Basta o texto de JOSÉ RIBEIRO E CASTRO para explicar tudo, com os
antecedentes respectivos. Será que os de hoje - habituados que estamos às
facilidades do auxílio externo, e do descarrilamento governativo interno - terão
o mesmo rasgo que nos libertou do domínio espanhol com os RESTAURADORES de 1640
e seguintes? Ainda bem que existem pessoas como RIBEIRO E CASTRO para nos
alertar sobre essas cobardias! Quando às vezes vejo programas por esses portugueses
que nos mostram as belezas do nosso mundo português, ou até mesmo quando
acompanho a graciosidade e simpatia de apresentadores televisivos com a sua
expressividade própria, não julgo possível tal hipótese “iberiana”, “iberista”,
“iberizadora”, iberomedrosa (poderá ser merdosa igualmente) que nos arranque
deste solo antigo, de que Ribeiro e Castro refaz a História. Mas nunca se sabe!
Às vezes somos apanhados de surpresa. Já aconteceu e foi miserável. Nunca se
sabe.
Iberofonia? Não, obrigado
Ninguém fala ibérico. O ibérico não
existe, é uma invenção. Sim, há as línguas latinas. Mas houve o latim, de que
derivaram. Do “ibérico” não nasceu ninguém. Nem ele sequer. Não existe. Nunca
existiu.
JOSÉ RIBEIRO E
CASTRO, ADVOGADO
OBSERVADOR, 22 ago. 2024, 00:042
Quando alguém dá um abraço, até forte e apertado, convém ter o discernimento suficiente para distinguir: pode não ser um amigo. Pode ser o urso. O abraço do urso pode ser muito forte, fortíssimo até; mas não é de amigo, antes pelo contrário. O abraço do amigo conforta, o do urso mata.
Como Presidente da Sociedade Histórica
da Independência de Portugal, volto a esta série de crónicas em preparação dos
900 anos de Portugal, série que serve não só para conhecermos e lembrarmos como
foi, mas para fortaleceremos a consciência de eixos, pilares e capitais
essenciais ao nosso próprio ser. E, hoje, é oportuno focar-nos num dos nossos
mais preciosos recursos, sujeito que está a cercos e pressões, desafios e
ameaças: a língua portuguesa.
Português: pilar, eixo e perímetro de
um Estado-língua
Muitos
historiadores definem-nos como Estado-língua, destacando a importância da
língua para a nossa existência e independência consolidada. Não havia portugueses
antes de haver Reino de Portugal; e o que os fez, além de se reverem no seu
rei, foi falarem a mesma língua e fazerem-na uma língua própria, distinta. No
seu livro mais recente, “Portugal na História – uma Identidade” (2022), João Paulo Oliveira Costa escreve:
«Quando a monarquia portuguesa
ganhou independência, ao longo do século XII, a população do reino, sobretudo a
sul do Douro, já comunicava através de uma expressão arcaica da língua
portuguesa contemporânea; tratava-se de um idioma claramente diferenciado do
asturo-leonês e do castelhano falados a leste, e estava em fase de
diferenciação da língua comum do ocidente peninsular, o galaico-português,
desde o século anterior. Em 1296, D.
Dinis ordenou que a documentação oficial do reino, incluindo toda a comunicação
da coroa com os seus súbditos, passasse a ser registada na língua portuguesa,
que era falada praticamente por todos os habitantes do reino e por quase
ninguém fora dele. Antes de ser um estado-nação, Portugal foi, pois, um
estado-língua.» (op.cit., p. 114).
D. Dinis foi, ele próprio,
poeta e trovador, cultor dessa língua, deixando-nos «73 cantigas de amor, 51
cantigas de amigo, 10 cantigas de escárnio e maldizer, e ainda 3 pastorelas,
num total de 137 textos», segundo a biografia de José Augusto de Sotto Mayor
Pizarro, em “D. Dinis” (2008) (p. 322).
Penso que ainda não fizemos suficiente justiça a D. Dinis,
que “fez tudo quanto quis” – um dos
nossos maiores reis, pela inteligência, visão estratégica e capacidade de
governação. Resolveu
os conflitos com a Santa Sé, fechou com Fernando IV de Leão e Castela (sendo
regente a mãe, Maria de Molina) a última
definição da fronteira oriental de Portugal (Tratado de Alcañices, 1297), povoou essa fronteira e equipou a sua defesa, outorgou
dezenas de cartas de foral, fundou a Marinha, criou a Universidade e
oficializou a língua de Portugal. Mostrou agudo propósito nacional,
como aponta António Resende de Oliveira, no “Portugal Medieval” (2023), que
escreveu com João Gouveia Monteiro:
«Admitindo que as razões de tal
promoção [da língua vulgar do território] não se afastariam muito do
enquadramento sugerido por [José Mattoso], poderemos talvez dizer que a
medida visou dois objectivos complementares: a
assunção da diferença perante as restantes línguas peninsulares, em particular
perante o castelhano, e, ao mesmo tempo, a uniformização
político-administrativa interna sugerida pela difusão do galego-português por
outros documentos saídos da corte.» (op. cit., p. 99).
