quarta-feira, 6 de março de 2019

País do fado



Um texto de lógica, de Salles da Fonseca, um de “lúdico”, de Luís Rosa, ambos em tentativas de aclarar o que por cá se passa, em termos de diversões governativas ou de seus apoiantes, do interior da “caverna”. O certo é que senti vergonha por Ricardo Salgado, que não parecia tê-la, quando apareceu em público, punhos de renda e expressão triste - nosso genérico, nosso destino.

 HENRIQUE SALLES DA FONSECA
A BEM DA NAÇÃO, 05.03.19

Das contas nacionais se extrai que:
O emprego cresceu 2,3% em 2018;
O PIB cresceu 2,1%

CONCLUSÃO 1
A produtividade caiu 0,2%.

CONCLUSÃO 2
Com este crescimento do emprego, o PIB poderia estar a subir 4%.
In «FORUM PARA A COMPETITIVIDADE» - FEV19
II - A falta de vergonha na cara de Ricardo Salgado /premium
LUÍS ROSA
OBSERVADOR, 4/3/2019
Não há pachorra para a cassete rançosa do ex-líder do BES. Se Sócrates não se cala com o PEC IV, Salgado imita-o para omitir toda e qualquer responsabilidade sua no descalabro do GES e do BES.
1. Não há pachorra. Sempre que a agenda mediática proporciona uma oportunidade a Ricardo Salgado de accionar a sua cassete em loop (“culpa é do Banco de Portugal e do Governo Passos Coelho”, “culpa é do Banco de Portugal e do Governo Passos Coelho”…), o ex-presidente executivo do BES não desperdiça e lá dá uma entrevista com a mesma mensagem de sempre: “culpa é do Banco de Portugal e do Governo Passos Coelho”, “culpa é do Banco de Portugal e do Governo Passos Coelho”…
E não há pachorra porque a cassete de Ricardo Salgado consegue ser tão rançosa quanto a cassete do PEC IV de José Sócrates. Se este argumenta (de forma delirante) que o PSD de Passos Coelho provocou o pedido de assistência financeira à troika com o chumbo do PEC IV, Salgado continua a não ter vergonha na cara por omitir toda e qualquer responsabilidade da sua parte no descalabro financeiro na gestão do Grupo Espírito Santo (GES) que levou à queda do BES e, consequentemente, à resolução determinada pelo Banco de Portugal.
Desta vez, não só o mau bocado que o governador Carlos Costa está a passar por causa do caso da Caixa Geral de Depósitos, como, acima de tudo, anúncio de que o Novo Banco vai pedir um reforço de capital de 1.149 milhões de euros depois de um prejuízo consolidado em 2018 que atingiu os 1.413 milhões de euros estão na origem de nova investida de Ricardo Salgado com uma entrevista à TSF.
Vamos ser claros. Se há coisa que Ricardo Salgado deveria fazer era ficar calado publicamente e de se concentrar na sua defesa em todos os processos criminais e de contra-ordenação que foram levantados à sua gestão e do GES pela Justiça e por diversas entidades regulatórias de Portugal, Suíça, Luxemburgo, Estados Unidos e Dubai, entre outros países. Precisamente por respeito aos lesados do BES e do GES — precisamente aqueles que diz agora que não o deixam dormir “totalmente descansado.”
Para contentamento de Ricardo Salgado, vamos deixar de lado o facto de o ex-líder do BES ter sido acusado de 21 crimes na Operação Marquês, entre os quais os crimes de corrupção ativa de um primeiro-ministro e de dois líderes da administração da Portugal Telecom. Vamos ignorar o facto de uma sociedade offshore secreta, a Espírito Santo Enterprises, que era por si dirigida através de um operacional suíço ter transferido quase 50 milhões de euros para Zeinal Bava e Henrique Granadeiro. Tentemos não nos lembrar que a mesma empresa que propositadamente não fazia parte do organograma do GES por vontade de Ricardo Salgado pagou durante mais de 30 anos remunerações e prémios por ‘debaixo da mesa’ a membros da família Espírito Santo e a centenas de administradores e de altos quadros do BES e do GES com transferências para contas no banco suíço dos Espírito Santo. E ignoremos ainda o facto de o próprio Ricardo Salgado ter recebido 16 milhões de dólares de um empreiteiro que era seu cliente no BES que só declarou ao fisco português depois de o Ministério Público ter descoberto as transferências feitas a partir de Angola para uma conta na Suíça aberta em nome de uma sociedade offshore de Ricardo Salgado.
Pelo bem de Salgado, ignoremos tudo isto — e consequentemente, e em abono da “equidade” que o ex-líder do BES diz defender — vamos também não esquecer que o ex-banqueiro disse na entrevista à TSF que não cometeu erros de princípio.
Então o que nos resta? ‘Só’ os seguintes pormenores:
a contabilidade de várias holdings do GES foram falsificadas devido ao facto de os prejuízos e passivos financeiros não terem sido devidamente registados.
a própria contabilidade do BES tinha activos sobrevalorizados e passivos subavaliados;
O BES foi obrigado a reconhecer nas suas contas de 2014 (ano em que Salgado saiu do BES) prejuízos de cerca de quatro mil milhões de euros, 980,6 milhões de euros negativos de 2015 e os prejuízos de 362,6 milhões de euros anunciados este fim de semana e que são referentes ao período entre janeiro e junho de 2016;
Entre junho de 2016 e o o final de 2018, os activos do Novo Banco herdados do BES já geraram 2,6 mil milhões de prejuízos. Só a carteira de crédito ruinosa do BES é responsável por 1,6 mil milhões desses 2,6 mil milhões.
2. Não sei se Ricardo Salgado é culpado dos diversos e graves crimes corrupção activa de políticos (José Sócrates e Manuel Pinho) e de funcionários do próprio banco, dos inúmeros crimes de fraude fiscal organizada e, consequentemente, de branqueamento de capitais ou dos ilícitos de abuso de confiança, burla qualificada e de outros crimes — que não a administração danosa porque a lei portuguesa só permite a imputação deste ilícito a entidades públicas — relacionada com a gestão do banco.
E não sei porque essa não é a minha função. Não sou juiz, procurador ou política para determinar a culpabilidade seja de quem for. Como autor de notícias sobre a gestão de Salgado no BES a minha função é descrever os factos que apurei de forma independente e neutra. Como autor de artigos de opinião é emitir um juízo de valor sobre algo de fundamentada e, uma vez mais, independente e equidistante dos protagonistas do caso BES.
Daí que diga que, tendo em conta os ‘pequenos’ pormenores acima descritos, das duas uma:
Ou o ex-banqueiro é um homem muito distraído e ingénuo — que era enganado a toda a hora por toda a gente que o rodeava;
Ou Ricardo Salgado é um gestor muito incompetente — dos piores que alguma vez passaram pela liderança de uma sociedade financeira por não saber escolher as pessoas com quem trabalha.
Seja qual a resposta certa, nenhuma delas abona nada em favor do ex-Dono Disto Tudo.
3. Sendo eu um defensor intransigente do direito da propriedade e do direito das famílias de deixarem o seu património para os seus descendentes sem que o Estado onere esses bens com impostos estapafúrdios, tenho simpatia por todas as famílias (umas mais poderosas do que outras) que perderam os seus bens durante o período revolucionário sem que o Estado tenha pago as indemnizações correspondentes. A família Espírito Santo foi uma delas.
Não há dúvida que o direito da propriedade é essencial para o sucesso do capitalismo — o sistema económico que mais progresso económico e social trouxe à humanidade por via da distribuição da riqueza. Mas também não há dúvida que o capitalismo e os mercados precisam de regras básicas para atingirem tais objectivos.
O problema é que Ricardo Salgado violou muitas das regras do bom capitalismo com a opacidade, a ganância e o lado predador do GES de outras empresas muito relevantes para o nosso mercado, como a Portugal Telecom. Salgado bem tenta fazer com que as pessoas acreditem que não só não era responsável por muitas das coisas que aconteceram no BES e no GES, como também nunca teve uma gestão centralizada na sua pessoa.
Independente de inúmeros testemunhos de membros da família, que apontam em sentido contrário, uma coisa é acerta: acreditem quem quiser.
4. Ricardo Salgado tem alguma razão nas críticas que faz ao Banco de Portugal e ao Ministério das Finanças, mas não pelas razões que aponta. Ou seja:
a resolução aplicada pelo Banco de Portugal (BdP) foi determinada pelo Banco Central Europeu, sendo que o BdP seguiu uma metodologia seguidista e acrítica. Certo é que tal medida de resolução nunca mais foi aplicada pela União Europeia;
Já o Ministério das Finanças, que fechou um acordo para a venda do Novo Banco ao fundo de investimento Lone Star, tem gerido o dossiê com os pés. Não só porque Mário Centeno foi vendendo a verdade aos bocados, como as contingências de cerca de 4 mil milhões assegurados pelo Estado vão sendo apurados agora.
Neste último sentido, a auditoria pedida pelo Ministério de Centeno aos créditos concedidos pelo BES de Ricardo Salgado também não deixa de ser uma cortina de fumo para disfarçar as responsabilidades do Governo António Costa na gestão do dossiê Novo Banco.
Seja como for, ou muito me engano ou esta auditoria que será feita aos créditos do Novo Banco vai voltar a demonstrar a responsabilidade da gestão de Ricardo Salgado na falência do BES.
O que só falta é o Ministério Público actuar. A ver se será este ano que o procurador José Ranito, o coordenador das investigações ao Universo Espírito Santo, termina a fase de inquérito. Já passaram quase cinco anos e já vai sendo tempo…

