quinta-feira, 28 de março de 2019

Somos os melhores



Há dias ouvi o Ricardo Araújo Pereira em chufas reiteradas ao “optimismo” balofo do Presidente da República, que o não deve ter visto nem ouvido, mas mesmo que o tivesse o não teria, já que o que me parece que ele tem mesmo é impudência, nenhuma lição lhe servindo, “pobre do lusíada, coitado!”, indiferente a críticas – neste caso a chufas que o puseram, no dito programa, de RAP, “Gente que não sabe estar”, a repetir sensaboronamente que “somos os melhores do mundo”. E ninguém o dissuade de envergonhar o país, com a autoridade do posto que ocupa, tirando selfies e dizendo baboseiras, o que é uma forma de conquistar votos, mesmo que seja à custa do ridículo com que enlameia o país. Somos os melhores do mundo, no futebol também se diz, quando perdemos os jogos, que ganhamos moralmente, ou que fomos injustiçados, etc.
Mas o texto de Rui Tavares, que começa por se socorrer de referências bibliográficas para desancar o país do outrora, que conquistou mundos, é certo, mas onde ele só viu sintomas de atraso, oportunismo manipulador e ostentação, (porque se tratava de classes mais “à direita”) país que não soube enveredar pelo trabalho sério, como fizeram os povos nórdicos, ao criarem condições estruturais para usufruírem inteligentemente das riquezas por nós conquistadas e desperdiçadas, a dada altura o texto de RT envereda pelo encómio, a lembrar o nosso PR com os seus encómios de mentirinha, nem sequer patrióticos, pois que patéticos, num espalhafato de adolescente mimada. Ao considerar que “Portugal tem condições suficientemente interessantes — geográficas, linguísticas, culturais e societais — para desejar ser não apenas uma sociedade em convergência com a média europeia, mas antes uma das sociedades mais desenvolvidas, cultas e iguais de uma das regiões mais desenvolvidas do mundo”, Rui Tavares, com tais contradições inesperadas, entre o que disse antes  e o que afirma agora, ou está “em gozação”, ou está em busca de qualquer outro cargo para si, sabendo que por cá o elogio é um bom meio de progressão na vida, e ele tem todo o direito de lutar pela sua. Mas a honestidade intelectual é fundamental, não é aceitável que ele não enxergue o que se está a passar neste país, e não só ao nível da educação, está visto.
OPINIÃO
Que fazer com este país?
Portugal tem condições suficientemente interessantes — geográficas, linguísticas, culturais e societais — para desejar ser não apenas uma sociedade em convergência com a média europeia.
RUI TAVARES     PÚBLICO, 27 de Março de 2019,
António Ribeiro Sanches, que deixámos na última crónica em 1759 escrevendo sobre Portugal as suas Cartas sobre a educação da mocidade, deixou implícito que o problema do país se resume essencialmente a um dilema: mão-de-obra barata ou valor acrescentado? Como vimos, a sua crítica precoce (para termos portugueses) à escravatura baseava-se desde logo só no facto de esta ser imoral — ou, nos seus termos, uma desumanidade — mas também incluía na sua análise as consequências de um modelo económico baseado na escravatura para o subdesenvolvimento cultural e social de Portugal. Enquanto as elites nacionais, no reino ou nas colónias, extraíam recursos humanos de África para que estes atravessando o Atlântico fossem extrair recursos naturais do Brasil, outros povos europeus manufacturavam os produtos mais complexos, mais intensivos em conhecimento e tecnologia, que o ouro luso-brasileiro ia depois comprar. No curto prazo os portugueses ficavam mais ricos; a longo prazo ficavam mais pobres, porque não tinham sentido necessidade de se educar para produzir com mais valor acrescentado.
Como descrevi então, esta tese atravessou os séculos — de Garrett a Passos Manuel, de Antero de Quental a António Sérgio — e de certa forma ela é relevante ainda hoje. Aludi na crónica anterior à forma como a crise de 2008 foi enquadrada em Portugal como uma luta entre duas desvalorizações. Uma, a desvalorização interna, consistia em competir com o resto da Europa e do mundo através dos salários mais baixos, simulando através deste mecanismo a antiga desvalorização do escudo que com o euro já não é possível fazer. A segunda era a desvalorização externa, que consistia em romper com o euro para poder desvalorizar o novo escudo, nunca se explicando bem que isso consistiria também num corte de salário. Ora, uma desvalorização — interna ou externa — é sempre um atalho. Fora de um momento de crise, um atalho não é um caminho de futuro para o país. E navegar à vista, fazendo um bocadinho de cada coisa, também o não é.