Esta língua evoluiu até ao português
moderno, escorou o Estado e moldou a Nação, viajou pelo Mundo com os
Descobrimentos, plantou-se nos cinco continentes onde definiu e uniu outros
territórios, tornou-se uma língua global, internacional, exprimiu-se em leis,
romances, história, ciência, poesia, pensamento, cultura, modo de ser e sentir,
identidades, com tantas variantes quantos os seus países, lusófonos. Não
esqueçamos o início e o seu porquê: “assunção da diferença perante as
restantes línguas peninsulares, em particular perante o castelhano”.
Esta
nossa língua celebrou 800 anos em 2014, contados do testamento de D. Afonso II,
de 1214. E, colectivamente, estamos a entrar nos 900 anos do país que a gerou:
Portugal. São realidades formidáveis. Incontornáveis.
A ameaça da Iberofonia
Em 23 de Julho, o ABC, de
Madrid, publicou um artigo de opinião de Frigdiano Álvaro Durántez Prados,
intitulado “La Corona y la iberofonía”. O texto
conclui com uma frase que é também o lead: «São bastantes os sinais, sem mencionar sequer os muitos que vêm de
outras fontes, dirigentes e fóruns como as próprias Cimeiras Iberoamericanas,
que indicam que algo importante se está a movimentar em favor da cooperação
mais estreita entre o conjunto de nações iberofalantes do planeta, espaço que
podemos definir como a nova comunidade histórica de Espanha.»
O artigo coloca Felipe VI e a Coroa
espanhola no lugar central da promoção da Iberofonia. Espero que não seja verdade. Desejo que não passe de um impulso
oportunista dos que se aproveitam da figura do rei para dar vento a uma
política inadequada, inconveniente, até hostil. Voltarei ao tema em breve.
Neste espaço dos 900 anos de Portugal, devo, quanto possível, limitar-me a uma
abordagem histórica.
O conceito da Iberofonia – tão
engenhoso, quanto ardiloso – é uma ideia que tem vindo a ser soprada e
trabalhada, sobretudo no quadro da Comunidade Iberoamericana e seus ramos,
desde há cerca de uma década. Basicamente,
para nos engolir – e, de caminho, engolir também a CPLP. O conceito mete
tudo no mesmo saco, para aumentar e ampliar o poder do miradouro de Madrid –
“somos todos o mesmo”. A assinatura “ibérica” é reveladora; e uma nossa velha
conhecida.
A iberofonia é o iberismo em modo
linguístico e ampliando o compasso pelo mundo fora. Procura capturar por
dentro, pela alma e identidade, não escapando os outros países e territórios
lusófonos e, talvez para impressionar,
até os Estados Unidos da América (contando, aqui, os falantes de espanhol).
Por isso, o artigo de Frigdiano Durántez Prados acrescenta: «no âmbito académico já se denomina
“espaço panibérico” ou da Iberofonía e inclui o conjunto de países de língua
ibérica do mundo que, actualmente, atinge quase a cifra extraordinária de 900
milhões de pessoas, o primeiro bloco geolinguístico do planeta na base da
intercompreensão generalizada entre o espanhol e o português.»
O autor, principal promotor da ideia, apresentou,
em 2014, na publicação da sua tese de doutoramento, um Apêndice Cartográfico com a geografia
de espaços multinacionais como o da Iberofonia e outros (CPLP, Francofonia,
Commonwealth, Império Russo, etc.). O Apêndice tem um pormenor muito revelador:
o mapa que antecede os da Comunidade Iberoamericana e do “Espacio
Multinacional de Países de Lenguas Ibéricas” é o do “Imperio de la
Monarquía Hispánica (1580-1640/68)” – isto
é, exactamente o período que chamamos de Dominação Filipina, sendo os anos
1640/68 os 28 anos de guerra que levámos a ver-nos livres do rei espanhol e a
consolidar a Coroa de novo em rei português. É sintomático. Consigo imaginar o
grito triunfal, em ibérico evidentemente: “¡Felipes! Hemos vuelto. ¡Más
allá que nunca!”