ALGUNS COMENTÁRIOS
Carlos Sousa: Ricardo Salgado nas finanças, José Sócrates na política, fizeram uma dupla irrepetível. Conseguiram um calote enorme para os portugueses durante gerações pagarem, e não terem crescimento. Parece coisa do passado, mas não é. Estas duas personagens continuam a ser protegidas pelo Governo e pela Justiça, adiando até à prescrição a punição dos seus crimes.
victor guerra: Ele é o banqueiro aristocrata, neste país de medíocres e trafulhas, que andaram ao colo dele. E que não podem cuspir para o ar, em face do que fizeram com o "banco de todos nós"
José Martins: 50 MIL MILHÕES  ENTREGUES ao  ESTADO. Oligarquia reinante, umas vezes servindo-se do PS, outras servindo-se do PSD e do CDS e agora servindo-se da geringonça, sonha é com o tempo dos monopólios salazarentos protegidos pelo Estado. Tal como Sócrates com quem Salgado tem muitos paralelismos, Salgado só ainda não está preso porque se falasse levaria meio regime atrás de si para a prisão. Da direita à esquerda e da justiça à comunicação social. 
Irene Feijão: Esquecemos que houve um juiz, sem medo do poder político, que ousou enfrentar estes poderosos da corrupção, e logo este governo da geringonça o substituiu pelo (juiz do computador) que tem feito malabarismos jurídicos no processo marquês e não há quem o detenha!...


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