domingo, 25 de agosto de 2024

Vira o disco


Mas…

A política vice-versa

Como se distinguem os pagamentos extraordinários de Costa dos de Montenegro? Não distinguem. São o resultado da política vice-versa: aquela em que cada líder opta por fazer o mesmo que o seu contrário.

HELENA MATOS Colunista do Observador

OBSERVADOR, 18 ago. 2024, 01:12121

Marcelo veio agora pedir um pacto entre os maiores partidos na área da Saúde. Em Portugal, quem quer ficar bem na fotografia pede um pacto e creio que essa foi a intenção do Presidente. Não só porque este é um momento em que está politicamente vulnerável, mas também porque quem pede um pacto dá de si a imagem de consensualizador. Afinal está implícito que o pacto só não se consegue porque os outros só não aderem ao pacto por interesses ocultos, segundas intenções ou, o que para o caso vai dar ao mesmo, por cálculo político. Mas não só. Pedir um pacto para a Saúde é muito fácil porque, em 2024, o pacto para a Saúde não mudaria nada no estado do SNS. Oito anos de governação socialista, durante os quais o Presidente foi irresponsavelmente conivente com medidas como a aprovação das 35 horas para os trabalhadores do SNS, afastaram os portugueses do SNS, quer como utentes quer, ironia das ironias, como trabalhadores. Nada disto se resolve com pactos, mas sim com competência e pondo os interesses dos utentes em primeiro lugar.

Mas se o Presidente quer mesmo promover um pacto pode e deve virar-se para a Segurança Social, uma área em que um pacto é talvez a única forma de salvar da pobreza os actuais contribuintes e futuros pensionistas: segundo as projecções da Comissão Europeia, o valor das reformas vai cair para quase metade nos próximos anos. Actualmente o valor da reforma é equivalente a 84,9% do último vencimento. Em 2050 será de 43,5%. (As almas pias que andam para aí a dizer como quem reza um credo que os imigrantes estão a salvar a Segurança Social já pensaram que esses imigrantes terão uma reforma proporcionalmente muito mais baixa que aquelas que eles agora pagam?)

A degradação do valor das pensões não só é um tabu como a política dos pagamentos extraordinários inaugurada por Costa e prosseguida por Montenegro reforça a ilusão de que está tudo bem. Pior, agrava a politização da gestão da Segurança Social: cada vez menos o que se recebe é visto como o resultado de uma carreira contributiva, mas sim como o resultado da bondade de quem governa.

A opção do PSD de Rio e agora de Montenegro em não defender a importância dos governos de Passos levou não só a que Costa agarrasse a bandeira das contas certas como permitiu que se instalasse o dogma de que então se tinha governado contra os pensionistas. O resultado está aí à vista de todos no que se pode designar como política vice-versa: como se distinguem os pagamentos extraordinários de Costa dos de Montenegro? Não distinguem. Montenegro encurrala Pedro Nuno Santos ao anunciar os pagamentos extraordinários porque o líder socialista gostava de anunciar o mesmo. E, valha a verdade, podia fazê-lo nos mesmos termos.

Sim, nós temos muitos problemas por não existir continuidade nas políticas, embora essa falta de continuidade só cause preocupações quando o governo deixa de ser socialista. Mas os nossos dramas resultam precisamente do contrário: da continuidade. Basta olhar para a Segurança Social para o percebermos. Arriscamos que quem se reformar em 2050 tenha uma reforma por metade do que teria actualmente porque em matéria de Segurança Social vivemos a continuidade.

Sim, faz-nos falta um pacto nesta área. Não para que exista a continuidade do tal empobrecimento silencioso, mas sim para que se possa fazer a ruptura indispensável que o minore. Mas disso o Presidente não quer ouvir falar. E Montenegro também não. E Pedro Nuno Santos ainda menos. É o chamado consenso vice-versa: aquele assunto-momento em que cada um pode dizer ou fazer o mesmo que o seu contrário. É precisamente esse o ponto em que a linha do empobrecimento se cruza com a da mediocridade. Podem chamar-lhe sina. Eu chamo mediocridade.