Um caminho de futuro só pode passar pelo contrário da desvalorização — de qualquer desvalorização, seja a da austeridade, seja a do rompimento com o projecto europeu — e projectar a médio prazo aquilo a que poderíamos chamar uma “Grande Valorização”. Há anos que defendo que essa grande valorização deveria passar por três eixos fundamentais — valorização das pessoas, do território e do conhecimento — e mais recentemente tenho defendido que ela seja precedida de um grande debate nacional que nos permita encontrar em conjunto as metas em cada um desses eixos. As medidas e as políticas específicas fariam parte, como é natural é desejável que seja, do terreno contencioso da política, em que cada partido ou cidadão escolheria as propostas e programas a defender. Essa pluralidade essencial não sai prejudicada, pelo contrário, pela existência de objectivos comuns. Foi assim que fizemos a primeira geração de políticas após o 25 de Abril, e foi assim que muitos países — da Irlanda à Finlândia — se têm conseguido modernizar.
Uma valorização das pessoas, do conhecimento e do território passa certamente pela realização de verdadeiras reformas. Não as reformas erradamente “estruturais” das falhadas políticas a curto prazo da desvalorização interna. Mas o tipo de reformas que permitam sustentadamente aumentar produtividade e fazer o país subir na escala de valor europeia e mundial. Essenciais seriam uma reforma do ensino superior, uma reforma da administração pública e a regionalização. Sim, eu sei que a última é politicamente uma batata quente, mas olhemos para um mapa com as regiões mais pobres e mais ricas da Europa e rapidamente veremos como se tornaram mais prósperas as regiões espanholas, de que a Galiza é uma ilustração, e como o Norte de Portugal ficou comparativamente mais distante destas. Uma valorização das pessoas passaria necessariamente por políticas de micro-economia, ajudando as empresas a incorporarem conhecimento e tecnologia na sua produção, e por um reforço das provisões de bens públicos por parte do estado, para não deixar ninguém para trás enquanto o país se tornasse mais produtivo e especializado. E um plano deste género não poderia passar por um rompimento com a Europa, mas antes pelo contrário por uma maior europeização da nossa economia e sociedade, sendo o estado um ajudante da sociedade civil e dos agentes económicos na captação de recursos europeus de uma forma mais simples, eficaz, e inclusiva do que se passa hoje.
No quadro desse debate nacional haveria talvez uma questão que apareceria mais tarde ou mais cedo. Essa questão é a da convergência com a média europeia — o Santo Graal das nossas políticas das décadas anteriores. Será preciso reflectir sobre se não é preciso ser bastante mais ambicioso do que apenas a convergência. Ou, em metáfora futebolística, se devemos continuar a jogar para o empate, maneira mais do que consabida de acabar a perder. Portugal tem condições suficientemente interessantes — geográficas, linguísticas, culturais e societais — para desejar ser não apenas uma sociedade em convergência com a média europeia, mas antes uma das sociedades mais desenvolvidas, cultas e iguais de uma das regiões mais desenvolvidas do mundo. Talvez precisemos de actualizar o nosso desafio como sociedade se queremos ir mais longe sem deixar ninguém para trás.
E é aí que o regresso a Ribeiro Sanches faz sentido. O Portugal do ciclo imperial foi um país que gastou todas as cartas sem conseguir dar um pulo de desenvolvimento. O Portugal do ciclo actual só pode contar consigo, com as suas gentes e com os que aqui quiserem viver e trabalhar, e com o seu território inserido no espaço político europeu. Terá chegado finalmente a altura de entender que só chegaremos “lá” com uma Grande Valorização daquilo que agora temos?
COMENTÁRIOS:
AA...Para a mentira ser segura ... tem que ter qualquer coisa de verdade,  Portugal 27.03.2019: Comentários muito interessantes sobre as razões do nosso crónico e secular atraso, apesar do ouro que choveu umas 3/4 vezes ao longo dos nossos 900 anos de história. Eis-nos chegados ao século XXI como o quinto país mais pobre da UE, e em risco de sermos ultrapassados pela Polónia e pela Hungria. O problema meus caros é a matéria prima das nossas gentes. Custa muito admiti-lo mas o povo é fraco, a sociedade civil é inexistente e os políticos, que temos gerado, é do mais rasca que há: completamente incompetentes e um bando de ineptos. A justiça não funciona e os corruptos de colarinho branco são totalmente inimputáveis. Para quem quiser ter uma vida melhor, terá que procurar outros valores que não existem por aqui. Portugal só tem sol e praia para oferecer. Triste sina a nossa. É a vida.
A NON DOMINO, Terra 27.03.2019 : Nada, neste artigo, é ideia nova. Anda-se a escrever isto há, pelos vistos, uns 300 anos. Nestas últimas 5/6 décadas não há governo, académico, publicista, comentadeiro, etc. que não diga o mesmo. Claro que comunistas serôdios (como o José+Jonas) vão buscar o tema estafado e arcaico do "orgulhosamente sós", versão PCP (não acham que o PCP não está cada vez mais parecido com o Salazarismo nas suas posições ultraconservadoras e autárcicas?). Uma ideia nova, por favor.


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