Não brinquemos por favor. São memórias e lições históricas que
tomamos a sério. Sofreu muita gente.
Iberofonia – balão vazio, mas perigoso
Iberofonia é, em rigor, um conceito
falhado, inepto para se impor. Por uma razão simples: ninguém fala ibérico. O
ibérico não existe, é uma invenção fantasiosa. Sim, há as línguas latinas. Mas
houve o latim, de que derivaram. Do “ibérico” não nasceu ninguém. Nem ele
sequer. Não existe. Nunca existiu.
Os
textos reconhecem, por isso, a Iberofonia como neologismo, isto é, uma palavra
inventada agora, sem densidade, nem antiguidade. Não tem a nossa antiguidade
portuguesa; assim como, é claro, não tem também a de Espanha. Mas é inventada
para quê? É inventada para alimentar uma miragem mobilizadora, que nos leva ao
engano. Para servir o poder de alguém, como todas as miragens políticas. E esta
miragem o que procura é uma reorganização política do espaço.
À partida, o espaço geográfico
arrebanhado não passa de uma açorda, sem contiguidade geográfica, nem mútua
pertença, sem identidade própria, nem base histórica bastante. E sobre essa
açorda pseudo-ibérica procura afirmar-se (atentemos bem nas palavras e nos
conceitos do artigo no ABC) “o primeiro bloco geolinguístico do
planeta” e “a nova comunidade histórica de Espanha.” Nada mais,
nada menos do que isto mesmo: o primeiro bloco a nível mundial; ao serviço de
Espanha.
Retomemos a postulação inicial de
Frigdiano Durántez Prados: «el conjunto de naciones iberohablantes del
planeta, espacio que podemos definir como la nueva comunidad histórica de
España.» É preciso ser absolutamente claro a este respeito: não
fazemos parte da comunidade histórica de Espanha. Tirem daí o sentido.
Continuamos sempre o caminho de D.
Dinis. Iberofonia? Não obrigado.
PORTUGAL 900
ANOS HISTÓRIA CULTURA
COMENTÁRIOS
JM Azevedo: É isto mesmo! E já pensaram porque raio é que a volta
à Espanha começa em Lisboa? Abraço de urso... já não chegava o Vox apresentar
mapas da Península Ibérica em que Portugal é uma região de Espanha. Sim,
iberismo seja ele qual for, não obrigado! Obrigado JRC pela chamada de atenção
pública.
NOTAS DA INTERNET
Guerra
da Restauração
Após
a restauração da independência nacional, em 1640, com
o afastamento dos representantes da administração filipina e
a tomada do poder por D. João IV, a primeira preocupação do novo rei e dos seus
apoiantes foi, naturalmente, consolidar o poder alcançado. Essa consolidação
passava por iniciativas em vários domínios. Na ordem interna, D. João IV obteve
legitimidade formal sendo reconhecido e prestando juramento perante as Cortes de
Lisboa, logo em janeiro de 1641. No plano diplomático, o envio de
embaixadores a várias capitais europeias visou obter o apoio de outros
monarcas.
Contudo, o principal problema era de natureza militar, pois temia-se, e
acertadamente, ataques de Espanha. O governo do
reino precaveu-se, preparando exércitos e dispondo os meios para custear o
esforço de guerra. Os meios de defesa ter-se-iam certamente mostrado escassos
se os espanhóis atacassem de imediato, mas a Espanha estava
envolvida na Guerra dos Trinta Anos, que acabou em 1648, e apostou depois em
intervenções armadas noutros pontos, de maior importância estratégica para os
seus interesses que Portugal. Desta forma,
começou por assistir-se a campanhas esporádicas e inconsequentes, que
a resistência portuguesa enfrentou sem grandes
dificuldades. A primeira investida séria dos espanhóis deu-se apenas
em 1663, já no reinado de D. Afonso VI, tendo Portugal perdido
então as praças de Évora e Alcácer do
Sal. O conflito desenvolveu-se de forma descontínua, com arremetidas
irregulares, e de uma maneira geral pendeu a favor dos portugueses, que venceram uma
série de recontros importantes, com destaque para a Batalha do
Ameixial, em 1663, a Batalha de
Castelo Rodrigo, em 1664, e a Batalha de
Montes Claros, em 1665.
As
batalhas da Guerra da Restauração
A
guerra terminou apenas em 1668, com a assinatura de um tratado de paz, em Lisboa, a 13 de fevereiro.
Nos termos desse tratado, a Espanha reconheceu
definitivamente a independência de Portugal.
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