chave da revolução tecnológica!”. O palco era o da Web Summit, uma cerimónia de carácter religioso que decorreu para os lados de Moscavide e na qual ninguém, em nenhum canto do mundo civilizado e do outro, reparou. O extraordinário evento, que não foi noticiado por qualquer “media” a leste de Badajoz e a oeste das Berlengas, serviu para um guru carismático vender bilhetes e camisolas, para o Estado “investir” milhões e para governantes sem vergonha recolherem o aplauso de fiéis em transe. E só.
Portugal talvez seja razoável em matéria de rolhas e chinelos de dedo, mas anda tão distante da revolução tecnológica quanto perto dos resultados de uma lobotomia desastrosa. A coisa não teria sido pior se o prof. Marcelo tivesse visitado o IV Torneio de Columbofilia de Famalicão e decretado que estamos na vanguarda da conquista espacial. Ao contrário do que garante o prof. Marcelo, Portugal não tem os melhores jogadores do mundo, os melhores bombeiros do mundo, os melhores emigrantes do mundo e nem sequer os melhores portugueses do mundo. Em compensação, tem, provavelmente, o presidente mais inverosímil do hemisfério norte. A fechar a Web Summit, o prof. Marcelo, aplaudido de pé, jurou que “não temos medo do futuro, somos imparáveis. Ninguém nos vai parar.” E a seguir chamou os repórteres para, acompanhado do sem-abrigo que fez a descoberta, espreitar o recipiente do lixo onde se encontrou um bebé recém-nascido.
Muitos julgaram perceber um contraste simbólico entre o país que finge ser moderno e o país em que uma mãe deita fora o próprio filho. Julgaram mal. A senhora em causa é estrangeira, crimes terríveis acontecem em toda a parte, e a loucura individual é uma permanência em todos os tempos. Por sorte, a loucura colectiva é menos frequente. Por azar, é uma constante do buraco a que descemos: num ápice, meio mundo decidiu que a responsabilidade pelo bebé atirado ao lixo não é da mãe que tentou o infanticídio, e sim da sociedade, da crise de valores, da crise da bolsa, do capitalismo, nossa, minha e sua. No dia em que eu resolver abalroar com um autocarro o comentador Y por proferir palermices, espero que seja a sociedade a responder em tribunal. A miséria mental da pátria, afastada da inovação tecnológica e próxima da insuficiência cognitiva severa, não se revela no acto isolado de uma senhora desesperada, maldosa ou demente. A chatice é a demência geral que “justifica” e tolera o acto.
Ao invés do que sucede com a tecnologia, estamos perfeitamente aptos a exportar doidice. E os pessimistas, os que acham que não possuímos doidos suficientes, devem pôr os olhos no entusiasmo com que, nos dias seguintes à cimeira das camisolas, inúmeros portugueses saudaram a libertação do sr. Lula, ex-presidente do Brasil e afamado gatuno. Houve canais que transmitiram em directo a missa subsequente. Houve uma “jornalista”, dada a apaixonar-se por trafulhas, que se confessou arrepiada ou assim perante a “força” daquele homem. E houve, inevitavelmente à esquerda, e hoje quase tudo por aqui é esquerda, o tipo de veneração dedicada a um santo, um mártir a que, por uma réstia de pudor, a “inteligência” (não se riam, vá) oficial chama “preso político”.
Desde que haja boa vontade, até o canibal de Milwaukee poderia ser considerado um preso político. No mundo real, fora das alas de psiquiatria, o sr. Lula é um trafulha, que aprovou um gigantesco esquema de corrupção e acabou condenado por ele. Não duvido de que isto, apenas isto, seria suficiente para subjugar a esquerda à sua “força”, por norma indistinguível da delinquência. Porém, o sr. Lula acumula a desonestidade épica com uma boçalidade lendária, que o torna praticamente incapaz de falar a própria língua e de certeza incapaz de assinar o próprio nome. A “inteligência” indígena derrete-se face a um bom troglodita.
Aliás, ainda a “inteligência” não tinha terminado de se derreter com o sr. Lula, passou a dissolver-se de vez com o sr. Morales. O sr. Morales é o presidente deposto da Bolívia, despachado após sabotar eleições. O sr. Morales é também o erudito que atribuiu a homossexualidade dos europeus ao consumo de frango. Ditador, vigarista e chanfrado: era impossível a “inteligência” não apreciar tamanho vulto. Escusado dizer que a “inteligência” nacional é sinónimo da falta dela.
Eis a questão: Portugal está repleto de imbecis, dos quais os maiores percorrem as televisões a dar palpites, e os ligeiros servem de coro nas “redes sociais” (aparentemente, os indivíduos equilibrados vivem no manicómio). São estes chalupas, os melhores chalupas do mundo, que definem a “opinião pública” e traduzem o exacto atraso de vida que permite as infantilidades demagógicas do prof. Marcelo. Ninguém nos vai parar, e o problema é esse.

COMENTÁRIOS
Joaquim Moreira: Sou dos que diz, há muito, que a Inteligência Nacional é o grande problema de Portugal. Só mesmo um Liberal, pode descrever tão bem esta Loucura Nacional. Que, de facto, não é de agora, já vem do passado, em que, um qualquer bom falante dava um bom governante. E, por isso, nunca cuidamos de promover, quem realmente sabe fazer. E como dizia um grande amigo meu, somos excelentes a fazer diagnósticos, só falta fazer. Aqui há dias, saiu uma notícia que dizia, para nos informar, que havia mais Generais que Praças para comandar. E hoje, ouvi dizer, um dos muitos Administradores, que, há mais dirigentes do que trabalhadores. Portanto, e pensando bem, um país fortemente endividado, que reduz o tempo de trabalho, só pode estar a ser bem governado. Afinal, com tantos inteligentes a falar, só mesmo um demente é que quer trabalhar. Esta abordagem, ligeiramente diferente, serve só para contestar que, somos um país de loucos. Por uma simples razão: a de que para trabalhar ou fazer há mesmo muito poucos! ...
Jean valjean: E o louco sou eu!! Brilhante AG, Brilhante
William Smith > Manuel Ferreira: Concordo que a Web Summit não tem relevo algum fora de Portugal, que é uma má aplicação dos nossos impostos, embora deva haver alguns socialistas que lucrem com o assunto.
José Henrique Cruz: Todas as semanas é leitura obrigatória e um exemplo de lucidez. Abraço.
Gustavo Lopes: Que bela forma de arrasar esta malta tão inteligente, mas tão inteligente, que se calhar nem percebe este texto fabuloso!!! Que bela descrição, brutalmente assertiva, do nosso "Papa" Marcelo, e dos seus correligionários. Que nunca lhe doam os dedos, AG!!!
Luís Félix Morais: Como de costume, uma opinião lúcida sobre o “nosso” manicómio. Subscrevo, com excepção da notoriedade do evento. O web summit consegue publicidade em todo o mundo, graças às redes sociais. Isto só agrava o delírio presidencial e a sua demagogia. Para quem o ouve, fora do manicómio, a situação é hilariante. Se quem o ouve calha de ser português... o hilariante passa a trágico. Nem com incentivos fiscais (a sério? Acham que é disso que os emigrantes precisam?) pensamos regressar. É mesmo trágico.
Rui Lima: Confirmo eu vivo bem fora viajo procurei em tudo o que jornais , rádio e TV em vários países nem uma linha , fiquei confuso ao ler a nossa imprensa que apresentava o acontecimento como algo a escala planetária .

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