Um passe para a GP – Greves de PortugalNo Pontal, Luís Montenegro anunciou o passe ferroviário a 20 euros e logo o país desatou a fazer contas sobre as vantagens e desvantagens deste anúncio. Mas não adianta fazer contas e muito menos criticar ou elogiar o Governo por este anúncio pois custe o passe o que custar em muitos dias ele não serve para nada porque a CP na verdade não é CP – Comboios de Portugal  mas sim GP – Greves de Portugal. Estava Montenegro no Pontal a anunciar o passe ferroviário a 20 euros e já decorria a greve convocada pelo Sinfb e pelo Stmefe, respectivamente Sindicato Independente Nacional dos Ferroviários  e Sindicato dos Trabalhadores do Metro e Ferroviários, entre 9 e 31 de Agosto. Entretanto o Sinfb já convocou uma nova greve entre 29 de Agosto e 9 de Setembro, a partir da sexta hora de serviço e ao trabalho extraordinário.

Tendo em conta o muito que os contribuintes pagam à CP pelo serviço público de transporte o que precisamos não é tanto que os passes baixem (o que só aumenta ainda mais o valor a transferir para a CP), mas sim que a CP preste o serviço de que praticamente detém o monopólio em Portugal: transportar os passageiros dentro dos horários previstos.

Lusa, a nossa agência “noticiosa”: “Milhares de opositores reclamam por “verdade” e Maduro mobiliza caravana motorizada”. Esta verdade entre aspas usada no texto da Lusa logo replicado em várias notícias é um bom símbolo da forma como a agência Lusa nos mostra o mundo: os opositores a Maduro pedem “verdade”. Cautelosa a nossa Lusa coloca verdade entre aspas porque como é mais que óbvio quem pede verdade pode estar a mentir e portanto usam-se aspas, faz-se uma citação e fica tudo acautelado. Curiosamente  ao mesmo tempo que coloca aspas na verdade exigida pelo opositores a Maduro, a nossa Lusa (sim, todos nós contribuintes somos obrigatoriamente accionistas da Lusa) escreve sem aspas “Mortos em Gaza ultrapassam os 40.000″ A fonte deste número é o Ministério da Saúde de Gaza controlado pelo Hamas, que para a nossa Lusa merece uma credibilidade várias vezes superior à oposição venezuelana e portanto está dispensado de ter as suas declarações entre aspas.

Nada disto espanta na Lusa. O que espanta e deve suscitar perguntas é a opção do Governo de Luís Montenegro de enterrar ainda mais dinheiro dos contribuintes na Lusa. Note-se que o Estado português já era maioritário na Lusa, mas os 50,15% que aí detinha passaram em Julho deste ano a 96 % quando o Governo de Luís Montenegro comprou as participações da Global Media e da sua accionista maioritária Páginas Civilizadas no capital da Lusa. Não sei quais os planos governamentais para a Lusa mas, para começar, vale certamente a pena que a Lusa explique aos seus accionistas, ou seja a todos nós, quais os seus critérios para o uso de aspas. Ficava tudo mais claro, o que é naturalmente de agradecer.

POLÍTICA      GOVERNO      PS     PRESIDENTE DA REPÚBLICA

COMENTÁRIOS (de 121)

