domingo, 31 de março de 2019

Breve História de Mascate e do sultão Kaboos



Ormuz, Goa e Malaca, eis três baluartes da dominação portuguesa, em terras do Índico asiático, ficou-me gravado, talvez da escola primária.
E assim vamos navegando num cruzeiro de requinte, por terras de um Oriente Médio que nos traz ao pensamento contos de encantar do oriente persa, extraídos das Mil e Uma Noites da ladina “Sheherazade apostada em salvar a sua vida, contando histórias de suspense, acerca de tesouros e outras fantasias, ao sultão mauzão que não sofria infidelidades femininas mas que era curioso de narrativas de mistério e aventuras. Salles da Fonseca vai-nos distraindo com coisas do presente arábico e simultaneamente pescando, curioso por histórias, como esse sultão Schahriar, atento ouvinte de Sheherazade, pormenores de um passado de que fizemos parte, nós, portugueses, sem, contudo, grande dimensão cultural, como velhos castros soterrados nas areias do tempo, deixando apenas vestígios de passagem, no mundo tão mutável, onde povos de cultura e dinamismo bem superiores ao nosso, espalharam influências de outra amplitude estrutural. Fica-nos o orgulho do termo Mascate, apesar da corruptela inglesa. O mesmo se passa com a marmelada portuguesa, de universalidade terminológica indiscutível, essa.
Quanto ao sultão Qaboos também me parece uma história a encaixar nas “Mil e uma Noites”, nos tempos vividos hoje, robustecidos pelas estrondosas receitas petrolíferas, a possibilitar outros tantos casos de dureza governamental, por vezes. E, todavia, a descambar para uma democracia admitindo “Sheherazades” no seu governo – caso deste sultão de Omã, “rei do petróleo”.

HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃSO 30.03.19
REI DO PETRÓLEO
O que está ali em cima escrito e que o meu leitor não descortina é o nome da capital do Sultanato de Omã, Mascate, a que actualmente há quem chame Muscat. Mas isto é a corruptela inglesa do nome original, o que nós, portugueses, trouxemos para a escrita em caracteres latinos nos idos de 1500 da nossa era. Sim, há situações em que os ingleses lêem o «u» como «â» e, consequentemente, vice-versa também. Eis como ao nosso som «mas» eles acabaram por copiar na escrita como «mus» e eternizaram o erro.
Enfim, desculpemos os tradutores britânicos que por certo seriam bons artilheiros mas que deveriam saber muito pouco de etimologia.
Portanto, pondo um ponto final na discussão etimológica, a capital do Sultanato de Omã chama-se Mascate, seja qual for o tipo de caracteres utilizado. Confesso que não fui investigar como se escreve em hindi nem sequer em chinês simplificado. Mas admire-se o meu leitor de que haja por essas bandas outras ou ainda piores corruptelas…
E foi a Mascate que aportámos depois de uma noite de navegação desde que zarpámos de Khasab[i] na Península de Musandam, exclave omanita na margem sunita do Estreito de Ormuz.
É em Mascate que reina o Sultão Kaboos, um autêntico «rei do petróleo». E falar dele é contar um pouco da história omanita das últimas décadas.
Qaboos ibn Sa’id Al ‘Bu Sa’id (nascido em Salalah a 18 de Novembro de 1940) é Sultão desde 1970 quando, a 23 de Julho, por golpe de Estado, depôs o seu próprio pai.
Como Sultão, detém, em conformidade com a tradição regional, o poder absoluto. Acumula os cargos de Chefe do Estado, de Primeiro Ministro, Ministro dos Negócios Estrangeiros, Ministro da Defesa e de Ministro das Finanças. Apesar da sua riqueza e poder, é considerado geralmente como autor de uma política moderada. Conhecido por ser um mãos largas (a que eufemisticamente se chama «desinteressado e generoso»), é-lhe creditada uma firme política anti-terrorista (é seguidor do Ibadismo que é diferente do Sunismo e do Xiismo).
O primeiro problema que Qaboos teve que enfrentar após assumir o poder foi uma incursão comunista armada do Iémen do Sul que derrotou rapidamente com escassa ajuda externa.
Governando com mão de ferro, desde há alguns anos tem dado passos no sentido de alguma democracia, nomeadamente com eleições parlamentares nas quais as mulheres podem votar e ser até candidatas.

(Foto do sultão  Qaboos ibn Sa’id Al ‘Bu Sa’id): « - Legislem à vossa vontade mas a decisão final é minha.»

Contudo, é grande a apreensão dos súbditos porque não se lhe conhece mulher (os comentários são emitidos sem grande contenção mas com muitos subentendidos) e, portanto, que se saiba, o trato sucessivo não está assegurado. Diz-se que há uma determinação de que ao terceiro dia após a sua morte, o Conselho de Família deverá abrir o cofre em que se encontra guardado o documento no qual ele próprio designa o seu sucessor. Quem será? Aguentar-se-á no «balanço»? Mistérios que ensombram o futuro de Omã como Sultanato.
Não nos esqueçamos de que a estabilidade política deste Estado não é «coisa» menor pois que se trata de um muito importante exportador de petróleo. E nem vale a pena buscar mais argumentos para explicar o perigo que por ali paira. E o homem já não é criança nenhuma.
Uma curiosidade não despicienda: o Rial (dividido em mil sub-unidades) é actualmente a moeda mais poderosa no planeta pois vale cerca de US$ 3,00 e de € 2,50. Imagine-se o que será comprar um Rial de pevides…
(continua)
Março de 2019

(FOTO: HSF diante da mesquita de Khasab)

[i] - Khasab é um lugarejo sobre que me eximo de escrever

COMENTÁRIO DE Adriano Lima  30.03.2019  23:25: Em texto de reduzida extensão, somos proporcionados por uma bela lição de história, geografia e política. Parabéns ao autor.

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