Miguel Nobre Menezes: Os médicos nunca passaram para as 35 horas. Há 15 anos que trabalho 40 horas no SNS como médico. Ouço sistematicamente os jornalistas falharem sempre neste ponto. Todos. Sem excepção. É como o tema da falta de médicos. Há falta de médicos no sector privado? Não. Nem em Portugal, que produz há bastos anos médicos a mais. O que há é um SNS com um sistema ultrapassadíssimo, disfuncional, incapaz de promover a produtividade, alicerçado em ideologia em vez de pragmatismo. Quem trabalha bem fá-lo por brio profissional e está sempre a lutar contra toda a estirpe de disparates. É exasperante. Por isso tantos saem, e cada vez mais. Não é com “horas” que se resolve isso. A maior parte da actividade em Medicina não se mede em horas. Quando tivermos um ambulatório funcional, deixamos de viver para as urgências. Não é preciso inventar a roda. Basta olhar para os sistemas que funcionam na Europa ou mesmo em Portugal fora do SNS e mudar. Enquanto insistirmos no velho modelo inglês (as coisas no UK também estão péssimas, com problemas idênticos aos nossos) não saímos disto. É preciso pensar muito mais longe que a uns meses. E perceber que só uma reforma de fundo resolverá o problema - e demorará anos, não meses.                José B Dias: É sempre bom recordar a aprovação do regresso das 35h para a Função Pública ... e do que Marcelo afirmou que faria se se viesse a constatar efeitos perversos da medida! Os portugueses têm a memória muito fraquinha ...           Fernando CE: Marcelo “só” se preocupa com a sua popularidade. Agora os portugueses talvez descubram a diferença de um estadista como foi Aníbal Cavaco Silva. Nunca quis agradar, apenas preocupado com a ideia que ele tinha e tem sobre o futuro do país e dos portugueses.               Nuno Abreu: O problema é que nós, os velhos que somos já quase 50% dos eleitores votamos em quem nos garante o pagamento das pensões e nos fazem promessas de aumentos. Quem vier que feche a porta. Pobres dos nossos netos!              bento guerra > Maria Fernanda Louro: Puro cinismo                   Vítor Araújo: Confirma-se que o socialismo de Montenegro não é diferente do de Costa, do de PNS e mesmo do de Rui Rio, que felizmente nunca chegou a acontecer. O que se vem constatando é que o socialismo do Chega converge também com os demais, na aprovação de medidas populistas e eleitoralistas no que toca à questão económica. Parece não haver opção no espectro político após o único homem de estado ter deixado de governar há já quase 10 anos.     Jorge Espinha: Sobre a Lusa Helena, já os leitores do Observador andam a reclamar há anos nas caixas de comentários. O Observador faz copy paste daquilo que a Lusa noticia sem sentido crítico. E o mesmo acontece com a AP e a Reuters. Talvez o JMF deva ler a sua crónica. Quando à segurança social, qual a solução? Aumentar as contribuições dos trabalhadores e dos patrões? Há espaço para isso? Cada um de nós tem de ter o seu plano de poupança reforma paralelo ou seguir os conselhos da “casa de investimentos “             Alfaiate Tuga: Perdi a esperança, Portugal está condenado à miséria, ajudei a eleger um governo supostamente de direita, que todos os dias aumenta a despesa pública em troca de futuros votos, o PS não foi tão longe e até poderia ter ido. Este governo desde que tomou posse, mais não fez do que distribuir dinheiro pelos funcionários públicos mais ruidosos ou grevistas, agora vai tocar 400 milhões aos  pensionistas, afinal são muitos e é preciso mantê-los contentes não vá haver eleições amanhã.  Ou seja, este governo só implementou políticas de esquerda, que em nada reformam o país e apenas acrescentam despesa.  A baixa de IRS até ao oitavo escalão como prometido na campanha afinal é só até ao sexto,  ou seja os que são mais esbulhados em impostos para o governo distribuir dinheiro pelos acomodados improdutivos vão continuar a ser esbulhados.  Portanto Montenegrino, sejam as próximas eleições quando forem, o meu voto não vais voltar a ter.                   Rui Lima: Temos mais médicos, formamos mais médicos , temos o dobro de escolas de medicina , em relação a Europa. Se houver uma governação socialista no deserto do Sarah após um ano estarão a importar areia. O socialismo tudo desgoverna e o actual governo é primo dos socialistas, com as suas últimas medidas dá uma mensagem errada  ao povo , afinal tudo depende do estado é tão popular distribuir dinheiro sem resolver os problemas.                      Ana Luís da Silva: Quando leio artigos como este de Helena Matos, em que são reveladas as verdades ou, melhor dito, a mediocridade e a manipulação políticas e os seus protagonistas (PR, PM, LUSA), apesar de ser feia a realidade sinto sempre que a sanidade ainda existe sobre a Terra.  Montenegro acusa outros de populismo, mas ele próprio é a outra face desse populismo. Rendeu-se sem apelo nem agravo ao salva-vidas dos medíocres: o facilitismo. Mais: sem coragem de propor e realizar o que precisa ser feito para mudar Portugal (designadamente no transporte ferroviário), aderiu ao miserável pão e circo dos socialistas. Sem competência (sem competentes?) o PSD afunda-se no imediatismo popularucho.                Antonio Sennfelt: Cada vez tenho mais apreço por Pedro Passos Coelho!      

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